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4

AGHATA

O toque do celular me desperta do sono profundo em que caí há algumas boas horas, e me faz saltar no colchão sentando-me de qualquer modo. Pisco os olhos meio atordoada e tateio cegamente a superfície lisa da mesa de cabeceira ao lado da minha cama, até encontrar pelo toque com a ponta dos dedos, a fonte de ruído que não cessa por um minuto sequer.

É madrugada, minhas vistas não estão lá em ótimas condições nesse momento, então deslizo o indicador sobre a tela do celular sem conseguir de fato discernir o nome da criatura que está me ligando a essa hora, e atendo a ligação com a voz rouca e pastosa de sono.

-Alô? Quem está... -pergunto meio aérea, porém sou cortada no mesmo segundo pela voz ansiosa do outro lado da linha.

-Alô, Aghata? Graças a Deus consegui falar com você! -sou pega de surpresa quando noto o tom desesperando na fala e então um alarme se acende de imediato dentro de mim.

O que estava acontecendo? O que havia de errado?

-Dante, é você? -questiono um tanto confusa e esfrego os olhos com as costas das mãos na tentativa de acordar de verdade. -O que...

-Sim, sou eu Aghata. Eu te liguei porque não sabia mais para quem ligar. Tudo está uma confusão, e eu já não sei mais o que fazer... -Dante se atropela no meio das palavras, e meu cérebro ainda lento não consegue processar com clareza o que ele diz.

Entretanto é tão palpável o desespero em cada sílaba pronunciada, que faz com que eu sinta que alguma coisa ruim tinha acontecido para ele me ligar nesse estado. Dante nunca foi um garoto dado a atitudes impulsivas ou exageradas, então este era um claro sinal de que a situação estava fora de seu controle.

-Tente se acalmar um pouco, Dante. Eu não consigo te entender desse jeito. Respira fundo e me diz pausadamente o que aconteceu, por favor. -peço com gentileza enquanto coloco os pés para fora da cama, e calço minhas pantufas após acender a luz do abajur.

-A Ali... a Ali e o Enzo sofreram um acidente de moto depois que deixaram a lanchonete em que nos encontramos de tarde. Assim que a notícia chegou aqui em casa há pouco tempo atrás, meus pais correram desesperados direto para o hospital. -Dante explica com certa pontada de dor, e eu suspendo o ar em meus pulmões em choque diante da informação.

Meu coração se torna pequenininho dentro do peito ao imaginar a dor que a família Morales e Fábio, pai de Lorenzo, estavam enfrentando nesse exato momento. Ambas as famílias são grandes amigas e muito queridas por todos os seus conhecidos, e por essa razão, eu mal podia imaginar o tamanho do sofrimento deveriam estar passando.

Então uma certeza logo se instala em minha mente, eu preciso me mover e fazer alguma coisa para ajuda-los. Não posso ficar apenas parada sem fazer nada. Tem que haver algo em que eu possa ser útil e... Luna! Caramba, como minha amiga deve estar lidando com essa situação agora? Como será que ela...

-Aghata, você ainda está aí? -Dante me chama no telefone, trazendo minha mente de volta a realidade.

-Eu estou... estou sim, Dante, pode falar. -digo com o celular pendurado entre o ombro e a orelha, enquanto fecho o zíper da calça jeans que estou vestindo no momento, e enfio os pés nos tênis que estão próximos ao closet.

-Sei que o que eu irei lhe pedir é muito abuso da minha parte, mas seria possível você vir para minha casa agora? Posso ligar para seus pais e avisar que preciso de você, mas por favor, me ajude.

Pego a primeira blusa que encontro na frente pendurada no cabideiro, passo pela cabeça e pelos braços enquanto ouço Dante falar do outro lado.

-Eu não sei mais como lidar com Luna. Desde que minha irmã ficou sabendo do acidente ela pirou de vez. Isso aconteceu depois que meus pais saíram para o hospital e isso já faz bastante tempo, Aghata. Eu estou muito preocupado. Eu só não liguei para vovó Josefina a essa hora, porque como você também sabe, ela tem problemas de saúde, e eu não quero preocupa-la com esse monte de problema que surgiu, entende?

-É claro, Dante. Não se preocupe, eu estou indo agora mesmo.

Respondo-o ao mesmo tempo em que escrevo uma breve nota, explicando o ocorrido das últimas horas para não deixar minha família preocupada com meu sumiço repentino no meio da noite, e a deixo pregada em um lugar bem visível na geladeira. Assim que a primeira pessoa acordar e a ler, avisará aos demais também.

-Irei pegar um uber e em dez minutos no máximo estarei aí. -eu informo já saindo de casa, e guardando as chaves no bolso da calça.

-Muito obrigado mesmo, Aghata. Não sei o que eu faria sem você. -Dante agradece com a voz embargada de emoção, e eu sinto meu peito afundar em misto de compaixão e culpa.

Como será que Dante irá reagir quando souber que estou de partida, pronta para ir embora para o outro lado do mundo? É claro que eu não irei contar tal novidade pessoalmente a ele. Talvez eu escreva uma carta, ou redija uma mensagem de texto ou um e-mail, porque com toda certeza não terei coragem suficiente de olhar em seus intensos olhos verdes e dizer: Estou indo embora.

Minha alma se partiria em mil pedacinhos. Eu simplesmente não conseguiria olhar o motivo da minha ida e dizer adeus. O risco é alto demais de que eu possa fraquejar, e tornar atrás em minha decisão de ir... e eu não posso permitir que isso aconteça.

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