Capítulo 4
– Mãe, vó, o que vocês fazem aqui? – Pergunto observando as mulheres. Minha vó está confortável no sofá, fazendo alguma peça de tricô, enquanto minha mãe aparenta estar mudando de canal a todo o momento procurando alguma coisa para ver na tv.
– Ora, te visitando. Já falei sobre isso, querida. – Disse minha mãe como se eu fosse uma mulher com Alzheimer e precisasse ser lembrada do porque elas estavam ali.
– Não. – Disse enquanto tentava parecer tranquila na frente do estranho, o que, claramente, eu não estava. – Eu quis dizer, o que vocês estão fazendo aqui, no meu apartamento? Vocês não iam chegar só daqui quinze minutos? – Perguntei como se fosse óbvio. Dessa vez, foi minha vó que respondeu.
– Adiantou o ônibus. E você não preza pela sua própria segurança. Diga-me senhor, você sabe que sua namorada deixa a porta do apartamento aberta quando vai sair para fazer seja lá o que for? – Perguntou vovó carrancuda. O olhar quarenta e três dela era de dar medo, ainda mais dado a Alexander, que Jesus! Não tinha nada a ver com a situação e estava ali, servindo de cristo para ser crucificado.
Maldito momento que fui aceitar essa loucura toda.
– Ah, eu... – Começou Alexander e eu só conseguia imaginar o quão louco seria falar para a minha mãe e a minha vó que eu deixei um desconhecido entrar em casa.
– Eu não sabia que a Sara fazia isso. Por que você é tão descuidada assim, amor? – Ele perguntou me fazendo arquear a boca e paralisar por um instante.
– Como é que é? – Perguntei ainda sem fala. Minha voz saiu mais aguda do que imaginei que sairia, mas, o pior de tudo, era ver que ele dava asas para o que minha mãe e minha avó pensavam, transformando todos os sonhos delas em realidade.
– Ah, mas você nem imagina. A começar pelo fato de que ela nunca falou de você. – Continuou minha vó sendo mais sensível que uma cabra.
Será que eu nunca falei dele porque ele nunca existiu até hã, alguns minutos atrás, minha vó querida?
– Não acredito! – Exasperou Alexander, fingindo-se de ofendido. Meu Deus, ele era um ator mesmo, não pode ser. Por que agir tão fantasmagoricamente bem assim, só podia o fazer ser duas coisas: Uma pessoa muito boa no que faz ou quem sabe, um assassino.
A ideia me fez o olhar mais minunciosamente. Okay. O guarda não mentiria para mim, não é mesmo? Não faria eu deixar um assassino entrar em casa? O meu porteiro não teria ficado tão boquiaberto com essa opção, não é mesmo? Alguém me diz que não, que só posso estar delirando.
– Mas sabe, faz parte da Sara. Sabe o que acho também? Que ela com certeza inventou para vocês de que amanhã não vai poder dar atenção a vocês porque terá que cozinhar para se tornar chefe. Não é? – Aquilo me fez sair do sem fala, para o completamente falante.
– Mas isso é verdade! – Exasperei. Meu Deus, o que estava acontecendo com a minha vida? O que esse estranho estava fazendo? Só podia querer que elas mudassem de ideia e achassem que eu não era o que demorei anos para mostrar que era: Ocupada!
– Não, não é, meu denguinho. Vamos, para elas você não precisa mentir. – Ele continuou falando, ainda piscando para deixar claro o que tinha dito. Eu só conseguia manter a minha boca aberta, tentando entender onde diabos eu tinha parado de viver a realidade e cochilado e vivido um sonho. Por que a minha vida já tinha se perdido de mim a muito tempo e só eu ainda não tinha percebido isso.
– Não preciso? – Perguntei já perdendo a paciência. Primeiro, que espécie de apelido carinhoso era esse? Denguinho? Era algum diminutivo para dengue? Segundo, não te dei essa intimidade toda, moço, para você achar que pode agir assim comigo e dizer o que bem entender. Terceiro, onde eu tinha perdido a caminhada da andada e ganhado um namorado?
– Não. – Ele disse muito seguro de si. Seguro até demais para uma pessoa que eu poderia arrancar a cabeça a qualquer hora. Afinal, era do meu trabalho que estávamos falando! E eu tinha muito, muito apreço por ele! Mas para piorar, Alexander ainda sorria enquanto falava. – Você sabe que é só uma fachada. Você já ganhou, querida. – Okay. O moço estava usando maconha. Só podia ser. Cogumelo. Por isso ele mencionou o cogumelo. Agora faz todo o sentido.
– Olha só, eu... – Eu ia concluir, mas Alexander me interrompeu enquanto eu analisava a minha mãe e a minha avó, olhando-nos como se fosse um show de teatro, da qual elas estavam amando, e não conseguiam despregar os olhos. Para piorar a visão dos infernos, eu só conseguia imaginar que elas estavam achando que era uma simplória briga de casal, já que, hã, Alexander deixou a entender isso!
– Sarinha. – Ele começou e eu estava prestes a perder o controle de mim mesma. – Você sabe que vai ganhar. Ande, fale para sua avó e sua mãe.
– É, Sara, conta logo. Você sempre foi muito reservada conosco mesmo. – Acentuou minha avó, porque ela era dessas. Se podia jogar lenha na fogueira, ela faria questão de fazer.
– Falar o que? – Pergunto exasperada, porque a única coisa que consigo pensar é em como eu posso ter aceitado a carona de Alexander, o idiota, que só piorava a minha vida. Ou talvez eu devesse me beliscar, porque só podia ser um sonho!
– Que você será a nova chefe do restaurante Falcão. – Ele disse como se fosse simples assim. Ele queria, pum! Pronto, tudo acontecia. Não era assim não, o mundo não rodava ao redor dele só porque ele era famoso e estava meio que insinuando para a minha família que estava comigo. O que era ilógico, já que não nos conhecíamos não fazia sequer uma hora!
– Eu não... – Mas fui interrompida novamente por Alexander que me fuzilava com o olhar.
– Desculpe ser tão repentino conhecer as senhoras dessa maneira imprópria. – Disse Alexander tentando se desculpar por algo que eu sequer via sentido. – Mas já que a minha namorada não faz questão de me apresentar, eu faço eu mesmo. – Ele tomou ar para respirar, meio que para concluir a frase e eu só conseguia pensar em maneiras de castigar Dobby pelo abandono na hora errada.
– Meu nome é Alexander Von Falcão e eu sou Filho de Frederico Von Falcão, o verdadeiro dono das redes Falcão, vulgo meu pai. E, por acaso do destino, será eu que irei julgar o prato do novo chefe do novo restaurante da rede. E minha namorada, obviamente, é a mais qualificada para tal. – Terminou Alexander deixando não somente minha mãe e minha vó de olhos arregalados, mas eu também.
Agora fazia um pouco de sentido porque todos arregalavam os olhos para o moço. O famoso senhor famoso. O irônico era eu não ter reconhecido o meu suposto chefe.
Engoli em seco.
E aparentemente meu suposto namorado também.