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Silverglade

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Dan Yukari
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Notas

Resumo

Vampiros existem? Eu pensava que não, até me tornar um deles. - Louise Armstrong. A vida de Louise nem sempre fora boa, tinha seus altos e baixos, seus bons momentos e aqueles muitos momentos de depressão e aborrecimento. Porém, de qualquer forma, era SUA VIDA e ela não fazia ideia do quanto deveria ser grata por isso. A bela mulata tinha trinta e oito anos, era alta e forte, tinha bumbum grande, coxas grossas e seios fartos. Os cabelos negros longos e bem cuidados eram seu xodó, seu orgulho, seu capricho. Vivia mudando cortes e penteados e amava suas próprias fotografias. Estava um pouco acima do peso, mas já não mais se importava com isso. Não depois dos últimos três namorados, três relacionamentos que não tinham dado em nada. E não depois dos últimos vinte homens com quem dormira casualmente e que sempre a elogiavam na cama. Ela era boa em sexo e isso lhe bastava para satisfazer ao menos essa pequena parte de seu ego ferido. Tudo mudara naquela noite, quando, ao acordar, a bela Louise percebera que tudo em sua vida havia mudado. A vida que ela conhecia não existia mais, ela havia sido assassinada! Agora, uma nova, misteriosa e surpreendente realidade se colocava à sua frente. Louise era uma vampira! Quem a havia transformado, o porquê e o que fazer eram respostas que teria de lutar para obter. Mas ela sabia que não poderia mais voltar atrás. Tudo que lhe restava agora era aprender como viver em seu novo mundo e que posição deveria ocupar nessa nova vida.

romance

I - O início

Vampiros existem?

Eles existem.

E agora existe mais um.

Louise abrira os olhos devagar. A sensação era de quem estivesse dormindo há dias. Em sua mente a única memória remetia a um sonho distante. Só poderia ser um sonho, era surreal demais para ser verdade. Ela não era uma assassina.

A bela mulata de trinta e oito anos arqueou o corpo e sentou-se na cama. Exceto pela luz que adentrava o quarto pelas enormes janelas todo o restante estava imerso na escuridão. As cortinas de seda balançavam enquanto a brisa invadia o ambiente. Inclinando a cabeça para a frente a mulher levou a mão à face reprimindo a leve tontura que sentia. Não se lembrava daquele lugar, tampouco como havia chegado até ali. O que estaria acontecendo?

Estava em uma enorme cama box king size recoberta por um lençol de seda branco – ou bege – considerando que a pouca luz não lhe permitisse uma completa percepção das coisas. O lugar estava gelado como se estivesse pela rua em meio à madrugada. Aliás, pensando por esse lado, que horas seriam? Escorregando pela cama macia a mulher colocou as esguias pernas para fora e tocando o chão gelado com a ponta dos pés tentou se levantar. A tontura de poucos instantes atrás voltou e ela precisou apoiar-se no colchão. Sentia-se estranha, não tinha ideia do que estaria acontecendo com ela, mas havia algo muito errado.

Quando finalmente conseguira equilibrar-se em pé, Louise notara que vestia uma camisola branca, também de seda como os lençóis da cama. Os cabelos longos e negros lhe caíam pelas costas. Suspirou e tentou se lembrar o que havia acontecido, mas a memória ainda era como uma floresta escura, apenas borrões que não lhe levavam à lugar algum.

Ignorando quaisquer outras coisas no quarto – afinal, aquela escuridão lhe impedia sequer de ver qual o tamanho real do aposento – Louise fora até uma das janelas e encarou o mundo do lado de fora. Sabia agora que aquele quarto estava em algum andar bastante alto pela vista. Abaixo podia ver as luzes em neon das propagandas em outros prédios e diversos telhados com o vapor e fumaça das chaminés de suas cozinhas. Olhando para cima as estrelas indicavam a noite, mas as horas ainda eram um mistério.

O ar gelado invadia o ambiente. A mulher respirou fundo e só então percebeu que não sentia frio mesmo com a brisa que passava e movia as cortinas atrás dela. Tocando a própria face a mesma notou também que estava gelada como um cadáver. Esfregando as mãos uma na outra confirmara que não apenas sua face, mas todo seu corpo estava daquele jeito. De repente sentiu-se como um daqueles presuntos que pegava toda semana em freezers no mercado. Estaria morta ou ainda estaria sonhando?

Tocando as laterais da janela a mulher sentira o metal gelado sob seus dedos. Felizmente ainda tinha tato e isso a fazia pensar que não estava morta. Agarrando-se com força à batente Louise erguera a perna direita e então subira na base. Percebera que estava nua por baixo da camisola. Mesmo em pé na janela a mulata tinha sequer metade da altura da mesma. A brisa tornara-se um vento mais forte e agora seus cabelos e a camisola esvoaçavam no mesmo ritmo da cortina. Bem abaixo era possível ver as luzes amareladas dos postes, dos faróis e as setas vermelhas de carros passando por uma rua movimentada.

—Eu entenderia o ímpeto de saltar, mas não o faria se fosse você.

A voz viera de dentro da escuridão e atingira a mulher como se estivesse tocando sua alma.

Louise virou a face devagar procurando por alguém atrás de si. Por mais que quisesse saltar para dentro do quarto novamente, não havia segurança em movimentos bruscos. Na verdade, pensando com mais calma, onde ela havia encontrado coragem para subir ali?

Girando o corpo devagar a mulher pode contemplar enquanto as sombras tomavam forma e um homem surgia, iluminado pela luz que entrava de fora e passava por ela. O sujeito tinha cabelos grisalhos lisos que escorriam pela testa cobrindo-lhe uma parte dos olhos. Em meio à escuridão o pouco que ela podia notar era que o mesmo usava um suéter vermelho. O sujeito então estendeu a mão esquerda claramente se oferecendo para ajudá-la a descer.

Ainda que aquele homem fosse mais suspeito que tudo até aquele momento, Louise aceitou a ajuda, ela queria respostas e ele provavelmente as teria. O toque entre suas mãos fez com que uma espécie de choque atravessasse por seu corpo. Um calafrio lhe subira pela espinha como uma pequena descarga elétrica. A mão do sujeito era quente e comparada à dela mesma agora, era acolhedora. De volta ao chão ela e o mesmo se encararam frente à frente bem próximo à janela. A luz que avançava brevemente pelo interior revelava os traços do anfitrião, olhos levemente puxados, lábios finos, nariz pequeno e o quadro do rosto levemente arredondado.

—Onde estou? – perguntou ela – Que lugar é esse? Não consigo me lembrar como cheguei aqui. Você me trouxe?

O homem a fitou de cima à baixo e ela se sentiu constrangida. Normalmente era ousada e atrevida, mas naquele momento sentiu-se invadida sendo observada curiosamente por um estranho enquanto estava seminua. O sujeito ficou a contemplá-la por alguns segundos, então suspirou e começou a falar.

—Suas memórias irão retornar em breve. Eu precisei lhe trazer para cá.

Louise sabia que havia mais que aquilo.

—Quem é você? E onde estamos? – insistiu – Não acredito que queira me fazer mal ou já o teria feito. Eu não saberia dizer como agem os sádicos, mas você não me parece ser um.

Caminhando para dentro da escuridão o anfitrião desapareceu novamente nas sombras. Instantes depois uma melodia começou a tocar e então as luzes de meia dúzia de luminárias amarelas se acenderam pelos cantos. Agora a mulher podia ter uma melhor ideia do ambiente. A cama estava posicionada em um canto, mas a julgar pela distância entre as luminárias de chão aquele aposento era um grande salão. Ao lado de um dos móveis a silhueta do sujeito aparecia caiada pela luz. Sua face estava escondida nas trevas. O mesmo parecia uma estátua com as mãos dentro dos bolsos da calça.

—Evening Star, Nox Arcana, Winter’s Knight – disse ele. Sua voz soava como melodia em meio ao som que reverberava pelo aposento.

A mulher permaneceu imóvel tentando assimilar o que ele dizia. Era a única peça naquela estranha paisagem a ser banhada pelas luzes que vinham de fora. Sem que ela pudesse ver, o sujeito lambeu os lábios devagar. Poderia guardar aquela imagem em sua mente para sempre.

—O que está dizendo? – indagou ela após alguns segundos de silêncio. De alguma forma sua voz não parecia tão harmoniosa quanto a dele e nem se encaixava na melodia que tocava.

—Música, artista, álbum – respondeu ele e sua voz sim parecia parte da melodia.

—Creio que não me trouxe aqui para falar sobre música. E ainda não me disse quem é você e onde estamos. Preciso me arrumar e ir para casa. Seria muito atencioso de sua parte se me dissesse onde estão minhas roupas.

—Isso – ele fez uma pausa após a palavra, como se estivesse escolhendo a dedo o que iria dizer a seguir – Talvez seja complicado para você entender até que recupere suas memórias, mas é aqui que você mora agora. Digamos que pelo menos até você escolher um lugar onde prefira ficar no caso de as acomodações não agradarem a todos os seus desejos.

Agora Louise sentia que tinha razões para ficar nervosa.

—Do que está falando? O que eu preciso me lembrar? Poderia acender as luzes?

Em meio à escuridão a mulher pode ver quando o sujeito levou à mão é face e tocando o semblante com dois dedos balançou a cabeça em negação.

—Eu poderia acender as luzes, mas isso certamente lhe feriria os olhos. Você não enxerga mais como antes. Sua visão, assim como todos os seus sentidos não é mais como antes. Todos os seus sentidos básicos estão aprimorados, mas você precisa aprender a usá-los antes de fazê-lo. Pense em si mesma como um bebê que precisa aprender a andar, se você o deixar seguir com pressa ele irá cair, é preciso aprender a engatinhar primeiro.

A mulher estava confusa e agora sua cabeça começava a doer. Aquela tontura de antes parecia voltar e ela sentia enjoo. O que estava acontecendo com ela?

—Por que você usa tantas metáforas para falar? – questionou ela apoiando-se na janela para ficar em pé – Não me sinto bem, o que há de errado comigo? Quem é você afinal?

O sujeito avançou e a tomou nos braços no exato instante em que ela iria desabar ao chão. Embora fosse alto e magro parecia ser muito forte. Suas faces quase se colaram e agora ela era capaz de ver bem dentro de seus olhos de cor púrpura. Seria efeito das luzes que banhavam os dois vindo de fora?

—Eu me chamo Silverglade, Johan Stanley Silverglade. Você está em transição e por isso está se sentindo desconfortável, mas lhe garanto que se sentirá melhor em breve.

—Não entendo. O que quer dizer com transição? – perguntou a mulher.

—Você acabou de voltar à vida – disse ele calmamente – Você estava morta. Eu matei você.

Eu não sou uma assassina, afinal de contas. Você é – pensou ela.

Na mente de Louise um turbilhão de perguntas se atropelavam. Ela queria perguntar tudo, saber tudo. Porém, o mundo escureceu, as sombras tomaram conta e ela finalmente apagou.