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Capítulo 04

O dia foi tenso, Vanessa me olhava como se quisesse me matar e depois jogar meus restos aos porcos. Eu não queria mexer com alguém como ela, que com certeza pisaria em mim como se eu fosse uma mísera barata.

Falei do ocorrido para Beatriz durante o horário de almoço e ela gargalhou.

— Eu não posso acreditar, Alice — ela indagou ainda rindo.

— Foi muito constrangedor.

— Mas como ele é de perto e a sala dele?

— Ah, eu não reparei muito. — Finjo dar de ombros.

Ela me lança um olhar cético.

— Está bem, está bem. Ele foi educado e só. Somente isso, Beatriz. — Me rendo. — A sala dele é muito bonita.

— Podre de rico, tinha que ser né.

Para mim era estranho a visível divisão de classes. Enquanto Dante tinha ouro e diamantes cravejados em uma inópia garrafa de vinho Italiano 1886, eu me humilhei mais cedo para continuar em um emprego de recepcionista.

Já estava nos últimos minutos do meu expediente.

— Finalmente, trabalho concluído. — Beatriz diz trocando de roupa.

— O dia foi duro hoje.

— Muito cansativo, e agora a minha noite vai ser fantástica.

— E por quê? — Pergunto.

— Tenho um encontro com um homem maravilhoso, ele é perfeito. — Ela diz fantasiosa.

— Uau, um homem perfeito?

— Quero dizer que aparentemente sabe fazer as coisas, entende? Não existe homem perfeito dona Alice.

— Certamente.

Depois de uma conversa divertida, Beatriz vai embora e eu caminho até a estação de metrô mais próxima que ficava a umas quadras da empresa. Ouvir Don't stop me now do Queen, enquanto eu mesmo queria desistir de andar e me deitar e uma calçada era um tanto contraditório.

Já estava tarde eu estava sozinha, mesmo sendo uma rua muito movimentada durante o dia, a noite tudo fica parado.

Um carro se aproxima de mim, eu me assusto e me afasto, poderia ser um sequestrador ou um psicopata qualquer, mas o automóvel era muito chique para ser de qualquer um. O motorista abaixa o vidro e vejo quem era, sr. Dante.

— Quer que eu a leve para casa? — Perguntou.

— N-não, eu estou indo para a estação. — Minha voz sempre fica falhada quando se tratava do Dante.

— Tem certeza? Está bem tarde, não vai me custar nada te levar pelo menos na rua da sua casa. — Disse.

— M-mesmo assim, não seria adequado. — Digo cruzando os braços.

Ele olha para frente e bate repetitivamente seu dedo indicar no volante, parecia pensar.

— Te levo pelo que aconteceu hoje, para ficarmos quites. Está bem?

Fico relutante, mas no fim aceito a proposta.

— Tudo bem. — Entro em seu carro. O cheiro que exalava era tão bom, perfume masculino e carro novo.

Ele dá partida, vamos a caminho da minha casa. Eu estava nervosa, aquele homem me tirava da minha zona de conforto. Permaneço olhando para frente, eu quase não pisquei para ser mais exata, sentia o olhar dele queimar na minha pele ressecada, de vez enquanto.

— Você está desconfortável? — Diz ele ainda com a atenção voltada para a rua.

— Sim, não é todo dia que alguém como você me oferece uma carona.

— Não leve isso a mal, eu só a vi sozinha e não quis ser rude. — Continuou — acredite ou não, tento ser um cavalheiro que não faz distinção.

— Está tudo bem.

Eu não olhava em seus olhos, sentia vergonha. Ele sendo oposto de mim, sempre me olhava nos olhos, sem vergonha e com intensidade, talvez porque seus olhos eram duas piscinas esmeralda.

— Eu confesso que nunca a vi na empresa, é funcionária nova?

— S-sim, eu fui contratada há dois dias por um homem de sanidade duvidosa.

Ele rir do que falei, nossa, que sorriso perfeito.

— Não seja tão malvada com meu querido gerente. Ele costuma ser bem seletivo. — Paramos no sinal, não haviam muitos carros má avenida. Senti seu olhar queimar sobre mim, de novo — assim como eu.

Sua voz ficou rouca der repente, e a expressão de animação sumiu de sua face em um instante. Ele continuava me encarando, eu por um momento de loucura o encarei de volta.

— Alice? — Ouvi sua voz bem no fundo, era como se eu tivesse apagada ainda de olhos abertos — Pode me dizer sua localização?

— Ò, sim. Me desculpa. — Fecho os olhos e balanço a cabeça. — Queens.

O resto do percurso eu não abri a boca pra falar nem um "a", aparentemente ele percebeu que eu quase babei em seu carro após aquela troca de olhares de segundos.

Finalmente parou o carro em frente à minha casa, que situação estranha.

— Chegamos. — Ele desliga o carro.

-— Obrigada, senhor Dante.

— Foi um prazer, Alice.

A cada vez que ele falava meu nome eu sentia meu corpo dar pequenos espasmos, o sotaque dele falando meu nome me instigava.

Saio de seu carro e entro logo em casa, ainda estava ofegante e com muita vergonha. Subi e fui direto para o banheiro, liguei o chuveiro e deixei a água escorrer pelo meu corpo, me lembrava daquele homem meu coração acelerava e minha mente ficava confusa, um sorriso bobo escapou de meus lábios.

Minutos depois saí do banheiro e fui para meu quarto, me joguei na minha cama e fiquei fitando o teto branco.

Era bobagem ficar pensando nele, um homem como Dante Angnel não era qualquer um, ele tinha muitas outras melhores do que eu.

No dia seguinte, acordei mais cedo, não queria ser punida novamente. Levantei e fui direto para o banheiro, tomei banho e vesti minha roupa sem graça de sempre. Mas antes de sair fui no quarto da minha mãe, dei um beijo em sua testa e quando ia sair ela segurou meu pulso.

— A-alice? — Ela estava fraca.

— Descanse, mamãe. — Passo minha mão em sua cabeça sem um fiapo de cabelo. A quimioterapia já tinha feito seus cabelos loiros caírem há dois anos atrás.

— Estou sentindo muitas náuseas.

Lagrimas quiseram vacilar dos meus olhos, nem eu nem Anne fazíamos ideia do que mamãe sentia. Ela mesmo com tudo isso se mantia forte, mas como todos, as vezes ela falhava. Me forcei a abrir um sorriso, entreguei o remédio designado para náuseas.

— Durma, vai ficar tudo bem.

Saio do quarto e suspiro. Desde que meu pai descobriu que minha mãe estava com câncer, após uma longa briga onde ele a culpou pela doença e alguns dias depois fugiu de casa, nunca mais o vimos em lugar algum, nem nós, nem os criminosos que ele devia. As únicas lembranças que tenho de meu pai foram as dívidas e as diversas brigas que teve com minha mãe. Anne ainda era uma criança quando tudo começou a desmoronar, levaram tudo, até a nossa casa de bonecas que ficava no quintal ao lado da piscina de plástico. O que vemos hoje é apenas resquícios de uma vida que um dia fora feliz, o quintal estava cheio de mato que mal podíamos ver a cerca do outro lado. Era triste olhar pela janela da cozinha e ver tudo isso, mas não ter forças para arrumar toda aquela bagunça, e a minha bagunça interna muito menos.

Vou para a estação e espero o metrô, quando finalmente chega eu entro e me sento em um banco vazio ao lado de uma moça. Encosto minha cabeça no vidro da janela e penso em tudo que aconteceu ultimamente, Anne sempre dizia que eu era a pessoa mais forte e destemida que ela já conhecera, mas às vezes eu me sentia fraca e impotente, como agora.

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