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Capítulo 6

MELISSA

-Ei... eu... -assim que ouvi uma voz masculina muito próxima a mim, virei-me assustada em direção ao som e notei que ali havia um homem estranho.

Com o rosto ardendo pelas lágrimas que escorriam sob os arranhões em minha pele, o encarei com os olhos baixos, vendo-o se aproximar cautelosamente como se temesse minha fuga a qualquer momento.

Mas eu não iria fugir. Não mais.

Não possuía forças suficientes para correr, por mais que houvesse a ínfima possibilidade de escapar, eu não conseguiria. Todas as partes do meu corpo protestavam a menor das ações, tudo isso resultado do acúmulo de cansaço, privação de sono e sedentarismo somados a uma provável acentuada desnutrição.

Não havia a menor chance. Eu nunca escaparia dali com vida. Então para que tentar? Seria melhor deixar que tudo terminasse enfim.

-Por favor, me mata logo de uma vez. Eu não aguento mais esse inferno. -pedi em um sussurro enquanto cobria meu rosto do emitente golpe que viria a seguir.

Já estava acostumada com esses tipos de punições quando me atrevia a contrariar ou responder Gouveia.

-Eu não... não quero te machucar. Só pretendo ajuda-la, se me permitir é claro. -ele levantou suas mãos alvas para o alto para provar o que dizia.

Entretanto eu não acreditava em uma única palavra vinda desse homem estranho, que me encarava fixamente com um olhar que não pude discernir. Seria compaixão que espelhava seus grandes olhos verdes? Ou talvez medo? Poderia ele realmente me ajudar, ou seria só mais truque que aquele diabo do Gouveia usava para me torturar de outra maneira, para ferrar de vez com meu psicológico?

Eu não sabia o que pensar naquele exato instante, era tantas coisas girando em minha cabeça que não conseguia me concentrar em nada no final das contas, os sons da floresta que eu sequer imaginava onde era e como havia parado ali, tornava a situação ainda mais assustadora.

A única coisa boa, mas que me deixava com fortes dores de cabeça, era o sol. Fazia tanto tempo que eu não via ou sentia os raios solares contra minha pele, que por um momento, quando fugi daquela casa estranha pela manhã, e a luminosidade natural invadiu meu corpo, foi como se milhares de agulhas afiadas perfurassem meu cérebro, e a intensa claridade cegasse meus olhos. Porém o calor aquecia minha alma de um modo bom, como eu não sentia a muito, muito tempo.

Depois disso corri como se minha vida dependesse disso, e na verdade dependia, pela mata a fora sem saber que direção tomar ou que caminho seguir. Diminuí o ritmo da respiração durante o percurso entre galhos e pedras no caminho, tentando não entrar em pânico, e foi quando retomei o ritmo da corrida que tropecei e, minhas pernas fracas me levaram no mesmo instante ao chão, no local em que me encontrava agora.

Pensa Melissa, pensa. -eu gritei internamente. -Não seja burra, tome uma atitude.

Fechei os olhos com força, desejando simplesmente evaporar naquele instante. Eu não sabia o que fazer.

Os minutos se passaram e o cansaço aumentou. Apertando um pouco os olhos para tentar enxergar a distância, avistei o mesmo homem ainda me fitando com certa expectativa. Meus braços e minhas pernas quase não tinham mais forças para me impulsionar para qualquer coisa. Deitei o rosto em um galho quebrado e avaliei minhas opções.

Não levei muito tempo para perceber que eu não tinha nenhuma.

-Eu ainda estou aqui. Me deixe ajuda-la, por favor. -sua voz grave chegou até meus ouvidos em uma espécie de súplica.

Após muito tempo sem poder conversar ou conviver com pessoas diferentes a minha volta, era um tanto quanto bizarro receber outro tipo de som, de timbre de voz em meus ouvidos. Era surreal.

Mas eu ainda não poderia abrir mão dos meus medos e confiar em um desconhecido, em um homem. Não depois de tudo que eu havia passado.

-O que você quer? De verdade. -eu perguntei com a voz rouca.

-Nada, eu juro. Só... -ele se interrompeu antes de continuar. -Se você quiser, eu e minha irmã podemos fazer algo por você, o nome dela é Bruna, ela estava comigo ontem quando... quando eu a achei e a trouxe para casa.

-Me achou? -o questionei sem compreender o que ele queria dizer com aquilo. -Como assim me achou?

-Você não se lembra? -seu rosto quadrado se transformou em uma máscara de puro horror e seus lábios se crisparam contendo seus pensamentos para si mesmo.

-Não. -eu respondi. -O que houve comigo? Eu só me lembro dele chegar e vir para cima de mim, depois disso não me lembro de mais nada.

Com o maxilar trincado, o estranho desferiu um soco contra o tronco de uma árvore velha e tombada aos seus pés. Um grito de dor escapou de seus lábios muito vermelhos pelo frio da manhã, e ele sacudiu o punho no ar enquanto resmungava baixinho algumas palavras que não consegui entender.

-Eu não irei obriga-la a nada. Mas acho que você deveria aceitar minha ajuda. Você não parece nada bem, e olha, não precisa ter medo. Não vai estar sozinha comigo aqui. Sou eu e minha irmã, e nós iremos cuidar de você, eu prometo. Se quiser ir embora a qualquer hora, poderá ir, você é livre para fazer qualquer coisa. -ele disse com suavidade.

Pisquei os olhos algumas vezes para espantar as lágrimas que se acumulavam em meus olhos. Eu realmente poderia acreditar nele? Finalmente poderia começar a confiar em alguém? Essas e milhares de outras perguntas rondavam minha mente enquanto eu tentava fazer a escolha correta.

Então eu tomei uma decisão.

Nunca saberia o que poderia vir a acontecer se eu não me permitisse arriscar. E não é como se eu tivesse mais alguma coisa a perder mesmo.

Como se pudesse ler meus pensamentos, o estranho deu alguns passos até parar a minha frente e estendeu sua mão em minha direção. Ainda hesitante, depositei timidamente minha mão tremula sob a sua, e quando seus dedos longos e firmes se fecharam sob a mesma, um calor estranho percorreu desde a palma de minha mão até o pulso. Uma sensação incomum tomou conta de mim, como se afirmasse que eu poderia confiar minha vida a esse homem, mesmo que mal o conhecesse.

-Eu sou Guilherme Amaral, mas pode me chamar de Guilherme ou Gui, como quiser. -ele deu de ombros e usando a mesma mão que ainda segurava, ajudou-me a levantar do chão.

Quando já estava de pé, cambaleei para frente com um pouco de falta de equilíbrio, porém antes que eu pudesse vir a cair, o tal Guilherme puxou-me para mais perto me envolvendo em um abraço. Um tanto constrangida com a ação, não retribuí o ato, contudo por algum motivo oculto que desconheço, também não saí de perto e me deixei ser abraçada.

-Obrigada por confiar em mim. Farei de tudo para não falhar com você. -ele sussurrou em meu ouvido.

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