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6- Rude, Frio e Impiedoso

Encaro por alguns segundos o homem que durante toda a minha vida serviu como exemplo e inspiração, tentando acreditar do que ele se transformou, e então saio em silêncio. Me despeço de Dory e decido ir para a minha casa, pois não sinto mais um pingo de ânimo para voltar ao trabalho.

Me sento debaixo da água quente que tranquilamente sai do chuveiro, deixando a sensação de impotência e a tristeza saírem através das minhas lágrimas, me questionando o que fiz para merecer tudo o que aconteceu nesses últimos meses.

A todo o momento me pergunto se mereço passar por mais esse sofrimento, ao aceitar me casar com um homem como o Noah, que num primeiro momento me pareceu tão gentil e cavalheiro, e agora se mostrou um homem rude, frio e Impiedoso.

Quando sinto o meu corpo menos pesado e o coração menos apertado, me levanto do chão do box e me seco. Antes que pudesse terminar de me vestir recebo uma ligação de Emma, pedindo para me encontrar na casa dos pais dela, e em poucos minutos dirijo até lá.

— Oi, Ava! — Emma diz ao me abraçar calorosamente — Sei que você deve estar cansada do trabalho, mas precisava que viesse até aqui.

— Tudo bem, na verdade, quase não trabalhei hoje.

— Você sumiu durante todo o dia, achei que…

— Esse dia foi um dos piores, amiga — Digo desanimada assim que nos sentamos no imenso sofá branco da sala de estar — Se iniciou tão bem por saber que a cirurgia da minha mãe acontecerá nos próximos dias, e então surgiu o Noah me cobrando o relógio e me propondo um absurdo, Emma.

— O que ele propôs, amiga? Você pediu um tempo a ele?

— Sim, ele me deu um novo prazo até amanhã de manhã para devolver o relógio ou…

— Ou… — Emma me encara de um jeito confuso e assustado em simultâneo — Não me diga que ele te ameaçou, Ava!

— Não, isso não, na verdade, julgo ser ainda pior, pois certamente a morte seria melhor. Ele me propôs um casamento, Emma.

— O quê?! — Ela exclama surpresa — Claro, Ava! Ele não está fazendo isso pelo relógio, amiga, ele está apaixonado por você, ou melhor, está obcecado por você.

— Óbvio que não, Emma! Ele me disse que tudo será contratual, com certeza ele pretende continuar a se vingar de mim através disso. Fiquei tão desesperada que fui atrás do meu pai e ele me humilhou novamente — Falo com a voz embargada — Eu preciso recuperar esse relógio até amanhã, não posso me casar com um homem como o Noah, Emma, não quero sofrer ainda mais.

— Amiga, eu prometi te ajudar, não foi? — Ela sorri enquanto segura e acaricia as minhas mãos — Os meus pais chegaram de viagem pela manhã, eu conversei com eles e expliquei a sua situação, e eles não pensaram duas vezes em te ajudar. Tudo dará certo!

— Eu não acredito, Emma — A abraço empolgada e ficamos assim por alguns breves minutos, até os pais dela aparecerem.

— Ava, querida! — Ada, mãe de Emma, me abraça carinhosamente e se senta ao meu lado.

— Oi, tia, Ada! Como foi a viagem de vocês?

— Foi ótima, Ava, Santorini parece ficar ainda mais atraente a cada ano. George não parou um segundo sequer.

— Tem certeza que foi eu, Ada? — George, pai de Emma, brinca ao se juntar a nós três — Vocês precisavam ver, Ada parecia uma adolescente empolgada, não queria parar no hotel.

— Fico feliz que tenham se divertido e aproveitado a viagem.

— Nós também, estávamos precisando — Ada segura a minha mão enquanto faz pequenos círculos em cima dela, de maneira reconfortante — Ava, querida, a Emma explicou o seu problema, por que não nos ligou e nos avisou o que estava acontecendo?

— Não quis atrapalhar a viagem, tia.

— Vocês nunca atrapalham, Ava — George responde — Você sabe que pode contar conosco sempre que precisar. Olha a encrenca que você se meteu, menina.

— Nem me lembre, tio.

— Enfim, vamos resolver logo tudo isso para que você possa aproveitar a boa fase que virá de agora em diante.

Conversamos por algum tempo e após isso, George fez a transferência do valor do relógio para a minha conta, me deixando aliviada novamente.

Após o jantar nos despedimos e fui embora, mas, por mais que eu tente dormir, a ansiedade em ir até a loja de penhores recuperar o bendito relógio de Noah, e me livrar da ideia absurda de me casar com ele, faz com que eu role de um lado para o outro.

Pelo segundo dia consecutivo vejo o sol nascer, e após um café bem forte e uma bela maquiagem para esconder as olheiras, vou em direção a loja de penhores novamente.

— Bom dia, senhor — Cumprimento o homem, que dessa vez aparenta estar menos entediado que da última vez.

— Bom dia, senhorita! Veio me trazer outro relógio? Hoje posso te fazer uma oferta melhor que a anterior.

— Na verdade, vim pagar pelo relógio que deixei aqui — Digo enquanto pego o meu celular para fazer a transferência e ele me encara com um sorriso no rosto — Onde ele está?

— Sinto muito, senhorita, mas eu o vendi ontem. Uma senhora bem elegante veio atrás de um presente para o avô e se apaixonou por ele.

— Mas isso está completamente errado! — Respondo indignada e pego o papel que ele me deu quando deixei o relógio — Aqui está escrito que tenho uma semana para reaver o item penhorado.

— Leia as letras pequenas, senhorita.

— Letras pequenas? — Pergunto e percorro os meus olhos nas letrinhas quase invisíveis no fim da folha. Logo após a frase "não nos responsabilizamos por eventuais danos", vejo escrito "o prazo para reaver o item poderá ser alterado caso seja feita uma oferta de maior valor" — Isso está completamente errado! Senhor, eu preciso daquele relógio, é caso de vida ou morte, o senhor tem noção disso? O meu futuro depende daquele relógio!

— Lamento, senhorita, mas estava escrito aí a todo o momento, deveria ter lido antes de sair daqui. Além disso, a moça negociou um valor bem acima do que eu te paguei, não poderia perder essa oportunidade.

Respiro profundamente, controlando a imensa vontade que sinto em xingá-lo, e sai em silêncio, para não arrumar outra dor de cabeça ao quebrar toda a sua loja.

Vou até a empresa para cumprir os meus compromissos e os compromissos que o meu pai teria, pois em sua ausência sou eu quem responde pela empresa.

Um pouco antes do horário do almoço volto para a minha sala, após a segunda reunião do dia, e confiro o celular. Ao me certificar que até agora o Noah não entrou em contato, suspiro aliviada. "Com certeza ele desistiu dessa ideia maluca", assim eu pensei, pois não demorou para que recebesse uma mensagem dele avisando que apareceria em breve.

— Srta Hampton, — Florence, minha secretária, me interrompe enquanto leio uma proposta apresentada na reunião — há dois senhores na sala de espera querendo falar com a senhorita. Eu já informei que não há nenhum horário disponível na sua agenda, mas um deles insiste em dizer que não sai daqui enquanto a senhorita não recebê-lo.

— Eles se identificaram, Florence? — Reviro os olhos e deixo os papéis de lado, já ciente de quem seja.

— Sim, Sr Ewing e Sr Spencer.

— Deixe-os entrar, por favor, e peça para a Srta Moore para vir até aqui.

— Certo, com licença.

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