Retorno
Rubião já havia preparado tudo para sua fuga. Tinha pedido para vigiar todas as noites daquela semana e quando retornava seus pais já estavam dormindo. Já haviam se passado sete dias e ele cuidara de tudo que poderia levá-los até ele.
Então, nesta manhã, ele pegou um saco plástico grande, foi até a área final dos escombros, local totalmente contrário de para onde iria e despejou o conteúdo do saco ali, misturando com seu próprio sangue que escorria de um corte em seu pulso, que ele próprio fizera. Eram restos de corpos com muitas penas dele próprio, que havia colhido em suas trocas de penas.
Tirou suas roupas, rasgou-as e misturou naquele monte de restos e abrindo as asas subiu, voou por um tempo, parou em uma outra área e vestiu-se com as roupas que havia deixado ali no dia anterior. Subiu mais uma vez, saindo da cidade e parou em uma pequena elevação, onde cavou, desenterrando um saco plástico que enfiou por dentro da camisa.
Só então voou bem alto, acima das nuvens, para não ser visto e só desceu na entrada da nova cidade. Parou e a máquina solicitou que se aproximasse, o que ele obedeceu e foi feito o escâner de seus olhos.
– Bem vindo desaparecido 6634, para liberar sua entrada, preciso que você diga a pessoa que será sua responsável.
Ele ficou espantado com aquilo. Então ele tinha um registro? Mas não conhecia ninguém ali para ser seu responsável. Resolveu apelar.
– Meu responsável trouxe três crianças resgatadas na semana passada – Esperou para ver se passava.
– Espere por favor, a comandante já está vindo recebê-lo. Obrigado por seu retorno 6634.
Rubião ficou olhando a máquina surpreso por ter sido acolhido tão facilmente, se soubesse teria vindo embora antes. Os impuros enchiam a cabeça das crianças com histórias terríveis, sobre o que o povo mau faria com eles. Era tão aterrorizante, que eles não se atreviam a fugir com medo de ser pior do que o que já viviam.
***
Correu por todo o quartel, a notícia de que estava havendo uma luta acirrada entre o general e a comandante e vários aquartelados foram lá assistir. A luta já durava uma hora e nenhum dos dois cedia ou estava muito ferido. Em determinado momento, o general fez um movimento contrário e pegou Mira desprevenida, pois não era um movimento usado contra aliados e dessa forma, ele jogou o corpo por sobre o dela e a imprensou no chão.
Ela tentou usar mãos e pés, mas ele segurou-lhe as mãos sobre a cabeça e prendeu suas pernas sob as dele. Mira conseguia sentir a ereção dura dele, em seu baixo ventre e sentiu ele vindo para a beijar, virou o pescoço, no que ele aproveitou para inspirar seu aroma, mas para subjugá-la e mostrar para todos que ela era dele, precisava beijá-la em público.
Quando ela virou o pescoço e olhou para as laterais do salão, viu a enorme quantidade de pessoas que assistiam e percebeu a armadilha que ele preparou para aprisioná-la.
– Seu rato inescrupuloso e lascivo, eu nunca serei sua - Mira falou, puxando o pescoço para o mais longe possível dele.
– Não adianta resistir, Mira, você já é minha.
Ele se esfregou nela, quase chegando ao ápice e no momento que ia alcançar sua boca, ouviu-se a voz saindo pela caixa de som e inundando o local.
– Comandante Mira Atanes, sua presença é requisitada com urgência no portão de entrada da nova cidade.
Mira aproveitou a distração e além de dar uma cabeçada no rosto de Soro, subiu com força seu joelho, acertando seu produtor de sementes. A dor fez ele soltá-la e ela, saindo rápido de sob ele, correu para a saída, mas antes, deu uma ordem ao captor de áudio:
– Quero a identificação de todos que estão nesta sala e que envie as gravações à superintendência..
Em seguida desceu pelo elevador, foi até a garagem subterrânea e subiu em sua motocicleta, acionou o capacete automático, embutido na gola de sua roupa e rapidamente chegou ao portão.
Parou a moto antes da cancela e olhou o ser alado, ali parado esperando. Desceu e reduziu o capacete, olhando direto para o indivíduo.
– Bem vinda, comandante Mira Atanes. Este é o ex-desaparecido 6634.
Mira tomou um susto, que seus olhos arregalaram, sua boca se abriu e seu corpo todo se eriçou. Não conseguiu emitir nem um som, então Rubião falou primeiro, se aproximando:
– O que o cheiro de outro homem faz em minha companheira?
– O que? – Mira não estava entendendo nada.
– Meu nome é Rubião. Fui raptado quando criança e adotado por impuros. Encontrei você na semana passada e pelo seu aroma, meu lobo te reconheceu como nossa companheira. A princípio pensei que eras um garoto. Mas está bom assim – explicou, mas Mira ainda não entendia.
– Eu continuo não entendendo. Você é um guardião dos impuros, o que quer aqui? – Perguntou ela.
– Quero você!
– Só me faltava essa, ser disputada por dois irmãos. – Ela resmungou, mas ele escutou.
– Irmão? É dele o cheiro de macho em você?
– Sim, estávamos lutando. Mas o que você quer, sem ser eu, é claro? – Perguntou mais uma vez, Mira, piscando diversas vezes.
– Asilo. Para provar minha intenção, trouxe para você, mapas das cidades subterrâneas que eu mesmo fiz – tirou o saco plástico de dentro da roupa e passou para ela, sobre a cancela.
Mira abriu o saco e puxou um dos papéis e pela segunda vez arregalou os olhos. Guardou o mapa e colocou o saco dentro de sua blusa. Pegou um dispositivo em forma de pulseira de silicone e pediu o braço direito dele, que o estendeu. Ela colocou a pulseira em seu pulso e imediatamente, a cancela começou a levantar e ele pode entrar.
– Bem vindo, Sertrá Soro, ex-desaparecido 6634. – Saudou a máquina.
Rubião ficou olhando para a máquina enquanto entrava na nova cidade. Será que entendeu bem? Ali ele tinha um registro e um outro nome?
Voltou os olhos para a jovem linda a sua frente. Cabelos curtos, pretos e olhos azuis cristalinos. Num impulso a abraçou apertado, esfregando-se o mais que podia nela, tentando substituir o cheiro do outro macho, pelo seu.
Ela o empurrou, mas ele era muito forte.
– O que está fazendo? Me solta. – Pediu, parando de lutar.
– Larga ela, agora!
Os dois se viraram devagar, mas Rubião não a soltou e nem Mira se afastou dele, pois ali a sua frente estava o seu pesadelo ambulante.
Quando o general Soro olhou para o rosto de Rubião, ficou estático, do mesmo modo que ficou Rubião. Embora os cabelos de Rubião sejam compridos e os de Soro, curtos, seus rostos são idênticos.
– Não é possível – disse, abaixando a arma e se aproximando – olhou nos olhos de seu irmão, tentando um reconhecimento da parte do outro.
Mas Rubião escondeu a fêmea atrás de si e falou com sua voz de lobo:
– Minha!
A postura de Soro mudou, agora era só o general. Falou então, apontando a arma novamente:
– Solte ela, ou mesmo que você seja meu irmão, eu te mato.