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Capítulo 5 A pintura falsa

Às seis da tarde, Vitor e Camila saíram da delegacia de trânsito.

Camila estava visivelmente abalada, com os ombros tensos e os lábios tremendo ligeiramente. Para tentar obter um tratamento mais brando, ela assumiu a responsabilidade logo ao entrar. Não mencionou que Vitor havia tentado tomar o volante, apenas expressou sua disposição em assumir toda a culpa. Estava disposta a aceitar qualquer consequência, fosse pagar uma multa ou enfrentar processos judiciais.

Mas os policiais olharam para ela de maneira estranha, informando que ela e Vitor não tinham nenhuma responsabilidade na ocorrência. O acidente havia sido causado pela explosão de um pneu antigo do caminhão. Os policiais ainda mostraram o registro de segurança, elogiando a rápida reação de Vitor. Se não fosse por sua decisão rápida, eles teriam sido mortos no local.

Camila ficou boquiaberta. Seus olhos se arregalaram e a boca se abriu em um 'O' de surpresa. Percebeu que não só havia culpado Vitor injustamente, mas também lhe devia um agradecimento. Se não fosse por ele, ela poderia estar morta.

Ao entrar no BMW, Camila queria se desculpar, mas não conseguiu baixar a guarda. Finalmente soltou um grunhido:

— Fico aliviada que o acidente não tenha sido sua culpa, senão você estaria em grandes problemas.

Vitor já estava acostumado com a postura desafiadora da família Marinho e respondeu, mantendo a voz calma, mas com um leve toque de ironia:

— Entendido, terei mais cuidado na próxima vez.

Camila havia assumido a culpa por ele, o que aqueceu o coração de Vitor. Mesmo com todas as desconsiderações de Camila, ela ainda o protegia internamente. Ele observou-a de soslaio, sentindo uma pontada de gratidão. Depois, ele acariciou gentilmente a caixa preta que segurava em suas mãos. A caixa havia caído do Audi e tinha o código 9981. Fabiana havia ligado especificamente, pedindo aos policiais para entregar a caixa a Vitor. Ela também insistiu para que ele a aceitasse.

Vitor não se mostrou tímido. A vida da Cecília naturalmente merecia um presente assim. Pensar nela trazia uma preocupação visível aos seus olhos. Uma coroa branca havia reparada parcialmente a alma de Cecília, mas não era suficiente para ajudá-la a superar os perigos. Ele planejava visitá-la nos próximos dias.

Ao ouvir Vitor, Camila virou o volante com força, sinal de sua irritação, e saiu.

— Você está finalmente ficando mais maduro. — Comentou, irritada.

— Camila, na verdade, não estou falando besteira. Você tem uma energia negativa que pode causar-lhe um desastre sangrento. O acidente foi apenas uma prova... — Vitor desviou seu olhar do horizonte e, aproveitando o humor mais relaxado de Camila. Ele advertiu. — Você deveria jogar fora aquele amuleto budista.

— Cala a boca! — O rosto da Camila escureceu imediatamente, seus olhos se estreitaram de raiva. — Você pode parar de falar besteiras? Este é um amuleto que a mãe comprou nas férias. Você acha que a mãe queria me machucar?

— Não é isso que eu quis dizer, talvez a mãe também tenha sido enganada... — Vitor rapidamente negou, levantando as mãos em um gesto de defesa.

— Basta! Quando estamos de férias, ninguém conhece ninguém. Quem teria motivos para enganar minha família? — Camila desabafou, encerrando o assunto. — O acidente foi apenas um acidente, e o desastre sangrento é pura fantasia. Você não deve falar mais sobre isso comigo, senão você pode sair do meu carro.

Para ela, Vitor estava apenas buscando atenção.

Vitor ficou desanimado e não disse mais nada para não desagradar Camila, enquanto pensava em como ajudar a resolver a situação. O amuleto ainda estava absorvendo a sorte e a vida de Camila, e em dez ou quinze dias, ela enfrentaria novamente a ameaça da morte. Ele precisava resolver isso rapidamente.

Meia hora depois, o BMW vermelho parou na entrada do Hotel Fênix.

“Por que aqui?”, Vitor pensou, enquanto franziu a testa em confusão. Mas logo se lembrou de que era o aniversário de cinquenta anos de seu sogro, Carlos Marinho.

Os membros da família Marinho haviam reservado um banquete no Hotel Fênix para celebrar.

— Esqueci que é o aniversário do pai, vou comprar algo...

Vitor havia enfrentado muito desdém ao longo do ano, mas, afinal, era um dia especial para o sogro, e ele deveria mostrar alguma demonstração de apreço.

— Não é necessário, eu já comprei. Hoje, Carolina e os outros também virão, é melhor você não falar muito, senão vai envergonhar a família.

Camila abriu o porta-malas, tirou uma caixa de presente e entrou no hotel sem olhar para trás. Vitor pensou por um momento e pegou a caixa preta que Fabiana havia enviado. Embora ainda não tivesse aberto, sabia que Fabiana a havia dado como um presente de agradecimento por salvar a filha dela, então devia ser adequado para oferecer ao sogro.

Logo, Vitor seguiu Camila até o salão e percebeu que a família Marinho havia convidado muitos parentes. Cerca de trinta pessoas estavam sentadas em três grandes mesas redondas, o ambiente estava animado.

A irmã mais velha de Camila, Carolina Marinho, e o espouso, Gustavo Valente, também estavam presentes. Mas o sogro Carlos e a sogra, Lorena Rocha, ainda não haviam chegado, e a irmã mais nova de Camila, Clara Marinho, estava estudando no exterior e não poderia voltar por enquanto.

— Camila, você finalmente chegou. Hoje é o aniversário de cinquenta anos do pai, por que chegou tão tarde? Embora os pais sempre tenham favorecido você, você também deve se importar, não é mesmo? — Ao ver Camila e Vitor aparecerem, Carolina e os outros se juntaram, falando animadamente. Eles nem olharam para Vitor.

Vitor também não se importou. Mas Gustavo, como de costume, começou a provocar:

— Vitor, hoje é o aniversário de cinquenta anos do pai, e aí, o que você trouxe de presente? Não me diga que é o mesmo que a Camila comprou, hein? Você se mete na casa da família Marinho, come o que tem na panela e gasta o que eles têm. Num dia tão importante assim, não seria hora de mostrar um pouco de gás, mesmo assim? Espero que você não tenha chegado sem nada nas mãos, cara.

Ele olhou para Vitor com um sorriso irônico, com desdém nos olhos.

Apesar de Carolina ser uma mulher bonita, ela não se comparava a Camila. Portanto, via Vitor, que havia conquistado a mulher mais desejada, como uma pessoa desagradável.

— Eu trouxe um presente. — Vitor respondeu calmamente, com um olhar firme.

Camila ficou surpresa. Quando o policial entregou a caixa a Vitor, Camila não estava ciente disso.

— Você trouxe um presente? — Gustavo riu, com um tom de zombaria. — Deixe-me ver, o que você comprou?

Sem esperar pela reação da Camila, Gustavo avançou rapidamente e pegou a caixa preta de Vitor. E a abriu. Um ginseng brasileiro grande e desagradável, com uma cor avermelhada e uma forma que se assemelhava a um dragão, foi exibido aos olhares de todos.

— Presente? Ginseng brasileiro? — Gustavo zombou, exibindo o ginseng como se fosse uma piada. — O embrulho está desgastado, e o fruto é feio, definitivamente é de um quiosque de rua. — É mesmo, e a cor vermelha é assustadora, parece que tem algum agente químico, pode matar alguém. — Inútil mesmo, no aniversário do pai, ele traz um ginseng brasileiro que custa cinco reais?

— E mesmo se fosse um presente, deveria ser algo mais normal, esse tipo de coisa feia e vermelha é claramente um produto falso.

— Ele não está mesmo preocupado com o aniversário do pai, e ainda tem o direito de ser um “marido sustentado”? Divorcie e vá embora.

Gustavo e os parentes da família Marinho riram, mostrando desdém e repulsa. Camila estava muito constrangida, o rosto queimando de vergonha e raiva, não esperando que Vitor a envergonhasse tanto.

— Você é um inútil! — Camila resmungou com irritação, evitando olhar para Vitor.

Vitor não respondeu e apenas observou o ginseng brasileiro com surpresa. Ele nunca imaginava que Fabiana lhe daria um presente tão caro.

A falta de reação de Vitor fez com que os outros pensassem que ele estava envergonhado por ter sido desmascarado, e a sala se encheu de risadas.

— Veja o presente que eu trouxe para o pai, uma pintura do David, um dos pintores famosos do país! — Gustavo disse, com um sorriso de satisfação, enquanto mostrava o pacote que carregava. Ele abriu a embalagem, revelando uma pintura intitulada “Napoleão Cruzando os Alpes”. — Isso aqui foi um verdadeiro investimento, custou trezentos e trinta mil reais. E o valor de mercado? Pode chegar a dez vezes mais! — Gustavo continuou, claramente orgulhoso. — Até contratei especialistas para autenticar a peça. Vitor, aprenda uma coisa: quando for dar um presente para o pai, faça algo de qualidade. Não adianta vir com coisas baratas para agradar nossos pais.

Ele estava determinado a exibir seu presente diante dos parentes e, para isso, usou Vitor como um contraste para brilhar ainda mais.

Os parentes da família Marinho ficaram impressionados com o presente de Gustavo. O contraste entre o presente de trezentos e trinta mil reais e o ginseng brasileiro, que parecia algo de uma feira, era evidente. Os murmúrios de aprovação se espalharam pela sala, enquanto os olhares de desprezo voltavam-se para Vitor.

— Gustavo, devo admitir que o presente é ótimo, — Camila interveio, tentando defender Vitor, mas a frustração era clara em sua voz. — Mas o que importa é a intenção, não o valor. O que conta é o carinho.

Ela lamentou não ter notado o conteúdo da caixa que Vitor carregava antes, se tivesse visto, teria descartado o presente constrangedor há muito tempo. Camila sentiu um misto de vergonha e irritação, sabendo que sua tentativa de defesa parecia ineficaz diante da situação.

— A intenção é importante, mas precisa ser acompanhada de sinceridade. — Gustavo retrucou com um sorriso irônico, levantando uma sobrancelha. — Vocês vivem na casa dos pais, comem e se beneficiam deles. Não seria pedir muito gastar um pouco mais para alegrá-los, certo?

— É uma questão de consideração. — Carolina adicionou com um sorriso afiado, seus olhos brilhando com um toque de crueldade. — Deixe pra lá, Camila. Você já tem bastante trabalho com o Vitor, que só vive às custas dos outros.

Mais uma vez, risos e comentários cortantes preencheram o ambiente, criando uma atmosfera descontraída e sarcástica. A sala parecia ter se dividido em dois grupos: um que ria das provocações e outro que tentava ignorar o embaraço crescente.

— Vocês... — Camila disse com voz tensa, o rosto vermelho de raiva.

Apesar de ser a presidente da filial do Grupo Marinho e ganhar uma boa quantia por ano, o dinheiro era controlado pelos pais, e o que sobrava para ela era muito pouco. Presentes de dezenas de milhares de reais estavam além de sua capacidade de compra. O sentimento de impotência a consumia, e ela sentia uma mistura de raiva e tristeza ao ver sua tentativa de defesa desmoronar.

— Camila, não fique chateada. Meu presente pode não ser o mais extravagante, mas é sincero. — Vitor disse calmamente, interrompendo o murmúrio que preenchia a sala. Sua voz tinha um tom de firmeza tranquila, quase como um bálsamo para a tensão crescente. — É melhor do que um presente falso, como o quadro que o Gustavo trouxe para os pais.

A sala ficou em silêncio instantaneamente, enquanto todos processavam o comentário de Vitor.

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