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Capítulo 3

Melinda

Após me formar na academia, viajei pelo mundo em busca de conhecimentos, ervas e novos chás. Tudo parecia bem, exceto por meus pensamentos que me traiam quando tentava me apaixonar, ao ver Mark em todos os homens que me relacionava. Quando parti não tinha intenção de voltar, até uma tragédia assolar minha família e precisar voltar para cuidar da minha afilhada, irmão, e claro, a casa de chá.

Faz anos que tento ao máximo me afastar de Mark, ambos saímos machucados da nossa história, a qual, somente eu o amei mais que a mim mesma. Neste tempo foram apenas formalidades e nada mais que alguns minutos diante da sua presença, pois tento ao máximo ser fria e distante. Sabia que se ouvisse meu coração, os sentimentos poderiam voltar mais fortes do que nunca, então foquei em outras coisas e na deusa.

Desisti de relacionamentos sérios porque nenhum homem me satisfaz mais, mas parece que o destino gosta de pregar peças.

"Pela deusa Tríplice, seria um bom dia e isso me deixa profundamente irritada!"

Para acabar com minha paz, minha sobrinha, Angèle, estava tendo um romance com um rapaz do Coven inimigo, e a aceitação do seu destino estava em risco.

A lua azul se aproximava, com ela seu aniversário de dezoito anos e ela teria sua iniciação como bruxa na “colheita stregha ”.

Desço a escada furiosa com a posição que ela me deixava.

— Rodolpho, resplandecente dia — chamo e logo ele aparece na cozinha.

— Resplandecente dia, irmã!

— Estive pensando, irmão, Angèle precisa de uma luz para responder seus questionamentos.

— Vamos aproveitar que a casa de chá está parada hoje e Zoey, está praticando as artes ocultas da deusa, podemos pensar em como ajudar Angèle.

Zoey era filha do meu irmão com uma antiga namorada da academia, após ela dar à luz abandonou a menina na nossa porta e sempre a tratei como filha, igual Angèle, mas diferente da prima ela era quieta, calada e nada social vivendo em seu mundo próprio.

Havia um nome que não ousava pronunciar e Rodolpho sabia tanto quanto eu que era a pessoa mais indicada.

— Irmã, ela invocou um familiar. Escolheu um nome da colheita glorioso, mas não entendo suas dúvidas quanto a colheita.

Reviro os olhos com aquela afirmação, mas admito.

— Minha irmã teria orgulho da bruxa que ela está se tornando, chegar a maioridade na colheita é uma honra, aos dezoito anos ela será uma mulher completa do nosso Coven!

— Sim, ambos teriam uma epifania com tamanho orgulho!

— Então o que faremos quanto as dúvidas que saíram daquela cabecinha?

— Não sei, irmão!

— Não sabe mesmo?

Um arrepio percorre meu corpo.

— Não sei, vou pensar em alguém!

— Irmã, o sumo sacerdote é o mais indicado e mesmo com o passado de vocês, não acha que deveriam ter superado?

— Eu superei irmão, mas não sofro de amnésia! — Olho de forma gélida para Rodolpho.

— Pela sua sobrinha, irmã! Para recuperar o prestígio do nome da nossa família está disposta a pisotear no seu orgulho?

Ele sabia como me convencer e eu sabia que a recusa de Angèle ou algo que ela faça sem pensar direito na cerimônia da “colheita stregha” faria com que o sobrenome de la Barthe fosse questionado. Respiro fundo, vou até a escadaria, pego o telefone em meus dedos, giro as teclas e fecho meus olhos esperando que ele atenda.

— Sumo sacerdote Clarke falando.

Uma voz rouca atende o telefone e me sinto fraquejar por alguns segundos.

— Mark — respondo pensando rapidamente sobre o que falar.

— Doce Melinda, a que devo a honra da sua ligação está hora da manhã?

Este homem não muda nunca, nem com a esposa grávida ele toma jeito.

— Não me chame assim! — Reviro os olhos com sua ousadia.

— Ainda com ódio de mim, Melinda?

Ele não tem ideia de quanto o odeio.

— Não, tenho apenas uma repulsa enorme, mas não liguei para falar sobre você e muito menos sobre mim — chamo sua atenção.

— Você já foi mais doce, Mel!

— Nunca mais me chame assim! — Estava começando a perder o que me restava de paciência. — Ligar foi um erro, passar bem sacerdote...

— Espere, irmã Melinda, peço desculpa pelas brincadeiras bobas, mas me diga, o que deseja da minha pessoa?

Respiro fundo tentando controlar minhas emoções.

— Assuntos referente ao Coven! Minha sobrinha, está andando com o Coven inimigo e tendo pensamentos demais, gostaria de pedir a sua orientação espiritual para ela — digo calmamente.

— Dúvidas? Que tipo de dúvidas?

Reviro os olhos, pois pedir ajuda para aquele homem em especial mexia demais com meu lado racional.

— É mais se desprender da sua vida atual, tendo que largar o namorado! — exclamo sem ânimo algum. — Ela veio com perguntas que não sabemos responder, ou melhor, não temos seu conhecimento e precisamos tentar salvar o que resta da credibilidade da nossa família...

Minha irmã desgraçou o nome da minha família ao fazer um acordo com o clã inimigo e agora tenho que salvá-la a todo custo.

— Para isso quer minha ajuda?

Ele estava jogando comigo.

— Mas se não puder falarei com o conselho dos bruxos e...

— Irei à sua casa na hora da bruxa para conversar com sua sobrinha e é essencial a presença de todos os membros!

Senti meu corpo estremecer e meu coração errar a batida.

— Sua conversa é com Angèle!

— Sim, irmã Melinda, mas nem começamos a negociar os termos da minha visita...

Sinto um arrepio na espinha.

— Mark! — exclamo e ele apenas ignora.

— Não paro, temos assuntos inacabados e após minha ida, você irá à minha casa como nos velhos tempos!

Aquela frase invadiu minha mente e me deixou eufórica.

— Eu... Eu... Eu... — Começo a gaguejar, levei anos para superar nosso rompimento ao descobrir as mentiras.

— Não aceito não como resposta!

Ele era um demônio, sabia me provocar e como ter o que desejava.

— Muito menos, uma desculpa que nós dois sabemos ser mentira... Pelos velhos tempos Melinda!

— Pela Angèle! — exclamo sentindo meu sangue ferver. — Até mais tarde. — Não espero sua resposta e desligo o telefone.

Com o coração acelerado subo a escada, entro no quarto e fico encarando as paredes cor carmim. Tranco a porta e vou até a cama onde deito e fecho os olhos.

Como esquecer as noites naquela casa, ou melhor, como esquecer agora que ele me lembrou do que vivemos?

Tive uma vaga lembrança de como nos conhecemos, nos odiamos e como o amei ardentemente, mas minha irmã estava certa. Ele só queria saber de ser sumo sacerdote e nunca trocaria o poder por sentimentalismo barato.

Ainda me lembro como se fosse hoje, o conheci uma semana antes de chegar a Cividale del Friuli , havia ligado para a minha irmã para combinar a hora que ela iria me buscar, porém ela sempre foi uma cabeça de vento e se esqueceu.

Seria somente mais uma noite normal, se uma voz rouca não tivesse atendido a ligação e me causado arrepios. Aquela voz máscula havia chamado minha atenção. Nunca fui santa, mas tão pouco sou uma daquelas vadias que ficam se insinuando. Meu foco era apenas os estudos até o conhecer pessoalmente.

Por que ele tinha que ter atendido aquela maldita ligação?

Vinte e um anos atrás...

Não é fácil se despedir de alguém querido, nem que seja para um até logo, ficaria apenas mais uma semana e após sair do grupo de estudo da magia obscura e oculta, onde fiz inúmeras amizades, precisei avisar da minha partida repentina. Precisava focar na minha colheita e na minha aceitação ao escrever meu nome no livro, além do meu aniversário de dezoito anos.

Voltei para o hotel e subi para meu quarto com o coração apertado. Me joguei na cama, pegando o telefone para avisar a cabeça de vento da Thalia que Rod estaria a caminho de casa e que eu chegaria na próxima semana. Havia um único telefone na academia que era compartilhado por todos e após alguns toques uma voz feminina atendeu.

— Resplandecente noite!

— Resplandecente noite! Gostaria de falar com a Thalia!

— Aguarda um pouco que irei procurá-la!

Esperei um tempo e pela deusa Tríplice se esperasse mais um minuto iria estrangular minha irmã dolorosamente.

Ouço uma respiração pesada no outro lado da linha.

— Thalia?

— Não!

Senti arrepios pela espinha ao ouvir aquela voz rouca e grave.

— Onde ela está? Não liguei para falar com qualquer um! — Fui um pouco grossa e ele me interrompeu de forma brusca.

— Olha aqui menina, primeiro não sou qualquer um e segundo aqui é uma escola séria!

Ele era arrogante e petulante, o que me faz revirar os olhos e praguejar.

— Então, sugiro que não fique incomodando com assuntos sem interesse algum!

— Idiota!

— Não sou, docinho!

Ele sabia ser um babaca e mal-educado.

— Mas ela está no banho, quer deixar algum recado?

— Quero sim, idiota, avisa a ela que sua irmã ligou, que Rod chega amanhã e eu chego no domingo ao meio-dia à Cividale del Friuli! — Houve um silêncio enorme e resolvi provocá-lo. — Perdeu a fala ou a pretensão?

— Você é a irmã da Thalia?

Ainda tem a ousadia de duvidar da minha palavra.

— Sou e não deixe de dar o recado ou farei da sua vida um inferno particular! — Antes que ele pudesse responder desliguei o telefone.

Se soubesse que aquela ligação faria tanto estrago na minha vida nunca a teria feito.

Uma semana havia se passado e estava a caminho de casa.

Podia sentir o cheiro das florestas, o pavor e o medo, além da sensação forte da magia presente naquele lugar.

Lar doce lar!

O trem que andava rápido começa a diminuir sua velocidade, dando indícios que vamos aos poucos nos aproximando da estação e um assovio do trem dava a entender que logo estaria em terra firme.

Mais cinco minutos e ele parava.

Me levanto do assento com um belo sorriso no rosto e após uma longa viagem saio do trem. Um rapaz muito bem afeiçoado me ajuda a descer e sinto como se estivesse sendo observada. Procuro em meio à multidão minha irmã, até ouvir sua doce voz me chamar. Era impossível não me reconhecer com o cabelo de fogo que possuía.

— MELINDA! — encaro a voz que me chamava em meio a acenos e grito:

— THALIA... — Largo as malas e corro em sua direção me jogando em seus braços.

— Maninha, como foi a viagem? — ela me indagava em meio ao rodopio do meu corpo no ar.

— Foi maravilhoso, aprendi muitas histórias e magias novas... — Paro a fala ao notar a presença de um homem sombrio, ele era perversamente lindo e aqueles olhos que pareciam duas esferas do oceano me devoravam intensamente como se me despissem. Sinto minhas pernas bambearem com a força da sua expressão e sorrio sem querer para aquela criatura belíssima da noite quando Thalia me coloca no chão.

— Mel, este é, Mark, meu grande amigo na academia e...

Este era o homem que havia me ofendido no telefone?

Fecho o semblante e o encaro com raiva.

Fiquei furiosa com ele, não aceito suas falsas desculpas e giro os calcanhares enquanto aquele homem que era uma tentação pegou minhas malas e as levou para o carro. Entramos no carro e seguimos a caminho de casa, mas não sem antes trocarmos algumas farpas. Mal cheguei em casa e nossa troca de olhar era intensa, pela deusa Tríplice, prometi odiá-lo, mas como sentia algumas coisas que ainda por mim eram desconhecidas me limito a ignorá-lo. Estava dando certo até aquele infeliz contar para meus pais sobre meus modos.

Ele partiu e tive que ouvir como ele era um homem com posses, brilhante futuro, ambicioso e acima de tudo criado no meio do nosso Stregheria.

— Minha filha, não foi essa educação que lhe demos!

— Então, ele pode ser grosso e me ofender, mas porque é homem merecer meu respeito?

— Maninha, ele pediu desculpa e olha que não é do feitio dele.

Nisso ela estava certo, aquele homem não era do tipo que pede desculpa, mas aquele que muitos pais diriam ser péssima influência para seus filhos.

— Irá pedir desculpa para ele! — Papai conclui e o olho incrédula.

— Não irei! — Cruzo os braços e bato o pé em sinal de raiva.

— Não só irá, como vai convidá-lo para o seu aniversário.

— Nem que o deus me leve para o inferno!

— Ótimo, não terá uma festa, somente seu irmão!

Não era justo pagar pelos erros dele, sociedade patriarcal era horrível.

— Não é justo! — Sinto as lágrimas rolarem em meu rosto.

— Maninha, por favor, vai lá, será rápido e logo voltará para casa.

— Isso é tudo culpa sua! — exclamo com raiva. — Se tivesse atendido ao telefone nada disso teria acontecido!

— Filha, faça o que seu pai mandou! Não quero que a minha filha do meio não tenha a devida iniciação no nosso Stregheria como bruxa, por favor, filha!

Não poderia negar ao pedido dela.

— Ele mora há quinze minutos daqui, passando a floresta e logo achará a placa da casa.

Bufando, larguei minhas malas no meu quarto, desci a escada e saí pela porta sem falar nada com a minha família. Eles preferem um estranho a sua filha.

Caminhei durante quinze minutos floresta adentro até chegar à casa dele.

Foi lá que tudo começou a desandar...

Primeiro, ele me atendeu somente usando uma toalha de banho enrolada na cintura. Notei que ele era forte e bem definido, e quase gemi com aquela visão. Ele trocou de roupa e trocamos mais e mais farpas até ele se irritar comigo com o que disse, entender aquilo como um desafio e o aceitar.

— Nunca irei ser domada!

— Um desafio, Melinda?

— Uma promessa!

Foi tudo muito rápido, ele aproxima seus lábios e sussurra:

— Aposta aceita!

Abri a boca para dar uma boa resposta, mas ele foi mais rápido colando seus lábios nos meus. Não queria desejar o beijo por mais que meu subconsciente chamasse minha atenção. Vi tantos beijos nos livros, sempre os desejei e agora tinha um homem me proporcionando isto, mas ele não era o homem que sonhei.

Cerrei os dentes enquanto ele explorava minha boca com a língua, apertando com os dedos minha cintura. Nunca havia sentido isso antes, era meu primeiro beijo de fato e ele estava sendo tudo aquilo que descreviam nos livros, mas não podia ser com ele, preciso parar o beijo e voltar a odiá-lo sem desejá-lo. Resolvo me afastar e começo a bater nele para que ele me soltasse, mas parecia que todas minhas tentativas eram falhas. Solto um gemido baixo e ele invade minha boca com sua língua procurando a minha. Subo os dedos dedilhando seu peitoral, havia perdido aquela batalha e me entregado ao prazer.

Sua língua enrola na minha e nosso beijo começa ganhar vida. Sinto que meu corpo não me pertencia mais, seus dedos começavam a passear pelo meu ombro, descendo pelo braço até segurar novamente meus pulsos e os erguer acima da cintura. Nosso beijo, sinônimo do pecado de deus Cornífero, precisava se parado agora.

Mas porque parecia tão cruel findar as sensações que sentia?

O ar aos poucos foi se fazendo necessário e nos afastamos. Minha respiração estava descompassada, nossos olhos se encontraram e então caí em mim.

Não podia sentir aquilo, não por ele!

O empurro com todas minhas forças e saio correndo ouvindo Mark me chamar a plenos pulmões até sumir floresta adentro.

Dias atuais...

Não me arrependo da fuga!

Não me arrependi de me entregar ao seu beijo!

Me arrependi do que veio a seguir...

Estou deitada na minha cama, tentando acalmar meu coração para a visita do sacerdote, Mark, à minha casa.

Maldita seja, Angèle, por me fazer encarar meu passado que tanto fiz para esquecer.

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