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Capítulo 4

― Pensei que seu marido não ligasse para o fato de você ser desastrada. ― Congelei imediatamente na cadeira e arregalei os olhos olhando o Senhor Hamzaf.

Dubai me dando sorte? Rá! Nunca, nunquinha. Ele havia desistido de mim. Porque de todas as pessoas que eu devia mentir sobre meu marido não ligar para eu ser desastrada tinha que ser justamente o pretendente a marido com quem eu gritei? Porque diabos o universo decidiu brincar com minha cara? Sério, Deus? Será que eu não poderia receber um pouquinho de sorte alguma vez na vida?

Minhas bochechas coraram sem que eu quisesse, um misto de vergonha e raiva. Raiva porque o senhor Hamzaf tinha um sorriso largo no rosto, muito diferente da cara fechada do dia anterior, como se debochasse de mim. Provavelmente era o que estava fazendo, percebi logo em seguida. Decidi falar antes que mais vergonha fosse estampada no meu rosto.

― Pensei que vocês daqui de Dubai fossem mais tolerantes. ― Hamzaf sorriu ainda mais como se pensasse em alguma coisa.

― Então como forma de tolerância devo apenas anotar que a candidata… ― Ele fez um gesto com a mão como se esperasse que eu me apresentasse. Arqueei uma sobrancelha. Ótimo! Ele não tinha nem se dado ao trabalho de saber qual era os nomes das candidatas. Bufei.

― Pâmela. Mas me chamam de Pam. ― Ele meneou a cabeça num gesto afirmativo, voltando a abrir a boca.

― Devo apenas anotar então que a candidata Pâmela ― Ele me ignorou completamente quanto ao fato de eu preferir Pam. ― é não somente desastrada, mas também atrasada? ― Mais deboche. Mas tudo bem. Eu era brasileira, sabia debochar mais do que ninguém. Se ele queria entrar nesse joguinho, não precisava se preocupar, eu sabia jogá-lo também.

― Exatamente, quando me convém. Mas olhe pelo lado bom, você não precisou nem me perguntar e já me conhece. Duvido que as outras candidatas serão tão sinceras com os defeitos delas como eu estou sendo agora. Deveria considerar isso, Hamzaf. ― Disse com um mini sorriso de canto, o que fez Hamzaf relaxar na cadeira, encostando as costas na mesma e parecendo pensativo sobre o que eu havia dito. Depois de alguns segundos, ele voltou a falar:

― Algum outro defeito seu que eu deveria saber já de antemão?

― Só que eu gosto de falar. E não desisto fácil. E minha mãe me chama de teimosa. ― Confessei, o que fez Hamzaf gargalhar, tirando o foco das meninas que me encaravam estupefatas apenas para encararem Hamzaf mais estupefatas ainda por vê-lo rir. É, até que parecia que toda a minha onda de azar estava ajudando em alguma coisa no fim.

Hamzaf pareceu se recuperar da risada espontânea depois de alguns segundos e bebericou do copo com vinho ― acho que era vinho, parecia muito, na verdade ― sem sorrisos dessa vez.

― A sua teimosia então não conseguiu ser domada pelos seus pais. ― Ele parecia mais refletir do que de fato perguntar-me. Ainda assim, respondi:

― Acho que não. ― E então voltei minha atenção para as outras meninas que soltavam “Oh” seguidos de “ela não disse isso”, como se fosse uma afronta. ― Eu prefiro ser sincera com o senhor. Isso, com certeza, terá de mim.

― E a sua teimosia não domada. Seria interessante domá-la. ― Ele ponderou. Sorri.

― Igualmente, tal como a sua rudeza em pessoa. Aliás, o senhor precisa ter mais amor no coração e não sair xingando todo mundo na rua por causa de um maldito sorvete. ― Quando eu disse que eu tinha tido azar em Dubai, eu não estava mentindo. Toda a possível onda de sorte pareceu se esvair no momento que eu lembrei a cena ocorrida no dia anterior, pois foi o suficiente para Hamzaf se alterar.

― Não sair xingando? ― Ele parecia se controlar para não gritar no restaurante. Aparentemente, ele também estourava como eu. ― Maldito sorvete! Nisso tens razão! Um maldito sorvete que estragou o meu terno para sempre! Eu tive que jogá-lo no lixo! Lixo! Você tem noção de quanto gastei naquele terno?

― Não sei não, Hamzaf. Mas provavelmente foi muito para uma máquina não conseguir resolver o ocorrido. ― Se havia uma veia estourando em algum lugar, ela estaria exatamente ali, na testa de Hamzaf, os olhos castanhos amendoados me encarando como se eu fosse lunática. Fazer o que, Hamzaf tinha despertado o pior de mim e esse meu pior queria discutir com ele e fazê-lo entender coisas que pareciam difíceis de ele entender.

Talvez porque fosse riquinho, vai saber.

Sua ingrata, seu pai…

A frase veio numa velocidade avassaladora me fazendo respirar fundo e sentir como se todo o ar de repente estivesse saturado de gás carbônico prestes a me sufocar. Buscar o ar parecia difícil. Eu devia parar de discutir com Hamzaf e não provocá-lo. Eu disse que tentaria pelo meu pai, mas estava ali mais parecendo uma louca varrida do que realmente uma candidata tentando alguma coisa. As palavras sumiram dos meus lábios e os pensamentos seguiram pelo mesmo caminho me tornando praticamente muda.

― Não vai falar nada? ― Hamzaf me perguntou. Ele estava vermelho e havia me feito uma pergunta, provavelmente no calor da raiva, mas eu não fazia ideia de que pergunta era. Se eu tinha certeza de alguma coisa era que estava mais perto de ser a primeira excluída do que qualquer outra coisa. Eu devia me calar e parecer centrada e não uma brasileira barraqueira ou qualquer coisa parecida.

― Eu deveria? ― Perguntei fazendo Hamzaf desistir de mim e começar a conversar com as outras meninas.

Pois é, a minha possível chance de ser escolhida havia ido por água abaixo.

Eu deveria me preparar para voltar para o Brasil, infelizmente.

Era a minha sorte, muito embora ela só estivesse começando, como eu descobriria depois.

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