Prólogo
AGHATA
-Amiga, você sabe que eu te amo muito não sabe? -sou surpreendida por um braço enganchado em meu pescoço assim que me encontro com Luna no estacionamento do campus.
-O que quer dessa vez, Luna? -reviro os olhos com um sorriso no rosto ao retribuir o abraço.
-Nossa, que insensível você é, amiga. -ela ri enquanto seguimos até onde nossos veículos estão estacionados. -Pode buscar meu irmão no Instituto por mim? Fiquei de dar carona a ele assim que saísse daqui, porém surgiu um imprevisto de última hora e eu irei demorar um pouquinho.
-Hum... sem problemas. -dou de ombros.
Que Deus me ajude!
-Obrigada, amiga! É por isso que eu te adoro. -Luna agradece com um beijo estalado em minha bochecha.
-Achei que me amasse por minha beleza e carisma. -brinco beliscando suas costelas ao que ela se afasta rindo.
-Isso também. Mas quando você salva minha pele eu te venero ainda mais. -ela responde entrando no carro da mãe e baixando os vidros. -Nos encontrem com o resto do pessoal na lanchonete que havíamos combinado, ok?
-Beleza, nos vemos lá Luna! -aceno em despedida e subo em minha moto com a certeza de que estou fazendo a coisa errada.
*
EU ESTOU FAZENDO TUDO COMPLETAMENTE ERRADO!
Essa é a certeza que me atinge em cheio como um soco, quando retiro o capacete em frente ao Instituto da família Morales, e aceno com uma mão para que Dante me veja parada próxima aos portões a sua espera.
Sinto como se minha alma estivesse sendo desnudada quando aquele par de olhos verdes que estremecem minhas bases, reconhecem-me de imediato e me fitam de alto a baixo com uma força a qual não consigo mensurar.
-Eu estava me programando para me queixar do dia exaustivo que tive nos ouvidos da minha irmãzinha que no caso não está aqui, durante o caminho de volta para casa. Entretanto acabo de mudar de ideia ao receber essa adorável surpresa em seu lugar.
Dante como sempre, vem com um de seus galanteios adolescentes para cima de mim, e por mais idiota que possa parecer, de alguma forma esse gesto ainda tem a capacidade de me mexer comigo.
-Sobe logo, garoto. -faço-me de durona ao rolar os olhos e lhe oferecer um capacete.
-É para já, Gata.
Dante pisca um olho aceitando o objeto ao me chamar pelo apelido ridículo que somente ele insiste em usar.
-Agradeço por não me deixar a pé ao contrário de Luna. -ele ri e sobe na garupa em seguida.
-Não se acostume. -eu rebato seriamente .
-Oh, eu com certeza poderia facilmente me acostumar com essa mordomia, Gata. Você é a melhor carona que eu poderia desejar.
Quando Dante se inclina para beijar minha bochecha como sempre faz, sinto o calor de seu peito irradiar por toda a extensão das minhas costas e algo dentro de mim se revira.
Ah, por favor não! Agora não, cérebro inútil e coração burro! Isso não é hora de agir estupidamente como uma pré-adolescente apaixonada por alguém totalmente fora de alcance.
-Fique quieto ou terá que se virar para ir embora, garoto. -ralho subitamente irritada com a maneira idiota como ainda reajo a esse menino.
-Certo, certo. Não precisa se estressar, Gata. Vamos nessa então. -ele dá uma meia risada antes de colocar o capacete e segurar em minha cintura.
É como ter a sensação de brasas incandescentes queimando-me viva na região em que seus dedos firmes tocam a faixa de pele exposta através da barra da minha camiseta que subiu alguns centímetros.
Oh, céus! Que sentimentos mais tortuosos e... errados! Por Deus! Que minha alma não vá diretamente para o inferno com os pensamentos inadequados que estou tendo nesse exato momento com o corpo de Dante colado ao meu.
Estou tão absorta no turbilhão que há em minha cabeça que dou uma brecada na pista ao me assustar com a fechada que levo de um outro motociclista que surge praticamente do nada ao meu lado.
-Seu idiota, filho de uma parideira sem alma! -grito furiosa com o careca tatuado que agora está a poucos metros a minha frente quando o semáforo fica vermelho.
-Aghata fica calma, pelo amor de Deus mulher. -Dante murmura temeroso apertando minha coxa esquerda em um alerta que deliberadamente ignoro.
Estou muito enraivecida com a atitude imprudente do outro cara para me manter quieta, quando ele poderia ter causado um grave acidente sem pensar nas consequências.
-O que você disse? -o cara se vira em minha direção e eu o encaro com o queixo erguido ao responde-lo.
-Isso mesmo que você escutou, idiota! Além de barbeiro ainda por cima é surdo?
-Aghata, você é louca? -Dante ralha em meus ouvidos quando percebemos o homem descer da moto e vir em nossa direção com passadas rápidas e perigosas.
-Quero ver você repetir isso outra vez na minha cara. -ele desafia erguendo o punho do tamanho de um melão quase nos alcançando.
-Não encosta nela, cara. -sem que eu note Dante já saltou da garupa e está se enfiando na minha frente. -Não irei permitir que coloque um dedo sobre essa garota. É melhor ir embora. Eu estou avisando... -então a frase é abruptamente cortada quando o careta acerta um soco tão forte na boca de Dante, que sua cabeça ricocheteia para trás com o golpe.
-Briga! Alguém chame a polícia! -uma voz feminina grita em meio ao caos que outras tantas vozes fazem quando se juntam a dela.
O idiota agressor corre de volta para sua moto fugindo do local feito o babaca covarde que é, e eu pulo para o asfalto como um raio para conferir o estado de Dante.
-Irresponsável! O que pensa que está fazendo? Porque fez isso? -agarro seus ombros e o chacoalho com raiva.
-Não importa, Aghata. Agora vamos embora daqui. -Dante limpa o canto da boca de onde corre um filete de sangue.
-Você está machucado. -constato ao montar de volta no veículo com as mãos tremendo de nervosismo.
-E daí? Não faz a menor diferença. -ele rebate mal humorado e eu arranco ganhando velocidade novamente.
-Deixa de ser otário, garoto. É claro que faz. Não pedi para se meter em um assunto que não é da sua conta. Da próxima vez fica na sua, está me entendendo? -ordeno estacionando em frente a lanchonete. -
-Perfeitamente. -Dante se desfaz do capacete e me dá as costas como resposta.
-Não quero ter que explicar para Luna e Alice como o irmãozinho mais novo delas apareceu com a cara toda quebrada porque agiu como um menino idiota e precipitado. -eu alfineto fazendo com que ele pare no meio do caminho, e gire sobre os próprios pés retornando até mim com o semblante transtornado.
Finjo não me abalar com a expressão direcionada a mim e desço tranquilamente da moto seguindo rumo a porta de entrada da lanchonete.
-Olha aqui, Aghata. Ouça bem com atenção as minhas palavras. Eu não sou nenhum moleque então não me trate como criança. Sou responsável por meus atos e ninguém mais. -ele diz apontando o dedo indicador em minha cara o que me enfurece ainda mais.
Quem ele pensa que é para falar comigo desse modo?
-Então não aja como um. -disparo irritada e sigo pisando duro para as portas duplas de vidro, com Dante logo atrás de mim com uma cara não muito amigável como a minha.
-Olha a droga em que o idiota do irmão e amigo de vocês se meteu. -cuspo furiosa assim que paro em frente a mesa em que estão meu irmão e nossos amigos, e meneio a cabeça na direção de Dante ao cruzar os braços.
-Jesus! O que aconteceu com você, Dante? -Lorenzo questiona com os olhos arregalados ao fitar o canto do lábio superior inchado devido ao pequeno corte que se abrira com o soco do careca tatuado.
-Não foi nada... -ele desconversa como se não fosse nada de mais e eu estouro.
-Não foi nada? Não foi nada, seu idiota?! É isso que tem a dizer? Por que não conta a verdade para todos? Aposto que suas irmãs vão adorar saber que andou se metendo em uma briga! -eu acuso e ambas suspiram surpresas com a revelação.
-Pois é, eu conto sim. Conto também que eu só me enfiei em uma briga logo após a senhorita ter se metido em outra primeiro. -ele rebate desafiadoramente e eu tenho vontade de acrescentar um olho roxo a sua lista de ferimentos.
-Uou... -Luna exclama admirada achando a situação muito engraçada e eu me contenho para não revirar os olhos.
Agora não, Luna! Fala sério!
-Eu não sou nenhuma donzela indefesa que precisa ser defendida por ninguém, garoto. Não pedi que fizesse nada a respeito, você fez porque é intrometido e teimoso. -me defendo e isso parece irrita-lo ainda mais.
-Ah, beleza... Então eu deveria ter ficado de braços cruzados vendo aquele imbecil pronto para te agredir e assistir tudo quietinho no meu canto? Certo? -ele indaga ironicamente com os olhos verdes e intensos estreitos.
-O QUE? -Luna grita atraindo a atenção e fazendo com que algumas cabeças ao redor se voltem em direção a nossa mesa com seu grito desnecessário.
-É isso mesmo que vocês ouviram. Tudo porque um cara em outra moto deu uma fechada na gente no trânsito e Aghata o xingou. Como o sinal estava fechado na hora, o imbecil desceu da moto e veio tirar satisfação, e como vocês sabem o sangue de pit bull que corre nas veias dessa aqui...
Dante aponta provocativo em minha direção, eu fecho às mãos em punhos e ele continua.
-Ela não quis levar desaforo para casa. Só que o cara não aceitou muito bem a reação e veio com tudo, foi aí que eu me coloquei no meio, acabei ganhado um soco na boca e fim de papo. -Dante termina de falar com tranquilidade e puxa uma cadeira que está por perto para se sentar ao lado Lorenzo.
Como ele pode estar tão desencanado sendo que a situação poderia ter saído de controle a qualquer segundo e ter sido muito pior do que foi?
Dante deixa a mochila escorregar das costas pelos braços até o chão enquanto se acomoda no lugar e pega o cardápio para examinar, evitando assim ter de encarar o olhar mortal que lhe dou, desacreditada em sua capacidade de fingir que está tudo bem, enquanto me dirijo para me sentar ao lado de Israel.
-Amiga, você é muito doida. -Luna comenta com uma risadinha e eu fecho a cara reprovando sua atitude.
-É assim que se faz, garoto. Sempre defenda as garotas da família. -Lorenzo diz com um enorme sorriso no rosto e dá dois tapinhas nas costas de Dante.
-Eu não pertenço a mesma família que esse idiota. -digo com raiva e imediatamente Alice Luna me olham em alerta.
-Quer dizer, hum...desculpe meninas, eu não quis ofender a família de vocês. -me desculpo rapidamente com o rosto em chamas. -Estava me referindo apenas a esse idiota.
-Ah por favor, vê se cala a boca Aghata. -Dante diz de maneira rude chocando a todos presentes e eu o encaro boquiaberta.
Ah, eu vou matar esse garoto!
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*barbeiro: nome comumente atribuído a péssimos motoristas.