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DANTE
Quando Lorenzo e Alice foram embora após a fatídica cena em que acabei explodindo na frente de todos, é que eu paro para refletir e ponderar sobre minhas últimas atitudes e chego à conclusão de como agi errado.
Inspiro fundo e solto a respiração em uma lufada de ar pesada passando a mão sobre os cabelos e o olhar perdido. Sinto-me um completo imbecil por ter tratado uma pessoa de modo tão rude, sendo que jamais levantei a voz para alguém na vida, que dirá mandar calar a boca.
Eu fui um completo boçal com Aghata, minha consciência acusa.
-Israel, eu sinto muito por ter falado com sua irmã naquele tom. Eu não deveria e sei que foi muito errado. -digo com sinceridade ao encara-lo nos olhos, após nossas irmãs terem se retirado da mesa com a desculpa de irem ao banheiro.
-Foi mesmo, Dante. Mas eu só não entendi o motivo dessa explosão repentina. -Israel comenta debruçando os cotovelos sobre o tampo da mesa. -Entre todos do nosso grupo, você de longe é o mais tranquilo de nós. Além do mais, você e Aghata sempre se deram bem, então eu não entendo. O que há de errado com você, garoto? -ele questiona em tom compreensivo mesmo tendo todos os motivos do mundo para socar a minha fuça.
Agradeço a Deus por ele ser um bom amigo, por seu coração ser tão grande a ponto de me dar um voto de confiança e me escutar primeiro antes de agir impulsivamente.
-São apenas alguns problemas pessoais que não vem ao caso agora, e que não justificam meu comportamento. -respondo-o sem me aprofundar mais no assunto. -Sei que não estou em uma boa posição com você agora, entretanto quero te pedir um favor.
-E o que é? -seus olhos azuis se estreitam desconfiados enquanto arqueia uma sobrancelha.
-Se você puder pegar uma carona com Luna na volta para casa e me deixar sozinho com sua irmã para termos uma conversa civilizada para colocarmos os pingos no is, eu ficaria imensamente grato. -peço batucando os dedos sobre a mesa nervosamente. -Quero me desculpar com ela adequadamente. Sabe que não gosto de deixar as coisas mal resolvidas. -dou de ombros e ele não demora a concordar em resposta.
-Tudo bem, sem problemas. -Israel diz afastando a cadeira para trás e levantando-se em seguida. -Aí vem elas.
Giro o pescoço para seguir seu olhar encontrando ambas vindo em nossa direção, ao desviar de alguns outros clientes pelo corredor razoavelmente cheio da lanchonete.
-Boa sorte, garoto. Espero que vocês se acertem logo. -ele dá dois tapinhas em meu ombro ao passar por mim.
-Obrigada, cara. Mande um abraço para o Max e para os tios.
-Claro, pode deixar. -ele acena e vai de encontro as duas.
-Já está indo, Isra? -ouço Aghata perguntar ao irmão. -Então eu te dou uma carona, também estou indo para casa.
-Estou sim, mas não se preocupe com isso. Luna pode me levar. -ele a responde. -Dante quer conversar com você, então é melhor ficar.
-Problema é dele. Eu não quero papo com esse grosso. -ela rebate petulante e alto o suficiente sabendo que eu estou escutando tudo de onde estou.
-Não seja cabeça dura, irmãzinha. Ele só quer se desculpar com você. -Israel a abraça e beija sua bochecha em despedida. -Nos vemos em casa, pirralha. -ele pisca com um sorrisinho de lado.
-Resolvam-se logo, amiga. -Luna também a abraça. -Eu amo vocês dois maluquinhos. -ela ri lembrando-se do fato ocorrido. -Vamos, mané. Está na nossa hora. -Luna sai puxando pelo braço um relutante Israel que resmunga algumas coisas pelo caminho.
-Diga logo o que tem a dizer para que eu possa ir embora. Quanto mais rápido começar a falar, menos tempo teremos que permanecer na presença um do outro. -Aghata sentencia mal humorada ao deslizar para a cadeira de frente para minha, mantendo o olhar distante para qualquer lugar que não seja meu rosto.
-Por favor Aghata, olhe para mim. -peço segurando suas mãos entre as minhas, porém ela as retira no mesmo instante colocando-as sobre o próprio colo.
É como se eu levasse um tapa.
-A última coisa que desejo nesse momento é olhar na sua cara, Dante. Nem se tivesse pintada de ouro. -ela revira os olhos claros ainda sem me encarar.
Meu coração se aperta com o tom magoado em suas palavras. E tudo é exclusivamente culpa minha.
Me coloco de pé e com isso ganho sua atenção por apenas alguns segundos, antes de dar dois passos e me sentar na cadeira vazia ao seu lado.
-Quero pedir perdão por ter sido um completo estúpido e por ter agido grosseiramente com você, Aghata.
Seguro firmemente seu queixo com o polegar e o indicador fazendo com que me olhe diretamente nos olhos.
-Além de trata-la mal, eu ainda te envergonhei na frente dos nossos amigos, peço desculpas também por isso. -começo a dizer. -Você tem toda razão em estar com raiva de mim, se quiser pode até me dar um soco que sei que deve estar louca para me dar, mas por favor eu te peço, me perdoe de verdade. Não fique brava comigo para sempre. Odeio quando estamos brigados assim.
-Eu não quero socar sua cara, Dante. -ela bufa e eu a olho com descrença. -Tá bom, talvez essa ideia tenha me passado pela mente uma ou duas vezes enquanto estava no banheiro. -um sorrisinho desponta no canto dos seus lábios e eu sou incapaz de não fazer o mesmo.
-Sei disso. -afirmo brincalhão ao fazer um carinho em sua bochecha com o polegar. -Você é muito especial para mim Aghata, nunca duvide disso. O que eu fiz hoje jamais irá se repetir outra vez, eu prometo.
-Então porque fez, Dante? -seus olhos quase perfuram minha alma devido tamanha intensidade e eu mordo o lábio inferior me arrependendo no mesmo segundo ao sentir uma fisgada de dor.
-Eu... Somos amigos, certo? -pergunto ponderando se devo contar ou não algo do tipo para ela.
-É claro que sim, Dante. Você pode se abrir comigo sempre que precisar. Jamais te julgaria, sabe disso.
Então eu me sinto mais confiante e começo a falar.
-Bem... é que estou tendo um problema lá no instituto. É na turma da tarde em que sou monitor nas aulas de reforço. Algumas vezes quando a situação parece que está fugindo de controle, eu tenho vontade de abandonar o projeto e não voltar mais. Mas eu gosto muito do trabalho que faço lá, além do mais a experiência conta pontos para o meu currículo. -digo abrindo o jogo.
-E de que tipo de problema estamos falando? -ela sonda entre curiosa e preocupada.
-Uma garota.
-Hum...
-Beatriz. A garota cisma que está perdidamente apaixonada e vive se jogando para cima de mim de tal modo, que chega a ser constrangedor em alguns momentos.
-E o que você fez em relação a isso? -Aghata questiona com o semblante impassível.
-Eu fui muito claro e enfático, mas de uma maneira muito educada, e expus meu posicionamento de que não retribuía dos mesmos sentimentos que ela. Nunca dei margens para que a menina pensasse que sua paixonite era recíproca. A linha tênue entre amizade e relacionamento sempre foi muito explícita, amigos amigos, sentimentos de outro tipo a parte. Eu não misturo esses dois tipos de coisa, me entende?
-Uhum. -Aghata assente lentamente e engole em seco. -Eu entendo perfeitamente.
-Não sou uma pessoa de fazer joguinhos, se eu tivesse qualquer tipo de sentimentos por alguém, certamente falaria cara a cara com essa pessoa. Então se eu ainda não o fiz é porque eu não estou interessado, mas Beatriz parece não se dar conta disso. O que eu faço, Aghata?
-Eu... acho que... -ela pigarreia antes de prosseguir. -Se você se sentir muito incomodado com essa situação, pode... simplesmente mudar de turma. Não precisa necessariamente deixar de fazer algo que gosta por causa desse problema. Pegue outra turma em que essa menina não esteja matriculada e se afaste dela.
-Você tem razão. Como eu não havia pensado nisso antes? Obrigado, Aghata. -puxo-a para meus braços em um abraço. -Você é uma ótima amiga. -digo e ela me aperta fazendo com que meu rosto pressione a lateral de sua cabeça.
-Aiii. -resmungo ao sentir dor em minha boca cortada e inchada com o contato abrupto.
-Não chore, bebezão. Há dores bem piores do que essa. -ela diz e então se afasta sem ao menos me dirigir um segundo olhar.