Capítulo 2. Fuga
A loba dourada, depois de pular pela janela, seguiu em disparada em direção à floresta. Precisou passar pela estrada, no vale e quase foi atropelada por um carro solitário, que seguia em alta velocidade. Mas estava focada em chegar à floresta e não parou nem quando conseguiu chegar.
Correu, correu, sem pensar e sem ligar para a dor que sentia. Desviava das árvores e parecia saber onde ir. Após uma hora de corrida desenfreada, diminuiu o ritmo, levantou as orelhas e parou escutando e farejando o lugar. Ouviu som de cachoeira e sentiu o frescor das águas. Estava em um aclive da montanha e seguiu o som, chegando à beira de uma lagoa, formada pela queda d'água, que seguia como formando um rio.
Foi até a beira d'água, lavou o focinho e molhou a boca. Tentou beber um pouco, mas a dor ainda era intensa. Estava exausta e precisava de um lugar para descansar. Olhou a sua volta e lembrou das aulas de geografia, quando o professor comentou que atrás de algumas cachoeiras, encontravam-se cavernas ou grutas, onde escondiam-se animais.
Foi andando pela margem, subiu em umas pedras, chegando bem ao lado da queda d'água. Olhando por ali, viu que realmente havia uma caverna, pulou através das águas e tocou as patas no solo amolecido pela água. Adentrou a caverna procurando um local seco para deitar. Parecia bem profunda e escura, mas sua visão conseguia ver tudo. Achou uma reentrância na parede e ali se deitou enrolada, adormecendo imediatamente.
Ainda não tinha amanhecido quando três lobos encontraram ela. Farejaram confirmando ser da mesma raça, fêmea e muito ferida. O que parecia mais velho, se afastou um pouco para a entrada da caverna, tirou um celular do bolso e logo falou com alguém.
— Sabe o que Alfa, encontramos uma loba na caverna, bem na saída das terras humanas, está bem ferida e parece desmaiada. Levo ela?
— "Tem ideia de qual Alcatéia é?"
— Seus pelos são dourados Alfa.
Do outro lado da linha, o Alfa passa as mãos nos cabelos e solta um xingamento. Volta ao telefone.
— "Então sabemos de onde é, o mistério é o que está fazendo aí. Traga-a para cá, cubra-a com a manta da pickup, entre pelos fundos e leve ao consultório. Vou chamar o médico. Até. "
— Até chefe.
Com a ajuda dos outros dois, levou a loba, já enrolada na manta, para a pickup e foram em direção à casa do Alfa. Fez como lhe foi ordenado e deixando-a na maca. Saiu para informar o Alfa.
Enquanto isso, o médico chegava ao escritório, pronto ao atendimento, pouco depois chegou a informação.
— Obrigada, Bêne, leve o doutor lá para examiná-la. Depois me dê o diagnóstico doutor, por favor.
Bêne é o capitão da guarda que patrulha a Alcateia do Sul. Ele estava de guarda esta noite para treinar um novato e foi justo o novato que sentiu o cheiro da fêmea. Em todos os anos de trabalho na patrulha, Bene nunca tinha visto algo assim. Dificilmente alguém atravessava a caverna, do lado humano para o sobrenatural e vice-versa. Seja lá quem for essa loba, a verdade é que foi muito maltratada, causando feridas profundas e mexendo com seu psicológico.
O médico entra na enfermaria montada na casa do Alfa e aproxima-se do leito. Olha a loba desacordada e a primeira coisa que percebe é a demasiada desnutrição. Coloca o suporte para soro próximo a loba, lava as mãos e põe as luvas, separa o material e insere a cânula e conclui todo o procedimento.
Com hidratação e nutrição, o organismo curará mais rápido. Ele aproveitou para verificar seus ferimentos, examinou sua dentição, abriu suas mandíbulas e identificou as queimaduras em toda extensão interna, do focinho à garganta. Vai até sua maleta e pega um spray que aplica em toda extensão das queimaduras.
Tira as luvas e sai para falar com o Alfa. Bateu na porta do escritório e após autorização, entrou e sentou-se na cadeira de frente a mesa onde se encontra o Alfa.
— Gostaria de ter notícias melhores meu Alfa, mas não.
— A loba está tão mal assim?
— Ela está muito desnutrida, fraca e ferida. Nota-se claramente que foi espancada violentamente. Forçaram ela a ingerir algo muito quente que queimou o interior de seu focinho até a traquéia. Se não a encontrassem, com certeza morreria, pois seu corpo debilitado, não consegue regenerar-se.
— O senhor tem certeza que ela foi torturada, doutor? — Perguntou o Alfa.
— Sim. E acho que ela não aguentou, se transformou e matou seu agressor. Encontrei pedaços de carne em seus dentes e pelo odor, é humana. — Informou o médico.
— Ela foi abusada, doutor?
— Pelo menos isso, não.
— Vim falar-lhe enquanto dá tempo do soro fazer efeito, para podermos acordá-la, vem comigo? — Chamou o medico para que o Alfa service de testemunha.
— Vou sim doutor, quero dar uma olhada nessa loba. Só preciso fazer uma ligação antes.
O médico continuou sentado esperando o Alfa ligar. Se admirou ao reconhecer com quem ele estava falando.
— Alfa Geofrei, não desligue, é muito importante… sim, é importante… bom dia para você e sua família. Tenho aqui em minha casa, uma loba dourada, está muito ferida e foi encontrada na saída da caverna do lado humano. Você gostaria de dar uma olhada? — Perguntou ele, ao Alfa da Alcateia dos lobos dourados.
O Alfa afastou o celular do ouvido, o alfa do outro lado da linha gritava.
— Eu só pensei que o senhor gostaria de confirmar se é da sua alcateia ou mesmo sua filha.
Agora o outro lado ficou mudo.
— "Estou indo até aí com minha luna, prenda os cães."
Desligou deixando um alfa enfurecido do lado de cá. Levantou-se xingando e chamou o médico para irem ver a loba.
Ao chegarem lá, o médico foi na frente. Quando o Alfa entrou…
— MINHA!!!!
O médico espantou-se com a declaração do alfa, dura coisa será ter essa loba quebrada como companheira. Notou que já havia uma melhora, se aproximou mais, puxou o lençol sobre ela e a chamou:
— Lobinha, ei lobinhaaaaa, acooorda…
Deu uma leve sacudida em seu ombro e chamou novamente:
— Vamos lá, querida, agora estás a salvo, acorde…
Ela começou a mexer os olhos e gemeu. Levou as patas ao rosto e pareceu assustar-se. Abriu os olhos e agitou-se.
— Calma, você só precisa pensar em você na forma humana.
De repente, ali estava, uma jovem assustada, com os olhos arregalado, encolhendo-se assustada.
— MINHA!
— meeeeellluu
Ela nem sabia porque tinha dito aquilo, mas seu coração estava acelerado e seu narizinho identificou o cheiro mais gostoso do mundo: bife com batata frita! Esse aroma maravilhoso lhe abriu o apetite e ela gemeu, pensando no ardor que ainda sentia em sua garganta.
O médico, sorrindo, carinhosamente iniciou um colóquio:
— Eu sou o doutor Jairo, estou cuidando de você, desde que trouxeram você. Se me permitir, continuarei o tratamento para que fique logo curada.