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Oh, Deus do Céu, ele faria isso? Levaria alguém para lá? Ela teria de observar uma mulher bonita se enroscando toda nele? Teria de olhar enquanto flertassem? Teria de ir para a cama sabendo que a apenas poucas paredes finas e portas ele estava fazendo todos os tipos de coisas sensuais com outra mulher? Mia ergueu o queixo, desafiadora.
– Apenas porque fiz um voto como celibatária não significa que espero que os que estão à minha volta sigam meu exemplo.
Ele a estudou por um breve momento, alternando o olhar entre os olhos dela de uma maneira
desconcertante. Por que a olhava daquela maneira? O que estava vendo? Percebia a reação do
corpo dela a ele? Ela estava se empenhando ao máximo para esconder o efeito que ele tinha
sobre ela, mas sabia que a maior parte da linguagem corporal era inconsciente. Já passara a ponta
da língua pelos lábios três vezes.
– Você acha que Mathew teria sacrificado a vida, como você está fazendo, se a situação fosse
inversa?
Mia apertou os lábios. Ao menos, ia parar de lambê-los, pensou. Sabia exatamente aonde
aquilo estava indo. Seus irmãos estavam sempre falando a respeito. Jaz também opinava,
dizendo-lhe como estava perdendo os melhores anos de sua vida, numa baboseira sem fim.
– Vou fazer um acordo com você, Leon – disse, fitando-o. – Não lhe direi como viver a sua
vida se você não me disser como viver a minha.
– Afaste essas garras de gatinha, cara. Não preciso de mais inimigos.
Ele nunca usara uma forma de tratamento carinhosa quando se dirigira a ela. A maneira como
a dissera, com aquele indício de sotaque italiano que todos aqueles anos vivendo na Inglaterra
não tinham removido, fez a pele dela se arrepiar. Mas por que a chamara daquele jeito? Para
provocá-la? Zombar dela?
Mia dirigiu-lhe um olhar de reprovação.
– Não me trate com falsas gentilezas. Sou adulta. Tenho minha própria opinião.
– Mas você era apenas uma garota, na época. Se ele tivesse vivido, vocês teriam rompido
dentro de uns dois meses, se não semanas. É o
que adolescentes fazem.
– Isso não é verdade. Tínhamos sido amigos desde crianças pequenas. Estávamos
apaixonados. Éramos almas gêmeas. Planejávamos passar o resto da vida juntos.
Ele sacudiu a cabeça como se ela estivesse dizendo tolices.
– Você acredita realmente nisso? Vamos. Realmente?
Mia endireitou a espinha. Manteve-se firme na sua resolução de rebater quaisquer
críticas à sua decisão de se manter fiel às promessas que fizera a Mathew. Ela e Mathew tinham se
tornado amigos próximos durante o início da infância, quando tinham ido para a mesma escola
no vilarejo antes de ela ter sido enviada para o internato com Jaz. Os dois tinham começado a
namorar oficialmente aos catorze anos. Além da amizade com Mathew, seu lar estável tinha sido
um grande consolo. Os pais dele eram tão normais comparados com os seus! Não houvera festas
glamorosas com astros de Hollywood e a elite do teatro entrando e saindo todas as horas do dia
e da noite. Na casa de Redbank não houvera explosões de raiva nem trocas de insultos com as
pazes sendo feitas apaixonadamente até que o ciclo recomeçasse.
Os pais de Mathew, James e Susanne, respeitavam e apoiavam um ao outro, e Mathew sempre
fizera Mia se sentir parte da família.
Leon não tinha o direito de duvidar das convicções dela. De criticar suas escolhas.
Tomara
sua decisão, e nada que ele nem ninguém pudessem dizer a faria desviar do rumo que sua
consciência tomara.
– É claro que acredito. Eu acredito nisso com todo o meu coração.
O silêncio se prolongou.
Leon continuou olhando-a daquela maneira calculada. Desconcertando-a. Fazendo-a
Leon continuou olhando-a daquela maneira calculada. Desconcertando-a. Fazendo-a
pensar nas coisas que não tinha direito de pensar. Coisas eróticas. Coisas proibidas. Como seria o
contato dos lábios dele nos seus. Como seria
sentir-lhe as mãos em seu corpo. Como seus corpos
se encaixariam juntos, suas curvas com os músculos dele. Como seria correr seus lábios pelo
rosto dele com a barba por fazer, buscar-lhe os lábios com os seus e abri-los para lhe deixar a
língua invadir sua boca.
Nunca tivera tantos pensamentos maliciosos antes. Estavam fora de controle, zombando de
suas convicções, deixando-a ciente das necessidades que por tanto tempo fingira que não
estavam lá. Necessidades que agora se manifestavam naquele lugar secreto de seu corpo. A
maneira como Leon a olhava a fazia sofrer com uma paixão silenciosa. Ela tentou controlar
cada pequena expressão em seu rosto. Permaneceu imóvel, como uma das estátuas frias e sem
vida no andar de baixo.
Mas, como se estivesse, enfim, satisfeito com o que vira, ele rompeu o silêncio:
– Estarei no escritório no andar de baixo. Vamos comer fora assim que você desfizer a sua
mala. Então, me chame quando tiver terminado. Mia piscou algumas vezes. Jantar fora?
Com ele? Em público? As pessoas presumiriam
que estavam namorando. E se alguém tirasse uma foto que fosse parar nas mãos dos pais de
Mathew? Embora eles tivessem dito – junto com todo mundo – que devia seguir em diante com
sua vida, sabia que achariam doloroso se o
fizesse. E como não poderiam? Tudo que ela fizesse
com outra pessoa só lhes tornaria a perda mais difícil. Mathew tinha sido o único filho deles. Os
sonhos e esperanças que haviam tido para o filho tinham morrido com ele. Os marcos da vida –
namoro, noivado, casamento e filhos – jamais se concretizariam e a ferida ficaria sempre aberta.
Não podia fazer aquilo com eles.
– Não quer que eu prepare algo para nós aqui? – sugeriu.
Leon emitiu um som brando que poderia ter sido sua versão de um riso.
– Você está confundindo os contos de fadas. Você é a Bela Adormecida, não a Cinderela.
Mia sentiu uma onda de raiva em seu
íntimo. Que direito ele tinha de zombar de sua decisão de se manter fiel à memória de Mathew?
– Foi por essa razão que me pediu para vir até aqui? Para poder debochar de mim?
– Não estou debochando de você.
– Então, o que é que está fazendo?
Ele observou-lhe os lábios por um segundo, antes de tornar a lhe sustentar o olhar.
– Não faço a menor ideia. Mia franziu as sobrancelhas.
– O que quer dizer?
Ele se aproximou de onde Mia estava parada. Parou a menos de meio metro dela, mas
assim mesmo, ela sentiu o magnetismo de seu
corpo enquanto erguia os olhos para fitá-lo.
Nunca tinham estado tão próximos. Não de frente, com os pés quase se encostando.
A respiração dela ficou em suspenso quando Leon colocou um dedo sob seu queixo,
erguendo-lhe o rosto para que não houvesse meio de que seus olhos escapassem do poder
hipnotizante dos dele. Ela sentiu o calor do toque dele, como se a ponta de seu dedo fosse um
eletrodo junto à sua pele. Pôde sentir a fragrância amadeirada e cítrica da colônia dele, sutil e
tentadora com notas de limão.
Podia lhe ver a barba por fazer rente ao maxilar, uma lembrança da potência dos hormônios
Podia lhe ver a barba por fazer rente ao maxilar, uma lembrança da potência dos hormônios
percorrendo-lhe o corpo. Ela podia sentir seus próprios hormônios a mil.
Antes de poder se conter, umedeceu os lábios com a ponta da língua. Ele acompanhou-lhe o
gesto com o olhar, mantendo-o fixo em sua boca.
Mia sentiu o coração disparar quando ele lhe percorreu o lábio inferior com o polegar. O
movimento do polegar firme contra a pele sensível da boca de Mia fez com que cada
terminação nervosa do corpo dela ficasse alerta, causando-lhe traiçoeira excitação.
Leon deslizou a mão grande e quente pela curva da face dela, pegando-lhe um dos lados
do rosto. Um pouco do cabelo ruivo caiu-lhe sobre as costas da mão como uma cortina de seda.
Alguém já a segurara daquele jeito? Aninhara- lhe o rosto com ternura como se fosse algo
delicado e inestimável? O calor da mão dele penetrava na pele dela, fazendo-a ansiar para que
não segurasse apenas seu rosto, mas seus seios, para sentir-lhe a pele masculina contra a sua,
mais suave.
– Eu não deveria ter trazido você aqui – disse ele, num tom grave que reverberou pela espinha
dela.
Seu coração tornou a disparar, e a voz saiu quase inaudível: – Por quê?
Ele moveu o polegar pelo queixo dela e estudou- a com olhos inescrutáveis.
– Há coisas que você não sabe sobre mim.
Mia engoliu em seco. O que não sabia? Ele tinha corpos enterrados na adega? Chicotes
de couro, correntes e algemas? Um quarto vermelho?
– Q-Que coisas?
– Não as coisas em que você está pensando.
– Não estou pensando nessas coisas. Ele abriu um meio sorriso zombeteiro.
– Doce e inocente Mia. A garotinha num corpo de mulher que se recusa a crescer.
Ela afastou-se da mão dele, esfregando o rosto de uma maneira significativa.
– Pensei que estava aqui para verificar a coleção de arte do seu pai. Lamento se isso é
ingenuidade da minha parte, mas nunca tive
nenhum motivo para não confiar em você.
– Pode confiar em mim.
Ela lhe arriscou um novo olhar. A expressão dele não estava mais zombeteira. Na verdade,
parecia... triste.
– Por que estou aqui, Leon? Ele deu um profundo suspiro.
– Porque, quando vi você em Londres, não sei o que pensei. Vi você se encolhendo de medo
atrás daquela planta e...
– Eu não estava me encolhendo de medo – retrucou Mia indignada. – Eu estava me
escondendo.
– Senti pena de você.
O silêncio seguiu-se por um momento à declaração franca dele.
Mia respirou fundo.