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2

AGHATA

Após ter deixado Dante em sua casa, segui sem um rumo definido pelas ruas da cidade de Belo Horizonte, buscando espairecer a cabeça. O ronco do motor cumpriu a função de me distrair apenas por alguns minutos. Porém, quando a angústia apertou feia em meu peito eu desabei. Encostei a moto no acostamento de uma via menos movimentada e chorei.

Chorei por minutos a fio como se minha alma estivesse sangrando por dentro. Meu corpo sacudia em espasmos enquanto eu soluçava em um choro estrangulado.

A culpa desse sofrimento era minha eu sabia, enquanto sentia as lágrimas jorrarem por meus olhos. Eu nunca deveria ter sido tão estúpida... Não deveria ter dedicado um segundo olhar para Dante... Não deveria ter começado a olha-lo com outros olhos, mas mesmo assim eu o fiz. Não mal intencionada ou de forma proposital, entretanto acabou acontecendo com o tempo e o íntimo convívio entre nossas famílias.

Mas que merda! Ele é apenas um garoto de quase quinze anos de idade. Eu sou a adulta aqui, já na faculdade com excelentes oportunidades para o futuro em minha área de formação, mas que ainda age como uma tola garotinha do ensino fundamental vivendo uma paixão platônica por alguém que nunca irá me enxergar como nada além de uma grande amiga. Ou a melhor amiga de sua irmã mais velha.

Respiro fundo e me acalmo depois de um tempo. A crise de choro cessou assim como também algumas certezas se concretizaram em minha mente. Estava na hora de dar um basta nessa história secretamente ridícula que venho alimentando por anos, e a melhor maneira de fazer isso é seguindo em frente sem olhar para trás.

O passado ficaria no lugar onde pertencia, no passado. Estava decidido, eu seguiria em frente, rumo a um futuro aonde não houvesse mais espaço para Dante ou para sentimentos românticos. Eu seria uma nova Aghata, séria, firme e dedicada inteiramente aos estudos. A faculdade de Direito seria minha prioridade. E para isso... faltava apenas comunicar minha família sobre a decisão que tinha acabado de tomar.

*

Quando chego em casa deixo minhas chaves sobre o aparador e caminho em direção a cozinha de onde vem um cheiro maravilhoso.

Provavelmente papai deve estar cozinhando a essa hora, porque no quesito preparar uma refeição decente minha mãe é uma negação. Devo ter herdado isso dela, pois infelizmente também sou um desastre na cozinha tanto quanto ela. Já Isra e Max até que levam jeito para coisa, pelo menos os dois não morreriam de fome se tivessem que se virar sozinhos por uma semana ao contrário de mim.

-Como sempre, um exímio chef. -rodeio a cintura de papai pelas costas em um abraço apertado.

Estou carente, então tudo o que preciso nesse momento é de uma boa dose de carinho e talvez um afago na cabeça.

-O que eu fiz para merecer esse abraço tão repentino da minha gatinha? -ele questiona sorridente ao desviar o olhar da frigideira sobre o fogão e me olhar por cima dos ombros.

-Eu não posso simplesmente abraça-lo simplesmente porque o amo? -questiono bem humorada, ao me recostar sobre o balcão a minhas costas.

-Claro que sim, querida. -papai responde desligando as chamas e seguindo com a panela para o balcão onde distribui uma pilha de panquecas quentinhas sobre dois pratos. -Sente-se aqui, meu amor. -ele pede dando dois tapinhas no banco alto que há ao lado do seu.

Faço o que pediu no mesmo instante e minha boca quase transborda ao salivar diante do meu prato favorito.

-Do jeitinho que você adora... -ele diz com o sorriso de lado no rosto sem nunca o abandonar.

-Com muita calda de chocolate! -suspiro satisfeita enquanto o vejo derramar o líquido escuro e cremoso com abundância sobre a massa. -O senhor é o meu herói, papai. -digo após espetar o garfo sobre o alimento e leva-lo a boca.

-Eu também te amo, gatinha. Só que sem interesses. -ele ri também se servindo do seu prato.

-Um verdadeiro manjar dos deuses. -gemo em apreciação na terceira garfada. -Eu estava precisando tanto disso, obrigada pai.

Digo me referindo não somente a comida, mas sim ao gesto de atenção e cuidado que ele está me dando.

-Sei disso. Esses seus olhinhos verdes não conseguem esconder ou mentir para mim. -ele aperta a ponta do meu nariz e eu engulo em seco desviando o olhar.

Realmente eu nunca consegui esconder qualquer coisa do meu pai. Minha relação com ele desde pequena sempre foi muito aberta. Meu pai é o meu melhor amigo e meu confidente desde que me entendo por gente.

-Quer conversar sobre o assunto? -ele questiona com doçura sem me pressionar, e meus olhos marejam diante de tanta compreensão.

Não, eu não quero conversar sobre isso, mas...

-Tenho uma coisa para contar. -digo tentando afastar a rouquidão da voz embargada.

-Pois conte. -sua voz se mantém suave e o semblante permanece tranquilo, a atenção voltada inteiramente para mim.

-Pai, eu decidi aceitar aquela bolsa integral de estudos que consegui devido as minhas ótimas notas. -começo a falar e ele continua em silêncio, então prossigo um tanto nervosa. -O intercâmbio para a Espanha será uma ótima oportunidade para ampliar meus horizontes e concluir com louvor a graduação em Direito.

-Compreendo. -é tudo o que ele diz, com seus olhos incrivelmente azuis escrutinando minha face em busca de alguma coisa que não faço a mínima ideia.

-Só vai dizer isso? -indago perplexa e um pouco ofendida. -Não tem mais nada a falar, ou pelo menos me desejar boa sorte?

-Confio plenamente em você, gatinha. E você não precisa de sorte sendo tão inteligente quanto é. -ele beija minha bochecha e eu o fito com o coração derretido aos poucos.

Esse é meu pai.

-Tenho apenas uma única pergunta para lhe fazer e espero que seja sincera comigo e consigo mesma. -ele segura minha mão e entrelaça nossos dedos. -Você tem certeza de que está fazendo isso pelos motivos certos, meu bem? Te apoiarei de qualquer forma, sabe disso. Mas sempre irei querer o melhor para você. E isso é o melhor para você, Aghata?

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