O pedido
Sophia POV
Entrei no quarto e vi que o maquinário para o procedimento já estava ali, assim como Miriam e Claire, fui ajudá-las e não demorou muito até tudo estar nos conformes para inicial o processo.
“Não consegui fazer o pedido, não encontrei com o Senhor Hiperion hoje.” Miriam me comunicou.
“Bom, de qualquer jeito estarei aqui.” Fui até a poltrona do lado. “Se puder pedir para alguém trazer meu note, agradeceria.”
“Claro. Se você ver ele, você mesmo pode pedir autorização. Estou indo para casa.”
“Obrigada, Mi, bom sono.”
“Hey, Soph… Se cuida, tá bem?”
“Tudo bem.”
Estranhei aquele final de conversa, enquanto vi as duas saírem do quarto. Peguei meu celular e comecei a olhar os videos no TikTok, não demorou 10 minutos e pude sentir a presença de Hiperion na porta, não me pergunte como eu sei, eu só sei que sei.
“Boa noite, senhorita Sophia.”
Ergui o olhar em direção ao homem, chefe da família.
“Boa noite. Deve demorar em torno de 5h para finalizar esse procedimento.”
“Acabei de encontrar com a Doutora Miriam quando estava saindo do elevador. Ela me atualizou das informações e também me falou que você tinha uma requisição.”
Sorri de canto, revirando os olhos. Óbvio que ela ia mandar ele para mim.
“Eu tenho um evento online às 22h hoje, como estou fazendo turno extra, não vou poder comparecer da minha casa…”
“Entendo, bom, se isso não afetar o seu trabalho, você pode participar do evento aqui mesmo.”
“Obrigada.”
Abaixei o olhar e abri o aplicativo de mensagem.
[Ai, quero matar muito hoje, quero nem saber… Eu vou levar meus explosivos!] Eu
[AHahahaha! Conseguiu a autorização é?] Vic
[Ué, quem vai negar alguma coisa para a minha carinha de anjo?] Eu
[Anjo caído né.] Claire
[HAhahahaha! Com certeza meu lugar no inferno já está reservado.] Eu
[*Emoji diabo* Esse aqui é você oh.] Mi
[Com certeza!] Eu [Cade o Dylan ?]
[Acho que ainda não saiu do trabalho.] Claire
[Blz, depois eu volto então.] Eu
Fechei a tela do celular e olhei para Hiperion que havia se sentado em uma poltrona logo a minha frente, do outro lado do quarto. Ele estava me encarando, me analisando.
“Seu sorriso natural é bem mais bonito do que esses politicamente corretos.”
“Hum. Obrigada, eu acho.” Arqueei a sobrancelha esquerda.
“Até agora estou tentando decifrar quem você é. Ao mesmo tempo que demonstra claramente não gostar das pessoas que estão neste andar, julgando sem saber, te garanto isso, você também está aberta a ver além das aparências."
Não comentei nada, apenas deixei que ele continuasse a conversa.
“Recebi vários reportes que você e o Alexander estão se dando muito bem, que não reclamou de ter um guarda costas.”
Inclinei a cabeça levemente para o lado esquerdo, um hábito que eu tinha quando estava tentando entender alguma situação.
“Mas diga-me por que não gosta tanto de gente como a minha? Como você falou no nosso segundo encontro”
“Pessoas que acham que dominam o mundo e que o dinheiro pode comprar qualquer coisa. Esse tipo de gente eu não gosto e é isso que a princípio vocês demonstraram ser, não esperei que você fizesse o que eu tinha pedido, mas em épocas de desespero, pedem medidas desesperadas.”
Nos olhos das pessoas que encontramos sua alma e a de Hipérion era uma mistura de divertimento e seriedade.
“Além do mais, não consigo entender até agora porque eu, sei que sou a chefe das enfermeiras, mas Miriam é a chefe médica do hospital, ela com certeza tem bem mais qualificações.”
Aquele homem ficou quieto por alguns segundos, pensando no que me responderia, calculando as palavras.
“Concordo que dinheiro não compra tudo, inclusive muitos dos que me cercam não são comprados por dinheiro, eles fazem as coisas por honra e lealdade.”
As palavras dele não faziam muito sentido para mim, eu conhecia muito bem o mundo dos bilionários e não era assim, mas deixei minha expressão neutra.
“Sei que você pode não acreditar nisso, mas é a verdade. Quase não misturamos a família com esse círculo conhecido, meus contatos são diferentes.”
Respirei fundo, aquela conversa estava indo em uma direção que eu não gostava.
“Alguns diriam que parecemos mafiosos, de certa forma somos, mas não se preocupe não há nada de ilegal nos negócios da família e desprezamos esse tipo de coisa.”
Procurei algum indício que ele estivesse mentindo, mas não encontrei e meus instintos diziam que ele estava dizendo a verdade.
“Mas, quando estamos por aqui é muito normal encontrar pessoas dispostas a se venderem. Então, quando vi que você não era assim, me surpreendi e essa é a melhor coisa que aconteceu desde que cheguei aqui. Ter encontrado você.”
As palavras dele poderiam ser entendidas como um flerte, uma cantada, mas de alguma forma eu sabia que não era isso que ele estava querendo dizer.
Sinceramente, não tenho muito o que responder a ele, então quando Claire entrou carregando minha mala menor com meu laptop, agradeci silenciosamente a qualquer coisa que estivesse lá em cima.
“Hey, aqui está! Só pede para me esperarem, vou demorar em torno de 1h para chegar em casa, ainda quero comprar pipoca e vinho!”
Claire falou animada e me virei para ela sorrindo de leve.
“Isso vai ser engraçado. Ver a Tremere jogar bebada!”
Comentei dando um riso baixo.
“Pelo menos não sou a La Sombra piromaníaca!" Claire revirou os olhos e soltou um riso baixo. “Só você mesmo para fazer uma vampira que gosta de fogo.”
“O que posso falar? Se eu for morrer que seja com fogos de artifício!" Comentei enquanto abria a mala e retirava o laptop.
“Bom, mas pelo menos tu já ganhou fama por ter matado aquele lobisomem, posto 3. Quem diria que para matar um posto 3 só era preciso algumas C4 em pasta… Mas você foi louca quando falou que ia lutar mano a mano para conseguir grudar a pasta nos pelos dele.”
“O que posso falar? Eu rio da cara do perigo!”
“Virou o Simba agora é?”
“Pelo menos entendeu a referencia… Mas fala serio, foi épico, sai quase morta e quase ganhei laço de sangue para ficar viva.”
“Definitivamente, foi épico! Espero ter mais cenas hoje, afinal é a última sessão.”
“Eu também espero, afinal vamos invadir aquele Caern de uma vez por todas e espalhar corrupção!”
“Cara, quando você fala assim, até sinto falta dos encontros presenciais.”
“Eu também, mas vai logo para casa!”
“Sim, senhora!” Claire se abaixou e pegou minha mão e beijou. “Obrigada por me liberar, minha condessa.”
“Está liberada, serva. Agora vá cumprir a missão, quem sabe se voltar eu te deixo beber mais um pouco do meu sangue.” Meu tom de voz mudou para um mais rouco e mais grave, o mesmo que usava para a minha personagem.
“Céus! Você não sabe brincar! Já quer aumentar meu laço de sangue né?”
“Ué, fazer o que? Assim sempre vou ter uma serva à disposição. Além do mais, seu personagem ama meu sangue.”
“Claro, porque você comprou aquela vantagem lá: Sangue Viciante.”
“Hey! Eu tinha pontos de vantagens para gastar, não tenho culpa se vocês compraram outras coisas.”
“Sei sei, combeira safada.”
“Com certeza! E com orgulho!”
Claire revirou os olhos e então saiu do quarto, sorri de canto e respirei fundo, olhando a tela do PC ligada.
“Será que devo me preocupar?” Escutei a pergunta de Hiperion em tom de brincadeira.
“Ah, não… Eu só mato pessoas virtuais. É um jogo de interpretação. Hoje vamos terminar um campanha de Vampiro a Máscara, um jogo bem famoso até. No caso estou jogando com uma vampira de 9º geração, que dizer velha já, La sombra, que é um dos clãs, e que tem o defeito piromaníaco. Nossa missão é invadir um Caern, que é um lugar com grande poder mágico e puro, por assim dizer, estes lugares normalmente são protegidos por Lobisomens, que são divididos por tribos e dentro das tribos tem as matilhas, que podem ser mistas ou puras. No caso, o meu grupo de Vampiros que entrar nesse lugar, chegar no centro, carregar poder mágico e transformar ele para que a gente possa usar a energia mágica e não mais os lobisomens. Se a gente conseguir, provavelmente eu viro o Príncipe da cidade. Príncipe é o título para quem manda na cidade.”
Expliquei da forma mais simples que consegui sem tirar os olhos da tela do meu laptop, abrindo todas as aplicações que eu precisava para jogar.
“Isto é, se ninguém me trair…” Fiquei séria. “Se algum deles me trair e eu ficar viva, depois vou me vingar. Ninguém mexe com Alana Lafai!” Dei um sorriso de canto. “Enfim, é algo bem legal e ajuda também a me distrair do dia a dia.”
Terminei de arrumar as coisas para o jogo e levantei o olhar fitando Hiperion, ele parecia imerso em seus pensamentos. Virei o rosto e vi que não havia nenhuma mudança, peguei o tablet e anotei as informações, precisava fazer isso a cada meia hora, ajustei o despertador do celular.
“Mas, eu não gosto tanto assim de jogar Vampiro: a Máscara, prefiro bem mais jogar Lobisomem: o Apocalipse, porque nada melhor do que virar um bicho de 3m de altura para bater nos inimigos, ou então qualquer coisa de Cthulhu. Insanidade é meu nome do meio, com certeza.”
Faltava ainda 20 minutos para iniciar o jogo, mas a galera já estava entrando no site para jogarmos, coloquei o fone no ouvido esquerdo apenas e deixei o microfone desligado.
“Hum, não sabia que existia tal coisa.” Finalmente escutei a voz de Hiperión.
“Jogos, esse estilo é chamado RPG de mesa, que é basicamente interpretar um personagem, você pode ser qualquer pessoa, coisa, ser, etc… Tem de tudo. Prefiro isso a ficar jogando online, ou sair para beber. Apesar que sair para beber em um bar nerd/geek é bem legal também.”
Sei que meus olhos estão brilhantes e consigo escutar minha animação falando sobre o assunto, é um dos meus hobbies favoritos, sempre que eu podia trazia alguém para ele. Talvez essa fosse uma das coisas que me afastava de Joshua, ele não gostava de jogar.
“Interessante, muito interessante. Quem cria esses jogos?” Percebi que Hiperion estava genuinamente interessado.
“Olha, muitos, porque a temática pode ser tão variada quanto a imaginação humana. É como perguntar quem cria os filmes que assistimos, existem centenas de diretores, assim como existem centenas de criadores de sistemas. Basicamente alguém imagina algum cenário, cria as regras para ele e depois coloca a prova. Eu odeio criar sistemas, mas amo criar histórias, principalmente histórias de terror.”
“Entendo, mas você já pensou se alguma dessas histórias são reais?”
“Todo mito tem um fundo de verdade, o cérebro humano faz de tudo para se proteger, já vi pessoas chegando na ala de trauma com o corpo todo cortado porque alguém resolver fazer isso com ela, mas em vez do cérebro processar como um outro ser humano batendo em outro, ele registra como um monstro com garras. Vejo por exemplo que quem mora perto de florestas costuma dizer que tem lobisomens por lá, mas acho que é apenas uma forma do coletivo manter crianças e adultos de se perderem. Falando de forma simplista.”
“Faz sentido, de uma forma lógica sua explicação faz todo sentido.”
“É, eu sei.” Sorri sincera para ele e então escutei meu nome ser chamado pelo fone. “Se ficar muito alto o fone me avisa.”
“Hum… Na verdade, ia pedir para deixar com som alto, para poder escutar.”
“Melhor…” Peguei o outro par do fone bluetooth e joguei para ele. “Assim você também escuta e a gente não atrapalha o seu filho. Sò não se assuste, às vezes tem gritos e outras coisas.”