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Férias na Praia

Eu ria descontroladamente enquanto corríamos como tolos pela areia da praia. A minha garganta doía e pequenas lágrimas saíam de meus olhos, devido a tantas risadas.

Tom vinha atrás de mim, arremessando bolas de areia contra meus cabelos por seguidas vezes, fazendo-me lembrar de quando éramos crianças. Ele gritava gírias de futebol e me chamava de “torcedor adversário”, enquanto seus arremessos ficavam cada vez mais fortes e eu via-me obrigada a correr, consequentemente, cada vez mais rápido.

“Que merda, Tom! A areia está quente! Está queimando minha nuca, seu filho da puta!” protestei com uma voz odiosa, enquanto balançava os meus cabelos com as mãos, a fim de tirar um bocado de areia dentre eles.

Ouvi-o ainda rindo, divertido. Suas risadas até pareciam ter aumentado com minhas reclamações. Empinei o nariz e catei a minha toalha, lotada de pequenos grãos amarelados de areia espanhola.

Ele sorriu, e começou a andar ao meu lado, também pegando sua toalha e enrolando-a no alto da cabeça. Não pude deixar de sorrir ao perceber a quantidade de areia que caíra agora por cima de sua cabeça.

Já ele, não se importou muito com minha vitória.

“Tudo bem que você não se importa em ficar com essa sua cabeleira suja mais suja ainda, mas eu me importo em sujar o meu cabelo.” Joguei a toalha por meus ombros, enquanto inutilmente tentava fugir daquele sol escaldante.

“Você é muito fresca, Willa.” Ele zombou-me, revirando os olhos e chacoalhando a toalha sobre seus cabelos porcos. Mais um amontoado de areia caiu de sua cabeça, destinando-se para o chão, enquanto ele tirou a toalha da dianteira e abriu um sorriso leve, passando a andar mais devagar que eu.

Não acompanhei seu ritmo, pois vi sua silhueta no chão, há apenas alguns passos de mim, e no momento eu encontrava-me com muita pressa.

Neste instante, certamente algum paparazzo estaria fotografando-nos. Flashs e mais flashs. Ele deveria estar bem feliz ao notar em pouco tempo a sua câmera cheia, pois claro, os irmãos Krahm renderiam uma boa quantia para qual fosse a sua adorada revista.

Ao pensar nisso, senti os meus lábios formularem um breve sorriso e uma onda de egoísmo invadir o meu peito. Hoje, só por hoje, em minhas férias, esses malditos não iriam levar mais uma dezena de fotos pra casa e eu não seria fonte de dinheiro e entretenimento de ninguém.

“Tom, nós podemos entrar?” perguntei triunfante; pude até sentir minha sobrancelha esquerda formar um arco proeminente sobre minha testa, deixando as rugas um pouco mais salientes.

“Mas já?” ele respondeu-me, com uma sonoridade mimosa.

“Já.” Rebati enquanto ajeitava meus óculos de sol, nem um pouco convencido por seu tom.

“Vamos ficar mais um pouco... Eu ainda nem entrei no mar.” Ele continuava com seu tom choroso, a fim de me convencer.

Notei que sua silhueta, antes tão pregada atrás da minha, estava parada, e que seus braços estariam, certamente, como na sombra, esticados para a horizontal.

Olhei para trás e pude confirmar minhas especulações. Ele comprimiu os olhos, ainda fazendo miminhos.

“Se você quiser ficar, pode ficar, ora...” voltei a olhar para frente e a andar. Agora um pouco mais feliz, ao perceber que sua silhueta voltara a seguir a minha.

“Sem a minha irmãzinha? Não, não. Se eu deixar você sozinha você morre. Não consegue ficar sem mim por perto por mais de cinco minutos e eu sei bem disso.” Dizia ele, com um sorriso fanfarrão pregado nos lábios.

“A-ha-ha. “pigarreei um tanto irônica. No contexto daquilo, ele é que parece não conseguir ficar longe de mim, já que não iria continuar na praia só porque eu não quero mais ficar. “Então venha comigo irmãozinho, não posso ficar sem você! “completei de maneira sarcástica, enquanto aumentava meus passos.

“Estou indo!”

Vi-o a continuar seguindo-me pela sombra e, sem que ele percebesse, esbocei um sorriso largo e relaxei a atenção. Mas, passados mais alguns passos, senti uma bela bola de areia quente acertar-me a cabeça e descer candente por minhas mechas, fazendo-me perder a paciência com ele, agora de vez.

“Thomas Krahm! - gritei, ringindo os dentes enquanto, devidamente, prolongava o som de “hm”.

Ele gargalhou e passou a andar em minha frente e, em questões de milésimos, correr em minha frente.

Em suas mãos ainda havia os resíduos de areia caindo pelos seus dedos: a prova do crime. Seus pés agora pisavam forte, deixando pegadas engraçadas na areia quente.

Como uma boba, passei a pisar em cima de suas pegadas, encaixando os meus dedos exatamente aonde os deles haviam se encaixado. Admirei-me com a perfeição de nossos pés. Apesar de não sermos de sangue, eles tinham a mesma forma. Exceto pelo fato de que os meus eram muito mais pequenos.

Se ele soubesse que eu estava pisando justamente onde ele havia pisado, certamente chamar-me-ia de imbecil.

Continuei a segui-lo, até alcançá-lo na porta da casa de madeira onde eu, ele, David, alguns seguranças e o resto da banda estávamos hospedados.

Agradeci por estar livre do sol quente, que há mais de uma hora batia em minha cabeça. Entrei com Tom no pequeno hotel de poucos andares e ele foi até o balcão, a fim de pegar a chave do nosso quarto.

Enquanto Tom pegava nossas chaves, David passou por nós, com o seu sorrisinho malicioso de sempre. Vestia uma regata cinza, com uma bermuda branca, boné e óculos de sol. Também segurava um jornal, e uma revista de fofoca. Ambos preciosamente postos em suas mãos, pois David estava sempre ligado em tudo, e essa era também, a razão de seu sorriso sempre tão sacana.

Ao passar por mim, piscou um dos olhos e ergueu a sobrancelha, para depois continuar caminhando. A razão disso era, descaradamente, o fato de estarmos em um mesmo quarto, enquanto todo o resto, banda, produtores e funcionários, estavam em quartos separados.

Sua piscada era uma forma discreta de dizer-nos: “Vocês estão fazendo certo.”

David havia combinado conosco um golpe de marketing. Um golpe grotesco, mas que poderia nos trazer mais fãs, um pouco de polêmica, um pouco de especulação e, consequentemente, mais atenção da mídia.

O combinado era simplesmente tocarmo-nos. Ficarmos próximos, falarmos coisas de duplo sentido em boa parte do tempo; sermos excessivamente carinhosos e fazer o possível para levar as outras pessoas a acharem que nós dois poderíamos ter algo além de um simples amor fraternal, o que muitas vezes era ridículo, pois bastava entrarmos para o fundo dos palcos e tudo terminava.

O Tom frio, chateado, mal-humorado e grotesco estava de volta. E nós então éramos os mesmos irmãos aparvalhados.

Não posso negar que muitas vezes isso me chateou, e que muitas vezes fiquei confusa, e quis parar com aquilo, mas o que mais me confundia era o fato de Tom ter aceitado o “trato” sem o meu consentimento.

Lembro-me que, quando ele veio me avisar, já estava tudo combinado. David estava eufórico, Jota e Gustavo acharam o máximo e Tom também tirava sarro, igualmente eufórico pela possibilidade de adquirir mais fãs com algo que para ele parecia tão estúpido e fácil de realizar. E a minha opinião? Não se deram o trabalho de questionar. Afinal, eram quatro opiniões iguais contra apenas uma divergente. Que se fodesse o que Willa Krahm estava achando daquilo tudo.

Após retirar nossas chaves, Tom tocou minhas costas, abrindo um sorriso fraterno, que movia apenas seus lábios, deixando os dentes ocultos. Subimos as escadas e ele abriu a porta, com um pouco de demora, para minha infelicidade.

Assim que ele acabou de girar a chave, pressionei a maçaneta imediatamente, dando os primeiros passos largos em direção ao chão de madeira. Meu pensamento imaginava com sede cada gotinha de água do chuveiro caindo sobre minha cabeça e limpando qualquer vestígio de areia que pudesse estar colado ao meu couro cabeludo.

Mas, não foi o que aconteceu. Tom bateu a porta, trancando-a em seguida, e, posteriormente, me encarou com um olhar estranho, que, de início, me deixara até sem graça. Mas como sempre não era nada daquilo pensei ser. O fato é que Tom apenas era... Sexy por natureza. Fechar uma porta e olhar dentro de seus olhos, mesmo sem malícia alguma, pode ser algo extremamente normal. Mas com Tom, aquilo pareceu quente.

Ele soltou sua toalha no chão, deixando a areia cair sobre o piso. Pensei em reclamar por ele estar sujando o quarto e pela porqueira que estava fazendo, mas não deu tempo. Ele logo se curvara, pegando o violão, para em seguida abrir o zíper do guarda-viola e jogá-lo no chão, por cima da areia, deixando consigo apenas o instrumento.

Ele afinou uma das cravelhas e jogou a mão sobre as cordas uma vez, testando o aparelho. Depois se sentou na cama, em postura musical.

Abaixei-me para pegar uma toalha limpa no criado-mudo e finalmente correr para o meu tão esperado banho, mas pude ouvir o barulho de seu corpo levantar-se da cama e, posteriormente, a sua presença em minhas costas e sua sombra a cobrir minha cabeça. Abri a segunda gaveta, ainda procurando uma toalha que me pudesse ser útil, mas, quando ia pegá-la, senti-o segurar em um de meus braços com força e depois puxar-me pra cima até que eu me visse obrigada a ficar de pé.

Olhei-o por um instante e depois observei a pele de meu braço voltando ao normal pouco a pouco após a retirada de seus dedos pouco cavalheiros. Ela estava passando rosada, após o vermelho, até que, pouco a pouco, ficava novamente amarelada, em sua cor normal.

Ele voltou até a cama, e sentou-se lá novamente, ainda me olhando. Ao perceber que eu também o olhava, bateu uma das mãos sobre a cama por duas vezes, chamando-me para sentar-se com ele.

“Vem cá?” Ele exigiu-me, em um tom autoritário, apesar de ter soado como uma interrogação.

Sentei-me ao seu lado, procurando manter um sorriso apaziguante para a nossa situação.

Ele retirou da boca do violão um papel milimetricamente dobrado, com uma caneta encaixada no mesmo, que deixava o acesso impossibilitado.

“Promete que não vai rir?” ele baixou a testa, erguendo as sobrancelhas e esperando minha ascensão.

Por breves segundos, arregalei os olhos, surpresa. Tom não costumava compor. Era sempre muito tímido e extremamente crítico. Qualquer falha na letra, qualquer palavra que não rimasse e qualquer verso sem sentido era um bom motivo para que ele jogasse o papel fora e ficasse nervoso por “não conseguir fazer nada de útil”.

Isso se repetiu tantas vezes, que até, pelo menos, ontem, Tom nem sequer tocava mais em uma caneta ou papel.

“Ué, prometo.” Relaxei os meus olhos, a fim de passar-lhe confiança. Eu estava ficando bastante curioso.

Senti-o contar até três mentalmente. Podia sentir isto porque seus lábios tremiam devagar, quase sem expor movimentos, mas expondo. Isso significava uma conta mental e alguns calafrios para mim que, a cada vez que sentia um pensamento dele, sentia calafrios pelas costas.

Passada a sua contagem, ele iniciara os acordes. Uma música intensa e muito bonita, que mesmo apenas ao som do violão, invadia os ouvidos e podia fazer-te flutuar caso fechasse os olhos, o que, até mesmo por isso, eu me segurava para não fazer.

Pensei que ele me daria o papel, para que eu cantasse e ele tocasse; como somos acostumados a fazer. Mas novamente fui surpreendida. Ele livrou-se do papel, deixando-o cair, e ele mesmo passou a cantar.

Era tímido de início. Balbuciava as palavras, com medo de errar, de ficar imperfeito. Soltava-se bem aos poucos, a cada conjunto de letras, e a cada vez que se sentia mais seguro para aumentar o tom de voz.

A letra da música, apesar de ir totalmente contra os nossos objetivos futuros, já que era uma canção de amor, era extremamente bela, e parecia ter se encaixado tão perfeitamente ao som de suas vocálicas que eu já podia sentir até uma pontinha de inveja.

“Não acha que cantar é o meu trabalho?” olhei-o, com um sorriso no canto dos lábios e as pupilas um tanto marejadas.

Ele me olhou de volta, expondo um breve sorriso um tanto sem graça e um olhar atônito que me dizia “cale a boca” mudo. Mas ele não se intimidou com o meu protesto. Mais relaxado e mais à vontade, se doava mais, em voz e mãos.

Eu deveria ter registrado este momento. Decidi que por agora, não falaria mais nada nem o perturbaria. Deixaria que ele se expressasse e ficaria apenas o observando.

Na crítica, eu não achava a sua voz feia. Era um tom enrouquecido, grave. Realmente, bastante bonito. Poderia até bater o meu tom, muitas vezes criticado pelos fãs, catalogado como enjoativo. Senti uma sensação em meu estômago, que é similar a ter uma pequena mão rodeando-o e apertando-o. Talvez angústia, medo, insegurança.

Tom então passou a fechar os olhos. A sonoridade ainda invadia meus ouvidos, como hipnose, mas meus olhos permaneciam fixos a ele, secando-o em cada milímetro.

Notei algo diferente em seus lábios. Pareciam bem mais bonitos que antes, mais desenhados, mais cheios. Os traços estavam mais marcados, o maxilar era mais másculo.

Subindo os olhos, era possível notar as marcas que afundavam sua pele para dentro da face, proporcionando uma beleza incrível ao rosto. Observei aquele ponto sem cansar os olhos... Em pouco tempo meus lábios estavam secos, precisavam ser lambidos por mim... Ou quem sabe por ele.

Droga, ele era tão bonito. Tão atraente. Era estranho sermos irmãos e não sermos iguais diante desses termos. Eu me olhava no espelho e, simplesmente, não tinha o que ele tinha. O produtor teve que “me reformar” por inteira. Pintaram o meu cabelo, colocaram ácido hialurônico no meu rosto, me obrigam a frequentar solários.

No meu rosto não havia aquela marca, os meus olhos não eram tão quentes ou chamativos e também... Eu não contrariava nenhuma lei científica para mexer o piercing com os fios da sobrancelha, como ele fazia com seu piercing com tamanha simplicidade, piercing posto, porém, em um lugar ainda mais quente: seus lábios sempre tão úmidos e avermelhados.

Diante dos calafrios que eu sentia ultimamente, era como se perto dele, eu não tivesse nenhum tipo de atrativo. Minhas tatuagens, uma estrela e escritas significativas pelo corpo; meus piercings, um no centro da língua e outro ao lado da sobrancelha; artes corporais nas quais tanto me gabo e uso para seduzir quem quero, pareciam ser lixo perto dele. A minha índole sumia e eu simplesmente me apagava.

E o pior é que, era tão bonito aquilo tudo em Tom. Encaixava-se tão bem. Seus lábios eram tão bem-postos, o seu estilo tão bem escolhido. Tudo tão perfeitamente certo a ponto de fazer-me sentir atraída.

Talvez fosse essa a definição. Quando achamos alguém bonito demais, isso pode ser dado como uma atração. E que mal há em, apenas, achar alguém bonito? Não pode? Poder... Pode.

Tom ergueu os olhos sorrindo, na parte do solo. Fez-me ficar completamente desajeitada diante de seu flagrante. Meus lábios estavam abertos e por mais alguns segundos um filete de baba iria cair deles ou então eu iria mordiscá-los sem uma mínima censura.

Meus olhos faiscavam, não queriam desviar-se da bela paisagem, mas foram obrigados.

No momento exato, mudei de expressão um tanto assustada, e foquei meus olhos em outro ponto de seu corpo, mas percebendo que fiz errado, resolvi consertar a gafe erguendo meus olhos e sorrindo de volta. Por ironia, Tom ainda estava ali, com os dentes meio expostos, meio escondidos. Resolveu morder os lábios enquanto terminava as últimas notas, como se estivesse provocando.

Pura alucinação. Era natural de meu irmão provocar sem saber. Ou apenas... Gostar de fingir que não sabe estar provocando.

Mais três notas. Só mais três notas.

“Ficou linda.” Falei em um bom som, interrompendo-o de prosseguir. Ele retirou os lábios de sua mordedura e trombou a mão pelo violão uma última vez, proporcionando ao ar a melodia de um fim de acorde.

Eu cruzei minhas mãos, um pouco exaltada, e permaneci olhando-o. Infernos. Cessei a minha tortura, mas não tinha mais capacidade para criticá-lo ou elogiá-lo. Estava ocupada demais prestando atenção em suas feições.

“Obrigado. “Agradeceu ele, em um tom calmo. Neste momento, podia-se ver o brilho exalando de seus olhos e a calmaria que se tornara o seu nervosismo. Toda a timidez transformou-se em segurança.

“Então eu já posso fazer os seus coros com mais frequência, não é?” questionou ele, franzindo a testa com os olhos ainda lotados de brilho. Mantinha uma expressão esperançosa e dedilhava as cordas do violão de brincadeira, sem permitir que ele produzisse som.

“Ué, você sempre pôde.” Respondi, abrindo um sorriso acanhado.

“Mas é que nunca ficava bom, e desta vez você disse que está bom.” Opôs-me, com um tom de empolgue adorável posto em sua voz.

“Sim, ficou bom, Tom..., mas... Já criou coragem para cantar em público, é?” ergui uma de minhas sobrancelhas, testando-o.

“Ontem de manhã enquanto você pintava as unhas, e logo depois foi tomar café e arrumar as malas pra podermos ir embora, você se lembra que eu não desci pra comer? Então... Foi porque passei a manhã toda treinando, até sentir que estava pelo menos... Mais ou menos.”

Era típico de Tom. Eu então deveria de ter a certeza de que estava bom. Meu irmão tem uma característica forte, de só mostrar algo que fez quando tem certeza de que está bom. Ele não mostra suas fraquezas aos outros... Isso me admira um pouco.

Eu sou, digamos, ao contrário. Já fui como ele, mas de um tempo pra cá não consigo mais esconder distúrbios e fraquezas. É como se quando faltasse algo, o meu corpo não se controlasse em esconder tais necessidades.

“Uau.” Expandi o meu sorriso, consequentemente, contagiando-o. “Posso afirmar apenas uma coisa...” aproximei o meu rosto do dele, olhando-o dentro dos olhos, a fim de lhe causar suspense, ou ao menos um pouco de expectativa. Ele logo veio, como um imã atraído por meu par de olhos azuis.

“As fãs ficarão felizes!” quebrei o suspense com minha exclamação, ainda com um sorriso nos lábios. Ele gargalhou, libertando-se da tensão que eu havia imposto. Uma gargalhada gostosa de orgulho que mostrava todos os seus dentes da frente.

Diante disso, eu poderia afirmar com fé. Se ele riu porque eu disse que as fãs ficariam felizes em vê-lo cantando... Tom realmente gostava de ser o centro das atenções, o assediado.

Se isso é bom? Não. Cria-me uma grande antipatia diante de tamanho convencimento.

***

O sol batia forte na janela. Nem mesmo as cortinas eram capazes de tampá-lo completamente. Uma das qualidades do verão sul-europeu: quando é verão, é realmente quente.

Um vulto agitado abriu as cortinas com um pouco de brutalidade, deixando que o sol invadisse o local e enviasse seus raios fortes para meus olhos um tanto cansados. Esfreguei as mãos em meu rosto, tentando limpá-los parcialmente, até que um bocado de remelas suficientes para que eu enxergasse fossem retiradas.

“Que droga, Gustavo...” resmunguei, mudando a posição de minha cabeça para debaixo do travesseiro.

“Bom dia, flor do dia.” Disse ele, com voz de apresentador de Talk Show, que causou o único efeito de fazer-me apertar, ainda mais, a espuma do travesseiro contra minha nuca.

“Cala a boca!” Ele puxou a coberta de meu corpo assim que terminei de choramingar, fazendo-a ecoar enquanto deslizava de meu corpo. Estava tão macia...

“Vamos lá, Willa. Levante-se daí. Temos um voo a fazer, Cinderela.” Prosseguiu ele, ainda me importunando. Agora com o seu tom natural de voz.

Retirei o travesseiro da cabeça e olhei-o com um bico formado nos lábios. “Em que dia, que eu não me lembro, eu te dei essa liberdade pra você chamar-me de Cinderela?”

Ele franziu a sobrancelha, e com a minha coberta ainda dentre suas mãos, respondeu-me com a maior naturalidade possível. “Se o Tom pode, eu também posso.”

Joguei-lhe a almofada e ele gargalhou. Pegou-a na mão e saiu de meu quarto, roubando o travesseiro. Estou certo de que Gust já estava satisfeito, pois havia me acordado, e se eu pensasse em dormir por mais aqueles “cinco minutinhos”, eu não tinha travesseiro para fazê-lo.

Decidi levantar-me. Tratei de lavar o rosto, escovar os dentes, colocar uns óculos escuros “já que não daria tempo de maquiar-me “e escolher uma roupa rapidamente.

Puxei minha mala de dentro do guarda-roupa, enguiçando o puxador da mesma e encaixando-a em minha mão. Notei que a de Tom não estava mais ali. Isso significava que ele já estava lá fora. E se chegou ao ponto de Gustavo vir me acordar, significava também que eu estava atrasado.

Desci as escadas correndo e encontrei-os na recepção. Pude abrir um leve sorriso ao notar que Jota ainda tomava um café e Tom estava quieto no sofá de entrada, batendo os dedos alternadamente sobre a cabeceira dele. Um tique já habitual.

Sentei-me ao lado de Tom, com uma perna cruzada sobre a outra. Ele tocou meu tornozelo esquerdo, segurando-o curva de seu dedo polegar e de seu dedo indicador. Permaneceu assim por um tempo, até que eu quebrasse o silêncio, consequentemente despertando-o.

“Este fim de semana durou tão pouco, eu queria ter ficado mais.” Falei em um tom mimoso, enquanto envolvi minhas mãos por seu pescoço.

“Eu também...” ele ergueu uma sobrancelha, com certa malícia colada nos olhos, direcionava a vista até o balcão. “Mas temos muito trabalho a fazer nos Estados Unidos...” ele acariciou meu braço levemente, pra cima e para baixo, duas vezes, e depois ergueu a coluna, fazendo-me, implicitamente, soltá-lo.

“Eu estava tão relaxada.” Continuei choramingando, como se fosse Tom quem decidisse as nossas rotas.

“Eu também, Willa. Mas não sou eu quem decide, não é?” Continuava ele, com sua ideia entediante.

Abracei-o, laçando meu braço, um em suas costas, e outro pousado na barriga. Minha cabeça baixou até seu peito, e lá me recostei, abrigando o pouco de sono que ainda se mantinha em meu corpo.

“Você sabe como é bom ter você nessas viagens, não sabe?” raspei minhas unhas sobre o tecido de sua camiseta, deixando-a enrugar-se como um papel encanecido. Senti sua pele macia recostada no pano, e as elevações de seu corpo naquele pequeno espaço.

“É?” ele perguntou, esboçando um sorriso quase invisível.

Em resposta, mostrei os meus dentes e levantei a minha cabeça, a fim de continuar a falar, porém olhando em seus olhos.

“É. É como estar com a Ritinha, com a mamãe... Você é um “pedaço de casa” aqui junto comigo, no meio de tanta gente estr...”

“Espera aí, Willa.” Ele sussurrou e depois tocou a minha perna, apertando-a com uma dose larga de fraternidade. Rapidamente se levantou, descruzando suas pernas antes jogadas com extremo desleixo.

Com os lábios ainda entreabertos e a sílaba “nha” também preparada para ser soada, mirei para onde Tom caminhava.

Meus olhos brilharam e meu peito se acelerou com um tipo de raiva. Vi-o apoiar seus braços sobre o balcão e dizer “olá” quase em um sussurro. A garota loira, no balcão há pelo menos desde que me sentei neste sofá, estava antes no telefone.

Com um “olá”, ela também o respondeu sorridente. Pude ler seus lábios através de minhas lentes escuras. Depois perguntou a ele se desejava alguma coisa, e sem a mínima questão de falar baixo, Tom respondera que desejava sim, desejava muitas coisas.

Ela sorria novamente, um tanto sem graça com minha presença exatamente atrás dos dois. Passou a mão dentre a lateral do pescoço e disse-o que podia fazer os seus pedidos. Bancava a desentendida, mas era visível que sacava o interesse de meu irmão.

“Primeiro seu telefone... Depois...” notei-o morder os lábios, passar os olhos sobre ela e erguê-los ao rosto da recepcionista. Sua língua traçou os dentes, e seu corpo avançou um pouco mais na bancada. “O que você quiser.

O rosto dela era estático. Parecia não estar acreditando no que estava acontecendo. Seu par de olhos verdes o encarou quase da mesma forma, e depois desceram para visualizar o bolsinho de sua saia de veludo azul. Ela retirou de lá um pedaço de papel e anotou o seu número rapidamente, entregando em seguida a ele.

Ele pegou o papel e sussurrou algo como “maravilha”, “ótimo”, eu não pude compreender corretamente. O pedaço de folha foi embrulhado e colocado em um de seus vários bolsos da calça. Ele ia beijá-la no rosto, como uma “forma de agradecimento”. Forma que, já o vi aplicar várias vezes. É sempre um estalo no canto dos lábios, que deixa a língua se recostar à pele para, segundo ele, atiçar o imaginário da menina e deixá-la com a vontade de vê-lo de novo acesa.

Mas eu não estava mais a fim de assistir àquela porcaria se reprisar. Aproveitei que Jota e Gustavo desciam as escadas com suas malas e simplesmente os interrompi.

“Tom!” exclamei.

Ele olhou para trás, enquanto a garota, um pouco assustada, recuou, aceitando a condição de que o clima estava quebrado.

“Vamos já, inseto nojento!” complementei já de pé. Tratei de logo me encaminhar à porta e juntar-me a Jota, Gustavo e nossas malas.

Para minha felicidade, notando que todos nós já estávamos reunidos exceto Tom, Lost entrou na casa-hotel, ficando junto de nós três e olhou para Tom, esperando-o também.

“Preciso ir embora, hã...”

“Helena.” Ajudou-o ela, tocando sobre o seu crachá.

“Helena..” Tom repetiu, buscando ter pressa em seus atos. “Hasta luego.”

“Hasta.” Respondeu, apoiando a mão em seu rosto e o cotovelo sobre o balcão. Ainda observava faminta cada passo de meu irmão.

Tom foi correndo até o sofá, pegou sua mala-mochila, jogando uma alça sobre as costas e veio até a porta, onde nós quatro e mais alguns seguranças o esperávamos.

Revirando os olhos, com cuidado para que nenhum deles notasse, agradeci aos céus por aquele espetáculo chato ter terminado.

Fomos todos para o carro-limusine, o mesmo que nos levaria até o aeroporto com destino aos Estados Unidos, onde teríamos mais turnês, entrevistas e um disco novo para preparar.

Aos nos sentarmos todos no banco, Jota puxou uma garrafa de vinho espanhol do cubo de gelo, com um sorriso animado no rosto.

“¡A las chicas de España!” Tom pegou um copo, aceitando a sérvia de Jota, depois ambos brindaram. Tom bafejou a golada, mexendo o gelo com o dedo em seguida. “Eu que o diga.”

“Vocês não perdoam nenhuma, em?” riu Gustavo.

“Eu? Eu sou até comportado... Mas o Tom... Ah, tá. Pegou várias na festa de anteontem e ainda estava cantando a recepcionista na saída.” Respondeu Jota, em um tom de zomba.

“Meu amigo, se eu toco guitarra o motivo é este. Tanta mulher fácil no meu pé, sem que eu faça o mínimo esforço.” Contemplou-se, perdendo totalmente a modéstia “se é que ele tem modéstia pra perder.

“To ligado.” Adicionou Gustavo, soando um tanto malicioso e dando a entender que nestas férias também não ficou sozinho.

“Só o Willa que só fica aí deitada, e não pega ninguém. Não deixa ninguém foder com ela. Uma santinha.” Tom jogou-me um cubo de gelo que foi parar sobre minha barriga. Eu estava quieta, virado para a janela, descansando no meu sono e apenas ouvindo-os até ser realmente importunada.

“Vão se foder!” Joguei o gelo de volta, sem preocupar-me em qual colo o mesmo cairia.

“Porra.” Disse Jota. Realmente não havia caído no colo de Tom.

“Caraca, Willa.” Ouvi dizer o meu irmão, com um tom mais manso. “Você está nervosa, em?”

“Estou cansada desse lugar.” Respondi mal-humorada, com a finalidade de disfarçar que na verdade eu estava cheio era daquela conversa idiota que os três mantinham.

“Fica fria, Cinderela. Nós já estamos indo embora.” Falou Gustavo.

Girei o meu rosto, até poder olhar o meu baterista. Com uma expressão séria, olhei-o de forma odiosa.

“Willa.” Consertou ele, visivelmente segurando o riso.

“Melhor assim.” Disse eu, com indiferença.

“Mas agora a pouco você disse que queria continuar aqui na Espanha.” rebateu Tom, erguendo uma sobrancelha, suspeitando de mim.

“Pois já não quero mais. E cale a boca, quero dormir.” Voltei para o meu canto e fechei os olhos, agora com a paz do silêncio posta naquele carro. Pois os garotos, vendo a minha atitude, decidiram não conversar mais comigo.

Eu era a estrela deste negócio. Eu não poderia estar estressada. Por isso eles devem me respeitar, gostem ou não da ideia. Sou eu a rainha dessa porra toda.

Suspiro fortemente. Pensamentos sobre o meu irmão começam a atormentar a minha mente. Tom: sempre preocupado com garotas. Faz música para pegar garotas, tem um estilo para seduzir garotas, tem dinheiro pra atrair garotas, gosta de ser atraente pra conquistar garotas. É famoso para ter garotas. Vive para ter garotas. Respira para ter garotas. Move-se por garotas, existe por garotas.

E o sonho de quando tínhamos sete anos? Sumiu? Que eu me lembre queríamos levar alegria às pessoas através da música, e não “pegar garotas” em festa de gente famosa. Se o seu objetivo mudou, pergunto-me se você merece um posto tão desejado por tantos músicos, já que apenas os meus sonhos parecem ter continuado puros.

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