Capítulo 4
"Ava".
"Ava".
Saltando, eu coloquei minha mão sobre meu coração. Esfregando meus olhos, Blaze estava ajoelhado ao lado da cama.
"Blaze, que horas são? Eu bocejei.
"Preciso da tua ajuda, querida". Disse ele, levantando-se.
Deslizando para fora da cama, apercebi-me que já não estava apenas de toalha, mas com uma t-shirt e um par de boxers. Será que ele me vestiu? Sentindo o rubor tomar conta do meu rosto, respirei fundo antes de o seguir até à saída.
"Tens de encontrar uma maneira de parar a hemorragia. Foda-se".
Que raio se estava a passar?
Ao entrar na sala de estar, parei quando três pares de olhos pousaram em mim. Bem, isto não era estranho. Todos os homens estavam vestidos de cabedal e eu sabia que todos pertenciam ao MC.
"Quem raio é aquele?".
"Tu nunca trazes as tuas putas para casa".
"Porra".
Bem, isto não era nada embaraçoso. Todos os rapazes tinham comentado, exceto o que estava coberto de sangue.
Será que ele estava consciente?
"Blaze, o que é que se passa?". Perguntei, dando mais alguns passos para a sala de estar.
"Ele foi baleado". Blaze suspirou passando uma mão pelo cabelo.
"Pare de dizer a sua puta merda. Ela não precisa de saber".
Era isso. Quantas vezes eu tinha sido chamada de puta desde que cheguei aqui, eu estava muito cansada para isso.
Olhando para ele, coloquei as mãos nas ancas: "Não sou uma puta e não gosto que me chames isso". Bocejando, aproximei-me do tipo que estava a sangrar: "Parece que levou um tiro no peito". Murmurei mais para mim própria.
"Cabra, com quem pensas que estás a falar?". Ele rosnou pisoteando seu caminho até mim apenas para ser parado por Blaze empurrando-o para o outro lado da sala.
"Não vá lá". Ele estalou, olhando diretamente para mim. "Não, a não ser que queiras que o Prez te meta uma bala na cabeça". Blaze rosnou, vindo para ficar ao meu lado.
"Oh, então ela não é sua puta, mas é do Franko, por que diabos ela está aqui? Ele rosnou.
Em nome de Deus, quem era este gajo?
Espremendo o nariz, olhei para ele com nojo. "O Franko é o meu pai, seu idiota. Agora cala-te e torna-te útil".
Ver a cor a esvair-se da sua cara era divertido, mas se o pobre coitado no sofá continuasse a sangrar, não tinha a certeza de que ele se safasse.
"Nem pensar".
"Como é que ele se chama Blaze?". Eu perguntei rapidamente verificando seu pulso, sim ele ainda estava respirando.
"Tommy". Blaze grunhiu fazendo com que eu olhasse para ele. Porque é que ele estava a olhar para mim?
Puxando a sua t-shirt para cima, suspirei de alívio "Vai buscar-me uma toalha, por favor". Era uma ferida superficial. Nada de muito grave, aqui o Tommy era só uma hemorragia. "Preciso de um anti-sético e de um fio.
"Ele está bem?". O idiota de antes perguntou.
"Ele está bem, é apenas uma ferida superficial, nada de muito grave. Assim que eu limpar a ferida e o coser, ele ficará como novo. Mas pode demorar algum tempo a acordar".
....................
"Obrigado, querida". Tommy sorriu para mim de onde estava deitado. Eu lembrava-me dele de todos aqueles anos atrás.
"Não leves outro tiro". Eu brinquei
Os rapazes até estavam bem. O Jared tinha pedido desculpa por me ter chamado puta, mas acho que tinha medo que eu contasse ao meu pai. O Tank e o Cruz eram os dois mais calados que não diziam grande coisa.
"Como é que sabias o que fazer?". Jared perguntou enquanto bebia um gole da sua cerveja.
"Ava é uma médica, rapazes, ela poderia ser um verdadeiro trunfo para o clube". Blaze latiu dando uma longa tragada em seu cigarro.
"Não". Eu olhei para ele. Eu não estava brincando de médico toda vez que um desses idiotas se machucava.
"Oh, isso é certo, você não quer que ninguém descubra". Ele sorriu.
Porque é que ele estava a ser assim? Eu tinha acabado de ajudar um dos irmãos dele e ele estava a agir como um completo idiota.
"Vai-te foder". murmurei, levantando-me da cadeira e dirigindo-me para o quarto dele. Precisava de mudar de roupa e pôr-me a caminho. Já eram quase 5 da manhã e se saísse agora, espero que não demorasse tanto tempo a chegar a casa.
Batendo a porta do quarto, peguei nas minhas roupas que estavam no fundo da cama. Despi-me das roupas de Blazes e vesti as minhas. Assim que estava a calçar os meus sapatos, houve uma batida na porta antes de Blaze entrar.
"O quê? Eu perguntei, não estando realmente no clima para enfrentar sua boca espertinha.
"Onde vais?
"Para casa, está quase a amanhecer e já não tens de tomar conta de mim". disse eu, vestindo o meu casaco.
"Querida, eu...".
"Não, querido", sussurrei, "leva-me só até ao raio do meu carro para eu poder sair deste buraco infernal".
"Não". Ele olhou-me de relance, agarrando-me pelos braços e puxando-me para ele. "Não podes ir para casa até eu dizer que podes".
"Deixa-me ir". Eu disse com os dentes cerrados: "Não és meu dono, mal me conheces, por isso, por favor, tira as mãos de cima de mim".
Ele era outra coisa. A sua atitude quente e fria estava a confundir-me. Eu nem sequer devia estar aqui e agora ele não me deixa ir embora.
"Pensas que és algo especial porque és médico. Não passas de uma puta motoqueira que regressou a casa. Pensando que ninguém te pode magoar por causa de quem o teu pai é. Querida, o teu pai não quer saber de ninguém a não ser do seu clube...".
Senti a picada antes de me aperceber do que tinha feito. A minha respiração tornou-se mais difícil e as minhas mãos tremiam. "Afasta-te de mim". Coaxei, sentindo as minhas emoções tomarem conta de mim. Estaria ele a dizer a verdade? Será que o meu pai só se preocupava com o MC. "Não me acho nada de especial, sei de onde vim".
Passando por ele, peguei na minha mala e saí dali a correr. Ele podia ir-se lixar. Quem é que ele pensava que era? Como é que ele me podia julgar quando nem sequer me conhecia. Não parei de correr até estar dobrado na berma da estrada a vomitar as minhas entranhas.
Limpando o lado da boca, respirei fundo e olhei em redor. Uma coisa era certa: eu não tinha sentido de orientação e agora estava oficialmente lixado.
Peguei no telemóvel e liguei para o número da minha mãe, pondo-o em alta-voz para poder ver um mapa e ver se me dizia onde estava.
"Ava, querida, porque não atendes as minhas chamadas? Onde estás, tenho andado muito preocupada". Ela quase chorou.
"Acalma-te mãe". Suspirei, passando a mão pelo cabelo: "Estou bem..."
"Diz-lhe para ir para casa com esse rabo magro". Uma voz que eu conhecia muito bem rugiu ao fundo.
"Mãe, onde estás?". Perguntei já sabendo a resposta. Ela estava aqui, estava com ele.
Depois de ouvir alguns palavrões, ele atendeu o telefone: "Vem já para cá, a tua mãe está em casa, onde ela pertence. Não me obrigues a ir à tua procura". E depois nada, ele tinha desligado.
Mas que raio, porque é que a minha mãe estava aqui, mais importante ainda, a minha mãe e o meu pai estavam no mesmo quarto e nenhum deles tinha tentado matar-se um ao outro. Isto era lixado, a minha mãe odiava o meu pai e tenho quase a certeza que ele a odiava a ela.
Ao ouvir o som de motas, o meu estômago desceu. Ele ia obrigar-me a subir para a parte de trás da mota dele. Conhecendo meu pai, ele já teria dito a Blaze o que ele queria.
Eu não queria nada mais do que entrar no meu carro e ir para casa, com ou sem a minha mãe. Vendo as motos passarem, uma parou na beira da estrada bem onde eu estava.
Ele não precisou de dizer nada, o olhar que me lançou foi suficiente. Peguei no capacete que ele me oferecia, coloquei-o e subi atrás dele.
.........................
Ao chegar à sede do clube, reparei que alguns dos rapazes estavam a espreitar lá fora. Uma vez que paramos, eu saí empurrando o capacete para Blaze. Eu não queria estar perto dele, não depois do que ele disse.
Enfiando as mãos nos bolsos, ignorei os olhares e entrei pela porta. A minha mãe estava no bar, com um copo na mão e vestindo um par de calças de pijama, ela estava a falar com um par de outras senhoras.
Quando me viu, as senhoras foram esquecidas e ela correu para mim, abraçando-me e puxando-me para um abraço. Ela deu-me uma bofetada, com força.
A minha mão foi automaticamente para a minha bochecha enquanto eu olhava para ela. Ela nunca me tinha batido, nem mesmo em criança. Eu era uma mulher adulta e ela tinha acabado de me dar uma bofetada à frente de toda a gente.
"Não voltes a fazer isso, estás a ouvir? Deixaste-me muito preocupado, Ava". Ela gritou, cruzando os braços sobre o peito, dando-me um olhar. O olhar que dizia "discute comigo e vais levar com mais força ainda".
Eu não ia discutir com ela. Como já tinha dito, a minha mãe era uma mulher assustadora e eu sabia que não podia ficar do lado errado dela, mas sim bater-me. Ela nunca tinha levantado a mão para mim. A nossa relação nunca foi violenta.
"Ava Maria Mendez, ouviste-me?". Ela repreendeu-me.
Eu estava mais envergonhada do que qualquer outra coisa. Ela estava a repreender-me como uma criança à frente de toda a gente e quando digo toda a gente, quero dizer toda a gente. Para estas pessoas ainda era a meio da noite, ainda era tempo de festa.
Cerrando os dentes para não dizer nada de que me arrependesse, decidi virar-me contra ela e ir-me embora. Não precisava de a ouvir. Sim, ela é a minha mãe, mas aquela não era a minha mãe, ela nunca faria isso, nunca fez isso.
Uma vez lá fora, agarrei-me à vedação para recuperar o fôlego, não sabia se devia chorar ou ficar zangada. De pé, debaixo da luz, tirei o telemóvel para poder ver a minha cara, ela apanhou-me bem. Ainda estava vermelha e a marca da mão da minha mãe ainda era visível. Ia mesmo ficar com uma nódoa negra.
"Ela apanhou-te bem".
Sem me dar ao trabalho de olhar para ele, decidi abrir uma aplicação no meu telemóvel e procurar um emprego. Não queria ouvir o que ele tinha para dizer.
"Come inside Ava. Há muita gente a querer conhecer-te. Querem conhecer a filha dos seus presidentes".
Oh, então agora eu era procurada, será que ele estava a falar a sério? Eu não queria estar aqui, quanto mais entrar e conhecer pessoas que provavelmente não voltaria a ver. Mesmo assim, ignorei-o, fingindo estar mais interessada no meu telemóvel.
"Ava". Ele estalou.
"O quê? Eu respondi, virando-me para poder olhar para ele.
"Entra já para dentro".
"Que tal deixares-me em paz? Tu não me queres aqui e eu não quero estar aqui. Por isso, que tal esquecermos que eu estive aqui e voltarmos a não ter uma relação. Que tal assim, velhote?". Fiz uma careta, vendo-o olhar para mim.
Não fazia ideia de onde vinha toda a coragem para lhe dizer aquilo, mas tudo o que tinha acontecido nos últimos dois dias tinha mexido com a minha cabeça. Eu tinha mudado, antes eu não teria dito boo a um rato, agora eu estava finalmente de pé sobre os meus próprios pés. A defender-me como devia ter feito há muito tempo.
"Está bem, faz a merda que quiseres". Ele estalou, voltando para dentro e batendo a porta atrás de si.
"Estás bem, querida?".
Será que este dia podia ficar pior? Ainda nem sequer eram 7 da manhã. Alguém lá em cima estava contra mim agora, tinha a certeza disso. Porque é que ele não percebia a dica e me deixava em paz?
"Um cigarro?". Ofereceu-se antes de acender o seu próprio cigarro.
Recusando a oferta, sentei-me com a cabeça entre as mãos. Ainda não conseguia compreender a presença da minha mãe aqui ou o que ela fez.
Tinha de sair daqui, não queria estar aqui. Foi o erro mais estúpido que alguma vez cometi. De pé, limpei as mãos nas calças de ganga. Neste momento não podia ir a lado nenhum, não tinha carro e não fazia ideia de onde ele estava.
"Ava, olha o que aconteceu há pouco". Ele começou a dizer, mas eu interrompi-o.
"Esquece. Não quero saber, daqui a umas horas vou-me embora e nunca mais me vais ver. Não me interessa o que pensas de mim, quer seja uma cabra empertigada ou uma puta motoqueira, estou-me nas tintas para isso, por isso poupa o teu fôlego". murmurei no momento em que a minha mãe saiu.
Ótimo, era mesmo o que eu precisava.
"Ava querida, o que está acontecendo?". Ela perguntou olhando para Blaze antes de olhar de volta para mim.
"Nada". Eu disse olhando para a distância.
"Dá-nos um minuto?". Ela perguntou a Blaze e, antes que eu percebesse o que estava a acontecer, ela estava ajoelhada à minha frente, com as mãos nos meus joelhos.
"Foram dois dias longos para ti, não foi?".
"Sim e agora eu estou pronta para ir para casa. Não quero estar mais aqui. Quanto mais depressa pudermos ir para casa, melhor. Devia ter-te dado ouvidos. Fui tão estúpida".
"Ava, querida, o teu pai quer conhecer-te melhor". Ela sussurrou, fazendo com que a minha cabeça se levantasse.
"Diz-me que não o fizeste? Eu disse, empurrando as mãos dela para longe de mim e levantando-me. "Diz-me que não disseste, porra.
"Cuidado com a língua, menina.
"Cuidado com a minha boca, tenho 23 anos e posso dizer palavrões se quiser. Tu, por outro lado. Tu odeia-lo, odeia-o com paixão, mas um dia aqui e estás de volta à cama dele".
"Eu amo-o". Ela rugiu: "Eu não o queria deixar há tantos anos, mas tive de o fazer. Tinha de te tirar de lá, não queria aquela vida para ti, Ava", gritou, com as lágrimas a caírem-lhe dos olhos.
"Não posso ouvir isto". Eu gritei, saltando do pequeno degrau e indo embora: "Mantiveste-me afastada dele durante 16 anos porque não querias que eu fizesse parte desta vida. Bem, adivinha mãe, eu vou sempre fazer parte desta vida enquanto ele for o meu pai".
"Porquê toda esta gritaria?".
"Ava, Ava querida, por favor não te vás embora". Ela chorava.
Parando junto aos portões, olhei para ver a minha mãe nos braços do meu pai a soluçar. Os meus dentes estavam cerrados com força. A minha mãe tinha mudado completamente. Não era ela, era ele.
Uma vez fora dos portões, onde ninguém me podia ver, soltei um grito. Não queria que fosse assim, mas fiquei tão irritada que não consegui parar. A nossa relação sempre foi boa, mas o facto de ela ter voltado tinha-a mudado.
"Que tal voltares para dentro. A tua mãe está chateada, Ava". Ele parecia estar em todo o lado.
"Vai-te embora". Sussurrei. "Deixaste bem claro o que pensas de mim, por que estás aqui a tentar meter o nariz onde não és chamado?
"Vais perceber quando não tiveres uma mãe". Ele rosnou, caminhando para a escuridão, fazendo-me sentir ainda mais mal comigo mesmo.
As coisas só pareciam estar a piorar para mim. Não era assim que eu tinha planeado que as coisas fossem. Não era suposto a minha mãe estar aqui. Com os ombros erguidos, respirei fundo antes de voltar para dentro. Não queria pedir desculpa à minha mãe, porque achava que não tinha feito nada de errado, mas sabia que tinha de o fazer.
Ao fazer contacto visual com o meu pai, ele deu-me um pequeno sorriso antes de fazer sinal para que eu fosse ter com ele. A cabeça da minha mãe levantou-se e ela saiu do colo do meu pai mais depressa do que um relâmpago.
Com os braços à minha volta, soluçou baixinho: "Desculpa, querida, nunca te devia ter batido, nunca te devia ter feito ou dito nada daquilo. Vamos para casa daqui a umas horas. O que quiseres, querida, não te posso perder".
"Não me perdeste, mãe, nunca me perderás". Sussurrei, abraçando-a com mais força.