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CAPÍTULO 3

MICHELE ANTUNES

-Chega de enrolação, Michele! Já pode me dizer a verdade. Vai ser duro, mas eu vou suportar. Só não continue com isso. -minha mãe diz cercando-me no meio do corredor estreito que mal cabe duas pessoas enquanto bate o pé no chão com o rosto avermelhado de raiva.

-Do que a senhora está falando, mãe? -faço-me de desentendida por mais que eu tenha a leve impressão do que se trata o assunto, e caminho em direção a sala pegando minha bolsa de trabalho sobre o aparador.

-Você mentiu para mim! Mentiu para sua própria mãe, Michele! -ela me acusa seguindo-me de perto.

-O que? Como assim, mamãe? Como pode me acusar de algo tão grave? -questiono com o semblante retorcido em falsa ofensa.

-Não me tenha por tola, menina. -ela rebate com o olhar estreito sobre mim. -Você inventou aquela mentira do suposto noivado apenas para me engabelar (enganar).

-Mãe! Eu estou noiva sim! -protesto tentando dissuadi-la.

Mas que mulher astuta e esperta!

-Até parece. -ela bufa. -Era bom demais para ser verdade vindo de você.

-Mãe! -grito dessa vez realmente chocada e ofendida.

-Eu apenas não entendo porque brincar com meus sentimentos ao me dar falsas esperanças, filha. -ela diz colocando uma mão sobre o peito ao emitir uma tosse rouca. -Isso não é coisa que se faça com quem está na tábua da beirada. -mamãe se senta sobre o sofá com o rosto um tanto pálido e a respiração ofegante.

-Mamãe, eu.. Eu não menti para a senhora. Nunca faria algo para magoa-la intencionalmente. -me ajoelho a sua frente entre suas pernas e seguro suas mãos com as minhas.

-Então qual o motivo desde que mencionou o noivado, coincidentemente no mesmo dia em que contei sobre o diagnóstico da minha doença, que você não fala nada a respeito do assunto? Já faz quase uma semana e você não me diz nada. O que acha que estou pensando? Que tudo não passa de uma invenção da sua cabecinha de vento.

-É que... É meio complicado, mãe. -desvio o olhar do seu, formulando rapidamente em minha cabeça uma mentira bastante convincente que a satisfaça.

-Me explique então. Sou uma mulher muito inteligente, querida. -ela insiste dando-me dois tapinhas amigáveis no rosto.

-É que meu noivo é um homem muito ocupado e quase não temos tempo para nos vermos direito. -dou de ombros com a primeira desculpa esfarrapada que arranjo. -Eu fico meio sozinha nessa relação, entende? -digo com a maior cara de pau ao fingir uma fungada dramática.

-Ah, agora finalmente estamos chegando a algum lugar. -ela comemora ouvindo apenas a parte que lhe convém. -Qual o nome desse seu noivo misterioso, docinho? -ela questiona curiosa e em um pulo, salto sobre minhas pernas colocando-me de pé.

-Eu preciso ir senão vou acabar perdendo o ônibus e chegando atrasada no serviço, sabe como é né? -dou uma risadinha sem graça enquanto fujo em direção a porta como se o prédio estivesse em chamas.

-Se não responder a essa simples pergunta, saberei que continua mentindo para mim, Michele! -a severidade em seu tom de voz a minhas costas, me faz estacar no lugar já com os dedos na maçaneta. -Qual é o nome do seu noivo?

Pensa, pensa, pensa rápido Michele! Fecho os olhos ainda de costas para ela e suplico aos céus por uma mãozinha ou uma saída estratégica. É então que vem a minha mente a imagem, na verdade a recordação, de um lindo par de olhos azuis intensos como o céu.

-Oliver. O nome dele é Oliver Resende, mamãe. -digo com um sensação estranha na língua ao proferir a mentira.

* * *

Meu Deus do céu, o que é que eu estou fazendo da minha vida? Qual será a profundidade da cova que estou cavando para mim mesma? Me pergunto seriamente se não enlouqueci de vez enquanto encaro a fachada elegante indicada no endereço que dona Josefina havia me enviado por mensagem de texto, poucos minutos antes de sair para o meu horário de almoço.

Resende & Mileto, se o escritório de advocacia parece moderno demais apenas do lado de fora com sua arquitetura toda trabalhada em metais reluzentes e vidraria cara e chique por toda parte, o interior do edifício era de cair o queixo. Tudo na mais perfeita ordem, decorado com bom gosto e requinte, contudo sem perder a classe e discrição necessárias para um ambiente profissional de trabalho exigido no ramo.

-Por favor, poderia me informar onde fica a sala de Oliver Resende? -questiono a recepcionista que me encara educadamente com um sorriso polido pregado no rosto.

-A senhora tem hora marcada? -seus dedos teclam algumas vezes algo no computador a sua frente enquanto aguarda por uma resposta.

-Não, eu... -murmuro perdida sentindo-me muito idiota por não ter pensado no óbvio, e vindo assim na cara dura.

-Então infelizmente ele não poderá atendê-la. -ela lamenta. -Mas se estiver interessada em uma consultoria pode agendar uma reunião com a secretária dele. -ela prossegue e sua atenção se volta para algo atrás de mim. -Ei, Bianca!

A mulher faz sinal chamando alguém, eu me viro e vejo uma jovem segurando um tablet e pastas de arquivos, provavelmente a tal Bianca, que se aproxima de onde estamos ao lado de um belo homem elegantemente trajando um terno de corte perfeito.

Ela até que é bonitinha também.

-Boa tarde, senhor Tales. -a recepcionista cora ao cumprimentar o homem visivelmente afetada com sua presença.

-Boa tarde, Amanda. Está ainda mais radiante hoje. -ele pisca em resposta e a mulher só falta desmaiar tamanha a emoção.

-Do que precisa, Amanda? -Bianca indaga séria chamando a atenção da outra de volta para si.

-Essa senhora quer falar com Oliver mas não tem hora marcada. -ela aponta para mim.

-E o que deseja com ele? -seus olhos me analisam com desconfiança enquanto ela assume imediatamente uma postura altiva e profissional.

-Deixa eu te explicar uma coisa, lindinha. -o tal Tales que até então estava calado observando tudo, se intromete. -Não pode simplesmente chegar aqui e querer ser atendida sem...

-Tales, ainda bem que não foi embora. Você esqueceu seu celular na minha me... Michele? -Oliver surge repentinamente a minha frente e eu me volto para ele. -O que está fazendo aqui? -ele questiona claramente surpreso com minha aparição inesperada.

-Desculpe incomoda-lo em seu ambiente de trabalho, mas...

-Não! Que isso. Não há problema algum.

Ele balança a cabeça negativamente com um belo sorriso no rosto.

-Que falta de modos a minha. Venha até minha sala para conversarmos, por favor.

Oliver mal espera que eu formule uma frase coerente antes de deixar o celular no bolso da camisa de Tales, e uma de suas mãos logo se aloja em minhas costas guiando-me no curto trajeto até sua sala sob a mira e o olhar atento, porém disfarçado, de várias pessoas durante o caminho.

-Aceita água, café ou refrigerante? -Oliver age solicitamente quando me sento em uma confortável poltrona de frente para sua mesa.

-Não, estou bem assim, obrigada. -agradeço colocando uma mexa de cabelo atrás da orelha para disfarçar o nervosismo.

-É uma surpresa muito agradável vê-la outra vez, Michele. -ele comenta naturalmente após retornar do frigobar com uma garrafinha de água e sinto meu rosto em chamas quando seu olhar intenso recai sobre mim outra vez, especificamente em meus olhos. -Adorei te conhecer aquele dia na casa da Josefina.

-Eu também, foi... foi bem legal. -sorrio constrangida e ajeito nervosamente a barra do meu vestido. -Eu precisava falar com você depois disso, na verdade ainda preciso. -rio parecendo uma completa idiota.

-Eu estou aqui, Michele. Pode falar a vontade. Em que lhe posso ser útil? -seus olhos azuis estão fixos em mim enquanto ele sorve um pequeno gole de água.

-Preciso que seja meu noivo. -despejo na lata antes de perder a coragem.

-O que?! -Oliver engasga cuspindo boa parte do líquido longe.

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