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4

Ela é uma mulher muito bonita. E vestida com um conjunto de terninho como se fosse uma executiva, parece ainda mais bonita.

Qualquer um poderia dizer que o Nick é filho dela. Ele tem a mesma cor dos olhos e dos cabelos tendo como diferença o fato de que os dele são em um tom mais claro. Mas com certeza o olhar desafiante que ele tem foi herdado da mulher na minha frente.

Ela aproxima-se passando sem olhar para a Agnes e estende a mão para mim a uns bons dois metros de onde eu estou sentada.

Qual o problema dela? Não entende a situação aqui? Ergo uma sobrancelha pra ela e após dar uma olhada ao redor e ver minha cadeira de rodas ao lado do sofá, um rubor mínimo sobe em seu rosto e ela vem até mim para me cumprimentar.

— Me desculpe, eu não sabia sobre... — ela aponta para as minhas pernas. Franzo os lábios e aperto sua mão.

— Aceito suas desculpas.

Ela me dá um sorriso bastante amável. Pede permissão e depois se senta ao meu lado.

— Gostaria de tomar alguma coisa?

— Apenas água, por favor.

Não é necessário pedir. Ao ouvir, Agnes vai até a cozinha buscar a bebida para a senhora Hoffman.

Senhora Hoffman. Gosto do título. Quem sabe um dia ele se aplique a mim. Sorrio por dentro com o pensamento de estar casada com o Nick e construindo uma família e uma vida com ele.

— É bom finalmente conhecer a mulher que virou a cabeça do meu filho. — ela diz, tirando-me dos meus pensamentos.

Sorrio meio sem jeito para ela. Caramba. Deveria existir um guia de ensinamento de como se comportar na frente da sua sogra. Se existisse, eu com certeza compraria e leria em um único dia.

— Quando o Oliver me falou de você eu sinceramente achei que ele estivesse exagerando quanto à sua beleza, mas pelo que eu posso ver ele foi até econômico em seus elogios.

— Obrigada. — me sinto estranhamente sem graça com sua simpatia.

Sabe aquela sensação esquisita quando se está perto de uma cobra e a vê muito quieta antes de dar o bote? É exatamente assim que estou me sentindo agora.

— Meu filho sempre teve muito bom gosto para as mulheres. — estreito um pouco os olhos — Vejo que depois de quase seis anos, isso não mudou.

Não gosto nem um pouco de ser comparada às outras mulheres que já entraram na vida do Nick. Não gosto particularmente de ser comparada à ela. Ada.

O que eu falava mesmo sobre bote? Olha ele aí.

Meu sorriso dessa vez é forçado.

Agnes volta da cozinha com uma bandeja e dois copos cheios de água. Coloca em cima da mesinha de vidro e discretamente se retira.

— O Nick não deve demorar mais do que meia hora para voltar. — digo quando um silêncio se põe entre nós depois que ela bebe a água — Ele deve vir mais cedo já que a senhora está na cidade.

— Oh, na verdade ele não sabe que eu estou.

Franzo as sobrancelhas.

— Eu estava contando que você pudesse me ajudar com o meu filho.

Ajudar?

— Ajudar como?

— Eu tenho ligado repetitivamente para ele, mas ele não quer falar comigo. — ela cruza as pernas — Eu imaginei que talvez você possa convencê-lo a me ouvir.

Sorrio com a triste realidade de que agora eu não consigo convencer o Nick nem mesmo a fazer amor comigo, como poderia convencê-lo a falar com a mãe que ele cortou de sua vida?

— Desculpe senhora Hoffman, mas acho que veio procurar ajuda no lugar errado.

— Tenho certeza que não. — ela sorri um tanto amável demais para parecer realmente sincera — Você sem dúvida é capaz de fazer o meu filho fazer qualquer coisa.

— Acho que está equivocada.

— Você é a mulher que ele trouxe para dentro da própria casa depois de abrir mão de uma vida amorosa por anos...

OK, isso está ficando chato. Senhora quer, por favor, parar de me comparar às outras mulheres do seu filho?

—... então não, não estou equivocada. Você e o Oliver são os únicos capazes de mandarem na mente e no coração do Nicholas. Como o avô dele não está aqui, então...

— Eu posso tentar falar com ele e convencê-lo a atender as suas ligações, mas não prometerei. — eu digo em tom seco.

— Muito obrigada, Ellen.

— Não há de que.

Acho que não há motivo para não ser educada e usar de boa vontade com a mãe do homem da minha vida. Ela parece um pouco triste, na verdade.

— Talvez você e eu possamos sair um pouco. — ele sugere — Quem sabe para uma tarde de compras ou para tomar um café um dia desses.

Agora isso, já é outra coisa. Eu não poderia fazer isso.

— Me desculpe, senhora Hoffman, mas eu acho que quanto a isso, não será possível. Se o Nick não está pronto para aceitá-la em sua vida, eu acho que também não posso estar.

Como poderia? Não seria como se estivesse traindo o Nicholas?

Ela sorri e concorda.

— Tem razão. Não acho que posso me dar ao luxo de conviver com a namorada do meu filho sem o consentimento dele.

A mulher se levanta e começa a se preparar para ir embora.

— Eu sinto muita falta dele, Ellen. Eu gostaria muito de vê-lo. — ela parece enxugar uma pequena lágrima com o polegar — Mas fico feliz em saber que o meu filho tem alguém que é tão leal a ele.

Fico olhando para ela e ela de volta para mim. Por um momento eu acho que ela vai falar mais alguma coisa, talvez mais uma comparação entre mim e as ex do Nick, mas ela não faz isso. Ela simplesmente se abaixa e me beija no rosto em despedida.

— Foi um enorme prazer conhecê-la, Ellen. — Não posso dizer com certeza se ela está sendo sincera — Espero que possamos nos tornar amigas no futuro.

Agnes a acompanha até a porta. Observo o tempo todo enquanto ela sai com um certo sentimento ruim e o som da sua voz calma na minha mente durante sua última sentença. Ser amiga da mãe do meu namorado? Pode ser bom, mas não sei se é isso que o Nicholas quer.

Depois da saída da senhora Hoffman, não demora para que o mais jovem homem da família entre pela porta e se esparrame ao meu lado no sofá. Sorrio com a cena de um cara extremamente lindo fazendo cara de cansaço.

— Dia puxado? — pergunto tirando seus antebraços dos olhos.

— Demais. — ele responde, ainda com os olhos fechados. Depois ele sorri e me dá um beijo. Algo dentro de se agita com o ato. Estamos bem outra vez.

— Talvez eu possa te fazer uma massagem. Minhas mãos não são tão boas como as suas, mas eu tenho certeza que posso tirar o cansaço do seu corpo.

Ele me olha com olhos brincalhões e morde o lábio inferior, prendendo o riso.

— Ah, eu vou aceitar. Você já provou inúmeras vezes que suas mãos são tão mágicas quanto as minhas.

Sim. Devo fazer um mimo a ele antes de contar que sua mãe esteve aqui há pouco tempo.

Ele sobe para o quarto comigo nos braços. Beijo seu pescoço e queixo durante o curto percurso pelas escadas. É bem verdade que eu poderia provocá-lo um pouquinho, mas a última coisa que eu quero hoje à noite é discutir por qualquer coisa que seja. Já passamos boa parte do dia, distantes um do outro. E não falo apenas da distância física.

Ele me joga na cama com uma certa “brutalidade” que me deixa sem palavras por alguns segundos. O que se passa por essa mente cruel? Em um instante ele está me olhando com os olhos brilhando de malícia, no outro ele está subindo em cima de mim com as mãos em garra e me fazendo cócegas. Isso mesmo. Ele está me fazendo cócegas e eu estou rindo a ponto de sair lágrimas dos olhos.

— Nick, pare com isso. — advirto tentando pegar suas mãos travessas.

— Não mesmo. Você ficou emburradinha uma boa parte do dia e me fez ficar emburrado também, acho que precisamos rir um pouco.

Ele para seu ataque apenas o suficiente para que eu recupere o fôlego, logo depois volta mais implacável do que antes, fazendo com minha barriga comece a doer por causa do esforço de tentar me livrar dele e de não conseguir parar de rir.

Eu estou feliz. Pela primeira vez desde o acidente eu realmente estou feliz. Acho que nossos problemas podem ser superados se não deixarmos que nossa relação pessoal mude.

Olhamos um para o outro, totalmente ofegantes. Ele se apoia nos braços, tendo cada uma das mãos em um dos lados da minha cabeça e sorri como um menino. Meu namorado perfeito.

— Você é única para mim, Ellen. Não se preocupe com nada, amor.

Ele sabe que eu preciso ouvir isso e ele diz, porque ele sempre diz aquilo que eu preciso ouvir. Ele sempre soube de tudo que eu preciso. Desde a primeira vez que nos vimos.

Levo as duas mãos ao seu rosto e aos seus cabelos. Acaricio-o por bastante tempo, demonstrando com o meu toque que agradeço por ele ser tão doce... e tão meu.

— Você parece feliz.

— O Dr. Byron me fez um cara mais feliz hoje com o ótimo prognóstico que ele deu sobre você.

Então é isso...

— E também... eu não quero mais brigar. — ele continua — Meu dia fica especialmente péssimo quando brigamos.

— O meu também.

Ele beija minha testa. Meu nariz e por último a minha boca. Não espero mais do que um beijo rápido. Não hoje.

— Agora faça aquela massagem que você prometeu, garota. — ele ordena com um rosnado sexy.

Depois da massagem, tomamos banho no chuveiro, não na banheira. Ele me segura o tempo todo junto ao seu corpo. Enrolada nele como uma hera, ficamos um bom tempo embaixo da ducha. Acho que ele não sabe o que o corpo dele faz comigo, ou talvez saiba, já que é totalmente iniciativa dele nos manter perto um do outro durante o banho.

A noite segue com um jantar íntimo e maravilhoso à luz de velas no quarto, com uma melodia suave vinda do meu iPod no aparelho de som. Sei que a seu modo, ele está pedindo desculpas pela nossa discussão de mais cedo.

No meio do jantar Nick se levanta e vai até uma das suas gavetas. Fico olhando pra saber o que ele está fazendo, mas não consigo ver. Dois minutos depois, volta com algo em sua mão.

— Aqui. — ele coloca o conteúdo em minhas mãos e as fecha antes de dar um beijo nelas — A perícia me entregou logo depois do...

Ele baixa os olhos e eu abro as mãos. É o meu colar. O meu colar de Pégaso que ele me deu no dia do torneio. Ah, como eu senti falta dele. Instintivamente eu levo as mãos ao pescoço onde sinto sua ausência. Todos os dias da semana passada eu repetia esse gesto procurando pela peça que não estava lá.

— Obrigada. — É tudo que eu consigo dizer sem deixar algumas lágrimas caírem dos meus olhos.

Eu amo esse colar. É um símbolo do amor dele por mim e eu realmente fiquei péssima quando achei que tinha perdido enquanto o carro capotava.

— Desculpe não ter te devolvido antes, é que eu não sabia se você iria querer de volta.

— Está brincando? Eu amo esse objeto. — beijo o pingente — Eu nunca mais vou tirá-lo do meu corpo.

Ele sorri e meu coração se aperta, porque é um sorriso amarelo. Ele ainda está abalado pelo que aconteceu. Não posso nem mesmo imaginar como seria receber a notícia de que aconteceu algo com ele. Deve ter sido um golpe bastante duro pra alguém que já sofreu tanto.

— Você coloca em mim? — peço, chamando sua atenção para o meu rosto.

— Claro.

Depois de colocar o colar, Nick senta atrás de mim, me prendendo entre as suas pernas. Seus braços envolvem totalmente meu corpo e sua boca passeia pelo meu pescoço. Ouço-o respirar nos meus cabelos e o sinto fuçar minhas mexas com o nariz.

— Você cheira tão bem, meu amor.

Deixo a cabeça cair para trás no seu ombro e fecho os olhos enquanto seus lábios percorrem as veias que pulsam sob minha pele.

— Seu cheiro também não é nada mau.

Ele sorri. Eu sorrio. Passamos bastante tempo sentados no chão ao lado da cama, apenas acariciando um ao outro, presos em nossa bolha.

— Eu quero beijar você. — ele diz.

— Desde quando você precisa me dar um aviso prévio?

Dessa vez ele me pega sem aviso e após alguns rodopios comigo nos braços, cai em cima de mim na cama. Logo nossas bocas estão coladas e nossas mãos passeando pelo corpo um do outro.

— Deus, eu quero te beijar até amanhã de manhã.

— Não vou impedir.

E é exatamente o que ele faz. Beija-me até eu cair nos braços de Morfeu com uma sensação de bem estar tão grande que me deixa toda mole.

No dia seguinte, antes mesmo do café da manhã eu resolvo contar sobre a visita da senhora Hoffman ontem.

— Não acredito que minha mãe veio aqui. — ele anda exasperado pelo quarto, só de toalha. — Ela não tinha esse direito.

— Ela pediu pra você entrar em contato com ela.

Ele franze a testa minimamente e seu rosto contorce um pouco. Acho que ele está meio irritado.

— Nick, ela parecia sincera quando disse que sinta sua falta.

— Eu tenho certeza que parecia. — ele ri com deboche — Também deveria estar parecendo abatida, preocupada e triste.

Confirmo com um aceno.

— Mas acredite, ela não estava. Se a minha mãe tivesse ido a Hollywood, ela poderia ter feito muito sucesso como atriz dramática.

Não sei se devo contar a ele que realmente achei a sua mãe um tanto falsa, para não dizer cobra, e piorar sua relação com ela. Mas também não sei se poderia tentar forçar uma aproximação entre os dois, já que ele deve ter seus motivos para ter se afastado dela. Embora no fundo eu saiba que o afastamento do Nicholas com seus pais contribuiu para o homem que ele é hoje, sinto que apesar de negar, ele sente falta deles.

— Então você não vai falar com ela?

— Eu não sei. — ele solta uma longa respiração e vai para o closet, se trocar.

Quando volta, já vestido em uma bermuda azul marinho e camiseta branca mostrando muito bem os bíceps, ele afirma que ligará para ela depois.

Perto do meio dia, Nicholas sai de casa para encontrar a mãe em um restaurante perto do centro. Ele me pede para acompanhá-lo, mas acho que a interação que tivemos ontem já foi suficiente em um intervalo tão pequeno de tempo, então nego.

Aproveito o tempo sozinha para ir almoçar com o Asher. Ligo pra ele e em pouco tempo estamos em uma lanchonete perto do Sunrise.

— Obrigada por me trazer aqui. — digo de boca cheia — Normalmente eu não posso fazer isso com o Nicholas.

Ele sorri e enfia uma batata frita na boca.

— Não há de quê, mas não vou poder ficar com você além do almoço. O Terry me deu a maior bronca por faltar ontem.

Sussurro um pedido de desculpas. Não quero causar problemas pra ele no trabalho. Terrence é legal, mas acho que para tudo tem um limite.

— E então, por que não pode fazer isso com o Nicholas? — ele pergunta entre uma mordida e outra.

— O Nicholas não gosta de comer essas coisas e também não gosta que eu coma. Sabe, ele se preocupa muito com essa coisa de saúde.

— Eu acho que o Nicholas precisa de terapia. — ele sorri bastante com sua própria piada. Eu faço uma cara séria e seu sorriso acaba. — Desculpe, Ellen. É que eu acho estranho, só isso.

Não posso deixar de concordar. Para qualquer um que não o conheça como eu, alguns hábitos do Nicholas podem ser considerados estranhos, inclusive sua dieta perfeita. Quem, com vinte e três anos, não come besteiras? Principalmente sendo um homem.

— Aceito suas desculpas, mas não quero que ria do meu namorado na minha frente. — digo já com um sorriso novamente.

— OK. Prometo que só irei rir quando não estiver com você. — jogo uma batata frita nele, e ele me pisca um olho.

Depois disso começamos a conversar sobre uma série de coisas como seu trabalho, meu trabalho, o que o Dr. Byron disse ontem durante a fisioterapia e como é ter uma mosquinha me observando o tempo todo. Quando ele me pergunta isso, eu me viro instantaneamente para a mesa ao lado onde a Agnes está. Hoje não teve acordo, quando mencionei que viria almoçar com o Asher de novo, ela não me deu nem mesmo a oportunidade de tentar dissuadi-la a não me acompanhar. Asher vai pagar a conta e eu pergunto se posso ir junto com ele ao Sunrise. Quero ver o Tyler. Estou com saudade dele. Eu poderia tentar montá-lo. Embora eu ache que meu namorado super protetor não iria gostar disso. Ainda não posso.

— Obrigada pelo almoço. — digo ao entrarmos no carro dele.

Ele faz a volta, guarda minha cadeira no porta-malas e entra. Agnes entra logo em seguida no banco de trás.

— Não precisa agradecer. Sinta-se à vontade para fazer comigo tudo que não pode fazer com o Nicholas.

Olho nervosamente para a Agnes, que nem está me olhando, mas tenho certeza que ouviu tudo. Acho que nessa hora eu coro até a raiz do cabelo. Não sei nem por onde começar a imaginar o quanto o que ele disse seria estranho se ele soubesse o que mais eu não posso fazer com o Nicholas.

— Você está bem? — ele pergunta sorrindo — Você ficou vermelha.

— Estou bem sim. — ele estreita os olhos sem acreditar — É só que passou uma coisa pela minha cabeça, que é melhor você não saber.

— Tudo bem então. Mantenha seus segredos, Muller.

— Farei isso, Trager.

Senti tanto a sua falta Tyler. Mesmo estando ao seu lado, é como se não fôssemos mais parceiros. Eu não posso montá-lo. O Dr. Wood, o Dr. Byron e o Nicholas, disseram que é perigoso subir nele sem alguém preparado ao meu lado. Não posso nem ao menos tocá-lo. Sentada em uma cadeira, não é seguro estar perto dele agora. Ainda assim, me esforço para sentir sua crina.

— Vem aqui, garoto. — o chamo através da grade de proteção do seu curral particular.

Sorrio cada vez que eu o chamo, pois ele apenas levanta sua cabeça e relincha. Acho que ele não quer me machucar. Mas eu quero tanto tocar seus pelos. Quando estou prestes a abrir a grade para entrar no lugar onde ele está, ele vem andando devagar até a comida perto de o de eu estou. Aproveito a oportunidade para tocá-lo. Seu pelo brilha, tão negro quanto a noite. Sua crina está um pouco maior do que deveria, e talvez eu deva falar com o Terrence sobre isso. Quero saber quem está cuidando dele para poder dar algumas dicas e cobrar alguns cuidados.

— Oi. — olho para trás e vejo o Nicholas escorado em uma das barreiras de madeira da entrada do estábulo.

— Oi amor.

Ele anda até mim e se abaixa ao meu lado. Com sua altura, toda vez que ele fica nessa posição, seus olhos ficam na altura dos meus.

— Quando eu perguntei à Agnes onde você estava, eu sabia que seria aqui.

— Sinto falta dele. — digo sem tirar os olhos do Tyler.

— Eu sei. — ele suspira e depois de alguns segundos calado, completa sua frase — Sinto falta de ver você montando ele.

— Vai demorar muito para eu conseguir?

— Você vai ver que pode acontecer antes do que você imagina.

Ele não faz ideia do quanto torço por isso. Ficamos assim durante muito tempo antes dele voltar para a clínica. Aparentemente, ele interrompeu seu dia de trabalho para me dar um beijo rápido. Pergunto como foi seu almoço com a senhora Hoffman, mas ele me diz que contará apenas à noite quando voltar pra casa.

Mesmo com a saída do Nick, resolvo ficar ainda no clube. Passo uma boa parte da tarde observando o Asher trabalhar e, casualmente descubro que é ele quem está cuidando do meu cavalo. Dou-lhe uma bronca por deixar a crina do Tyler tão grande. Depois das quatro vou com a Agnes a outro centro de fisioterapia. Preciso marcar minhas sessões de gineco sei lá o que. Tenho que decorar esse nome.

Após poucos minutos de espera, a recepcionista me manda entrar no consultório da médica. Graças a Deus é uma mulher, acho que ficaria bem nervosa se tivesse que fazer esse tipo de fisioterapia com um homem.

— Seja bem-vinda senhorita Muller. — a mulher me cumprimenta, simpática.

— Ellen, por favor. — sorrio. — Sem formalidades, Dra. Kim.

— Claro, por favor, entre.

Entro sem a Agnes e me estabeleço em frente à sua mesa. Conto a ela toda a minha situação sexual desde o acidente há duas semanas. Ela fala como é a terapia e como são as sessões com ela. Francamente, fico um pouco chocada com uma das técnicas que ela me fala que fará comigo. Uma mulher enfiando os dedos em mim? Uau, quem diria? Ao ver a minha cara, ela sorri um pouco e diz que é normal se eu sentir um pouco de vergonha no início e que por isso seria interessante ter o meu parceiro junto comigo nas sessões.

Nicholas? Me vendo abrir as pernas para uma mulher? Não mesmo, obrigada. Eu não o quero aqui comigo. Digo a ela que não será possível e ela aceita, depois me dá algumas orientações para praticar em casa. Acho que teremos muito trabalho daqui para frente. No fim, marcamos as sessões para dois dias na semana, à tarde, em dias diferentes da fisioterapia na clínica do Nick.

Quando chego em casa, com pouco tempo o Asher aparece. Vamos para a varanda do quarto e ficamos conversando sentados no chão com os pés dentro da piscina. Um ponto na conversa me chama atenção. Eu juro que ouvi falando sobre um membro da Federação Equestre que esteve no Sunrise.

— Espera aí Trager, você disse Henry?

— Eu disse o quê? — ele desconversa — Quando?

Estreito os olhos para ele, que me olha nervoso.

— Não se faz de bobo Ash, não combina com você.

Ele me olha desconfiado por um tempo. Eu o pressiono com um olhar sério e uma sobrancelha erguida, inquisidora.

— Não vai parar de olhar pra mim assim?

— Só quando me falar.

Asher coça a cabeça, cada vez mais nervoso. Eu até poderia ter pena dele se não estivesse tão curiosa e se ele, não estivesse claramente escondendo algo sobre mim.

— Desembucha, Trager.

— Um tal de Henry apareceu lá no Sunrise no dia seguinte ao seu acidente e quis falar com o Terry sobre você. Ele disse que estava interessado em falar sobre uma possível integração sua com a Federação Equestre por causa da sua ótima colocação no torneio. Ele disse que já te conhecia de algum tempo atrás e gostaria de voltar a trabalhar com você, mas ficou desapontado quando soube do que aconteceu. Ele apareceu ainda duas outras vezes, uma na semana que você acordou e a outra foi hoje, pouco antes do seu namorado chegar lá.

Ele metralha as palavras na minha direção, não parando nem mesmo para respirar, mas sua última sentença me põe alerta. Sinto uma certa indireta na sua frase.

— Como assim “antes do Nicholas”? O que está insinuando?

— Nada. — ele emenda rapidamente.

— Ash... — o repreendo.

—   É que o meu bocão me colocou em maus lençóis agora. Eu não deveria ter falado nada. O Terry e o Nicholas me disseram pra não contar.

O quê? Como assim não contar algo que está diretamente relacionado com o meu futuro no hipismo? O Nicholas só pode estar de brincadeira.

— Mas por quê? — pergunto perdendo a paciência.

Em um intervalo de dois dias, já descobri duas coisas que o Nick omitiu de mim. Qual é a dele?

— Ele disse que você tinha outras coisas com o que se preocupar.

E por acaso é ele quem decide com o que eu tenho ou não que me preocupar?

Mas que droga! Eu não queria ter que chutar a bunda dele agora que estamos em um momento tão agradável depois da sessão de cócegas, do jantar e dos beijos maravilhosos de ontem. Mas aqui está o Nick, agindo como o idiota que eu conheço tão intimamente.

— Desculpa não contar antes. — Asher pega minha mão e aperta — É que eles me pediram pra não contar.

— Tudo bem, Asher. — dou um sorriso conciliador, embora por dentro eu esteja bem irritada — Não é culpa sua.

— Não está com raiva?

— Não de você. Mas agora se não se importa, eu gostaria de ficar sozinha.

Ele concorda. Beija minha testa e sai logo em seguida.

É difícil acreditar que o Nicholas esteja mentindo para mim sobre algo que diz respeito ao Tyler. Isso abre brecha para uma pergunta muito importante: o quê mais o Nicholas esconde de mim?

— Como foi o almoço com a sua mãe, Nick? — pergunto entre um gole e outro de vinho.

— Péssimo.

Nick está emburrado desde que chegou da clínica. Pretendia partir para o ataque logo que ele chegasse, mas seu humor nada agradável facilitou o esquecimento temporário da minha raiva.

Fico olhando pra ele, esperando que explique porque o almoço foi tão péssimo, mas apenas depois de um bom tempo é que ele se digna a olhar pra mim e me responder.

— Minha mãe quer que a gente passe o Natal com eles em Nova Iorque?

É impressão minha ou o ouvi dizer que ela quer que a gente passe uma data tão importante em um lugar tão inapropriado?

— Nova Iorque? — pergunto só para confirmar.

— Eles querem uma trégua.

— Eles?

— Meus pais.

Talvez eu devesse ficar mais chocada se eu soubesse o que pensar, mas essa situação é totalmente nova pra mim. Muitas coisas já se passaram pela minha cabeça, mas ver o Nicholas e os pais dele se entenderem com certeza eu nunca cogitei imaginar.

— E o que você decidiu? — não sei por que sinto um certo frio na barriga com essa pergunta. Eu tenho medo da resposta?

— Eu não decidi nada. Eu tenho coisas muito mais importantes com o que me preocupar ao invés de uma reconciliação tardia com o clã Hoffman.

É meio triste ver a forma com a qual o Nicholas de refere à própria família. De certa forma eu me identifico um pouco com o provável vazio que ele sente pela ausência da família, por causa da morte prematura da minha mãe. Mas por outro lado, eu penso que apesar de todas as dificuldades que enfrentamos recentemente, eu pelo menos tenho o Benny. Ele me decepcionou em todo o lance com o Will e o Tyler, mas eu sei que ele está arrependido. Será se os pais do Nick se arrependeram dos erros que cometeram com ele?

— Então não vamos?

Ele me olha um pouco surpreso com a minha pergunta. Será se ele não quer me levar lá?

— Você quer ir?

— Não sei. Acho que sim. Você não quer ir?

— Voltar a Nova Iorque será estranho, mas se você quiser podemos ir.

— Eu não quero forçar você a nada amor, mas eu acho que talvez fosse bom pra você reatar com eles. Sabe, quebrar esse gelo entre vocês. Não sente falta deles?

Ele termina seu prato e o leva para a pia junto com o meu. Encosta-se com os dois braços esticados na beira da pia e afunda a cabeça entre os ombros.

— Eu perdi meus pais há muito tempo, Ellen. Antes mesmo de acontecer tudo que você já sabe.

Será se ele odeia tanto a mãe dele por causa do caso que ela teve com o sócio do pai quando ele tinha dezesseis anos? Devido aos acontecimentos que sucederam isso, eu posso entender se for esse o caso, mas e quanto ao pai dele? O que fez o notório Julian Hoffman para merecer o desprezo do filho?

— Eles não eram os melhores pais do mundo. — ele continua, mesmo eu achando que não faria isso — Mas mesmo assim, eu os amava e os respeitava. Independentemente de qualquer coisa, meus pais se amavam e eram felizes, e eu tinha isso como verdade absoluta. Mas...

Fico ansiosa pra ouvir o que vem depois do “mas”, mas ele não fala. Ele apenas vem até mim, com uma expressão enigmática demais para eu conseguir decifrar apenas com os olhos, me pega nos braços e me leva para o quarto. Eu sei que o assunto morreu por hoje.

O resto da semana se passa sem tocarmos mais no assunto de Nova Iorque, mas dezembro já chegou então ele terá que se decidir logo se seremos só nós aqui em Miami – igual ao Dia de Ação de Graças – ou se teremos familiares a mais na mesa, seja ela aqui ou a mil e duzentas milhas de distância.

No sábado, percebo o Nick um pouco triste depois que chega da ONG. Na rápida conversa durante o almoço, ele me conta que é por causa do garoto Damian. Parece que ele sairá da instituição para ir morar com a avó e até onde eu posso ver, meu lindo namorado gosta muito do menino.

— Pense que ele estará bem Nick, com uma senhora que o ama e o protegerá, diferente dos pais adotivos.

— Eu sei. Mas é que eu me apeguei muito a ele.

Olho por um longo tempo pra ele enquanto terminamos nosso almoço e crio em minha mente uma imagem do Nicholas como um pai amoroso passeando com seu filho em uma tarde de domingo no beira da praia. Não consigo evitar o sorriso no meu rosto com a cena. Ele seria com certeza um pai maravilhoso se a vida não tivesse sido tão cruel com ele.

— Meu avô ligou pra mim ontem, Ellen. — ele diz lavando a louça.

— E aí? Como ele está?

— Ele está bem, obrigado por perguntar. Mas ele vai à Nova Iorque para o Natal.

— Sério? — interessante.

— Ele me pediu pra gente ir também passar as festas com ele. — Uau! Se até o Oliver quer o Nicholas perto da família, talvez então seja mesmo a hora de deixar para trás o passado.

Eu sabia que o assunto não morreria assim tão fácil. Todos acham que está na hora do Nicholas voltar pra casa. Acho que alguns demônios precisam ser exorcizados. Finalmente.

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