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Aplacando a fúria

Eu ergui meu olhar para Salvatore implorando para que ele me escutasse, que aquela fúria em seu olhar se aplacasse. Ele fechou os olhos por um segundo e voltou seu olhar novamente para mim enquanto falava para a mulher atrás de mim.

_ Saia daqui, antes que eu me arrependa e te dê a lição que você merece!

Escutei os passos dela se afastarem. Eu não desviei meu olhar dos olhos de Salvatore. Ele alisou meu rosto.

_ Eu sinto muito, por isto. _ ele disse.

_ Eu estou bem. Mas...

_ Elas são garotas que trabalham para mim. Mas não se preocupe isto nunca mais irá acontecer.

Eu ainda tinha as palavras delas em minha mente. Que ele dava atenção para elas e agora a sua atenção era para mim. Eu me sentia lisonjeada ao mesmo tempo irritada e com ciúmes. Eu não deveria estar sentindo nada daquilo.

Ele alisou meu rosto e beijou minha testa. Seu gesto de carinho sempre me confundia.

_ Lembra que eu te disse que gostaria de passar mais tempo com você?

_ Sim.

Ele alisou o meu rosto e sorriu.

_ Você tem alguns minutos antes de ir para o orfanato?

_ Sim. Eu tenho, por quê?

Ele abriu a porta do carro sem me responder. Eu entrei e ele se acomodou em seu assento, nos levando para fora do centro da cidade.

_ Para onde está me levando?

_ Você está com medo?

Eu senti borboletas no meu estômago.

_ Eu não tenho medo de você.

_ Mas deveria.

Não tinha agressividade em sua voz e nem mesmo advertência. Era uma constatação de uma verdade que eu ignorava.

Minutos depois ele estava abrindo a porta para mim em frente ao teatro Petruzzelli. Eu estava confusa.

_ O que estamos fazendo aqui?

Ele apenas piscou para mim. Me levando para dentro. O lugar parecia deserto enquanto caminhávamos pelos corredores.

Na sala principal estava um maravilhoso piano. Na frente dele uma grossa poltrona no estilo vitoriano na qual Salvatore se acomodou.

_ Por favor, toque para mim, Anna.

Eu nunca tinha me sentido tão nervosa antes de tocar para alguém. Eu sempre tocava para amigos, para família. E até mesmo em bailes de beneficência, sem falar na escola. Mas ali estava Salvatore, esperando a melodia se formar da habilidade de meus dedos.

Respirei fundo e me sentei. Posicionei meus dedos e fechei meus olhos. Toquei o que meu coração mandava. Salvatore da Lana del Rey, saindo do piano a cada nota, contando silenciosamente o que se passava em minha mente.

Eu estava no momento mais intenso da melodia quando ele sussurrou em meu ouvido.

_ Abra os seus olhos, quero que me olhe enquanto toca. Por uns segundos perdi o foco, mas ele tocou meu braço me incentivando a continuar e eu o fiz.

Quando terminei, estávamos nos entreolhando. Foi impossível não ficar envergonhada.

_ Obrigado por tocar para mim. Eu desejei muito isto.

_ Obrigada, por seu elogio.

_ Você me disse que seu sonho é tocar na Orquestra de San Remo, acredite em mim, você está à altura deles. Acredite em você, Anna.

Ele disse enquanto beijava a minha mão. Eu sorri com seu gesto.

_ Então, este era o plano? Quando disse que queria passar tempo comigo... _tentei aliviar o clima.

_ Um dos planos.

Ele piscou. Ele olhou o relógio em seu pulso.

_ Venha, vou te levar para o orfanato, como prometi.

Ele se afastou me levando com ele de mãos dadas até o seu carro. Ele falou antes de abrir a porta.

_ Venha me ver correr esta noite?

_ Você diz uma corrida em alguma pista automotiva?

Ele ergueu sua sobrancelha e sorriu divertido.

_ Na verdade estamos mais para um racha de rua. Temos as colinas do vale da morte na costa marítima como a melhor pista para uma corrida.

Um frio me percorreu o corpo. Aquelas estradas eram perigosas, mas eu tinha visto ele pilotar em alta velocidade pelas ruas da cidade. Ele sabia o que fazia, provavelmente saberia o que fazer naquelas estradas.

_ Tudo bem, eu vou. _ excitada e curiosa respondi.

Ele alargou o sorriso e beijou minha bochecha antes que eu entrasse no carro. Ele deu a volta e assumiu seu lugar atrás do volante. Assim que o carro partiu fiquei curiosa.

_ Você vai dirigir com este carro?

_ Não. Eu vou dirigir a minha Bugatti Chiron.

Ele sorriu ao ler no meu rosto que eu não fazia ideia de que carro era este.

_ Este carro vai de 0 a 100 km/h em 2,5 segundos.

_ Isto é muito rápido! _ falei já assustada com o que ele faria naquela corrida.

Parecendo ler meus pensamentos mais uma vez ele disse:

_ Não será a primeira vez que faço isto.

Eu sorri sem graça. Ele parou o carro na frente do orfanato como eu havia explicado por mensagem. Ele deu a volta e abriu a porta do carro para mim. Ele beijou o meu rosto antes de falar.

_ Eu não poderei vir te buscar, mas enviarei alguém da minha confiança para te levar até mim.

Eu concordei e entrei no prédio. Quando fechei a porta atrás de mim, senti o motor de seu carro esportivo rugir. Ele tinha respeitado ao menos o orfanato, ali eu estava tranquila em meio as crianças. Então ele limitou a minha segurança para o lado de fora do prédio.

***

Eu passei a tarde atarefada e a noite ao invés de ir para a faculdade eu estava indo para as colinas do Vale da morte, assistir a Salvatore competir com outros homens. Eu estava matando aula por ele. Eu nunca me imaginei quebrando regras e ali estava eu, em um carro seu, sendo levada por um de seus homens até ele.

Eu não sabia o que esperar e isto me deixava apreensiva. Mas à medida que fomos nos aproximando do lugar, vi o aglomerado de pessoas, carros esportivos luxuosos, muita bebida e música.

Os carros mais potentes estavam ali, eu nem precisava ser uma conhecedora disto, o visual dinâmico e caro de todos eles já contavam isto. Vi um rosto conhecido se aproximar, Raffaele sorriu para mim.

_ Bem-vinda, Anna. Ele está bem ali, pronto para partir. A corrida começará em segundos.

_ Obrigada.

Olhei para onde ele apontava e Salvatore piscou para mim quando me viu. Meu coração deu sinal em palpitações. Eu acenei para ele. Logo uma moça caminhou entre os carros e fez sinal com a bandeira. O som foi ensurdecedor, e eles arrancaram em alta velocidade.

_ Ele está determinado a vencer, ele sempre está. _ Raffaele disse e olhando para mim ele continuou:_ ele tem um motivo especial para passar por cima de todos hoje.

O rubor tomou conta das minhas bochechas e eu tentei disfarçar fazendo uma pergunta.

_ Quanto tempo dura e como vocês sabem quem está vencendo?

Raffaele apontou para um furgão equipado com vários monitores mostrando as estradas. Eles realmente não brincavam com aquilo. Eu jamais poderia imaginar que uma corrida de rua era acompanhada por câmeras. Vi que tinha tambem um telão em um campo próximo onde estávamos. Onde um aglomerado de pessoas torcia para os concorrentes, gritando seus nomes. Eu me perguntei se todos eles faziam parte da máfia.

Alguns minutos depois, senti o Raffaele praguejar enquanto olhava para o monitor. Ele começou a falar no telefone e estava tenso mandando os homens se deslocarem.

_ O que aconteceu?

_ O carro de Salvatore derrapou em uma curva, parece que o freio não funcionou. Neste ângulo a câmera não está funcionando. Ele não responde.

Olhei para o monitor desesperada. A Bugatti não estava à vista, ele tinha liderado até então, mas agora poderia estar ferido. Um amargo subiu em minha boca e senti minhas pernas fraquejarem. Vi pessoas horrorizadas buscando na tela por imagens da curva, mas a câmera estava com pouca visibilidade.

Busquei no olhar de Raffaele alguma notícia, mas ele continuava um pouco afastado falando e gesticulando ao telefone sem parar. Minutos de angústia se seguiram até eu ouvir alguém gritar.

_ Ele está ali! Salvatore está ali!

Eu olhei novamente para o monitor e vi seu carro liderar novamente. Ele acelerava e fazia as curvas sinuosas como se ele tivesse feito isso milhares de vezes na vida.

Eu apertava minhas mãos e só depois de ver seu carro se aproximando da linha de chegada foi que eu consegui puxar um respiro profundo.

Os pneus frearam, todos gritavam por Salvatore, todos correram até seu carro. Mas ele ignorou um por um, correndo em minha direção e me pegando em seus braços. Em um abraço demorado, onde todo o mundo a nossa volta parou e existia apenas nós dois.

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