Capítulo 03
Assim que o despertador toca, eu me levanto, tomo um banho, visto minhas roupas sociais e saio para o trabalho. Chego antes do senhor Carlos no escritório e arrumo minha mesa. E poucos minutos depois, o elevador se abre e ele sai, vestido em um terno azul-escuro que parece custar os olhos da cara. O senhor Carlos é um homem muito bonito, com cabelos e olhos castanhos e uma barba muito bem feita, que o deixa ainda mais belo. E mesmo sempre o vendo de terno, imagino que também seja forte.
— Bom dia, Ana. Como foi o fim de semana?
— Bom dia, senhor Carlos. Foi ótimo, obrigada por perguntar. E o do senhor?
— O meu foi perfeito. Te espero daqui a cinco minutos no meu escritório.
Assinto.
O senhor Carlos, apesar de ser bem exigente, não é grosseiro. Temos uma relação até que boa. Espero passar os cinco minutos, me levanto, arrumo minha roupa e bato à sua porta antes de entrar.
— Sente-se, por favor. Eu preciso que reveja toda a minha agenda da semana, confirme os compromissos importantes e faça também uma pesquisa sobre as melhores pousadas de Guarujá. Os investidores que virão para uma reunião semana que vem querem ficar alguns dias por aqui.
Anoto tudo com atenção no bloquinho. E assim que levanto o rosto, vejo que seus olhos estão fixos em mim.
— Sim, senhor. Tudo anotado. Algo mais?
— Só isso, por enquanto. — Ele sorri.
Volto para minha mesa e foco em meu trabalho e em cumprir o que me pediu. Começo a confirmar seus compromissos enquanto pesquiso as pousadas e só paro no horário de almoço. Me mantenho tão focada que quando dou por mim, já são quase seis da tarde. Graças a Deus está chegando a hora de ir para casa.
— Boa noite, Ana. Até amanhã — o senhor Carlos se despede.
— Boa noite, senhor. Até amanhã.
Assim que ele sai, desligo o computador, arrumo minha bolsa e ando até o ponto de ônibus. Hoje está vazio, por isso fico receosa de ficar aqui sozinha. Já faz dez minutos que estou esperando o ônibus e nada. Não sei por que hoje está demorando tanto. Meu coração acelera quando três rapazes se aproximam. Ansiosa, mando uma mensagem para Bia, mas ela não visualiza. Ainda deve estar no trabalho. Mando outra para Lipe, que também não visualiza. Parece que hoje não estou com sorte. Guardo meu celular na bolsa rapidamente.
— Oi, gatinha. — diz o mais velho — Sozinha no ponto. — Me rodeia e minhas mãos tremem. — Precisa de alguma coisa? Uma companhia?
— Estou bem, obrigada. — Tento soar o mais calma possível, mas por dentro já estou em pânico.
— Nós três adoraríamos te fazer companhia. — O rapaz mais alto passa a mão em meu cabelo.
— Você pode parar, por favor? — Minha voz sai embargada.
— Mas só queremos nos divertir. Tenho certeza que vai gostar. — O mais velho dá um passo, se aproximando mais. Ele fede a bebida barata, e seu odor me enjoa.
Fecho os olhos com força, tentando reunir forças para fugir ou gritar por ajuda, e quando os abro, meu coração se enche de esperança. Vejo de longe um carro familiar se aproximar e, instantes depois, a porta é aberta e Felipe sai.
— Afastem-se dela agora! — grita.
Lipe chega empurrando o rapaz para longe de mim, e ele cai de bunda no chão, resmungando. O segundo tenta avançar nele, mas um soco atinge seu nariz em cheio. Notando que não têm a menor chance, eles saem correndo e entram na primeira viela que encontram. Felipe se vira para mim e me abraça forte.
— Está tudo bem agora, estou aqui com você. Ninguém vai te fazer mal, eu não vou deixar — diz, me apertando em seus braços. — Vamos, vou te tirar daqui.
Estou com tanto medo. Não consigo nem agradecer, as palavras não saem. Lipe me conduz para dentro do carro, e quando estamos no meio do caminho, enfim consigo me controlar.
— Muito obrigada, se você não tivesse chegado... Não quero nem pensar nisso. Você me salvou. Foi meu herói, como sempre. — Forço um sorriso. Minha cabeça ainda está atordoada com tudo que aconteceu.
— Não precisa me agradecer, docinho. Peço desculpas por não ter visto sua mensagem antes. Ainda estava fechando a loja. Mas o bom é que fica bem perto do seu trabalho. Não teria me perdoado se tivesse acontecido alguma coisa com você, Ana. — Lipe me olha rapidamente e volta a atenção à estrada.
O restante do caminho ficamos em silêncio. Eu não sei o que mais dizer para ele nesse momento. Lipe me salvou, e não foi a primeira vez.
— Chegamos. Tente descansar bem. A noite foi muito tensa. — Ele beija minha testa; um gesto tão simples que significa tanto para mim.
— Obrigada novamente, meu herói. — Dou um beijo em sua bochecha e ele sorri.
Entro e vou direto para o banheiro tirar essa roupa e tomar o banho mais longo da minha vida. Estou me sentindo suja. Depois, vou direto para a cama sem nem jantar. Fico mexendo no celular e agradecendo aos céus por não ter acontecido nada comigo. Bloqueio o celular para tentar dormir, mas assim que o coloco em cima do criado-mudo, ele apita, avisando que chegou uma nova mensagem, e quando olho para a tela, vejo o nome de Lipe.
Felipe
Estou terminando de fechar a loja e ligar os alarmes quando sinto meu celular vibrar. Mas não o pego na hora, pois quero terminar de fechar tudo primeiro. Não posso me distrair e acabar deixando algo passar. Não faz muito tempo que subi de cargo, e nessa loja há muitos carros de luxo. Não dá para vacilar. Quando tudo está terminado e entro em meu veículo, puxo o celular do bolso e leio a mensagem.
"Você pode me ajudar? Estou sozinha no ponto. Estou com medo."
Jogo o aparelho no banco do passageiro e saio o mais rápido possível do estacionamento. Parece que a estrada não tem fim. Quanto mais rápido tento chegar até Ana, mais distante parece que ela está. De longe a vejo no ponto, mas ela não está sozinha. Há três homens a cercando; um deles muito perto dela. É impossível não perceber como está com medo. Meu coração se aperta.
— Afastem-se dela agora! — É a primeira coisa que grito ao sair do carro.
Confesso que as coisas saíram do controle. Eu preciso proteger Ana, e se isso significa enfrentar três homens sozinho... É o que eu farei.
Quando eles fogem e Ana começa a chorar, puxo-a para meus braços. Eu odeio vê-la chorar. Gosto de vê-la sorrindo, brincando. Feliz.
— Está tudo bem agora, estou aqui com você. Ninguém vai te fazer mal, eu não vou deixar. — E cada palavra foi sincera.
Tudo que quero é manter Ana em meus braços e protegê-la do resto do mundo. Ela sempre foi tão doce, frágil, e linda... Tão linda. Afasto esses pensamentos. Ana é minha amiga, nada mais que isso. Eu não posso amar, e ela é demais para mim. Jamais arriscaria perdê-la. Já não sei mais viver sem Ana ao meu lado.
— Vamos, vou te tirar daqui.
A conduzo até o carro, e por todo o caminho ela me agradece. Tento parecer calmo, mas por dentro a adrenalina ainda corre solta. Assim que paro em frente a sua casa, me despeço e peço para que ela descanse. E mais uma vez ela me chama de "meu herói". Eu gosto disso. Gosto de ser o herói de Ana. Nunca contei a ela, mas escolhi a casa ao lado só pra poder ficar mais perto dela. Porque quando estamos juntos, sinto que sou a melhor versão de mim mesmo.
Em casa, tomo um banho e preparo algo para comer. E enquanto cozinho, minha cabeça está a mil. Tenho que fazer algo para que isso não se repita. Não posso deixar ela correr esse risco sempre que sair do serviço. Subo para o quarto, pego meu celular e mando mensagem pra ela, que não demora a responder.
Lipe: Oi, docinho. Pode conversar?
Ana: Claro. Aconteceu alguma coisa?
Lipe: Tive uma ideia. Quero saber o que você acha.
Ana: E qual ideia foi essa? Não foi de abrir uma casa de stripper de novo não, né?
Lipe: Kkk não. Aquilo foi brincadeira. Já te falei isso várias vezes. Agora, falando sério, nosso trabalho é perto e saímos no mesmo horário... quero passar no seu e te trazer pra casa, assim não fica esperando ônibus. O que acha?
Ana: Eu não quero incomodar você.
Lipe: Você nunca me incomoda, Ana. Quantas vezes vou ter que repetir? Começamos amanhã. Me espera dentro do prédio. Quando te mandar mensagem, você sai.
Ana: Tudo bem, muito obrigada. Boa noite.
Lipe: Boa noite. Sonhe com coisas boas. A melhor de todo o mundo sou eu, então sonhe comigo.
Ana: Pode deixar, senhor convencido.
Leio a última mensagem com um sorriso no rosto e possa imaginá-la rindo enquanto escrevia isso. Bloqueio o celular. Agora mais tranquilo, já posso me deitar e dormir.