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Eu simplesmente não posso voltar e ter minha vida controlada pela minha família. Eu não me importava com isso aos 15 anos porque era apenas uma criança, mas aos 24 é insustentável.
Fazendo o papel de uma verdadeira contorcionista do Cirque du soleil, pego minha escova de dentes da tigela na pia, volto para o chuveiro frio, tomo um banho para renovar as energias e começar a segunda-feira com o pé direito.
De volta à sala, ligo o telefone para tocar um podcast cujo episódio se chama "A primeira impressão é a que fica".
"Você precisa causar impacto", diz Urymen, e meu sorriso se alarga. — A vida acontece num piscar de olhos, Nova York tem letreiros multicoloridos que roubam sua atenção, tem gente vendendo ouro na rua... você precisa chamar a atenção e se destacar em meio a esse turbilhão de informações.
Eu até sinto um arrepio na espinha ouvindo a voz grossa e um pouco rouca desse homem.
Ele tem sido meu guru pessoal todo esse tempo e em breve ele será meu chefe ou meu nome é Tina Camila Gonzales Buendía.
O podcast do Sr. Urymen anunciava uma vaga de assistente de criação em sua empresa.
Liguei o laptop, imediatamente enviei o currículo para o e-mail disponível e em meia hora recebi a resposta de sua secretária: entrevista marcada para segunda-feira às 7h.
Estou esperançosa porque Brian Will Urymen não é apenas a voz sensual no meu celular. Ele foi meu professor favorito em Columbia por dois semestres. E trabalhei no laboratório dele produzindo campanhas publicitárias, tive muitas oportunidades sendo seu aluno.
Infelizmente já me formei sim infelizmente porque ainda não tenho emprego na área e a dívida estudantil está batendo na minha porta. E no mundo real, ao contrário do estrelato acadêmico, tenho que começar do zero. Às vezes é ruim ser tão comum.
“Esteja sempre pronto para viver o dia como se fosse o último”, o celular toca e repito em voz alta, porque já o sei de cor. “Confie em suas palavras como se você fosse ficar sem palavras. E comece a agir agora como se estivesse prestes a entrar em coma nas próximas horas.
Agradeço a Deus por ter arrumado minhas roupas para a entrevista de emprego ontem à noite. Fico tão distraída e sonhando acordada ouvindo o homem no celular que saio da realidade.
Estou usando uma blusa branca por baixo do suéter laranja, uma saia que cobre minhas panturrilhas. Deslizo as meias pretas pelas minhas pernas e calço sapatos baixos da mesma cor.
Antes de sair, vou até o pequeno altar no centro da sala e acendo algumas velas. Venho de uma família mexicana muito religiosa, gosto de sentir essa conexão espiritual porque me conecta com minhas raízes e me conforta.
— Santa Inês — Dou as duas mãos e peço a proteção da padroeira das virgens. "São Judas." Faço uma rápida oração ao santo das causas impossíveis. — Santo Antônio — Rezo também ao santo dos pobres, padroeiro da minha família.
Num suspiro em que meus lábios tremem, digo em voz alta com os olhos fechados:
“Por favor, peço um milagre. Não quero voltar para o Arizona, não quero me casar com o velho Kill, então, por favor, me dê essa chance. Eu sei que Deus conhece meu destino desde o dia em que nasci, deixe-me ir do jeito que ele quer que eu seja feliz, em nome de Jesus, amém.
Uma sensação de alívio toma conta de mim, como um forte abraço de pai e mãe, algo que nunca tive, mas sinto cada vez que falo com Deus.
“Amém”, repito e me levanto, balançando os joelhos.
Corro para a janela do apartamento que dá para o prédio vizinho e grito:
— Acorde e cuspa, Ângela Rosi!
Eu rio para mim mesma e pego minha bolsa e bolsa para sair de casa. O podcast para de tocar porque recebo uma ligação.
Rezo silenciosamente para que não seja a vovó.
Com um suspiro forçado, agradeço a Deus e aos santos por já terem começado o dia com um milagre.
— Acorde para cuspir, Tina Camila — diz Ângela Rosi, minha vizinha construtora de janelas, ao telefone e ri muito. "E então eu vi você rezando." Foi para conseguir um marido rico? As probabilidades são de 0,001%, estou à frente.
— Que marido, Ângela Rosi. Aperto o botão do elevador freneticamente, mas nada acontece. “Eu estava orando para que Deus tocasse o coração do Sr. Urymen e me desse uma chance. Só isso.
"Eu vi a foto desse homem quando você o mencionou", ele suspira. — Eu queria tocar outra coisa — ele ri.
- Fechar! Minha risada desaparece rapidamente. — O elevador não quer subir.
"Esse seu prédio sempre tem um problema, é incrível!" Quando não é um vazamento, é um bloqueio, quando não é um bloqueio, é uma porta rangendo, quando não é, é o elevador que não está funcionando. eu creio !
“Mas é o que você pode pagar. Decido subir as escadas.
O elevador do meu vizinho funciona e deve haver água quente na primeira vez do chuveiro. No meu prédio... bem, é a mesma coisa, só que ao contrário.
- Vejo você lá embaixo. - diz Ângela Rosi e desliga.
Não vou deixar nada me atrasar para esta entrevista. É a primeira vez em muito tempo que me ligam e desta vez tudo tem que ser perfeito. Todos os meus colegas conseguiram empregos em grandes agências. A maioria deles vinha de famílias ricas e outra parte possuía o famoso QI, o Quem Indica.
Trabalhei na faculdade, fiz aulas extras, fiz estágios gratuitos e participei de campanhas publicitárias que deixam meu currículo ótimo, só que infelizmente não tenho experiência fora da Columbia e não conheço ninguém que possa me ajudar/indicar para um trabalho.
a ajuda financeira da vovó e as campanhas publicitárias que faço para mercados de bairro, salões de beleza e outros pequenos negócios. A conta no final do mês é sempre apertada, mas eu sempre consigo.
O Sr. Urymen, no entanto, conhece meu trabalho. Ele sabe que eu sou eficaz no que me proponho, ou pelo menos espero que ele se lembre disso, já que foi há muito tempo.
Tina Camila Gonzales
Um turbilhão de emoções me consome enquanto desço cada degrau e faço algumas pausas para respirar.
Crescendo em um lar muito cristão e conservador, minha família incutiu em mim três coisas:
1) é necessário ser virgem e puro até o casamento;
2) a felicidade está em encontrar um homem (temente a Deus) e se casar;
3) você nasceu para ajudar nos negócios da família (uma rede de mercearias) e para ser a mulher da casa.
Sim, isso é tão ruim quanto parece.
Claro, todos se assustaram e me chamaram de todos os nomes que podiam quando fui aceita na Columbia, meus tios até exigindo que eu fosse deserdada e jogada na rua. Mas convenci Abuelita de que com um diploma em marketing ela poderia ajudar nos negócios da família.
E eu realmente ajudei. Três anos atrás, os supermercados estavam ganhando pelo menos 150% a mais do que antes, e eu provei que o treinamento pode funcionar.
“Você está ficando velha, minha filha, e sua vida em Nova York não deu certo. Então volte para sua avó para consertar tudo.” Sua voz assombra meus pensamentos.
No podcast, Brian Will Urymen diz o contrário:
- Corra atrás dos seus sonhos. Contra tudo e contra todos. Há uma voz dentro de você que lhe pede para ir além do que lhe foi imposto durante toda a sua vida. Essa voz é a felicidade. Siga-o, caso contrário você pode se arrepender no futuro!
Ofegando e ouvindo um anjo e um demônio em cada lado do meu ombro, desci as escadas tossindo e sem fôlego.
- Alô - Ângela Rosi me espera na porta, que se abre para mim.
o cabelo preto sopra um pouco ao vento e me dá o melhor e mais encorajador sorriso do mundo. Ângela Rosi é alguns anos mais velha que eu, mas me adotou como filha. Ela cuida de mim e me trata super bem, diferente de todo mundo que eu já conheci.
"Oi", eu digo a ela animadamente, beijando sua bochecha. — Por que você desceu?
- Aqui. Ele me entrega uma xícara de café e um sanduíche de sanduíche. — Boa sorte com a entrevista de emprego e espero que tudo corra bem! Cruze os dedos, todos sorrisos.
"Você é um anjo, amigo!" — Dou vários beijos no ar e enlouqueço para pegar o metrô.
Por um milagre divino -talvez Santa Inês esteja realmente me ajudando- consigo chegar a tempo e me sentar em um banco vazio. Coloco os fones no ouvido e ouço novamente o podcast sobre "primeiras impressões".
“As pessoas precisam saber quem você é por causa da sua postura. Sua apresentação começa quando você chega no local.. .
A voz masculina me dá arrepios.
Bebo o café que Ângela Rosi fez para mim e como o sanduíche para fazer meu estômago parar de roncar. Agora me sinto revigorado, pronto para conquistar este trabalho.
Hoje tenho uma oportunidade de ouro.
Vou ao Urymen-Potter's na Quinta Avenida, onde só trabalham gente grande e milionário. Estou me candidatando a um cargo de Assistente Criativo na Urymen Think Technology Inc., de propriedade e CEO de Brian Will Urymen, meu ex-professor.
Tenho boas lembranças da faculdade graças a ele.
O homem era simplesmente incrível, um gênio, capaz de vender areia no deserto ou água no meio do mar.
Antes de fazer a aula dele eu tinha muito medo porque diziam que ele era mal educado, carrasco e arrogante, e quer saber? Isso era um fato. Mas ele foi o melhor professor que eu já tive, sem dúvida.
Ele me desafiou, me deu os trabalhos mais difíceis e trouxe o melhor de mim. Não tenho dúvidas de que, se você me der uma chance, as coisas serão assim novamente.
Saio do carro e termino meu café.
Começo a correr porque o tempo não está a meu favor.
Na calçada, a duas quadras do meu destino final, ensaio:
“Bom dia Professor Brian Will. Lembra de mim? — Pausa para um sorriso no ensaio improvisado. “Aqui está minha pasta. Como sabem, sou uma aluna exemplar, muito dedicada e disciplinada. Eu sei que a posição exige experiência na área, mas como vou conseguir experiência se nunca tiver a oportunidade? Eu pisco, como um cachorrinho que caiu de um caminhão em movimento. “Então, por favor, professor, me dê essa chance e eu não vou decepcioná-lo. Você sabe disso...
Sou interrompido por um aguaceiro que molha meu cabelo e todas as minhas roupas.
Enquanto me dou um tapa e tento me livrar da umidade, vejo o Lexus RX preto que passou por uma poça e me molhou, dirigindo para estacionar em frente a um prédio espelhado.
-Idiota ! Filho da puta! Foda-se! — Falo em espanhol e vou atrás do desgraçado, cheio de ódio.
Quando me aproximo, o veículo abre a porta, paro de xingar e cubro minha boca.
sapato social oxford preto brilha tão novo quanto parece. As calças são justas, os ombros do terno são bem largos e os braços preenchem bem a roupa, mostrando o porte atlético do homem.