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CAPÍTULO 3

Após servir uma dose no copo e deixar a garrafa à disposição de Omar, ele preferiu erguer-se e passear pelo recinto para acalmar a ansiedade. Parecia um tigre enjaulado, caminhando de um lado para outro. Edgar nunca fora bom em manter uma boa conversa e não via razão para começar agora, principalmente com Omar, que não era melhor do que ele na arte da eloquência. Para manter-se ocupado, resolveu colocar mais alguma lenha no fogão. Foi quando se lembrou de pôr água para ferver e preparar o café.

As confidencias que Marine lhe havia feito, antes da chegada de Lorena, retornaram-lhe à mente. Como ele gostaria que Cláudio Tavares ainda estivesse vivo para poder estrangulá-lo aos poucos até ver o último suspiro daquele crápula! Pobre Marine, pensou. Ele deveria ter feito mais pela irmã. Pelo menos ter tentado preveni-la com mais empenho sobre o mundo e os homens.

Logo após Edgar atender um novo pedido de Lorena e ter levado ao quarto uma chaleira com água fervente e uma vasilha, juntamente com o pequeno estoque de toalhas que possuía, os gritos de dor de Marine se intensificaram. Desesperado, ele ergueu a gola da jaqueta de couro que usava, a fim de agasalhar o pescoço, e saiu da cabana. Queria verificar se a neve tinha diminuído. Infelizmente, estava ainda mais espessa. Ele apertou com força a gola do agasalho para afastar a friagem e fez mais do que ansiar pela chegada do helicóptero: começou a rezar. Desde que saíra do Vietnã era a primeira vez que orava.

Nos momentos que se seguiram, Edgar entrava e saía da cabana. O vento tinha acalmado, mas não havia nenhum sinal de qualquer helicóptero chegando. Quando se aproximou da porta do quarto pela terceira vez, percebeu que Omar havia desaparecido levando a garrafa de uísque junto com ele. Edgar deu de ombros.

Como poderia culpar o velho malandro por ter caído fora se ele mesmo tinha vontade de sumir dali, se pudesse? Uma hora depois, Marine gritou pelo nome do irmão. Edgar correu para o lado dela e permitiu que ela lhe apertasse a mão enquanto resmungava palavras ininteligíveis. O que quer que ela precisasse, queria que soubesse que ele estava bem ali do seu lado.

Era surpreendente como Marine, que mantinha as unhas curtas para não roê-las, pudesse provocar sulcos profundos e arranhões na pele grosseira das suas mãos. Mas ele seria capaz de suportar qualquer coisa para aliviar o sofrimento da querida irmãzinha. De quando em quando, Edgar libertava as mãos para mergulhar uma toalha na vasilha com água fria e, depois de espremer o excesso do líquido, repousava na testa miúda e febril da irmã. Aproveitava para sussurrar-lhe no ouvido palavras de conforto.

- Quanto tempo vai durar esse martírio? - Edgar perguntou a Lorena, que aguardava por algum sinal do bebê enquanto fazia movimentos no abdome de Marine para ajudar no parto.

Então tudo aconteceu ao mesmo tempo: o som de um helicóptero chegando e o grito de Lorena.

- Está nascendo! - E, pouco depois, a notícia: - É uma menina, Marine! Uma menina!

Edgar pensou em sair para receber o grupo de resgate, mas Marine o impediu agarrando-lhe uma das mãos e suplicando com uma espécie de pânico no olhar.

- Quero que o nome dela seja Davina, Edgar. Igual ao de nossa mãe, está bem?

- Calma, querida. Como quiser - concordou ele, dando um tapinha carinhoso nos ombros delicados da irmã. - Agora procure descansar. Logo estará segura no hospital.

- Espere! - exclamou Marine, impedindo-o de sair dali. - Quero que me prometa... se algo acontecer a mim... você cuidará da minha filhinha. Prometa-me que você a criará, Edgar.

Ele não deu muita importância às palavras da irmã. Acreditava que ainda estava delirando por conta de todo o sofrimento pelo qual acabara de passar.

Mesmo numa situação de desespero, ele jamais seria a pessoa indicada para uma responsabilidade daquelas. E Marine sabia bem disso.

- Não vai acontecer nada de mal com você. Tire essa ideia da cabeça.

- Me prometa, Edgar. Não imagina o que representa para mim. Prometa que não vai deixar que aquela gente ponha as mãos no meu bebê. Por favor!

Lorena parou de acariciar a recém-nascida e fixou o olhar na cena que via entre os irmãos. O zunido do helicóptero aumentou tanto que chegou a ponto de provocar uma vibração nas paredes da pequena morada. Edgar sabia que precisava sair para acenar para a tripulação, caso contrário eles poderiam pensar que estavam no lugar errado e ir embora.

Como a pessoa simples que pretendia ser, Edgar só trouxera eletricidade para a cabana, alguns anos antes, a fim de manter a geladeira funcionando. Sequer mantinha uma iluminação na varanda da frente. Nem mesmo possuía uma lâmpada comum.

- Está bem, querida. Eu prometo. Agora preciso me apressar - Edgar falou com um sorriso forçado para tranquilizar a irmã e conseguir sair dali.

Finalmente, após libertar-se da mão desesperada que o detinha, saiu em disparada. Assim que chegou lá fora, avistou João Montes que, tendo ouvido o barulho da aeronave, fazia acenos para o piloto. Juntos, gesticularam indicando o melhor local onde o helicóptero deveria pousar. Logo mais foi informado de que não poderia acompanhar a irmã. No helicóptero havia apenas um lugar a mais, que seria ocupado por Lorena. O desespero de Edgar só não foi maior porque soube que eles iriam pousar diretamente no hospital de Wallis em vez de tentar alcançar as cidades de Helena ou Antep. A proximidade do local era uma boa notícia, e a companhia da enfermeira seria muito mais útil para Marine do que a de um homem desajeitado como ele.

Edgar assegurou para a irmã que os seguiria na caminhonete. E, depois de um sorriso, ele acenou e afastou-se para escapar do alcance da gigantesca hélice da aeronave. No momento em que Edgar chegou à cidade, a neve havia cessado. Avistando o prédio do Wallis Memorial Hospital, procurou estacionar próximo da entrada de emergência e saltou da caminhonete, seguindo na direção da entrada do ambulatório.

Já passava da meia-noite e ele se sentia exausto. Contudo, exibia um sorriso de alegria. Mal acreditava no milagre do qual tivera participação ativa. A irmãzinha querida tinha trazido ao mundo o seu pequeno bebê. Fato que o transformava num tio que começava a agir como coruja. Quem diria?

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