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III - Surprise, surprise - Parte 2

—Há um banheiro por aqui? – perguntou procurando desviar do que ele dissera sobre as janelas. O mesmo fez que sim com a cabeça e indicou uma porta que até então ela havia confundido com um armário de tão bem colocada em um canto da parede – Vou me arrumar e lhe encontrarei em alguns minutos. E vou manter distância das janelas – emendou piscando para o garoto. Ken saiu da sala e ao fechar a porta atrás de si, a mulher que ficara para trás suspirou. Ou ela estava ficando louca ou seu anfitrião e aquele garoto escondiam muitos segredos.

Cerca de vinte minutos depois Louise surgira na sala de jantar onde o rapaz a aguardava.

Diferente do salão anterior, aquele novo ambiente era iluminado e a mulher estreitara os olhos brevemente acostumando-se à luz. A elegância era visível em cada canto. Havia uma longa mesa com dez grandes cadeiras distribuídas ao redor. Acima duas grandes luminárias clareavam o local, porém, na mesa havia três candelabros dourados. Não havia pratos ou talheres sobre a toalha branca trabalhada, exceto na extremidade onde havia a refeição já servida. Enquanto seguia para o lugar previamente preparado a mulata notava a forma como tudo naquela sala havia sido arrumado minuciosamente, cada detalhe escolhido a dedo por algum decorador detalhista e certamente nem um pouco barato.

Quando a mulher chegou à extremidade da mesa onde o rapaz a esperava, este lhe ergueu a mão. Louise lhe dera a mão esquerda e o mesmo a ajudara a sentar. Era uma grande cadeira com estofado muito confortável.

—Uma simples refeição para uma linda mulher – disse ele – espero que perdoe a humilde escolha de pratos, mas logo entenderá mais sobre isso.

Louise sorriu sem dizer nada. Havia encontrado um vestido vermelho com um grande decote que lhe caíra perfeitamente, destacando o colo e o volume de seus seios. Os ombros e braços ficavam à mostra e no pescoço ela usava um dos inúmeros colares deixados na penteadeira, todos ornamentados com pedras lindas que ela se perguntava serem verdadeiras ou cópias. De alguma forma nada ali lhe parecia tratar-se de cópias. Havia tomado um banho rápido e arrumado o cabelo com uma longa trança que lhe caía pelas costas. Se maquiara e encontrava um grande número de perfumes, um melhor que o outro e escolhera um deles para acompanhar.

À sua frente, na mesa, havia uma taça de cristal com vinho tinto e uma garrafa onde ela lera Henri Jayer Richebourg Grand Cru, porém, não entendia nada sobre vinhos para dizer se era ou não algo caro. Mas considerando por tudo ali, duvidava que seu anfitrião tivesse gosto por coisas simples em qualquer quesito. No prato havia um bife tão vermelho e brilhante que parecia estar cru, porém, o cheiro lhe atraía. Estranhamente sentira vontade de atacar o animal dono daquela carne e lhe arrancá-la pessoalmente. Isso era estranho, definitivamente estranho. Por fim ela cortara um pequeno pedaço com os talheres de prata que a aguardavam e ao provar sentira uma onda de prazer que nunca havia experimentado antes. O que era aquilo e quem havia feito?

—Enfim – disse a mulher quebrando o silêncio – aqui estamos.

O rapaz estava em pé, agora um pouco distante da mesa e observava um quadro na parede onde um cavaleiro atravessava um soldado com uma lança. Assim como antes lhe parecera que Ken iria ignorá-la, mas ele logo se virou e veio ter-se ao seu lado.

—Eu lhe disse que explicaria o que quisesse saber, mas não há um ponto certo por onde se começar, então pergunte o que tiver em mente e eu lhe responderei o que puder.

Dessa vez ao menos ele parecia mais receptivo.

—Onde estamos e onde está Stanley? – perguntou a mulher.

—Estamos no Hotel Venatores et Luna. Digamos que não seja exatamente um hotel. Esse lugar pertence ao Mestre Silverglade, sob outro nome, é claro e não recebe quaisquer tipos de clientes. Podemos dizer que aqui é mais seguro e discreto que muitas fortalezas no mundo. O Mestre Silverglade nem sempre está presente, sua atenção é requerida em diversos lugares e ele costuma vir aqui apenas em ocasiões especiais…

—Como a noite em que me trouxe, estou certa? – interrompeu Louise.

—Sim, como na noite em que a trouxe. No entanto, os lugares em que o Mestre é chamado não me dizem respeito. Sei apenas o que preciso saber. Senhorita, logo entenderá que vivemos em um mundo de hierarquias. Sabemos o que precisamos saber e nada além disso.

A mulata terminou de mastigar a carne devagar, aquela sensação e aquele sabor eram tão bons que ela queria poder imortalizar aquele momento. Em seguida provou o vinho enquanto pensava nas palavras a seguir. Não queria demonstrar mais apreensão que o necessário. Fora então que ela percebera um detalhe do qual era impossível não falar.

Louise virara a face na direção do rapaz como se o mundo corresse em câmera lenta. Seus lábios faziam um “oh” que não era expressado por palavras. Seus olhos brilhavam mais que o normal. Ele finalmente a encarou desde que entrara naquela sala.

—Você disse que meu coração não havia parado de bater, certo? – indagou ela – Isso quer dizer que o coração que estou ouvindo é o seu? Me diga que isso pareceu menos louco para você que para mim fazendo essa pergunta.

O rapaz esboçou um sorriso como na primeira vez que haviam se visto.

—E finalmente – respondeu ele – parece que você está despertando. Apenas para que se acalme, saiba que não está louca e sim, os batimentos que ouve são os meus. Sobre você, o que posso dizer é que seu coração agora pulsa em um ritmo diferente dos seres humanos. Ao passo que parece nem estar pulsando, ele bombeia o sangue pelo seu corpo com muito mais velocidade que o coração humano é capaz de fazer. Isso pode parecer loucura, mas irá mudar de ideia quando entender melhor seu novo metabolismo.

—Novo metabolismo? Diferente dos seres humanos? – perguntou ela arregalando os olhos mais do que pretendia – O que quer dizer com isso?

—Oh, oh – respondeu o rapaz torcendo os lábios por um instante – Aparentemente você e o Mestre não tiveram tempo de falar sobre nada…

Louise, você agora é uma vampira.

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