4-Miami Beach, Flórida 1991....
Miami Beach, Flórida 1991....
Um ano antes, quem visse Vincent, o veria sentado no luxuoso escritório do cassino que dirigia em Las Vegas, comandando os negócios como ninguém. Alto, magro, mas forte como um pugilista, graças aos anos na prática de exercícios em sua academia particular. O cabelo negro, que podia estar bem penteado ou desorganizado, era um charme. Os olhos verdes puxados para o azul, expressivos. Era o único da família que tinha aquela cor de olhos.
A boca era sexy e cruel – fina e elástica – mas não era dada a demonstrar grandes expansões de vida: Vincent pouco sorria. Dentre os irmãos Bertizzollo, contudo, Vincent sempre se destacou. Sempre atraiu muitas mulheres, que não ficavam desatentas ao seu charme e elegância.
Tudo o que tocava transformava-se em dinheiro, que entrava a rodo.
Agora estava em Miami, ao lado do pai. Não fosse pela figura de seu pai, ele podia dizer-se independente. Tinha tanto poder, talvez mais do que tivera quando dirigia o cassino. Mulheres bonitas caíam em cima dele igualmente como antes.
Possuía o seu próprio avião, vivia até mais ostensivamente do que antes. Um verdadeiro homem de negócios. Agora tinha uma grande reputação. De homem violento, que era pavorosa.
Sua devoção ao pai era um dos sustentáculos do poder da família.
Vincent
Eu me sentia mudado. Pensar nisso não ia me levar à lugar algum. Mas aquele rapaz conservador e antiquado se fora. Eu me sentia como um homem que nasceu e viveu o tempo todo em sua cidadezinha, mas depois que começou a viver na cidade grande se tornou uma pessoa diferente.
Minha realidade tinha mudado.
Tudo que eu fazia agora era estar ao lado de meu pai e ajudá-lo. Eu, quando dizia que estava ao lado do meu pai, não queria dizer fisicamente, mas eu estava tomando conta dos negócios da família. Apesar de ser responsável por muitas mortes dos homens dos Sebastians que vieram, depois que meu irmão morreu, eu me tornei inabalável. Me tornei leal como um cão à família e ao meu pai, Don Salvatore.
Congelei todos os meus sentimentos. Não havia mais compaixão, não havia mais temor... mesmo assim, não me julgava capaz o suficiente para me tornar o novo Don. Sem meu pai, parecia que metade de minha força desaparecia. Eu precisava dele. Aos poucos, estávamos legalizando nossa vida. Eu queria sair das drogas, e investir em negócios lícitos. Foi uma das coisas que impus a ele, quando assumi os negócios da família. Mas uma coisa não tinha mudado. Ao longo da vida de meu pai, ele arranjara muitos inimigos, eu então fazia essa parte difícil. Eliminá-los ou afugentá-los.
Com raiva, me lembrei da esposa do meu irmão. Renata tinha sumido do mapa, desde o enterro do meu irmão. Desde esse tempo, estávamos a caçá-la. Fortes indícios mostravam que ela era culpada pela morte de Lorenzo. Um dos soldados reconheceu um homem que falava com ela no shopping. Ramon, filho do nosso arqui-inimigo. Eles não tiveram dúvidas em apontar isso, depois que viram as fotos de todos ligados a família dos Sebastians. Sua fuga também não deixava dúvidas sobre sua culpa.
E agora?
Ela estava quieta? Vivendo sua vida?
Ou estava unida aos remanescentes dos Sebastians?
Ficamos na cola de Ramon por um bom tempo para ver se achávamos ela. Mas nada!
E ela? Estava tramando contra nossa família?
Depois disso, tínhamos tomado muitas providências. Mudanças nos pontos de entrega, na nossa rotina e no modo como pegávamos a droga com nossos fornecedores. Deu um trabalhão danado, mas foi uma das estratégias que encontramos para levantar nossas defesas.
Unido ao desejo de vingança pela traição dessa mulher, eu me apeguei a outro sentimento. Eu acreditava que a encontrando, essa agonia da culpa que eu sentia por meu irmão estar morto se dissiparia. Os meus lamentos tinham se misturado aos da minha família, que a queria morta.
Morta?
Seria fácil demais. Antes, queria fazê-la sofrer. Morrer era muito simples para ela. Queria fazer como ela fez com meu irmão. Conquistá-la, deixá-la caidinha por mim e, só então, mostrar quem realmente eu era.
Ela com certeza deveria usar o anonimato. Usando dinheiro vivo. Ou até teria mudado de nome. Tudo isso estava sendo investigado. Eu não perdia as esperanças de encontrá-la. Era questão de tempo.
Saí para o pátio e olhei para a piscina. O tempo estava perfeito para um mergulho, e as pessoas estavam na farra. A casa estava cheia. Eu caminhei ao redor da piscina com vista para o jardim bem cuidado e me sentei ao lado de meu pai e de minha mãe que estava com seu mais novo neto – filho de Vitor – no colo. Estávamos de frente a uma mesa com vários tipos de sucos, tira-gostos, sombreada por um grande guarda-sol.
Um nó no estômago indicava a frustração que me consumia, mas eu tentei não aparentar isso. Não queria pensar na impunidade que aquela mulher livre representava.
— Filho. Por que não se diverte um pouco? — perguntou minha mãe. — Assumir os negócios da família não significa não poder relaxar um pouco. Está sempre carrancudo. Não vejo um sorriso em seu rosto.
— Estou bem assim — respondi, me servindo de suco gelado.
— Vincent, você precisa se casar. Precisamos encontrar uma mulher forte para estar ao seu lado. Afinal, pretendo me aposentar e você será o novo Don. Sua solteirice precisa acabar. Tenho pensado em te arrumar um casamento consanguíneo. Te mandar para a Sicília. Com certeza encontrará uma bella ragazza entre suas primas. Acredito até que compreenda a sua responsabilidade conosco, e isso te assegurará a não se envolver com alguma mulher errada.
— Não enquanto tivermos assuntos pendentes. — Eu encarei meu pai significativamente.
— Eu sei que assuntos são esses. É aquela mulher, não é?
— Empenhei a minha palavra e a minha honra que eu a encontraria e a faria pagar por tudo.
Don acenou com a cabeça afirmativamente para mim.
— Nunca pensei que ela fosse nos trair. Eu a tratava como uma filha — disse mamãe, chorosa.
— Eu a encontrarei e a farei confessar tudo. É questão de tempo.
Sua mãe o olhava, pensando por que Vincent queria fazer a traidora confessar-se culpada? Tal culpa já estava tão provada. A resposta era evidente. Vincent ainda não tinha tanta confiança em sua razão, receava ser injusto, ainda se preocupava com aquela lasca de incerteza que Renata fosse realmente culpada.
— Vincent! Vem para a piscina, a água está uma delícia. — Vanessa — amiguinha de Lucas — ao lado de uma amiga que eu não sabia o nome, me chamou.
Lucas estava conosco, tinha chegado ontem de Las Vegas.
Como eu não respondi, meu irmão nadou até a borda perto delas e olhando para mim, disse:
— Você está brincando? Vincent não se diverte. Ele só pensa em trabalho, trabalho, trabalho... Ele adora essa reputação de homem indomável.
— Lucas, deixe seu irmão!
Antony surgiu do outro lado da piscina. Usava roupas descontraídas, mas seu rosto sério denotava trabalho.
— E aí, Antony? Está de folga hoje?
— Mais ou menos.
Lucas jogou água nele quando ele passou perto da borda onde ele estava:
— Não acredito que veio falar sobre trabalho?
— E fazer o quê? Mas vou sobreviver. Você conhece nossa rotina. O cassino perto disso aqui é moleza!
— Hah! Moleza? Vincent sabe o inferno que é administrar aquilo ali.
Antony se aproximou da nossa mesa.
— O carregamento que esperávamos não chegou.
— Mas que porra? Eu não acredito nisso! — Eu rosnei e minhas mãos correram pelos meus cabelos em exasperação.
Eu encarei meu pai, que fez que não ouviu e apenas olhava o copo. Aos poucos ele queria que eu assumisse os negócios da família. Estava cada vez mais se afastando dos negócios.
— Vamos até a biblioteca. — Eu me levantei. — Pai, o senhor não vem?
— Não, ficarei aqui. Eu confio nas suas ações.
Eu o fitei resignado por um tempo, e fitei Antony que sorria para o gesto de meu pai. Fiz sinal para Vitor que estava com a esposa dentro da piscina. Atendendo meu gesto, Vitor deu um impulso com o corpo e saiu dela. Colocando um robe branco, nos seguiu.