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Cinco

Passei parte da madrugada me mexendo na cama de casal que dividia com Júlia, tentando encontrar uma posição boa para dormir e afastar os pensamentos importuno.

Não sabia o que iria encontrar no dia anterior, temia que fosse algo que não entrasse no meu agrado de jeito algum. Havia homens que, mais que se esforçassem, não conseguia agradar, era como de alguma forma fosse uma pista que não seria compatível de modo algum e eu temia que isto acabasse sendo mais um obstáculo comigo.

O primeiro era que não tinha muitas experiências sexuais e poderia passar uma vergonha tremenda na frente dele, quando não soubesse o quê fazer com as minhas mãos, a posição que deveria ficar ou o quê falar. Eu não sabia o quê falar! Não sabia se era melhor ficar em silêncio...e se eu não gostasse do que ele estivesse fazendo? Era para continuar em silêncio ou apenas fingindo que estava gostando com um gemido baixo?

....eu não sabia nem como fingir um gemido.

Por causa desse último pensamento, que mais foi como um aviso, sou obrigada a levantar e me trancar no banheiro e começar a gemer. Os primeiros gemidos foram horríveis e completamente roucos, mas os próximos até que soaram bonitinhos, continuei tentando, até que decido assistir alguns vídeos pornôs e sinceramente... acabou saindo como um tiro no próprio pé.

Eu me excitava com facilidade, graças a minha falta de relações sexuais e ver aqueles homens com seus belos paus eretos, fazendo aquelas mulheres gemerem e gozarem daquela forma, me fez querer sentir a mesma coisa, me sentir preenchida por um pênis daquele e me encorajar para o que iria fazer no dia seguinte.

Feio ou não, estava louca para sentar em alguém e iria fazer isso com certeza na manhã do dia seguinte.

Quando a porta do banheiro abre de repente, graças a falta de chave na fechadura, a primeira coisa que faço é sair do vídeo e encarar Mário com uma expressão que com certeza deixava claro o que estava fazendo.

Ele por outro lado, me encara com o cenho franzido e depois olha para o meu celular. Estava sentada sobre a tampa da privada, de certo modo que conseguia me mexer um pouco quando a umidade na minha parte íntima aumentava, fazendo uma pequena fricção. Era o único jeito que achava viável para tentar me aliviar um pouco, já que tinha tesão o suficiente acumulado dentro de mim.

- Tá fazendo o quê? - Ele pergunta sem rodeios.

- Nada.

- Nada o quê? Tava assistindo vídeo pornô que eu sei - Ele acusa. Irritada com aquela invasão levanto, passando por ele.

- Você me respeita, Mário, e além do mais se tiver assistindo, não é da sua conta.

Mário faz questão de me seguir.

- Você que tem que se respeitar! Mãe, com a idade que tem e ainda por cima vendo vídeo pornô! Uma verdadeira puta, é isso.

Me viro para ele no mesmo instante, pressionando meus lábios com força.

- Se acha que está me ofendendo - murmuro - Não está. Ser puta também é profissão e é melhor do que ser sustentada por alguém, por um macho escroto como você - Não espero que ele pense numa resposta, invés disso, continuo andando e entro no meu quarto bufando de raiva.

Se pudesse dar um fim em Mário, eu daria, sem pensar duas vezes, o mandaria de pés juntos para de baixo de sete palmos e bem longe de mim, já que era o que mais eu queria, ficar longe dele e apesar de já ter tentado outras vezes, ele sempre usava alguma ameaça contra mim e sempre tinha haver com Júlia, temia que na minha ausência ele sequestrasse minha filha, a matasse ou fizesse algo de ruim, apenas para me punir, pois sabia que ele era capaz muito bem disso.

Júlia acorda assim que começo a arrumar algumas coisas no quarto, não hesitando mais que poucos segundos antes de levantar. Continuo com o que estava fazendo, tirando por fim toda a roupa de cama para lavar. Diferente da casa de Gabriela, não tirava a roupa de cama três vezes na semana, bem que eu queria, mas não tinha tempo para isso, invés disso, esperava o final de semana para fazer isso e também não tinha uma máquina de lavar que, além de lavar ainda secava a roupa.

Antes de colocar a roupa no tanquinho, eu lavava na mão, só depois colocava no tanquinho e tinha que enxaguar pelo menos duas vezes antes de torcer e por no varal. E ainda precisava pedir ao tempo que me ajudasse, que colaborasse e não permitisse que chovesse no momento que as roupas estavam no varal. Isso já havia acontecido com frequência, mesmo eu pedindo.

Roupa no tanquinho, era hora de preparar o café da manhã de Júlia e a deixar com seu café em frente a televisão de cubo de 20 polegadas. A essa altura da manhã, Mário já havia saído de casa e só era eu e a Júlia, como sempre.

Varro primeiro meu quarto, depois passo para a sala e a cozinha, arrumando enquanto fazia isso. Depois entro no banheiro, para a faxina do final de semana, ele perto do banheiro do quarto de Gabriela, Lucas e Luan, era apenas uma pequena parte. Não entendia por quê toda aquela fixação por banheiro, claro, que se eu tivesse o dinheiro que ela tinha, iria querer também um banho bastante espaçoso, que coubesse também uma banheira com hidromassagem e um box que cabia facilmente quatro pessoas.

Claro que eu esbanjaria dinheiro, sem pensar duas vezes e seria exatamente isso que faria quando resolvesse o problema daquele empréstimo com o índio.

Termino a limpeza da casa, passando pano em tudo e tirando o pó, gostando da sensação de limpeza depois que tudo ficou limpo. Com Júlia no banho, já que teria que fazer o almoço, termino de por o restante da roupa no varal e volto para dentro de casa, no exato momento em que ouço Vaneide me chamando.

- Tava ocupada? - Ela pergunta, quando abro a porta da frente.

- Ia fazer o almoço. Entra - digo voltando para dentro de casa, ouvindo o portão abrir.

- Mário tá em casa? - pergunta baixo, temendo encontrá-lo por ali.

- Você sabe que ele nunca está em casa - digo na cozinha, me preparando para começar a cozinhar.

- Mas as vezes, né? - Ela se encosta no batente da porta - E aí, vai mesmo? - Prendo a respiração por um segundo, se toda vez que ela me visse e me perguntasse se eu iria, acabaria desistindo e teria que lidar com índio depois e, sinceramente não sabia como encontrar boa parte do dinheiro que devia em tão pouco tempo.

- Não disse que vou? - digo sem olhar para ela, cortando alguns temperos, sem saber ainda o quê faria para o almoço.

- Pode deixar que fico com a Júlia. Pode ir despreocupada - Se ela soubesse que eu não estava preocupada com quem Júlia iria ficar e sim se teria que fingir que estava gostando ou que conseguiria ir até o final, mesmo tudo indicando que não. Era muitas coisas que estavam se passando ao mesmo tempo na minha cabeça, era difícil se concentrar em apenas em uma, mesmo eu até aquele momento me esforçando para pensar e me concentrar em qualquer coisa que não fosse a visita que iria fazer a um presidiário no dia seguinte, em poucas horas.

- Ah. Obrigada - digo tentando fingir que estava calma, tranquila, se Vaneide me conhecesse bem, saberia que eu não estava tão calma quanto parecia, estava a beira de uma histeria, de ter um ataque, um troço, só de nervosismo misturado com ansiedade ou sei lá mais o quê.

Não tinha nem mais ideia do que estava acontecendo comigo, explicar então estava fora e controle.

- Então eu vou lá comprar as coisas que ele pediu.

- Que coisas? - Olho para ela por cima do ombro, franzindo levemente o cenho.

- O básico que ele precisa lá. Antes de você era outra menina que levava quando fazia as visitas, mas como ele enjoou da cara dela, agora vai ser você - Continuo sustentando o olhar dela, sem conseguir ter alguma reação - Mas não se preocupa não, não é muita coisa não.

Assinto devagar, a vendo sair em seguida de casa e me deixar ali com mais um medo. E se ele não gostasse de mim? Por que ela tinha que dizer isso agora? Não poderia ter dito depois ou simplesmente não ter dito?

Fico mais apreensiva do que já estava, quase não conseguindo focar no que estava fazendo e demorando o dobro do tempo, para preparar uma refeição.

- Mãe - diz Júlia, me seguindo a cada passo que dava na cozinha - Tô com fome.

- Tá quase pronto, Júlia - digo mexendo a panela com carne moída, que não demoro para desligar e servir Júlia que já estava mais do que impaciente.

Enquanto ela almoçava, tiro as roupas secas do varal e começo a dobrar. Roupa de Mário sempre tinha, a impressão que tinha era que ele sujava mais roupa do que eu e Júlia juntas, com certeza a cada volta que ele dava na rua, fazia questão de tomar um banho e vestir uma roupa limpa e assim por diante. Não havia outra explicação para a quantidade de roupa que sempre lavava dele.

Depois que termino de dobrar e guardar todas as roupas, aproveito para almoçar ou tentar, pois não estava sentindo fome, graças ao turbilhão de emoções que estava sentindo. Mesmo assim, forcei a comida a descer, mesmo com meu corpo dando todos os sinais possíveis e não possíveis para parar de insistir com a comida.

Lavei a louça por último, deixando tudo arrumado, mesmo sabendo que logo Júlia sentiria fome e eu seria obrigada a voltar para a cozinha e fazer alguma coisa para ela comer.

No final da tarde, Mário entra de repente em casa, sem qualquer aviso prévio, vai direto para o banheiro, aonde deixa a luz acesa ao sair, indo para a cozinha, aonde abre a geladeira e as panelas em cima do fogão velho de quatro bocas.

- Só tem isso pra comer? - questiona, vindo da cozinha com a panela pela metade de carne moída.

- Queria mais o quê?

- Isso aqui lá é comida?! - Ele grita - Isso aqui não dá pra nada.

- Se não dá, então vai comer em um restaurante ou se não manda alguém fazer a sua comida - Sem qualquer aviso prévio, ele joga a panela contra a parede, espalhando carne moída por toda a parte - Mas que porra, Mário!!

- Quem tem que ficar nervoso aqui sou eu! Não você!

- Você não compra comida nessa casa! - grito de volta - Na verdade, não compra nada! Não faz nada!

- Se tá achando ruim, dá o fora e deixa minha filha.

- Acha mesmo que vou deixar você com ela?! Você nunca cuidou dela! Nunca trocou uma fralda, muito menos perdeu noite com ela doente. Na verdade, você não deveria nem ser considerado pai dela, pelo quanto que você é ausente na vida dela!

- É melhor calar essa droga da sua boca, antes que eu mesmo faça isso! - Ele me empurra, por um instante quase perco o equilíbrio e caio. Não me dou por intimidada, nunca dei, nunca quis demonstrar medo, mesmo estando com medo dele. Se Mário desconfiasse, mesmo que fosse por um segundo, que eu as vezes ficava assustada com certos comportamentos dele, ele sempre faria e continuaria fazendo até o pior acontecer.

- Então vem, Mário. Já que você se acha homem o suficiente pra isso. Então vem, seu vagabundo dissimulado!

Ele faz menção em avançar na minha direção, entretanto, Júlia sai rapidamente do sofá e abraça minha cintura com força, o parando no mesmo momento.

- Minha mãe não! - Ela grita, o olhando sério - Não pode! A professora disse que não pode o papai bater na mamãe!

Abraço Júlia, olhando fixamente para Mário, estreitando os olhos.

- Vai me bater na frente da sua filha? - Meu coração estava disparado dentro do meu peito, era o quê acontecia toda vez em situações como aquela.

- Vai se fuder, Luíza - diz ele entre dentes, saindo de casa.

- Vai você! - grito alto o suficiente para ele ouvir. Continuo abraçando Júlia com força, até ter a certeza de que ele não voltaria e a fazer voltar para frente da televisão.

Quando consegui isso, precisei limpar toda a carne moída do chão com uma dor no coração. Só eu sabia o quanto custava cada alimento que eu comprava e quanto era doloroso ver desperdício da parte de Mário ou quando estragava alguma coisa. Infelismente não teria como reaproveitar aquela carne moída, era a nossa mistura da janta e agora eu teria que ir até a vendinha na outra esquina, ver o quê tinha lá.

A vontade de me livrar de Mário, apenas crescia dentro de mim, numa proporção sem tamanho. Todos os dias quando ele saia de casa para farrear, beber com seus amigos de copo, pedia que algo de ruim lhe acontecesse e que morresse, fosse parar no hospital, qualquer coisa! Só queria que ele saísse da minha vida e da vida da minha filha de uma forma ou de outra.

Uma vez, uma ideia louca surgiu em minha cabeça. Eu mesma poderia fazer isso, dando veneno de rato para ele ou até mesmo pedindo para Índio se livrar dele, ciente que essa segunda parte sairia cara para mim, já que ele iria me chantagear pelo resto da minha vida e teria que ajudá-lo em tudo que quisesse e isso incluía o tráfico. E é claro que eu não queria nem um pouco me associar ao tráfico, mesmo que não diretamente, eu havia crescido naquelas ruas, sabia muito bem o que acontecia com os “associados” e como os que sobreviviam ficavam marcados para o resto de suas vidas. Eu tinha uma criança que dependia de mim, não queria sentenciar ela à morte por uma decisão minha mal tomada no calor do momento.

Infelismente não seria pelas minhas mãos que o traste do Mário iria morrer, se é que ele iria morrer cedo, eu duvidava, geralmente pessoas como ele viviam por muito tempo, atormentando a vida de outras pessoas que só queriam sobreviver, empatando a felicidade alheia. Era exatamente isso que ele fazia, empatava o progresso das pessoas ao seu redor, ofuscava a felicidade alheia mesmo que fosse do tamanho de um grão de arroz. Era o quê ele mais fazia durante todos aqueles anos.

A mãe dele não me suportava, nem os irmãos e irmãs, acreditavam que tentei dar o golpe da barriga no filho e irmão deles, que só queria separar ele da esposa, quando na verdade, era Mário que não prestava e que me enganou. Eu não poderia nem me queixar para ela, para tentar por juízo na cabeça dele. Não podia, pois se fosse fazer, diriam que o comportamento dele era por minha causa, por ele estar amargurado com a vida que levava ao meu lado, sendo que eu fazia meu papel como mulher e homem naquela casa e, na grande maioria das vezes de mãe e pai.

Será que ela não via o quê o filho dela fazia diariamente? Fechava os olhos e os ouvidos toda vez que alguém comentava, que ele quebrava as mesas e cadeira de um bar? Tenho certeza que sim, não era preciso pensar muito para chegar numa resposta, se tratando de Mário, nunca era necessário.

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