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Capítulo 2

- Ok, mas por sua conta e risco. - informo fechando definitivamente as pálpebras.

Se ele fizer truques estranhos, poderá facilmente cuspir tudo.

Ouço o som de talheres e de algo ferroso sendo colocado no carrinho.

Tento confiar no meu olfato antes de colocar qualquer coisa na boca.

- Abre. - ele ordena em tom divertido, fazendo beicinho para mim antes de abrir levemente os lábios.

Assim que sinto o calor do prato a centímetros do meu nariz, reconheço imediatamente o cheiro de carne e... parece tomate.

Dou uma mordida, mas assim que sinto seu formato, congelo.

Oh meu Deus, é uma merda de bola.

- Mastigar. - ele diz, segurando uma risada.

- É uma falta! - Abro imediatamente os olhos mas a mão dele é mais rápida e os cobre imediatamente.

- Sim, é a porra de uma bola, mas não de um cervo, agora mastigue. -

Engulo minha saliva e começo a mastigar lentamente, franzindo a testa.

Assim que reconheço imediatamente o sabor, percebo que se trata de uma almôndega com tomate.

Sorrio e me acalmo, pois também é muito bom.

Eu até lambo meus lábios.

- Mh, almôndegas com molho. - digo alegremente, colocando minha mão em cima da dele, com a intenção de retirá-la.

- Mantenha os olhos fechados. - continue.

- Não é válido, adivinhei! - Reclamo cada vez mais impaciente para devorar um prato inteiro.

- Você tem que adivinhar o outro também e depois pode comer. -

Idiota.

Coloco os braços atrás das coxas e me preparo para o segundo prato.

Ele tira a mão do meu rosto e fico nervosa ao perceber que ele está demorando demais.

- Aproxima-te. -

Não entendo por que, mas, bufando, me vejo avançando ligeiramente com os ombros para frente.

- Agora abra. - ele ordena, e dessa vez seu tom não parece divertido.

Um sussurro saiu, baixo e muito rouco.

Hesitando mais do que o normal, abro os lábios novamente.

Quatro, cinco segundos depois e ainda nada.

Quando estava prestes a fechá-los, sinto algo pousar sobre eles.

Suavemente.

Instintivamente me encontro abrindo novamente, mas mal sabia que o que eu estava tentando provar eram seus lábios.

Eu apenas os lambi.

Eu suspiro, abrindo os olhos abruptamente e encontrando os dele, semicerrados e escuros demais.

Ele agarra minhas bochechas entre o polegar e o indicador e aplica uma leve pressão, fazendo-me abrir mais a boca.

Quando sinto sua língua tocar a minha, vejo suas pupilas dilatarem, como as de um viciado em drogas.

Então sinto algo doce e frio invadir meu paladar.

Tiro uma foto assim que entendo o que é.

Profiteroles.

Ele acabou de me entregar uma das minhas sobremesas favoritas direto da sua maldita boca.

Engulo a deliciosa mordida e o vejo lamber os lábios, levemente manchados de chocolate.

E ele ainda continua a olhar para mim com aqueles alunos fascinantes.

- Isso parece normal para você? - pergunto a ele, tenho certeza que minhas bochechas estão queimando.

- Os pelicanos fazem isso com frequência. - ele responde dando de ombros e, como se nada tivesse acontecido, começa a distribuir as almôndegas em dois pratos.

Os pelicanos fazem isso com frequência...

-Eu pareço um pelicano para você? - franzo a testa, começando a me preocupar com a sanidade dele.

E para mim, pelo que ele acabou de fazer... até gostei.

Ele me entrega um prato e examina meu rosto. - Neste momento você parece um cardeal vermelho. -

Ok, você está se enganando.

- Um que? -

Ele olha para mim como se eu fosse a coisa mais óbvia do mundo – é um pássaro de pigmentação vermelha que vive na América do Norte. -

Ah claro.

Agora tudo está claro.

Balanço a cabeça, coloco o prato ao meu lado e coloco a mão na testa dele - Tem certeza que está se sentindo bem? - pergunto procurando algum sinal que me dê uma confirmação.

Ele também coloca a mão na minha bochecha e se aproxima, fazendo nossos narizes se tocarem – eu sim, e você? -

Não, de jeito nenhum, droga.

Eu aceno e vou embora.

- Excelente então, você gostou? - aponta para o prato perto das minhas pernas.

Concordo com a cabeça novamente e dedico toda a minha atenção durante os próximos dez minutos apenas às almôndegas.

- Por que você escolheu o Profiterol como sobremesa? - pergunto, depois de ambos termos comido uma panela inteira de almôndegas, com pão e umas quatro bolinhas de chocolate cada.

- Porque era a única sobremesa francesa que tinham no cardápio. – responde abrindo uma garrafa de vinho tinto.

Oh.

Foi... legal, certo?

- Por que você não gostou? - Ele me olha furtivamente enquanto enche os dois copos.

Como se eu quisesse uma confirmação e só então sorrisse, porque obviamente queria algo que gostasse.

Eu uso uma mecha de cabelo atrás da orelha. Na verdade, é o meu favorito, obrigado de qualquer maneira. - Sorrio para ele pegando um.

Ele simplesmente balança a cabeça, levanta-se e abre a janela francesa.

Ele encosta as costas na parede e tira um maço de cigarros dos bolsos de trás do macacão, tirando um diretamente com os dentes, que acende imediatamente.

Juro que vi toda a cena em câmera lenta.

A maneira como ele agarra o filtro com os lábios, devagar e sobretudo sem sair dos meus olhos nem por um segundo.

- Eu não sabia que você fumava. - Digo a primeira coisa que me vem à cabeça, depois de tossir.

- Agora você sabe. - joga a cabeça para trás, expelindo uma nuvem de fumaça.

Seu olhar está começando a me deixar desconfortável.

Ele permanece ali, encostado naquela parede a poucos metros de mim, com uma mão no bolso e a outra ao lado com a qual segura o cigarro entre o polegar e o indicador.

E ele olha para mim.

Olho para minhas pernas penduradas, dada a altura da cama, e começo a movê-las nervosamente.

Por que diabos ele está olhando para mim sem dizer nada?

Talvez fosse melhor dizer por que ele me beijou?

De novo.

E por que eu gostei disso, de novo?

Não posso negar que senti e ainda sinto uma espécie de atração por ele.

E isso está errado?

Talvez sim ou talvez não.

Não posso dar peso suficiente a esta coisa.

É verdade, nunca tive nenhum tipo de experiência, deixando de lado algumas aventuras no ensino médio, que nunca foram além de alguns beijos ou pequenos toques.

E nem tenho vergonha disso, dada a minha idade.

Então não, talvez eu nunca tenha dado peso a essas coisas porque sempre tive outras prioridades.

Então tive uma vontade muito grande de construir algo meu, de poder dizer “Consegui mãe, realizei meu sonho e cumpri minha promessa”.

E caramba, ele estava tão perto.

Talvez ainda esteja, porque nunca desanimei e sei com certeza que esta é mais uma prova que terei que enfrentar.

Mais um muro para derrubar, como diz Yuri.

Mas com uma diferença.

Que pela primeira vez não estou... sozinho.

Olho novamente para sua figura, que agora saiu para a varanda.

Além da grande vontade que tenho de dar um tapa nele na maioria das vezes, além da estranha mas intensa atração e curiosidade que tenho de poder ver algo em suas íris negras, também sinto desagrado.

Sinto muito porque gostaria de poder perguntar qualquer coisa.

Sobre sua família, suas origens, se tinha muitos amigos, namoradas ou algum hobby.

Tenha confiança para conversar e confiar a ele a minha também.

Uma conversa simples.

Mas nada parece chegar perto da simplicidade.

É complicado, como ele, como eu e como toda essa porra de situação.

Tomo outro gole e percebo que engoli tudo de uma só vez.

Eu definitivamente gostei.

Levanto-me, ando descalço na ponta dos pés e pego o controle remoto da TV.

Depois de ligá-lo e encher novamente o copo, coloquei no mesmo canal de rock que descobri há alguns dias.

Volto para a cama, bato-os no colchão ao som de Seven Nation Army e começo a sentir uma onda de adrenalina percorrer minha espinha.

Aumento o volume e tomo outro gole deste maravilhoso vinho.

De repente, sinto como se estivesse vivendo um maldito filme.

Eu fugindo de um maluco junto com Rui, meu empresário sob chantagem.

Nós, aqueles que nos encontramos numa espécie de hotel, cheio de malucos e lidando com uma mulher misteriosa, Eva, de quem não sei nada além do nome.

E falo apenas à noite porque não consigo esquecer.

e a noite falo comigo mesmo porque não consigo esquecer.

Para frente e para trás em minha mente atrás de um cigarro.

As idas e vindas em minha mente atrás de um cigarro.

Balanço a cabeça e olho pelo canto do olho para o cara que acabou de fumar um.

E a mensagem que sai dos meus olhos diz: deixe-o em paz.

E a mensagem que vem dos meus olhos que diz nos deixe em paz.

O refrão começa.

A guitarra elétrica, o baixo e a bateria estrondosos na sala também me deixam louco.

Balanço a cabeça para cima e para baixo, fingindo ser um membro da banda, e rio.

Deus, eu rio muito.

Algumas gotas do meu copo caem nos lençóis brancos, mas esses paus enormes.

Pela primeira vez, decido não me entregar muito.

Nem mesmo suprimo algumas notas falsas ou sons estranhos que saem da minha boca enquanto levanto o copo até o teto.

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