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TRES

Onde já se viu? A minha história é com o Eduardo. Sempre foi. Não há mais nada no mundo que eu eu queira viver do que minha história com o meu Edu.

Mas, fingi que escutei o conselho da "minha nova amiga" pra que ela saísse logo dali e eu ficasse sozinha.

Não há o que fazer neste lugar, tudo é branco aqui. Minha cama, meus lençóis, meus móveis, minhas roupas.

Isso não vai me trazer paz ou equilíbrio. Tudo isso só está me sufocando.

_____

— Fiquei sabendo que não saiu do quarto até agora? - Doutor Tyler aparece, no dia seguinte.

— A ideia de andar por corredores de um hospício não me parece muito boa. Eu assisto filmes de terror, sabe?!

Estou sentada como da primeira vez que ele me viu. Ele se encosta na porta.

— Garanto que este é diferente.

— Não tenho nenhuma curiosidade. - Brinco com o fio do lençol e não olho pra ele. Só sinto o colchão afundar um pouco ao pé da cama.

— Você precisa reagir. Isso aqui não é o fim do mundo.

— Claro que não. É só um purgatório.

— Vem comigo? Quero te mostrar um lugar.

— É a sala de choques ou o armazém de camisas de força?

— Você vai ter que ir pra saber.

Considero a ideia, mas nego. Nada nesse hospício pode ser bom.

— Você tem que se dar uma chance, Júlia.

— Vocês estão tirando minha chance. Estou trancada em um quarto completamente branco, sem personalidade. Enquanto minha vida está lá fora, sendo vivida por outra pessoa.

— Sua vida está aqui agora. Tenta focar nisso.

— Você acha mesmo que eu sou louca? A Agatha não acha.

— E eu concordo. Você não é louca. Você precisa se reencontrar.

— Em um hospício?

— Você está aqui porque ofereceu perigo para você e para outras pessoas.

Abaixo a cabeça, ele se aproxima um pouco mais e segura minhas mãos. Tenho quase certeza que isso não é permitido, mas não deixo de sentir a energia que isso me passa. Olho apenas para nossas mãos entrelaçadas.

— Júlia, ainda há muita coisa pra você viver. Não desista.

— Eu não desisti. Minha família é que desistiu e o Edu também. Por mim eu estaria lá com eles agora.

— Você entende que o Eduardo seguiu em frente e que você precisa fazer o mesmo?

Solto sua mão com força e o encaro, meus olhos cheios de lágrimas.

— Você não faz ideia do que está falando. Me deixa sozinha.

Ele sai e não diz mais nada.

_____

— Ei menina, vamos dar uma volta?

Agatha tenta pela terceira vez me tirar do quarto hoje.

— Você já sabe a resposta.

— Desta vez você não pode negar, temos alguns exames para fazer e, logo mais, sua consulta com o psiquiatra.

— Quando é minha consulta com o neurologista?

— Amanhã, logo que os exames ficarem prontos.

Como Agatha falou, eu não tinha muita escolha. Eu tinha que fazer os exames, e foi isso que eu fui fazer.

O melhor, se é que existe algo de bom nisso, é que realmente consigo me desconectar de tudo e de todos. Como conselho do doutor, estou focando em mim. Melhorar é o meu objetivo para que logo eu possa encontrar o Edu e retomar de onde paramos.

Faço todos os exames prescritos e vou à consulta com o psiquiatra. Passar uma hora conversando com um senhor que acha que cada palavra que sai de sua boca é uma prova de que você está Lelé da cuca, é sem dúvida, uma hora desperdiçada.

Mas, eu não estou em posição de negar. Só me resta obedecer e cumprir cada etapa que tenho que passar. Muito em breve estarei nos braços do meu amor e isso tudo será apenas uma triste história de superação que contarei aos nossos filhos e netos.

— Júlia, como se imagina daqui a 5 anos? - O doutor pergunta.

— Casada, com o Eduardo. Escolhendo o vestido da minha formatura e o terninho do mini-Edu, meu filho.

Ele respira fundo. Tira o óculos e me encara.

— Isso não vai dar certo se o seu foco for o Eduardo.

— Não vejo porquê não.

— O Eduardo seguiu em frente. Você precisa fazer o mesmo e é minha obrigação lhe dar este choque de realidade.

— Pra alguém que fez medicina, o senhor é bem lerdo mesmo. Estamos falando de amor verdadeiro aqui.

— Estamos falando de obsessão.

Reviro os olhos.

— Acho que minha hora terminou.

— Não, ainda temos algum tempo.

— Ops, errei. Acho que a minha paciência terminou. - Me levanto.

— Devo lembra-la de que as sessões fazem parte do tratamento e só assim poderá sair daqui?

— Devo lembra-lo de que não sou obrigada? - Jogo um beijo e saio. Só então percebo que não sei como voltar.

Maldita hora que resolvi que não queria conhecer o lugar. Começo a andar por um corredor muito longo, aliás, era o único lugar pra onde eu poderia ir depois que fiz uni-duni-tê e caiu na esquerda.

Alguns passos depois, uma sala me chama atenção. A porta, apesar de branca, possui algumas formas geométricas coloridas e uma tela de vidro. Olho através dela e vejo uma sala enorme com telas em branco, mesas, blocos coloridos, tintas...

— Esta é a sala da criatividade. - Doutor Tyler aparece.

— Que nome criativo.

— Não foi a melhor invenção, mas gosto de acreditar que foi pela objetividade e não pela falta de opção.

— Talvez. Mas pode ser só porque estavam com preguiça de pensar em algo melhor.

— Você tem toda razão. Quer entrar e conhecer?

— Se tiver algum doidinho lá dentro, não.

Ele ri.

— É tarde para estarem aqui. A maioria está dormindo a esta hora.

— Eu já me perdi no tempo. Não faço ideia de que horas são.

— E isso é o de menos. - Ele abre a portão. — Vem, quero te mostrar uma coisa.

— Isso aqui faz parte do meu "tratamento"? - Ele dá de ombros.

— Ainda não sei. Algo aqui te chama atenção?

— Sim. - Abro um sorriso. E ele também. — As telas. Eu amo as artes.

— É ótimo saber disso. E o que gosta de pintar?

— Eu amo as borboletas. Elas são tão infinitas. Em suas cores, formatos e detalhes. Nenhuma é igual a outra e todas são belas em suas peculiaridades.

— Desde quando você ama as borboletas?

— Nosso caso é antigo, doutor. - Digo e pego um pincel. Começo a pintar enquanto falo. — Minha primeira borboleta foi o brinco de ouro com que furaram minhas orelhas quando nasci. Meus pais me contam que eu sempre amei, cada uma delas. Em minhas roupas, sapatos, acessórios e brinquedos. Tudo tinha que ter uma borboleta.

— E isso permanece até hoje? - Seus olhos parecem que conseguem ver através de mim. Sinto que deveria me incomodar, mas me sinto leve.

— Sim. E a gente consegue esquecer o que ama, doutor?

— Amor ou obsessão?

— É amor, doutor. - Dou um sorriso sincero e continuo pintando. - Eu me recordo da primeira vez que fui a um borboletário. Foi aos 5 anos, com meu avô. Fiquei feliz por poder ver tantas borboletas lindas. Vovô me perguntou se eu gostaria de comprar algumas pra levar e manter comigo. Expliquei a ele que meu amor por elas era tanto que eu não poderia mantê-las presas a mim. Desde então, quando saio, parece que sou um imã de borboletas. Elas vêm pousam em mim e depois vão embora. Tento guardar cada uma delas: em desenhos ou fotografias.

— Amor! - Ele disse.

— Amor! - Eu concordei.

****

Oi gente,

Será que Júlia tá vendo a diferença entre amor e obsessão?

Deixem uma estrelinha bem linda e um comentário de amor.

Amo vocês.

Beijos, S.?

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