Capítulo 5
Capítulo 5
Samy ainda se lembrava perfeitamente como havia sido a chegada de Jasper Rizzo em seu colégio.
Era só mais um dia comum... A rotina no Colégio Fitzgerald era previsível. Os mesmos corredores estreitos, os mesmos rostos cansados, e as mesmas conversas sem vida. Samy sabia exatamente o que esperar de cada dia ali, e era isso que a incomodava. Fitzgerald, embora fosse a escola de elite de Bullut, não passava de mais uma engrenagem na monotonia da cidade. Os professores não pareciam interessados em ensinar de verdade, e a maioria dos alunos estava apenas esperando a hora de sair dali e ir para as faculdades que os aguardavam em grandes cidades.
Era uma quarta-feira comum, como qualquer outra, quando a notícia de um novo professor começou a circular pelos corredores. Professor de literatura, algumas pessoas disseram. Jovem e misterioso. Samy, como sempre, ouviu os sussurros, mas não se importou. Para ela, era apenas mais um adulto que não fazia ideia do que significava viver a vida que ela vivia. O fato de ele ser jovem ou misterioso não mudaria sua realidade.
Ainda assim, quando entrou na sala de aula de literatura naquela manhã, sentiu algo diferente no ar. Havia uma expectativa silenciosa entre os alunos. Suas cadeiras estavam voltadas para o quadro, onde um nome estava escrito com uma caligrafia firme: Jasper Rizzo. Samy observou com curiosidade contida enquanto as outras garotas trocavam olhares e risos abafados. Era raro um professor novo chegar, especialmente alguém que não fosse de Bullut.
Quando o relógio finalmente marcou o início da aula, a porta da sala se abriu, e Jasper Rizzo entrou. Samy olhou de relance, sem muito interesse, mas logo percebeu por que havia tanto burburinho. Jasper não era como os outros professores do colégio. Alto, com os cabelos claros levemente bagunçados e um semblante sério, ele parecia carregar uma mistura de autoridade e mistério que imediatamente chamou a atenção de todos. Seus olhos, de um azul profundo, passaram rapidamente pela sala, avaliando os rostos dos alunos com uma intensidade que fez com que Samy sentisse um leve desconforto.
-Bom dia, - ele disse, com uma voz firme e ao mesmo tempo calma. -Meu nome é Jasper Rizzo, e sou o novo professor de literatura.
Sua voz era diferente do que Samy estava acostumada. Não era cansada ou monótona, mas também não parecia estar ali para impressionar ninguém. Era apenas... autêntica.
Jasper foi direto ao ponto. Não perdeu tempo com introduções elaboradas ou discursos motivacionais forçados, como a maioria dos novos professores fazia. Em vez disso, começou a falar sobre literatura de uma maneira que imediatamente capturou a atenção da sala.
-Literatura não é apenas sobre livros antigos e palavras difíceis,- ele disse, caminhando lentamente pela frente da sala. -É sobre entender o mundo ao nosso redor. As palavras que lemos e escrevemos têm o poder de nos transformar, de nos mostrar partes de nós mesmos que talvez preferíssemos não ver.
Samy, que geralmente se desligava da aula logo nos primeiros minutos, encontrou-se prestando atenção. Havia algo na forma como Jasper falava que era diferente. Ele não estava apenas repetindo um discurso ensaiado, ele acreditava no que dizia.
-Hoje vamos falar sobre ‘O Grande Gatsby’,- continuou Jasper, parando na frente do quadro. -A história de um homem que se perde em sua busca por um sonho que talvez nunca tenha sido real. Alguém aqui já se sentiu assim?
A pergunta pairou no ar, e os alunos trocaram olhares nervosos, mas ninguém se atreveu a levantar a mão. Samy, no entanto, sentiu um leve arrepio. A ideia de perseguir algo inalcançável, de lutar por um sonho que talvez fosse apenas uma ilusão, era estranhamente familiar para ela. Mas, claro, ela não diria isso em voz alta.
Jasper sorriu levemente, como se já esperasse a falta de respostas.
-É claro que sim,- ele disse. -Todos nós, em algum momento, nos deparamos com a dura realidade de que o que desejamos pode nunca ser atingido. Mas isso não nos impede de tentar, não é?
Conforme a aula prosseguia, Samy começou a perceber que havia algo mais em Jasper além de sua habilidade de capturar a atenção dos alunos. Ele parecia... diferente. Diferente dos professores que se resignavam ao tédio de Bullut, diferente das figuras autoritárias que apenas cumpriam seu papel. Ele falava com paixão sobre a importância das histórias, sobre como elas moldam nossas vidas e nos dão uma chance de compreender o mundo e a nós mesmos.
Samy estava intrigada. Era como se, pela primeira vez, alguém estivesse oferecendo uma visão de algo além das paredes opressivas de Bullut. Enquanto Jasper falava sobre o sonho inalcançável de Gatsby, Samy pensava em sua própria vida. Bullut, sua casa, seu pai... tudo parecia uma prisão da qual ela não conseguia escapar. Ela sabia que queria mais, mas a vida sempre parecia colocá-la de volta no mesmo lugar, como se não houvesse saída.
No final da aula, Jasper olhou para os alunos e disse.
-Quero que pensem sobre o que realmente significa sonhar com algo que pode nunca acontecer. Não sobre desistir, mas sobre a coragem de continuar mesmo sabendo que a realidade pode não ser o que esperamos. Na próxima aula, quero que tragam suas reflexões.
Quando o sinal tocou, os alunos começaram a recolher seus materiais e sair da sala. Samy, no entanto, ficou para trás por um momento, observando Jasper enquanto ele arrumava seus papéis. Ela não sabia o que pensar dele ainda, mas algo dentro dela havia mudado naquele curto espaço de tempo. Ele havia despertado uma curiosidade, uma faísca que ela não sentia há muito tempo.
Enquanto saía da sala, Samy olhou para o quadro, onde o nome Jasper Rizzo ainda estava escrito. Ela não sabia como, mas tinha a sensação de que esse nome e aquela presença seriam importantes em sua vida dali em diante. Havia algo nele, algo nos olhos azuis e no jeito enigmático de falar, que a fazia acreditar que, talvez, sua vida em Bullut não fosse tão previsível quanto pensava.
Jasper Rizzo, com sua chegada inesperada e seu jeito único de ensinar, havia quebrado a rotina de Bullut. Para Samy, ele representava uma possibilidade, uma abertura para algo mais. Mesmo sem perceber completamente, ela começava a enxergar nele uma espécie de porta para o mundo que tanto desejava conhecer.