Biblioteca
Português

Escuridão Mortal - O começo do fim

0 · Finalizado
Lauri Vieira
47
Capítulos
437
Visualizações
9.0
Notas

Resumo

Algo está acontecendo e Alex não faz ideia da magnitude dos fatos, quando ele se der conta, talvez possa ser tarde demais. Guerra nuclear?Uma invasão alienígena?Zumbis?Ou apenas uma alucinação? O primeiro livro de uma trilogia que irá tirar o seu fôlego.

Prólogo

Sexta-feira, 30 de dezembro.

Hoje vai ser um dia de maluco. Nesta manhã, quando acordei, chovia copiosamente, e continuava chovendo um pouco mais tarde, enquanto eu preparava uma xícara de café. Com o som de fundo das notícias do rádio, fui tomar um banho.

Sempre a mesma coisa. Estamos em crise, não estamos em crise, e isso, e aquilo... E hoje tenho uma reunião que pode representar a diferença entre viver como um marquês os próximos seis meses ou ser obrigado a brigar com uns acionistas que não têm nem idéia do que realmente é bom para eles. O dinheiro é deles, não meu, eu sei, mas, se a fusão vingar, a comissão me permitirá levar os próximos meses com muito mais calma. Preciso descansar, pegar minha lancha Zodiac e fazer um pouco de pesca submarina na enseada.

Enquanto bebia a xícara de café, fiquei olhando pela janela que dá para o jardim. Esta casa foi um acerto desde o início, mas não posso evitar que, por enquanto, muitas coisas continuem me fazendo lembrar dela. Foi ela quem a escolheu, quem decidiu como decorá-la, quem... Bem, imagino que isso agora não tem importância. Achei que o conselho médico de "me abrir" para os outros me ajudaria a superar sua ausência, mas o tempo passa e ainda a sinto presente em todos os lugares. "Escreva um blog", disse o psicólogo, "fale do que quiser, de qualquer assunto, mas fale." Bem, isso é o que estou fazendo agora mesmo, mas parece não estar ajudando muito. Pelo menos, não a mim.

Que diabos! Quem sabe?

O jardim está verde, úmido, frondoso, descuidado. Faz três semanas que chove sem parar na Galícia, e a umidade entra por todos os lados. Em breve, vou ter de cortar a grama e limpar os muros do jardim. Isso também foi decisão dela, que a casa fosse cercada desses altos muros de pedra pelos quais agora a água escorre. "Precisamos de privacidade", dizia... Agora que ela não está mais aqui, tenho a sensação de estar morando em uma fortaleza.

Ajeitei a gravata, peguei a pasta e desliguei o rádio. O locutor estava comentando a explosiva situação de uma dessas ex-repúblicas soviéticas do Cáucaso com um nome acabado em "ão". Pelo visto, um grupo de rebeldes atacou umas instalações militares onde tropas russas estavam acantonadas, ou algo assim.

Sangue demais para o meu gosto. Desliguei o rádio rapidamente. Tenho de ir para o escritório. Estou em cima da hora.

Passaram-se vários dias desde a última vez que atualizei o blog. A reunião com o pessoal da empresa acabou sendo excelente! Acho que este ano vou poder me permitir umas boas férias só com o que ganhei no último mês.

No fim do ano jantei na casa de meus pais, em Cotobade, perto de Pontevedra. Ele se mudaram para lá há alguns anos, desde que pararam de trabalhar. Estavam meus pais, como é óbvio, além dos meus tios e minha irmã com o namorado, recémchegados de Barcelona, onde trabalham. Ela é advogada como eu, mas atuamos em ramos diferentes. Ela mora em Barcelona há anos e parece estar muito integrada à vida catalã. Mas eu sempre preferi a Galícia.

Durante o jantar, comentamos a grande notícia desses dias no jornal: o novo conflito dos russos no Cáucaso. Pelo visto, um grupo de guerrilheiros islâmicos do... Daguestão?? atacou umas antigas bases soviéticas que ainda estão sob controle russo nessa república. Minha irmã acha que deviam estar procurando algum material nuclear.

Espero que esteja enganada. Só o que nos faltava era outro 11-M, só que com bombas nucleares.

As poucas imagens mostradas são muito confusas. Parece que as instalações atacadas eram de caráter super secreto e as autoridades não permitem filmar ou fotografar. Os correspondentes são obrigados a fazer suas reportagens com imagens de arquivo e outras feitas do terraço de um hotel. Estão falando de centenas de mortos e Putin decretou estado de atenção em todo o território russo. As imagens de soldados e tanques ocupando as ruas são impressionantes... Com certeza temem que haja mais atentados ou ataques pelo país.

Ainda bem que não estou lá.

3 de janeiro 19h03

Estou assistindo à televisão. A Telecinco interrompeu a transmissão para mostrar ao vivo a Federação Russa fechando todas as suas fronteiras. Todos os vôos da e para a Rússia foram suspensos e o lançamento de um foguete Soyuz que ia para o espaço foi adiado sine die. A CNN comentou que esse fechamento pode ser tanto porque a situação no Daguestão está fugindo do controle como porque Putin quer reforçar seu poder. Um espectador sisudo afirma que não há motivos de alarme, que é tudo manobra política. Não sei o que pensar.

Acabou de novo a luz hoje à tarde. Já não aguento mais as malditas falhas da companhia elétrica. Nem parece que moro em um condomínio a apenas dois quilômetros de Pontevedra, uma cidade de oitenta mil habitantes! Problemas no traçado das linhas de fornecimento, dizem. Seis meses para arrumar, estimam. Não caio mais nessa. Amanhã mesmo vou comprar umas placas fotovoltaicas para o teto e uns acumuladores. E que se foda a companhia elétrica.

4 de janeiro 10h59 Levemente inquieto

Nesta manhã, vi na CNN de novo as notícias sobre a Rússia. Finalmente imagens do que seja lá que está acontecendo no Daguestão. O governo de Putin continua fechando o país; depois das fronteiras, é a vez da informação. Os correspondentes originalmente enviados para o Daguestão foram transferidos para Moscou para "garantir a própria segurança", segundo informam.

Hoje, mostraram um vídeo gravado com uma câmera doméstica onde se veem unidades especiais do exército russo avançando por uma rua deserta de um povoado próximo à base atacada, segundo a legenda. Os soldados, que no início da gravação estão dentro de um veículo blindado, são rapazes muito jovens, com cara de quem está com muito medo. O que mais me chamou a atenção é que, ao sair do veículo blindado, colocaram as máscaras antigás, como se temessem respirar algo nocivo. De repente, começaram a atirar feito loucos em algo ou alguém e correram de volta para o blindado. Aí acaba a gravação. Não sei o que pensar de tudo isso.

Na Antena 3 dizem que é possível que as forças rebeldes que assaltaram a base fossem da Chechênia e que quisessem se apoderar de produtos químicos ou nucleares armazenados nos laboratórios. Bando de malucos...

Hoje à tarde saí para fazer compras. O Dia de Reis está chegando e o centro comercial que há a três quilômetros de casa está abarrotado de gente comprando presentes. Meu cartão de crédito ficou tremendo depois de comprar tanta comida, vários garrafões de água de cinco litros, duas poderosas lanternas com muitas, muitas pilhas, por causa dos malditos cortes de luz, e um pouco de material elétrico, principalmente fios. Como vou instalar painéis fotovoltaicos no telhado, é melhor estar preparado para pequenos incidentes. Também comprei uma tonelada de comida para Lúculo, meu gato persa, que ultimamente não me dá muita bola.

Deve haver alguma gata da vizinhança no cio e Lúculo se sente na obrigação de lhes apresentar seus respeitos; por isso, pula o muro constantemente em busca de aventuras... e o muro mede mais de três metros! O que não fazemos por uma garota... Passei pela empresa que instala painéis solares. Comprei dois, BP Solar SX-170B. São um pouco caros. No total, com a instalação incluída (que será, aliás, amanhã) chega a dois mil euros (sem contar as baterias acumuladoras), mas é o melhor que existe no mercado. Cada painel pesa uns quinze quilos, de modo que podem instalá-los tranquilamente no telhado de casa sem medo de sobrecarregar a estrutura. São de células de silicone multicristalino, o que garante a duração das placas por pelo menos vinte e cinco anos. Com duas placas no telhado posso carregar duas séries de vinte e quatro baterias acumuladoras, mesmo em um lugar tão pouco ensolarado como a Galícia, que, em caso de corte de fornecimento elétrico, vão me proporcionar uma autonomia de muitas horas, coisa imprescindível para não estragar a comida armazenada nos dois freezers do porão.

Normalmente tenho pouco tempo, de modo que gosto de manter a geladeira bem abastecida para o caso de não poder ir ao mercado por duas semanas. Os freezers são, definitivamente, uma grande invenção.

No caminho de volta, parei na tabacaria e comprei duas caixas de cigarros Fortuna e um pacotinho de papel de seda, para os momentos mais lúdicos. Enquanto esperava, notei que na loja de armas da frente dois caçadores compravam cartuchos. E temporada de caça e este fim de semana, com um feriado logo depois, será muito longo para eles.

Chegando em casa, guardei as compras e cortei um pouco a grama enquanto ouvia o rádio. O jardim de casa tem uns cinquenta metros quadrados; não é muito grande, mas muito íntimo por conta dos altos muros que o cercam. A casa, de tijolos, fica em um condomínio de quarenta chalés idênticos, alinhados em filas de dez, em duas ruas paralelas. O meu fica no meio da rua Um (ainda não tem nome, o condomínio tem menos de três anos, e essas coisas demoram), com um chalé de cada lado e outro na parte de trás, que dá para a rua Dois. Estou separado do chalé de trás por um pequeno quintal e um muro, também de uns três metros.

Mal conheço os vizinhos, já que passo pouco tempo em casa. Só sei que na frente mora um casal de aposentados muito simpáticos, têm um Pathfinder, e ao lado um médico com a mulher e duas filhas pequenas. No chalé do outro lado mora Alfredo, um rapaz muito bonito que trabalha em uma construtora e mora com a namorada. Eu, agora, moro com Lúculo, o gato mais safado e folgado da rua. Imagino que muito em breve vai aparecer alguma vizinha histérica na porta da minha casa com uma caixa cheia de gatinhos iguaizinhos a Lúculo no colo e exigindo uma explicação. Preciso fazer alguma coisa com esse gato.

No rádio, continuam dando notícias do Daguestão. A situação parece estar fugindo do controle. O governo Putin continua com o bloqueio de informações, enquanto envia mais tropas e equipes médicas. Pergunto-me que, diabos, está acontecendo.

5 de janeiro 13h54 Alguma coisa está errada

Esta manhã, vieram instalar os painéis solares que comprei ontem. Dão uma potência nominal de 220 W em condições ideais de luminosidade. Com as duas linhas de vinte e quatro acumuladores que tenho no porão, poderei ter uma autonomia de umas oito horas de corrente elétrica por dia, mais que suficiente para suportar qualquer corte no fornecimento.

Liguei para minha irmã para conversar um pouco. Ela está em Barcelona e neste fim de semana vai para a casa de uma amiga, em Girona. Diz que está tudo bem, e depois de um tempo de papo furado desligamos.

Continuam passando na televisão imagens do Daguestão. Segundo as últimas notícias (as poucas que há, dado o bloqueio de informação), as autoridades russas começaram a evacuar a população. Ao que parece, no assalto às instalações russas os rebeldes chechenos teriam liberado acidentalmente algum tipo de agente químico armazenado ali. Na La Primera, Milá fala de gás Sarin, como aquele dos atentados de Tóquio, enquanto a Telecinco comenta que possivelmente foi peróxido de hidrogênio, que é o combustível utilizado pelos foguetes intercontinentais soviéticos. Na verdade, acho que ninguém sabe direito o que está acontecendo.

Algo anda terrivelmente mal na Rússia. O fim de semana foi um desfile constante de informações, comunicados, desmentidos desses comunicados, bloqueio de informação e violência. A qualquer hora do dia, e em qualquer canal de televisão, falam dos acontecimentos do Daguestão das últimas quarenta e oito horas. Mas estou me antecipando aos fatos.

Na sexta-feira de manhã havia sido decretado o fechamento de todas as fronteiras russas. Nesse mesmo dia, a agência Reuters informou, à tarde, que as instalações assaltadas eram, na realidade, um laboratório de pesquisa biológica e que a substância liberada acidentalmente era algum tipo de agente patogênico. Horas depois, o governo Putin desmentia categoricamente a notícia e falava apenas de uma nuvem tóxica de fertilizantes químicos. Mas, no sábado de manhã, tomamos o café com a notícia de que uma equipe do CDC (Centro de Controle de Doenças) de Atlanta havia sido solicitada pela Rússia para ir até o Daguestão.

Agora, dizem que o que pode ter sido liberado é o vírus da febre do Nilo, um tipo de doença infecciosa e bastante contagiosa. Era endêmica no Egito, mas há alguns anos um mosquito transmissor da doença se infiltrou em um avião e pelo menos desde 1995 têm sido registrados casos isolados na Europa e no sul dos Estados Unidos.

A explicação pareceria lógica, não fosse pelo pequeno detalhe de que não há muitos mosquitos nas montanhas do Cáucaso em pleno mês de janeiro.

Além disso, no domingo, as coisas pareciam ter se descontrolado definitivamente. Apenas cinco horas depois de a equipe de Atlanta chegar, bem quando começava a trabalhar e atender os intoxicados (ou melhor, os infectados), dois membros deles tiveram de ser evacuados para os Estados Unidos, parece que após sofrerem algum tipo de incidente com os pacientes.

No fim da noite algo similar parece ter acontecido com uma equipe da Organização

Mundial da Saúde, que teve de ser evacuada em caráter de urgência para Ramstein (Alemanha). Em alguns sites se comenta que poderia haver mortos entre os membros dessa equipe internacional.

Dos russos, pouco se sabe; nem de suas equipes médicas, se é que existem, nem da população civil da região. Algumas imagens de cinegrafistas amadores que conseguiram sair do país, na maioria pela internet, mostram longas caravanas de gente fugindo, ou sendo evacuada, alguns com péssima aparência, e, acima de tudo, muitas, muitas ambulâncias. Também mostram grupos do Exército e da Polícia Alfandegária russa, equipados com material de combate, indo em direção contrária, para o local que já está sendo chamado de Zona Quente.

E hoje de manhã, a punhalada final. O governo russo decretou a lei marcial. Todos os jornalistas estrangeiros devem abandonar o país hoje mesmo, suprimiram a liberdade de reunião e de imprensa e - o mais curioso — decretaram um apagão da internet em todo o país. Nada pode entrar ou sair (em tese) pela rede na Rússia.

Além disso, esta manhã a ministra da Saúde falou na La Primera. Disse que o governo espanhol está preparado para garantir que não haverá contágios da febre do Nilo na Espanha e que não há motivos de alarme. Por outro lado, também ouvi o ministro da Defesa na SER dizendo que mandarão ao Daguestão pessoal sanitário do exército espanhol e uma companhia de sapadores, para colaborar no controle da situação. Garantiu que, evidentemente, não correm nenhum perigo e que blá, blá, blá...

A Europa, o Japão, os Estados Unidos e a Austrália também estão enviando equipes similares.

Alguma coisa está acontecendo na Rússia. Algo grande de verdade.