Vida que segue
A jovem estava parada em frente ao colégio, observando a fachada e os alunos entrando. Um porteiro vigiava tudo e o alvoroço era grande, por ser o último dia de aula. Ela espera seus colegas de classe, George, Lucy e Megan.
Lembrou-se do primeiro dia em que chegou ali, toda contrita, com receio por estar em uma escola nova e totalmente diferente do antigo instituto. Subiu aquelas mesmas escadas e logo no corredor dos armários, um aluno barrou a passagem dela, olhou em seus olhos e comentou com ironia:
— Olha só, mais uma nerd careta para enfeiar a escola?
Ela não teve dúvidas, prometera a si mesma que, nunca mais iriam tratá-la como uma qualquer e fechando o punho, acertou com força o rosto do menino, que voou longe.
Rapidamente ela saiu dali e dirigiu-se à recepção para saber onde era sua sala. O menino nunca mais mexeu com ela e a história foi comentada a boca miúda, pois o tal aluno era do time de futebol e um dos mais assediados pelas meninas.
Já faziam três anos e ela estava atrasada um ano na escola, mas finalmente se formaria. Sua vida não era fácil, sua família a rejeitara e ela precisou arrumar um emprego e custear suas necessidades da melhor forma possível.
Seus colegas chegaram e ela saiu de seus devaneios e entraram. Assim que a última aula terminou, os alunos fizeram uma bagunça de confraternização, trocaram endereço e telefone e alguns transformaram a blusa do uniforme em porta autógrafos e saíram do colégio todos rabiscados.
Mia não podia se dar a esse luxo, pois saiu direto para a mercearia onde trabalhava. Aquele emprego foi a sua grande oportunidade, pois com apenas quinze anos e um bebê para cuidar, quem a empregaria. Além disso, ela alugou uma quitinete na vizinhança, que pagava com a pensão que recebia pelo bebê.
— Boa tarde Jimmy, o seu Nestor já chegou? — Perguntou ao vigia.
— Ainda não, Mia. Mas você está adiantada, não quer almoçar primeiro? — Respondeu, Jimmy.
— Sim, vou dar um pulo em casa e já volto.
Foi rápido para casa, entrou e trocou o uniforme pela roupa de trabalho. Comeu um sanduíche e saiu. Seu filho já estava com três anos e ficava em uma creche até às seis da tarde e uma babá ficava com ele até às oito da noite, quando terminava seu turno.
Sua vida mudou drasticamente desde que descobriu que estava grávida. A única pessoa que sabia o que ela havia passado, foi a mesma que, para proteger a instituição, a expulsara.
A Alcateia a qual pertencia, não aceitou uma adolescente grávida sem estar acasalada sem sequer ter se transformado ainda e seu pai, acatando a opinião dos outros, a expulsou de casa e o Alfa a expulsou da Alcateia.
Ainda não completara dezoito anos e também não tivera sua transformação. Seu pai era o Beta e sua mãe era a bruxa curandeira da Alcateia e por isso, aos seis anos tinha sido enviada para o instituto, onde estudou até aos quatorze.
Aprendeu muita coisa no Instituto, mas seus poderes só seriam liberados, quando sua loba saísse e nem sinal dela.
A cidade onde se instalara, ficava próxima a rodovia interestadual e muitos viajantes paravam ali para descansar e foi assim que entraram dois clientes no mercadinho naquela tarde.
— Jane, pegue a comida que eu pego as bebidas.
— Não pegue nada alcoólico, heim Josué, estamos dirigindo.
Mia estava em seu lugar no caixa e ao ouvir aquele nome, seu coração palpitou pela lembrança do colega que sempre a alertou e protegeu, no instituto.
A jovem de nome Jane, colocou as compras na esteira e Mia começou a registrar, Josué chegou logo a seguir com um engradado de água e alguns refrigerantes. Quando ele foi pagar, olhou para o rosto da caixa e parou com o dinheiro no ar.
— Mia? É você mesma? — Ele a reconheceu.
— Oi, Josué, sou eu sim, como vai? — respondeu, pegando o dinheiro.
— Estou bem, mas e você, o que faz nessa cidade? Sua casa não era no sul? — Ele queria perguntar muitas coisas, mas o lugar não permitia.
— Eu moro aqui, agora, toma aqui o seu troco. Foi um prazer revê-los, boa viagem. — Dispensou-os, pois tinham clientes atrás, esperando para serem atendidos.
— Foi um prazer também, tchau. — Despediu-se ele.
Josué saiu inconformado, olhou para sua irmã e perguntou:
— Você lembra dela?
— Não é aquela menina que ficou grávida no instituto? — Perguntou Jane, lembrando da maledicência que ocorreu na época, por todo o colégio e que gerou a expulsão dela.
— Sim. Eu avisei tanto a ela sobre aquele traste do mestre Natanael e no final a única prejudicada foi ela. Nunca mais tive notícias e eu gostava tanto dela. — Por mais que tentasse, Josué não se conformava de ir embora sem saber mais sobre Mia.
-— Pela sua cara, já até sei o que quer fazer. Espera um instante.
Jane foi até o vigia do mercadinho e perguntou que horas fechava o estabelecimento e voltou.
— Eles fecham daqui a duas horas, quer esperar? Eu topo, também estou curiosa.
— Tá, vamos dar uma volta pra passar o tempo.
**
Mia fechou o caixa, pegou sua bolsa e a sacola com as compras que fizera e se despediu para sair, quando ouviu um gritinho:
— Mamãe, mamãe!!!
Ela foi em direção ao menino de cabelinhos loiros e lisinhos, que balançavam conforme corria e abaixou-se para abraçá-lo com bolsas e tudo.
— Oi, meu amor, você veio buscar a mamãe, foi? Que gostoso. — falou enquanto o abraçava.
— Eu vô levá você pa casa. — falou fazendo bico.
Josué e Jane observavam a cena, admirados.
— Então ela teve o bebê e pelos cabelos loiros, é filho do traste do mestre Natanael, mesmo. — murmurou Jane.
Mia levantou-se, agradeceu a babá e já ia em direção a sua casa, quando ouviu chamarem seu nome. Quando se virou, suas feições mudaram, não queria o passado batendo em sua porta.
Esperou que eles se aproximassem e dissessem o que queriam. Era fácil de adivinhar, mas não facilitaria, não precisava dar satisfação de sua vida para ninguém.
— Desculpe te abordar assim, mas não pude ir embora sem sabermos mais sobre você — esclareceu Josué.
— É porque vocês querem saber mais, curiosos com a vida da menina que se comportou mal e foi expulsa? — Perguntou, já nervosa.
— Não nos entenda mal, Mia. Na época, não gostamos do que aconteceu, até te procuramos para te apoiar, mas não te encontramos.
— Mamãe, casa mamãe…— seu filho já estava impaciente por estar parado ali, então ela achou melhor convidá-los para sua casa, pois pelo tanto que eles esperaram, não iriam embora sem explicações.