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Está chovendo no momento em que chego em casa e estou encharcada caminhando alguns quarteirões da estação até meu apartamento. Sarah saiu quando entro em nosso apartamento no terceiro andar. Absorvo o aconchego do pequeno apartamento alugado e me sinto mais relaxada. Estou feliz por estar em casa, cercada pelos nossos confortos domésticos e cômodos luminosos, nosso refúgio feminino. Estou cansada, foi um dia longo e quero tomar um banho e ir para a cama.
Amasso o bilhete de Sarah, informando que ela fez macarrão com queijo, do balcão. Está na geladeira para mim e eu jogo o papel no lixo.
As vantagens de morar com uma chefe de cozinha. Ela trabalha até tarde na maioria das noites e não consigo me lembrar da última vez que passamos mais de cinco minutos na companhia uma da outra. Nossas vidas compreendem breves conversas ocasionais de passagem e bilhetes na geladeira, o que me agrada mais do que quando tinha de fazer companhia a ela todas as noites.
Sarah tem sido minha melhor amiga desde sempre. Viemos para Nova York juntas há cinco anos e tivemos sorte de conseguir esse lugar. Ela foi aceita em uma escola de culinária de elite e eu consegui um cargo administrativo temporário na corporação Carrero, como recepcionista, embora não tivesse nenhuma experiência e quase nenhuma qualificação. Naquela época eu não passava de uma máquina de fazer chá e café, ansiosa para fazer qualquer coisa para me manter aqui nessa cidade louca. Meu novo começo. Minha fuga de quem eu não queria ser mais e das lembranças disso. Sarah ficou emocionada que eu quisesse vir com ela, inabalável ao deixar Chicago para ir para o mundo por conta própria, mas nosso relacionamento mudou desde então. Nós nos afastamos de tantas maneiras. Imagino que não precisamos uma da outra como costumávamos. O apartamento é a única coisa que nos mantém juntas.
Tiro os sapatos e vou para meu quarto me trocar. Visto uma legging de ginástica e um sutiã esportivo e uma toalha seca meu cabelo de volta à umidade antes do meu breve período de exercícios após o trabalho. Isso me ajuda a relaxar do estresse do dia e me deixa no modo de dormir.
Há uma luz piscando na secretária eletrônica e eu a pressiono, uma onda de ansiedade em minha barriga enquanto arrisco adivinhar quem será.
É Marcus.
O namorado intermitente de Sarah — é quem eu esperava que fosse. Eles estavam distantes novamente, para minha alegria, mas essa ligação significava que ele voltou a mendigar para ficarem novamente. Deleto a mensagem. Ela nunca saberá que ele ligou. Marcus é sórdido sem igual, mas Sarah não consegue ver isso. Ele é pegajoso, excessivamente amigável e faz comentários obscenos e insinuações sexuais quando está por perto. Creio que ela pode fazer melhor. Ele faz minha pele arrepiar, mas ela tenta me dizer que minhas experiências com homens são o motivo pelo qual não consigo gostar deles. Sei lá no fundo que em parte é a razão de eu ser assim, mas ele ainda é esquisito. Tento não permanecer nisso e ligo meu iPad para um pouco de música de malhação.
* * *
Estou cansada após me exercitar, refeição e banho quente, mas sei que não serei capaz de dormir. De qualquer maneira nunca fui de dormir bem, não desde a infância, até onde me lembro. Tenho sonhos vívidos que não fazem sentido, cheios de escuridão e ansiedade que me deixam devastada ao acordar. Exercitar-me antes de ir dormir ajuda, mas não os erradica e aprendi a viver do sono errático e irascível que consigo. Ainda gostaria de poder dormir como uma pessoa normal, mas sei que posso nunca perder os terrores noturnos, minha mente simplesmente não consegue deixar o passado para lá, não importa o quanto eu tente seguir em frente.
Meu celular vibra. Percebo com uma pequena surpresa que é uma mensagem de Margo. Estive esperando que meu trabalho me invadisse fora do horário normal de trabalho. Sei que eles estão indo devagar comigo tão no início da promoção. Eu me pergunto se este é o início completo do modo AP.
Emma. Preciso de você uma hora mais cedo amanhã. Você receberá hora extra. Haverá um carro para você para que não se atrase. Você vai se encontrar com Donna Moore. x
Está tudo bem, Margo. Obrigada. Eu respondo ansiosa.
Esse lado do trabalho é novo para mim. Trabalhar cedo/tarde com roupas específicas — os executivos com quem lidei nos andares inferiores não eram tão importantes, eu imagino. Estou ciente que trabalhar diretamente para um Carrero é um jogo completamente diferente e, de certa maneira, estou ansiosa para começar adequadamente. Preciso de um novo desafio, as coisas no décimo andar se tornaram obsoletas e previsíveis.
* * *
O carro chega de manhã bem cedo na manhã seguinte, um tração nas quatro rodas preto; uma escolha Carrero típica e o motorista está vestido com um terno preto, parecido com o segurança que estava no escritório de Jake. A aparência deles me faz revirar os olhos. O cara simplesmente ama tudo preto. Desde então, descobri que o segurança daquele dia era o guarda-costas pessoal de Arrick Carrero. Jake parece não exigir essas coisas.
Vestida com uma calça social e uma blusa rosa escura, presente da minha mãe pelo meu aniversário, que não é até a próxima semana, mas que ela enviou mais cedo para ter certeza que eu os receberia. Não celebro meu aniversário e Sarah sabe que nem deve mencioná-lo quando se aproxima a data. Fiquei surpresa com o presente da minha mãe, pois normalmente ela não se dá ao trabalho, mas por algum motivo, ela se deu dessa vez.
Eles não são tão frios e sob medida como as minhas roupas habituais, mas ainda são aceitáveis e me sinto obrigada a usá-los pelo menos uma vez pois sei como devem ter sido caros. Odeio que ela sinta necessidade de comprar coisas assim para mim, culpa materna de algum tipo, sem dúvida. É o estilo dela, não meu, mas ela tentou.
Minha mãe é uma hippie eterna. A frivolidade romântica é mais seu forte e parte do seu apelo aos homens. Mesmo na casa dos quarenta, ela ainda é atraente e os homens a consideram desejável. Embora quanto menos eu pensar no gosto da minha mãe sobre homens, melhor. Afasto essa lembrança, pressionando para baixo a repulsa em minha barriga.
O carro me deixa no prédio familiar. Está cinza e úmido esta manhã e há um frio no ar. Nova York está se aproximando de uma mudança de estação.
Percorro as verificações de segurança necessárias antes de chegar ao sexagésimo quinto andar. O prédio está assustadoramente silencioso devido a hora tão cedo. Tremendo, puxo meu casaco de lã mais ao redor dos ombros para tentar me aquecer, embora o edifício tenha um sistema de controle de temperatura de última geração.
Margo me cumprimenta na porta do escritório com uma mulher loira vestida com roupas caras e um ar de sedução. Alta, graciosa e vestida toda de vermelho, Margo a apresenta como Donna Moore, a personal shopper e me informa que minhas medidas devem ser tomadas. O Sr. Carrero insiste que sua equipe mais próxima receba esse benefício, pois sua imagem pública com frequência o vê em tapetes vermelhos e no centro do interesse da mídia. Ele espera que qualquer um que possa acompanhá-lo sempre esteja vestido adequadamente.
Seu pai aproveitou o apelo sexual natural de filho desde tenra idade, usando-o como o representante da linha de produtos de ponta de cuidados pessoais e de loção pós-barba, o que significa um interesse interminável da mídia. O menino é praticamente um supermodelo para sua própria empresa. Ainda o garoto propaganda de Nova York, mesmo agora, ele parece que não consegue se mover sem o flash da câmera ou um fã devotado aparecendo do nada.
Fico em pé em um banquinho me sentindo extremamente desconfortável com sua medição invasiva enquanto ela voa ao meu redor com uma fita métrica e pergunta o que eu visto, as cores que gosto e coisas assim. Ela pega o celular e tira algumas fotos minhas de todos os ângulos. Insatisfeita com as imagens, ela reclama comigo para soltar o cabelo. Mantenho minha paciência e irritação sob controle e sigo suas instruções. Nunca o conseguirei de volta em seu estilo elegante sem muito esforço.
Lá se vai outro dia suportando-o ao redor do meu rosto e tendo todo mundo cantando sobre isso. Simplesmente ótimo!
“Para o meu arquivo, querida… Assim eu me lembro da sua linda cor e estrutura óssea e como você se parece com sua massa de cabelos macios.” Ela sorri para mim, os olhos brilhando como uma criança no Natal. Não faço ideia porque isso é realmente uma necessidade.
“Amo seu cabelo solto.” Margo sorri para mim, me avaliando.
“Faz um mundo de diferença, Emma, sério. Suaviza todo seu rosto.” Ela olha para mim com uma expressão calorosa e olhar aguçado, o que acrescenta outra camada de desconforto ao meu humor.
“Você não acha que isso não é profissional?” Eu falo com impertinência. Quero que ambas se afastem e parem de me examinar, me deixando nervosa.
“Em nenhum lugar do manual do uniforme do escritório diz: prenda seu cabelo como uma professora.” As duas mulheres dão uma risadinha bastante surpreendente, matando toda a aura de profissionais maduras.
“Trabalhamos em um negócio proeminente, que requer uma certa atenção à imagem.” Posso sentir o calor em minhas bochechas aumentando com a irritação, com as risadinhas e o rebuliço por causa do meu cabelo.
“Emma, querida, você percebe quão lindo são esses cachos? Você tem uma cor de cabelo tão adorável, como folhas de outono claras.” Donna diz animada.
Olho para ela inexpressivamente, tentando não trazer à luz imagens de folhas pretas encharcadas de mofo e folhas marrons manchadas, nas pedras da pavimentação de Nova York no outono passado. Ignoro quão desconfortável me sinto por parecer ‘mais suave’.
“Ela está certa, Emma. Você parece muito mais natural e bonita assim. Creio que Jake concordou ontem.” Margo diz, um brilho em seus olhos.
“Ele concordou?” Faço uma careta, encontrando olhares divertidos. Ignorando a sensação quente e profunda na boca do meu estômago.