Capítulo 4
Tomás balança a cabeça. — Ele fode quando está entediado, não perde tempo brincando. -
- O que você está insinuando? -
Thomas franze os lábios. - Nada. Você está certo em ficar longe dele. -
—Mas até um segundo atrás você disse outra coisa. -
— Quer ele goste ou não: fique longe dele, principalmente agora. -
Eu franzo minha testa. Estou tão cansado do mistério. Violet não me conta nada sobre Michael e Ethan e a briga deles, Xavier esconde de mim porque foi preso, e agora Ethan e Thomas... Ok, não é da minha conta, mas sei que algo está acontecendo agora, por quê? Esconde? O que há de tão ruim?
- Tudo está bem? — Você está matando aula... — eu digo.
Tomás fica tenso. — Só faltei alguns dias, estou bem. -
— Sabe, dizem que confiar em alguém que você não conhece é mais fácil do que confiar em alguém por quem você tem sentimentos. -
-Onde você leu isso? -
Dou de ombros. — Minha terapeuta me disse isso na primeira sessão. -
Thomas toma um gole de cerveja. —Por que você está fazendo terapia? -
“Não vou mais lá”, digo simplesmente.
— Se você não confia em quem conhece, como poderá confiar em quem não conhece? -
— Pense que se você confessar algo para alguém que você conhece, essa pessoa pode ter uma reação que irá te assombrar, porque você a terá por perto, queira ou não, — eu digo, — mas se você contar para alguém, eu não' sei lá, eles vão esquecer de você depois de contar a eles, porque você não é ninguém para isso. -
Thomas olha para mim e suspira. —Não tenho nada a confessar. -
- Na realidade? -
Ele concorda. - Nada. -
—Nem mesmo um pensamento que muitas vezes passa pela sua cabeça? -
- Mesmo que fosse? O que me importa se eu disser isso? -
—Dizer isso em voz alta às vezes faz você perceber o quão insignificante é esse medo. -
Quando fiquei doente, não só escrevi, mas li o que havia naquelas páginas, porque então percebi que estava chorando por coisas tão estúpidas que quase me davam vontade de rir.
Claro, não é divertido ter um ataque de pânico online no MC Donald's, mas não pode ser divertido depois? Droga, vou entrar em pânico com o Mc?
Tomás fecha os olhos. — Tenho medo de perder as pessoas ao meu redor por causa das coisas que faço. -
Eu olho para o perfil dele. O pomo de Adão se move enquanto ele engole. —E você já pensou naqueles que têm medo de perder você por causa das coisas que você faz? -
Ele abre os olhos novamente e se inclina contra os meus, depois balança a cabeça.
Eu dou a ele um sorriso tenso. — Bem, só porque você não se importa o suficiente para parar de fazer o que faz, não significa que outras pessoas também não se importem. -
Ele abre a boca mas não diz nada, vejo seus olhos caírem no chão novamente.
—O que você está fazendo de tão ruim que está preocupado em ficar sozinho? -
Tomás respirou fundo. - Você não entenderia. -
- Você ficaria surpreso. -
— Você disse: dizer isso em voz alta faz você perceber o quão insignificante é. Bem, se eu disser isso, só ficarei com mais raiva de mim mesmo. -
Parece haver uma consciência entre nós dois. Ele está me dizendo coisas que não são nada claras, mas eu as entendo perfeitamente.
Eu limpo minha garganta. —A dor física silencia a dor de cabeça—, murmuro, —li num livro. -
Como se tivesse acabado de levar um tapa, Thomas olha para mim e eu o vejo corar. - O que entende? Eu não faço isso. -
Ele começa a cobrir as mãos com as bordas das mangas do moletom.
“Não entro no mar sem shorts desde o ensino médio”, continuo. — Você acha que está sozinho, que ninguém te entende, mas tem gente que sente o mesmo que você, Tomás. -
Mesmo que ele não esteja olhando para mim, noto um brilho em seus olhos. "Eu parei", ele sussurra.
- Sim? Você acha que só o que sangra é ferida? -ELE
morde o lábio. — Você não sabe de nada, pare com isso. -
— Você está livre para ir embora se não quiser conversar — digo a ele — mas vou ficar aqui. -
— Você que é psicólogo, por que não pensa nos seus ferimentos? -
Eu sorrio. —Já pensei nisso. -
- Como? -
— Você sabe, em filmes ou livros sempre tem um personagem que salva o outro: ele está ferrado e ela o cura, mas ela se destrói para fazer isso. —Volte e olhe para mim. —Mas na vida ninguém vai te salvar se você não se salvar. Não fique aqui sentado esperando que algo mude em sua vida que de repente vai fazer você querer parar de fazer o que está fazendo, porque isso não vai acontecer. Você faz isso, salve-se. -
- E como faço isso? -
— Comece jogando fora o que você usa, para fazer o que você faz. No ensino médio, eu mantinha minha lâmina de barbear atrás da capa do telefone, então, assim que tivesse um ataque de ansiedade, iria ao banheiro, tiraria as calças e me acalmaria. Mas então joguei fora aquela espada. -
Thomas termina sua cerveja e se encosta na parte de trás do balanço, balançando uma perna para fazê-lo balançar. —E aí você parou? -
— Não: comecei a cavar as unhas em todos os lugares que pude. -
“Então não adiantou”, diz ele, quase sarcasticamente.
— Sim, mas depois comecei a cortar as unhas curtas. -
Mostro-lhe a mão, com as unhas tão curtas que não consigo nem fazer um arranhão. - E logo? Você não faz mais nada? -
Suspirar. A lembrança dessa época pesa no meu peito, mas se puder evitar farei um esforço.
— Chuveiros quentes, até você ficar quase com falta de ar do vapor, — eu admito. — Aí comecei a tomar banho com a caldeira desligada. -
- Você torna isso mais fácil. -
Eu quase ri. —Você acha que parou em um dia? Faz seis meses que não faço nada no corpo, a vontade está sempre presente, mas consigo combatê-la, me distraio: escrevo, leio. Começou na sexta série e terminou há seis meses. Não é fácil, mas se você não tentar... —
—Você acha que ele ainda não experimentou? -
— Não sei, não te conheço — gaguejo — mas você não pode desanimar só porque não parou na primeira tentativa. -
Tomás muda. Por intermináveis minutos ficamos assim: ouvindo a música e as vozes altas das pessoas que ainda estão na minha casa.
Quando de repente ele fala novamente. "Obrigado", diz ele, desviando o olhar. — Limparemos sua casa se você quiser. -
- Isso pode ajudar. -
Thomas se levanta e se junta a Xavier, Cohen e Martin. Dois minutos depois, todos saem correndo da minha casa.
“Obrigado”, digo, quando ele está na porta de saída.
“De nada”, ele insinua com um sorriso. Então ele olha para sua irmã, ao meu lado. - Venha para casa? -
— Acho que tenho que ajudar Iris a limpar — diz ele. - Leve Jamie para casa. -
—Você não precisa me ajudar——
— Eu te ajudo e depois voltamos a assistir filmes. -
Eu sorrio e aceno com a cabeça. - Está bem. -