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Eu entro por aquela porta e vejo seu corpo em cima de uma cama de ferro, tampado por um lençol azul, eu ando lentamente até ele. Era de manhã já e eu não tinha dormido nada, eles demoraram para liberar o corpo dele. Todos os dias eu me arrumava para ele, ao sair do closet ele me dizia o quanto eu estava bonita, nossas mãos se entrelaçavam e ele dizia que me amava. Essa manhã, eu não acordei, eu passei a madrugada chorando, eu me arrumei pela última vez para ele, só que dessa vez, eu não tive ele me esperando ao sair do closet, não tive o seu sorriso e nem a sua voz me dizendo bom dia ou me elogiando.
Dessa vez eu me arrumei para encontrar ele nessa sala gelada do IML.
— Vou deixar você sozinha — o médico legista fala e eu olho para trás vendo ele sair e fechar a porta.
Eu me aproximo do seu corpo e baixo o lençol, revelando seu rosto.
— Como vai ser a minha vida sem você agora Paulo? — eu falo passando minha mão pelo seu rosto gelado. — Por favor, abre os olhos, fale do meu cabelo, fala que ama meu perfume… — as lágrimas desciam pelo meu rosto na velocidade do tempo. — Eu coloquei o perfume que você me deu, e não te encontrei para você me elogiar assim que sai do closet — eu digo ainda com a minha mão em seu rosto. — Me diz quem fez isso com você? Por que alguém faria isso com você? — eu encosto meu rosto no seu e por um momento eu procuro sua mão e encosto a minha mão na dele e espero que ele pegue a minha mão forte, mas isso não acontece. — Por favor, Paulo, acorda! — eu me afasto colocando a mão na boca e chorando muito.
E tudo que eu consegui pensar nesse momento, em quem o matou e por qual motivo mataram o meu marido? Eu não conseguia imaginar Paulo tendo inimigos, ele era um homem bom, de coração gentil, ele ajudava as pessoas, era amigo de seus funcionários.
Quem era a pessoa sem coração que mataria o meu marido? E ainda por cima no dia da festa de aniversário do nosso lho. Não tinha explicação que zesse sentido na minha cabeça, não tinha. Será que teria algum envolvimento com a sua saída repentina ontem de manhã? Aquele carro azul?
— Desculpe — o médico legista fala entrando e eu tento limpar as minhas lágrimas. — Mas precisamos preparar o corpo para o velório, o pessoal da funerária já está ali fora — eu o encaro. — Eu sinto muito, senhora.
— Claro — eu falo meio perdida procurando a minha bolsa — Me desculpa, eu espero lá fora — ele assente com a cabeça — Por favor, coloque o terno que eu trouxe, ele amava aquele terno.
— Vou pedir para colocarem — ele fala. — O pessoal da funerária irá arrumá-lo.
— A gravata não aperta muito — eu falo para ele — Paulo se incomoda com a gravata apertada, a camisa precisa está toda por dentro da calça também.
— Pode deixar, senhora — ele fala.
— A gravata… — eu falo chorando. — Não vai incomodar ele, não é mesmo? — eu falo fechando os olhos.
— Faremos tudo conforme a senhora falou — ele fala.
—Ok — eu falo olhando para o corpo de Paulo — Obrigada. — Saio da sala, sem rumo, sem nada.
Encontro Pietro no lado de fora que vem em minha direção e me abraça forte.
— Vamos?— ele fala. — Marília está indo para o velório com Pedro — eu faço um gesto positivo com a cabeça.
Eu não tinha forças para falar ou muito menos para comer e nem sei se teria forças para viver. Pietro tinha andado um pouco mais com o carro, porque viu que eu estava muito nervosa e quando chegamos no velório, o corpo já estava lá.
O lugar estava cheio de familiares, amigos e curiosos, Pedro está lá ao lado do corpo do pai, olhando para ele. Novamente eu respiro fundo, tiro forças de onde eu não tinha e vou até o encontro deles, toda vez que Pedro e Paulo caram juntos, era só alegria, era uma bagunça e tanto. Eu me aproximo de Pedro e olho para Paulo, a nossa aliança em seu dedo, o seu terno preferido, a camiseta que eu dei para ele no nosso aniversário de casamento e a gravata que Pedro tinha feito quando tinha 7 anos na escola, pintado para dar para ele no dia dos pais , Paulo a guardava com todo amor.
— Filho — eu falo encostando a minha mão em seu ombro — Você deveria ir descansar.
— Eu não vou sair daqui até ele ser levado para cremação — ele fala me olhando. — Não vou sair do lado do meu pai.
— Eu amo você e vamos estar juntos sempre — falo para ele que me encara deixando lágrimas descerem pelo seu rosto. — Ele vai estar sempre com a gente, não importa onde ele estiver.
— Ele não poderia ter ido assim mamãe, não poderia! — ele diz. — Eu vou achar o assassino do meu pai — Pedro diz nervoso e eu abraço ele o mais forte possível.
A nossa vida daqui para frente mudaria muito, desde que a luz do salão se acendeu e eu vi o corpo dele ali, a minha vida virou uma eterna escuridão. Eu sei que poderia passar anos e anos e jamais iria me conformar com essa sua morte, uma morte sem motivo, eu iria fazer de tudo, eu iria mover o mundo, irei gastar todo o nosso dinheiro se precisar para achar o assassino de Paulo.
Eu não iria descansar até achar o culpado pela sua morte e o motivo dela também, uma morte tão precoce e jovem, no auge da sua vida, era muito difícil de acreditar.
— A retirada das cinzas já foi marcada — Murilo fala se aproximando de mim.
— Obrigada por resolver tudo Murilo, sei que está sendo difícil para você também — respondo para ele.
— Amanhã algumas pessoas vão precisar ir até a delegacia — Murilo fala.
— Todos teremos — Pietro fala.
— Pedro vai posar lá em casa com os meninos —Marília fala.
— Vai ser bom para ele — eu falo.
— Por que você não vem junto? — ela pergunta.
— Não — eu falo. — Preciso car um pouco sozinha — eu olho para Murilo. — Vou precisar ir amanhã também?
— Provavelmente não — ele fala me olhando. — Primeiro vão escutar todas as testemunhas para depois falar com os suspeitos.
— Suspeitos? — pergunto. — Espera?! — eu olho para ele — Eu sou suspeita?
— Desculpa te dizer isso agora — Murilo fala — Mas foi um assassinato premeditado, então todos que estava na cena do crime quando a luz se acendeu, vão ser tratados como suspeitos.
— Eu sou suspeita de matar meu marido? — eu pergunto indignada e nervosa. — Suspeita de matar o amor da minha vida? Isso não está certo — eu falo nervosa e eles me encaram.