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9 de janeiro 19h58 Novas idéias
Passei a tarde toda testando os painéis solares. A potência que geram é surpreendente, mas não permite ligar muitos eletrodomésticos ao mesmo tempo, pois então o consumo dispara e as baterias acabam em duas horas. Todavia, para um consumo baixo, dois freezers e o computador, por exemplo, a autonomia aumenta até quinze horas, mais ou menos. Depois, por um período de umas oito horas não posso usar os acumuladores, porque a tensão é muito baixa, e isso poderia danificar os eletrodomésticos por conta da diferença de voltagem. Segundo o fabricante, em lugares muito ensolarados, eu poderia utilizá-los vinte e quatro horas por dia, mas aqui é a Galícia, e estamos em pleno inverno, de modo que imagino que não posso ter motivos para me queixar. Além do mais, acho que não teria de suportar um corte de luz de mais de duas horas, nem durante os piores temporais de inverno.
Lúculo está um tanto surpreso com o estranho chapéu que nasceu em sua casa (porque não tenho a menor dúvida de que ele a considera SUA casa, e eu, seu bichinho de estimação), mas acho que, apesar de tudo, é um investimento muito inteligente. Esta manhã, quando voltei do escritório, enquanto preparava minha comida, fiquei ouvindo rádio. O contingente espanhol já decolou do Torrejon de Ardoz rumo a uma cidade do Daguestão chamada Buynaksk, onde instalarão o hospital de campanha. Ao que parece, os russos estão tentando distribuir as equipes sanitárias internacionais em vários locais para evitar estorvos. A região é muito atrasada e os serviços sanitários russos parecem realmente estar à beira do colapso.
Pelo visto, em alguns campos de refugiados instalados nas repúblicas vizinhas estão ocorrendo novos casos de - insistem - uma variante especialmente virulenta da febre do Nilo. Mas há jornais, como El Mundo, que falam do Ebola. Se for isso mesmo o que está acontecendo, os russos estão fodidos de verdade. Ninguém parece ter tido a precaução de organizar campos de refugiados, de modo que tanto os saudáveis quanto os infectados foram distribuídos aos quatro ventos no momento em que foram expulsos de casa pelo exército.
O pior é que muitos refugiados abandonaram o país cruzando o Mar Cáspio em pequenos pesqueiros rumo ao Irã, e, com isso, teme-se que a doença chegue ao Oriente Médio. Como se já não tivessem problemas suficientes.
Preciso fazer mais compras e pegar uns antigripais e, de quebra, visitar minha mãe e pedir que me arranje umas receitas para comprar antibióticos. Sou muito obsessivo com resfriados.
9 de janeiro 20h40 Mais notícias
A Reuters informa que três médicos colaboradores da OMS evacuados para Ramstein faleceram. Pelo visto, trata-se de uma febre hemorrágica muito virulenta, que provoca desorientação e desvarios nos afetados, com crises de agressividade, segundo o informe médico divulgado. Parece que a teoria do Ebola está ganhando peso.
10 de janeiro 11h01 Ponto de equilíbrio
Escrevo isto em uma pausa entre duas reuniões. Estou sentado em um banco do parque que fica bem embaixo do escritório onde trabalho. Dado que com a nova lei não se pode fumar nos locais de trabalho (nem mesmo em meu próprio escritório), cada vez que quero dar uma fumada, preciso me exilar aqui, no frio. Felizmente, daqui dá para pegar umas redes wi-fi, de modo que posso descer com o notebook e navegar na internet.
As notícias que saem nos diversos sites não podiam ser mais confusas, e quase todas elas são preocupantes. A situação na Rússia parece estar completamente fora de controle apenas duas semanas depois do assalto checheno. A lei marcial parece não ter servido de nada e o caos está se espalhando por todo o país. Como era previsível, o apagão da internet ordenado por Putin foi inútil, pois muitos servidores russos estão situados em outros países, de modo que a informação sobre o que está acontecendo lá continua chegando pela rede (de fato, a ÚNICA informação além dos informes oficiais). Muitos blogueiros russos falam de patrulhas militares nas ruas, toques de recolher e até tiros indiscriminados. Alguns até mencionam casos de antropofagia. Imagino que isso se deva ao fato de, por conta do caos desatado, muitas regiões terem ficado totalmente desabastecidas. Evidentemente, nada disso está confirmado e o governo russo desmente absolutamente tudo, comunicado após comunicado. Segundo o ministro da Defesa russo, as revoltas são obra de extremistas muçulmanos que querem desestabilizar o governo. A verdade é que a credibilidade do governo russo desabou e toda a imprensa internacional o cita com muitas reservas.
A única coisa certa é que as medidas de segurança em volta das centrais nucleares e das bases de mísseis russas foram reforçadas, segundo o secretário da Defesa norteamericano, que cita fontes da Inteligência (CIA) e imagens de seus satélites. Por sua vez, o governo norte-americano ordenou a repatriação de todos os seus cidadãos residentes na Rússia. Ao que parece, há vários mortos e feridos entre eles, já que muitos eram cooperantes de ONGs destacadas no Daguestão. Estão chegando aos Estados Unidos desde hoje cedo, e a CNN mostrou a imagem de alguns deles descendo dos aviões em macas, e com uma aparência péssima.
Tropas norte-americanas estão sendo retiradas do Iraque para serem levadas aos Estados Unidos, onde corre o rumor de que poderiam elevar o nível de alerta terrorista para vermelho. Quase todas essas tropas irão por via aérea, com escala na base de Ramstein, na Alemanha.
Notícia do Última Hora: há casos da febre do Nilo russa, que é como a chamam agora, no norte do Irã, e parece que também no Kurdis-tão iraquiano. Os fóruns na internet estão pegando fogo e os pregadores do Fim do Mundo estão se deliciando nos blogs. Sinceramente, acredito que não é para tanto; aposto que, no fim, tudo isso vai ser como a gripe aviária.
10 de janeiro 11h43 Ponto de equilíbrio (II)
Como dizia... igual à gripe aviária. Mas, como diz o anúncio, não vai ser, não. O Reino Unido acaba de anunciar que vai suspender a aplicação do Tratado de Schengen de livre circulação pela União Europeia e que vai instalar controles sanitários nas fronteiras. Outros países, como Dinamarca, Suécia e Finlândia (esta faz fronteira com a
Rússia), planejam fazer o mesmo. O chefe do governo anunciou uma coletiva de imprensa para hoje ao meio-dia, e imagina-se que vai falar das medidas que a Espanha tomará a respeito.
As rádios estão soltando fumaça, e é surpreendente descobrir tudo o que todo o mundo sabe de medicina. Minha irmã ligou de Barcelona para dizer que a Generalität vai fazer uma vacinação em massa da população. Mas vacinação contra o quê? Acho que ninguém tem a menor ideia de nada e todos tentam dar pitacos... como sempre.
10 de janeiro 22h03 Ponto de equilíbrio (III)
A base de Ramstein foi declarada em quarentena, segundo informação do Google News. Os membros da OMS mandados da Rússia para lá parecem ter contagiado o pessoal sanitário da base militar. Todos os voos militares norte-americanos estão sendo desviados para outros países.
O ministro da Defesa apareceu na tevê dizendo que o governo espanhol autorizou os aviões norte-americanos a sobrevoar o território nacional. Pode ser até que utilizem Rota como base de apoio.
Alguém colocou uma imagem de Ramstein na internet.
Quase não se vê nada, são apenas duas pessoas vestidas com o que parecem ser trajes médicos de isolamento, que conversam na porta de um barracão. Mas há algo inquietante em tudo isso...
11 de janeiro 11h48 Ponto de ruptura
De novo no banco do parque, fumando um cigarrinho. Mas hoje até o mais cego perceberia que o ambiente na rua é outro; é algo muito sutil, mas inegavelmente ocorreu uma mudança.
Ontem, ao meio-dia, o presidente deu a anunciada coletiva de imprensa, com a ministra da Saúde, o ministro do Interior e o ministro da Defesa. A mensagem era basicamente: "Não há motivo de alarme". Mas, curiosamente, o estado de alarme da opinião pública parece aumentar a cada hora que passa.
Algo que contribui para isso, sem sombra de dúvida, são as declarações do líder da oposição solicitando o fechamento imediato de portos e aeroportos e a Cope pedindo que o exército ocupe as fronteiras. E, não em menor medida, o fato de que apenas quarenta e oito horas depois de ter partido, decidiram trazer os soldados de volta do Daguestão.
Não costumo concordar com Losantos, mas não posso deixar de pensar que talvez desta vez ele tenha razão. A situação parece estar fugindo do controle, mas de verdade. Na Rússia, o caos está definitivamente instalado. Pelo visto, há regiões inteiras incomunicáveis e sem controle. Notícias de saques, pilhagens e assassinatos em massa correm como rastilho de pólvora pela rede. A Telecinco passou, ontem à noite, imagens de um satélite francês mostrando gigantescos incêndios em Tbilisi, capital da Geórgia, a apenas trezentos quilômetros da fronteira com o Daguestão. Não há comunicação com essa cidade e não parece haver ninguém combatendo os incêndios. Mas que, diabos, há com eles? Querem virar churrasquinho ou o quê?
A OMS parece ter descartado definitivamente a possibilidade de se tratar do vírus da febre do Nilo e fala de uma cepa de uma doença muito parecida com o Ebola. O Ebola, como não se cansam de repetir em todos os jornais, rádios e canais de tevê, é uma febre hemorrágica que afeta humanos e primatas. O Ebola, descoberto em 1976, tinha até hoje quatro cepas conhecidas: Ebola-Zaire, Ebola-Sudão, Ebola-Tai e Ebola-Reston (esta última só afeta os primatas). Seu contágio se dá mediante o contato com fluidos, principalmente sangue ou saliva, e tem uma taxa de mortandade em torno de 90%. Mas há quem diga que não pode ser o Ebola, ou, pelo menos, nenhuma das cepas conhecidas. Rumores, rumores e nem uma maldita informação concreta.
Acho que, no fundo, ninguém tem a mínima ideia do que está realmente acontecendo e estão dando pauladas de cego. O governo suíço decretou a vacinação em massa de toda a população com Tamiflu, para evitar a gripe aviária. No Reino Unido, fecharam temporariamente o eurotúnel e os portos, mas acham que já pode haver casos em seu território, contagiados pelos cooperantes que saíram em disparada do Daguestão (parece que muitos chegaram feridos, alguns até por ataques de animais raivosos). Na Alemanha a situação é ainda pior, porque a quarentena de Ramstein parece não ter funcionado, e já declararam a lei marcial... Eu me pergunto quanto tempo nos resta, na Espanha, antes que se adotem medidas similares.
Não sei muito bem o que pode estar acontecendo no resto do mundo, mas em Atlanta já falam de uma pandemia. Nos Estados Unidos há seitas apocalípticas se preparando para a vinda dos marcianos, ou algo assim... Por sua vez, a presidência norteamericana anunciou que vai elevar ao máximo o nível de alerta por ameaça terrorista e que vai criar um gabinete de emergência.
Segundo um especialista do Ministério da Saúde, chegamos ao que se chama "ponto de ruptura" em uma epidemia, e que agora uma pandemia é inevitável, e que deveria chegar à Espanha em questão de dias, se é que já não chegou... O pior é que, tendo tudo acontecido tão rápido (apenas duas semanas desde que tudo começou), ainda não está muito claro como a doença é transmitida, nem qual é o período de incubação, nem sequer quais são os sintomas... pelo menos, a julgar pelo que dizem as autoridades. E por tudo isso que as pessoas estão angustiadas. Hoje, vi duas pessoas andando pela rua de máscara. Um sujeito começou a tossir ruidosamente em um bar onde eu estava ontem à noite com Pablo e Hector, e lhe pediram educadamente que saísse. Algumas atividades públicas foram suspensas temporariamente, e aqui, na Galícia, a prefeitura está pensando em fechar as creches públicas por umas semanas, até que se saiba bem o que é tudo isso. O governo ainda não decretou nenhuma medida de caráter restritivo, mas as pessoas estão começando a se limitar com medo de um contágio desconhecido. Somos como animais, encolhidos de medo diante de uma ameaça que há uma semana era apenas uma linha nos jornais e agora já não sabemos mais o que é.
Minha irmã me ligou esta manhã de Barcelona. Diz que, por ora, o ritmo da cidade continua igual, mas que também se percebe medo nas ruas. Após correrem rumores de que o ar quente poderia ser o meio ideal para a propagação da doença, as pessoas evitam o metrô, e todos olham com desconfiança para todos os que tenham jeito de ser do Leste. Pelo menos, disse rindo, as pessoas já não falam mais toda hora da maldita crise...
Levei Lúculo ao veterinário. Prefiro me certificar de que está com todas as vacinas em dia, por via das dúvidas. Além disso, aproveitei para passar pela loja de pesca submarina e pegar um regulador novo e um arpão submarino com meia dúzia de virotes de cinquenta centímetros, caso me dê vontade de pescar um pouco neste fim de semana (sem oxigênio, claro).
A propósito, preciso levar o carro para verificar o nível de óleo. É um Astra com menos de um ano, e não quero que aconteça com ele o que aconteceu com o anterior... mas isso é uma história longa demais para escrever aqui e agora.
12 de janeiro 13h19 Os pássaros caem do céu
Definitivamente, as pessoas estão começando a ficar nervosas. Esta manhã, a chuva caía torrencial. Deixei Lúculo bem quentinho, lambendo seus bigodes sentado perto de um aquecedor, e entrei no carro. Felizmente, estava estacionado bem em frente de casa, senão teria me encharcado. Enquanto atravessava a cidade a caminho do trabalho, notei que aumentou enormemente o número de pessoas usando máscaras. Talvez eu devesse arranjar uma também... e, a propósito, será que existem máscaras para gatos?
Nas rádios, a informação não poderia ser mais confusa. Há dezoito horas não há notícias do Daguestão. Nenhuma. Nada de nada. Não sei o que é mais inquietante: más notícias ou a completa ausência delas.
Incêndios como o da Geórgia, que mostraram ontem na tevê, repetem-se agora por várias cidades do sul da Rússia, aparentemente sem que ninguém se preocupe em combatê-los. A versão oficial russa é que são cremações maciças de cadáveres infectados pela epidemia, mas ninguém acredita nisso. Os incêndios são muito grandes (dá para ver do espaço!!) e estão arrasando quarteirões inteiros de cidades, depósitos de combustível e portos. Não são muitos, apenas uma dúzia, mas chama a atenção o fato de todos terem começado mais ou menos nos mesmos dias.
As imagens da Alemanha são impressionantes. As estradas entraram em colapso por conta de milhares de veículos tentando sair das cidades e se dirigir ao campo, longe das concentrações humanas. Todavia, só uma pequena porcentagem tem para onde ir, a maioria ainda permanece nas cidades. Aparentemente, não há pânico, mas se nota que as pessoas estão preocupadas. A lei marcial está vigente e todos que estiverem circulando depois das vinte horas ou fora das Áreas de Descanso habilitadas nas estradas serão abatidos a tiros, segundo a primeira-ministra alemã... eles não estão para brincadeiras.
Mas deixei o mais interessante para o final. A informação oficial flui a conta-gotas e é muito limitada. Hoje, às nove da manhã foi celebrada em Bruxelas uma reunião de urgência com os presidentes de todos os países da União Européia, juntamente com os ministros de Defesa, Saúde e Interior.
Estiveram reunidos até o meio-dia de hoje e no fim, deram uma entrevista coletiva. E aí soltaram a bomba. A partir desse momento, toda informação oficial passará por um Gabinete de Crise Único e será canalizada para toda a União Européia. Esse gabinete emitirá, a cada hora, um informe oficial a todos os países da União. Os respectivos governos farão apenas as pontuações que julgarem necessárias em matéria de política interna, saúde e segurança. As Forças Armadas de todos os países da União foram colocadas em estado de alerta. Pelo que dizem, o objetivo é evitar criar um estado de pânico desnecessário na população. O Gabinete afirma que as informações são tão contraditórias e confusas que estão gerando um estado de alarme irreal, cuja consequência é a debandada maciça da população (está se referindo à Alemanha, imagino).
Fiquei bobo ao ouvir a notícia. Esse negócio de Gabinete Único soa perigosamente a censura, não? O pior não é isso: o mais grave é ver a cara dos primeiros-ministros e presidentes. Parecia que vinham de um funeral. Na rádio Onda Cero, um analista político comentava que a coisa deve ser bastante grave, porque, assim que acabou a reunião, saíram todos disparados para o aeroporto para voltar a seus respectivos países. Há um rumor constante sobre a possibilidade de se declarar estado de exceção na Espanha, como em muitos outros países europeus. Por ora, foram suspensas todas as competições esportivas deste fim de semana "por razões de prevenção sanitária". Nos Estados Unidos mobilizaram a Guarda Nacional. Nestes dias, é alucinante assistir ao canal por satélite. Tropas armadas passeando por Nova York, Chicago, Boston etc. Esse pessoal está maluco. O que vão conseguir com isso? Assustar o vírus? Vão atirar em alguém ou o quê? Acho que estão exagerando, como sempre. Falando em Estados Unidos, pelo visto há doentes em Atlanta, Houston e Los Angeles, mas não dão nem detalhes nem imagens. Ali com certeza há censura de informação. Só se sabe que os "vetores de contágio", como os chamam, chegaram nas últimas horas em voos vindos da Alemanha ou de países do Leste. O fechamento de todos os aeroportos norteamericanos é iminente. As notícias do resto do mundo são mais ou menos as mesmas. Aqui, as tropas destacadas no Daguestão já chegaram a Zaragoza. Pelo visto, trazem bastante feridos leves, e comenta-se que até pode haver mortos, mas a informação é extremamente limitada. Só se sabe que habilitaram um andar de um hospital civil de Zaragoza para atendê-los.
Liguei para meus pais. Eles dizem que andam pensando em ir para a aldeia natal de meus avós na próxima sexta-feira, para passar o fim de semana. Acho uma ideia muito acertada. Liguei para minha irmã para ver como está. Ela conta que em Barcelona suspenderam temporariamente o transporte público subterrâneo e que só deixam as pessoas entrarem nos ônibus se puserem máscara. Comprei uma passagem de avião para ir vê-la este fim de semana. Espero convencê-la a vir passar umas férias em minha casa.
Sinto que vai acontecer alguma coisa em breve, mas não sei o quê. O medo é mais rápido que a pólvora... e já riscaram o fósforo.
12 de janeiro 19h28 ...E os rios se tingirão de sangue
A luz acabou de acabar. E a primeira vez nesta semana. Liguei para a maldita companhia elétrica e me disseram que em duas horas, no máximo, a corrente estará restabelecida.
Está chovendo canivete e a rua está totalmente às escuras, só iluminada ocasionalmente pelos relâmpagos da tempestade. Os muros do quintal estão pingando água, mas Lúculo e eu estamos confortavelmente sentados no sofá da sala vendo tevê, graças aos acumuladores. Não posso deixar muitas luzes acesas, senão as baterias acabam muito rápido, e, francamente, não estou a fim descer ao porão para ligar a segunda linha de acumuladores.
O Gabinete de Crise começou a emitir seus informes às três da tarde, hora espanhola. Pelo visto, o responsável pela epidemia é uma espécie de filovírus mutado, ou vários filovírus ao mesmo tempo, coisa que ainda não está clara (na Antena 3 falavam há pouco do vírus de Marburgo, seja lá o que isso for). Já há casos confirmados na Alemanha, Reino Unido, Itália, França, Holanda, Polônia, Grécia, Turquia... e também na Espanha, desde as sete horas da noite. A ministra da Saúde deu uma entrevista coletiva, com umas olheiras que chegavam até o umbigo, para anunciar que três membros do corpo militar enviado para o Daguestão estavam na UTI de Zaragoza com sintomas dessa doença "seja lá qual for". Transmitiram imagens do hospital: está cercado por equipes antidistúrbios e pela Polícia Militar. Caramba!
O pior é que, pelo visto, os pacientes passam por uma fase traumática aguda e apresentam tendências paranoides e agressivas. Já houve vários casos de ataques à equipe médica e mais de um paciente foi embora do hospital por seus próprios pés. Fico feliz por minha mãe já ser aposentada da área médica.
Pelo visto, a doença é altamente contagiosa, mas o meio de transmissão ainda é desconhecido. Um hospital de Sussex, Inglaterra, foi posto em quarentena depois de dois doentes percorrerem as instalações durante quase uma hora, agredindo todos os que se encontrassem pelos corredores. Isso saiu na internet há duas horas e ainda não apareceu ninguém desmentindo.
Não se sabe absolutamente nada do Daguestão há vinte e quatro horas. É como se não restasse ninguém ali. A última notícia da Rússia é que Putin e seu governo estão refugiados em um bunker nuclear da Guerra Fria e que o exército ocupa as ruas das principais cidades.
A Ucrania decretou estado de sítio, mas há povoados e cidades de sua fronteira dos quais não se tem nenhum tipo de notícia há horas.
Um blogueiro russo que mora em Moscou, e que é natural de um pequeno povoado da Ossétia do Norte, diz em www.russiskaya.ru que após ligar para seus pais durante horas, inutilmente, começou a ligar para todos os vizinhos que constavam da lista telefônica. Ninguém atende. É como se não morasse ninguém em um povoado de cinco mil habitantes. Há pouco, alguém fechou esse site. A censura russa continua implacável.
Que, diabos, está acontecendo? O que vai acontecer? Por que não dizem nada?