CAP. 3 - VIDEOCONFERÊNCIA COM OS LÍDERES
**Markus Richter**
— E então? - pergunto para Evelyn, deitada ao meu lado em minha cama. - Você vai tirar seu Ph.D.?
— Eu ainda não me decidi sobre isso. Já estou cansada daquela faculdade. Acho que vou tirar um ano sabático.
— Ou podemos avançar nos planos do casamento, e depois você se decide. - sorrio para seu semblante incrédulo.
— Sério? Você quer adiantar o casamento?
— Não vejo porquê não. Nós nos damos bem, você sabe que um dia quero sair da Alemanha e já concordou com esses e outros planos. Eu apoio sua carreira…
— Você nunca disse que me ama… - ela me interrompe, falando como se fosse mais um item da lista que estou fazendo.
— Evelyn… - suspiro me virando de frente para ela. - já falamos sobre isso diversas vezes. Tenho sentimentos por você e, para mim, o respeito vale muito mais que qualquer outra coisa que se possa sentir por alguém. Você prefere que eu te ame ou que nunca te traia?
— Quem ama não trai, Markus. - rio baixinho ao ouvi-la falar.
— Quer quantos exemplos de traição “por amor”? O respeito vale muito mais, querida. Amor, paixão… esse tipo de sentimento passa, o verdadeiro respeito se renova a cada dia. A paixão é algo passageiro, não tem sustentação própria, e o amor nasce da convivência. - acaricio seu rosto enquanto falo, depois beijo sua testa.
— Markus? - a voz de vati segue uma batida suave.
— Sim, vati? - respondo já me levantando para abrir a porta.
— Temos uma reunião em videoconferência. - ele responde empolgado. - Você não vai acreditar em quem está nos chamando!
— O Regente Mór? - pergunto brincando, e dou uma risadinha.
— Como você sabe? - ele pergunta espantado, me deixando boquiaberto.
— É sério? Eu estava brincando!
— Então vamos. Os dois maiores líderes da nossa organização, estão nos ligando. Aliás, te ligando.
— O que pode ser? - pergunto caminhando rapidamente ao seu lado pelo corredor, em direção ao seu escritório.
Escuto atentamente toda a situação da França, num alemão impecável. Estamos em condições precárias, tudo por culpa de um imprestável. Durant e Laviolette dizem também que suas próprias famílias podem estar em perigo. Olho rapidamente para o meu vati, ele parece estar muito surpreso, mas eu só vejo uma oportunidade.
— Olha, Markus, nós sabemos que não seria o ideal, mas…
— Eu aceito. - falo sem rodeios, interrompendo as desculpas de monsieur Durant. Os dois do outro lado da tela sorriem.
— Filho! - vati também sorri. - Mas que orgulho!
— Você entendeu o que está se passando, não é? - Laviolette me pergunta.
— Perfeitamente, mon seigneur. - respondo em francês, uma das línguas que falo. - Seu alemão é impecável! A França está sendo tomada por mãos desconhecidas, ajudadas pelo ex-Regente de Área que, provavelmente, forjou a própria morte. Prometo tentar achar esse verme e entregá-lo em suas mãos, além de restabelecer o nosso domínio sobre a França. Sei que tenho pouca experiência, mas darei o meu melhor. Dou minha palavra!
— Não vamos impor um prazo a você, pois sabemos que não é algo que se consegue da noite para o dia. Queríamos te empossar com um cenário melhor, filho. Sentimos muito por isso.
— Prefiro esse desafio completo, mon seigneur.
— Pode nos chamar de Filipi, ou Fil e Étienne, ou Étie. O mesmo vale para você Herbert. E, se você aceitar, gostaríamos que empossasse um cargo no Alto Conselho.
— É uma honra aceitar! - vati sorri para ele.
— Perfeito! Meu filho, Pierre, vai buscá-lo quando estiver pronto, Markus. E Herbert, apresente-se em até uma semana no núcleo aí em Berlim. Estou enviando a eles os documentos de sua posse, para que você os assine numa cerimônia solene.
— Eu já estou pronto, Filipi. - digo assim que ele termina suas instruções para meu vati. - Posso pegar o jatinho de meu vati em quarenta minutos.
— Deixe-nos fazer essa gentileza, Markus. - é a vez de Étienne falar. - Arrume mais uma mala para trazer. Fale para sua namorada fazer as malas também.
— Obrigado. Vou dar a notícia a ela. Se me dão licença. - faço uma pequena reverência enquanto me levanto, e eles me dão permissão para sair.
— Você não vai acreditar no que aconteceu! - falo com um sorriso largo, para Evelyn. Totalmente empolgado, assim que entro no quarto.
— Alguma coisa muito boa porque, parece que você está muito feliz! - ela sorri largamente, também. - O que aconteceu, amor?
— Acabei de ser nomeado Regente de Área! - Evelyn só entende o que falo para ela sobre a organização, a que eu e meu vati pertencemos.
— Parabéns, meu amor! - ela me abraça. - Você vai mandar em toda a Alemanha!
— Não! Vou mandar na França!
— O que? - ela se afasta o suficiente para me olhar nos olhos. Seu sorriso se foi.
— Exatamente o que você ouviu: França! Nossos planos de sair da Alemanha foram antecipados, querida! Partimos em pouco mais de duas horas. Não precisa fazer uma mala muito grande, teremos guarda-roupas novos, assim que chegarmos lá. Ficaremos num hotel cinco estrelas, até acharmos uma casa ou apartamento que a gente goste, e eles se encarregarão da aquisição para nós, se quisermos. Podemos trocar de casa depois de algum tempo…
— MARKUS! - ela grita, chamando a minha atenção. - Você não está me ouvindo! Eu disse que não vou!
— Como não vai? - franzo as sobrancelhas, sem entender.
— Você nem mesmo estava ouvindo o que eu estava dizendo… - ela me solta e se senta na cama. - você pensou em me perguntar, ou você já aceitou o cargo?
— É claro que já aceitei! É o meu futuro… o nosso futuro, Evelyn! - ela balança a cabeça. - Você sempre me diz que me ama, que partilha dos meus ideais. Você mentiu?
— Não, Markus. Eu não menti.
— Então o que é isso? - franzo o cenho, tentando entender todo o contexto. - Você partilha dos meus ideais enquanto eles não se realizam? Me ama, mas apenas se eu ficar preso aqui, esperando que meu vati me passe as rédeas dos negócios dele? Vai comigo para onde for, desde que seja atrás da muralha alemã, sem ampliar meus horizontes? O muro já foi derrubado, Evelyn! Os horizontes já estão visíveis, e cabe a nós caminhar ao encontro deles. O nosso futuro se apresentou para nós, vamos abraçá-lo juntos. Eu estou indo de encontro a ele e, se você me ama, você virá comigo.
— Eu te amo! - sorrio para ela. - Mas eu não vou com você, Markus.
— Você está brincando, não é? - rio em descrença.
— Não. - ela permanece séria. - Eu teria que falar com meus eltern…
— Então vamos. Eu falo com eles. - estendo a mão para ela, restaurando meu sorriso.
— Eu não vou, Markus.
Abaixo a cabeça, a balançando, enquanto penso por alguns segundos. Depois olho em seus olhos novamente.
— Existe algum motivo para você não querer me acompanhar? - pergunto, tentando entender seus motivos. - Seu vati ou sua mama está doente? Algum dos seus avós, ou tios? Ou seu irmão?
— Não. Todos estão bem…
— Então, o que está acontecendo, Evelyn? - pergunto suavemente. - Por que você quer abrir mão de nós assim? Não te deixo mais à vontade? Estou te pressionando de alguma forma? Te forcei a fazer alguma coisa que você não queria? Não te respeitei?
— Markus, você é maravilhoso! Esses dois anos ao seu lado, têm sido maravilhosos. Mas é que… - ela para de falar, e eu me abaixo à sua frente.
— É o que, Evelyn? - pergunto suavemente. - Me faça entender.
— Eu não quero ir para a França. Pelo menos, não agora.
— Qual a diferença entre agora e daqui a alguns anos? Quando falei em sair daqui, você citou a França. Foi a primeira coisa que me veio à cabeça para aceitar o cargo. Eu realmente não estou te entendendo.
— Eu apenas não quero ir.
— Então isso é um adeus, Evy. Se um dia quiser falar comigo de novo, procure meus eltern, está bem? - me levanto e entro em meu closet, para preparar minha mala.
— Markus? - ela entra pouco depois e para atrás de mim.
— Sim? - me viro para ela.
— Boa sorte! Espero que você aprenda a amar e seja feliz.
— Obrigado, Evy. - sorrio para ela, que se vira e vai embora.
Eu realmente esperava que ela fosse comigo. Seria bom ter um rosto amigo num lugar diferente. Um apoio que eu já estivesse acostumado a ter ao meu lado. Mas como as coisas nem sempre saem do jeito que queremos, o melhor a se fazer, é seguir em frente. A parte boa, como muitos em minha situação pensariam, é que, uma vez que estou solteiro, posso fazer o que quiser no final de cada dia, depois do trabalho, que pode ser cansativo ou prazeroso. Respiro fundo e faço a minha mala, com meus itens favoritos.
Claro que o novo cargo irá exigir que eu vista roupas mais elegantes e distintas que o estilo esportivo que estou acostumado, mas eu tenho dois ternos, e mais dois blazers, e claro que eles vão em minha mala, caso eu tenha que fazer algumas reuniões, antes de refazer meu guarda-roupa novo e impecável. Vou recriar meu estilo, de qualquer forma, mas isso não significa que eu não possa levar minha jaqueta de couro e outros itens mais descontraídos.
Como esperado, em duas horas, Pierre está na porta, para me buscar. Eu e meus eltern já fizemos um brunch de despedida, não sabemos quando teremos tempo e oportunidade de fazer uma refeição juntos novamente. Pode demorar meses, ou apenas algumas semanas então, achamos melhor aproveitar o pouco tempo que ainda estou em casa.
— Boa sorte, filho! - mama me abraça, chorando. - Me ligue sempre que tiver um tempinho, está bem?
— Sofie, deixe o garoto ir! - vati tenta fazê-la me soltar. - Você pode ir à França quando quiser, é um voo de menos de duas horas e você tem um jatinho à sua disposição.
— É o meu menininho se tornando um homem, Herbert! - ela funga, segurando meu rosto entre suas mãos. - Eu te amo! Não se esqueça de mim!
— Também te amo, mama! - sorrio e beijo seu rosto repetidas vezes, a abraçando. - Vou te ligar sempre, está bem? Será como se eu tivesse ido apenas até o centro da cidade. - ela assente, ainda chorando.
— Meu orgulho! - vati me abraça e beija meu rosto, eu retribuo.
— Não vou te decepcionar, vati! Terá ainda mais orgulho de mim!
— Assim que se fala, filho!
Pierre pede que o segurança leve minha mala e entramos no carro. Vejo Evelyn, assim que passamos os portões da mansão de meus eltern, e peço para parar o carro e, apesar de já desconfiar que ela não voltou atrás, meu coração tem um fio de esperança.
— Você vem? - pergunto ao descer do carro, mesmo vendo que ela não tem uma mala.
— Só vim te devolver o anel, e te dar essa lembrancinha. - ela me entrega uma caixinha.
— Fique como anel, Evy. Não tenho ninguém para dá-lo e, mesmo que tivesse, eu não daria! Foi para você que eu comprei. Use, guarde, venda… é seu. - ela sorri e agradece. - Posso abrir o presente, ou só quando chegar na França?
— Pode abrir. Eu ia te dar para o nosso casamento, mas… parece que ele não vai acontecer.
Abro a caixinha e vejo um par de abotoaduras com as minhas iniciais gravadas. MR, em cada uma.
— Obrigado, Evy. Vou usá-las sempre!
— Mais uma vez, boa sorte, Markus.
— Me ligue se precisar de alguma coisa. Qualquer coisa! Não vou mudar meu número.
— Está bem. Eu ligo.
Ela me abraça e vai embora. Sorrio encarando sua nuca, enquanto ela se afasta da minha vida, definitivamente.