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Capítulo 4

Theodoro

Quando finalmente deixo que Isla Tibuco saia do meu carro sei que temos um acordo e que a garota, mesmo contrariada, não irá dar para trás com o plano agora. Tenho sua palavra e ela tem a minha, e sem ao menos saber o porquê, sei que isso basta.

Um pouco de culpa atinge minha consciência enquanto dirijo pelas ruas da cidade e aproximo-me cada vez mais do bairro em que moro. Sei que não é certo forçar uma pessoa que mal conheço a fazer parte de algo que não lhe agrada, porém o que posso fazer? Não planejava estar onde estava quando tudo aconteceu. O que sei é que quando me vi já estava avançando para cima daqueles babacas aproveitadores, não que eu me sinta muito diferente de algum deles nesse momento, porém, por mais imbecil e idiota que possa ser, jamais em toda minha vida fiz ou faria o que aqueles escrotos pretendiam com uma garota sozinha e indefesa.

Mas isso não isenta minha parcela de culpa pelo modo como estou agindo, abusando do senso de dívida de uma menina que mal conheço. Ah, dane-se essa droga de consciência que insiste em me apontar o dedo acusador. O que está feito, está feito e não tem como voltar atrás agora. No fim vai dar tudo certo e cada um seguirá com sua vida normalmente como se nada tivesse acontecido.

Estaciono de qualquer jeito sobre o gramado na entrada de casa pois estou com muita preguiça de percorrer mais alguns metros até a garagem que é o lugar ideal para estacionar o veículo. Deixo minha chave sobre o aparador após fechar a porta principal atrás de mim e sigo para meu quarto. Tomo uma ducha rápida e quente para tirar a sujeira da rua e assim que me deito sobre o colchão super macio da minha cama king-size, capoto adormecido de tanto cansaço. É, o dia de hoje realmente tinha sido bem longo e cansativo.

Acordo sentindo todos os meus músculos doloridos e pesados. Arrastando os pés como um condenado, me obrigo a vestir uma roupa minimamente decente e digna para o dia, e desço em direção a cozinha para fazer meu desjejum. Quem sabe assim essa enxaqueca dos infernos me deixe em paz e alguns minutos de exercícios na piscina alivie as dores musculares.

-Bom dia, bundão. -nem me assusto quando minha irmã diz do outro lado cozinha em um canto escondido, enquanto gira entre os dedos uma latinha de energético que provavelmente acabara de beber.

Stella me fita com os olhos felinos estreitos, lábios cerrados e o constante ar de deboche que sempre lhe acompanha.

-Péssimo dia, peste. - respondo ao abrir a geladeira e tirar o leite de dentro. -Cadê a mãe e o pai? -pergunto ainda sem olha-la.

Despejo o cereal até a borda da tigela que já está transbordando de leite e acabo fazendo uma enorme bagunça sobre a mesa. Mas não me importo. A empregada limpa tudo depois.

-Nossa mãe está em reunião com uns acionistas ou algo semelhante... Já o nosso querido papai viajou essa madrugada para Seattle para fechar uma conta das grandes. -ela dá de ombros fazendo pouco caso.

-Hum... como sempre. -estalo a língua em desaprovação e me sento ao redor da mesa para comer meu café da manhã.

Um silêncio pesado recai sobre a cozinha e nenhum de nós dois faz nada para mudar. Essa peste esquisita e mimada que chamo de irmã, apenas fica encarando-me com um olhar avaliativo e incômodo enquanto me alimento. Em poucas colheradas ansiosas termino de esvaziar por completo minha tigela de cereais e a jogo sobre a pia.

Sigo para a parte exterior da casa e me preparo para nadar na piscina aquecida que temos na área recreativa. Por cerca de vinte minutos pratico a atividade initerruptamente, sem pausas, sem folga. E quando enfim sinto a exaustão me alcançar, pulo para fora da água e agarro a toalha que há na espreguiçadeira que algum empregado deve ter deixado a disposição em algum momento do dia.

* * *

-Pirralha. -eu a chamo lá pelo meio da tarde depois de ter ido almoçar muito além do horário ideal.

Todavia minha mãe não está aqui para azucrinar sobre o assunto, então dane-se.

Stella sequer levanta os olhos da revista que tem em mãos quando paro ao seu lado. Ela está deitada sobre o sofá com as pernas jogadas sobre o encosto do mesmo, balançando os pés preguiçosamente de um lado para o outro.

-Vê se presta atenção no que estou falando, peste. -dou um peteleco em sua testa ao que ela revida chutando-me o meio das pernas. E por pouco essa monstra quase que me acerta em cheio.

-Que é, estúpido? -seus olhos cinzas me fuzilam.

-Caso a mãe apareça por aqui ainda hoje e pergunte onde estou, diga que saí e que não é para me esperar, ok? -digo guardando a carteira no bolso de trás da minha calça jeans e pego minhas chaves sobre o aparador.

-Tanto faz. -Stella responde entediada e volta a se concentrar novamente em sua revista.

Sem tempo ou paciência alguma para lidar com essa peste, me dirijo até a porta, entro no carro dando partida e saio para resolver minhas centenas de problemas.

* * *

Stella

Vejo Theo chegando horas depois com sua costumeira postura confiante de quem tem o rei na barriga, como se fosse o dono do lugar. Detesto profundamente isso... essa atitude metida. Entretanto não digo nada, quero ver o que ele irá fazer em seguida e o sigo com os olhos até ele finalmente entre e feche a porta de casa.

Já é altas horas da noite e percebo que passei a tarde toda sozinha nessa casa enorme enquanto meu irmão bundão ficou fora esse tempo todo fazendo sabe-se lá o que ou com quem. Nossos pais não estão, os empregados já se foram a muito tempo ao findar do expediente, e nossa mãe não tenho certeza se volta hoje para casa. Mas... tanto faz. Eu não ligo. Theodoro não liga. Quem é que liga para isso? Ninguém, eu acho.

Estou pronta com um comentário ácido na ponta da língua para alfinetar o maioral dos bundões, todavia percebo um tanto surpresa que ele não está só. Meu irmão está acompanhado de uma garota, o que acho muito estranho pois essa é a primeira que o vejo trazer uma até nossa casa. Theo nunca foi de envolver seus rolos com a vida pessoal e familiar, por isso suas ficantes nunca colocaram seus pezinhos ridiculamente burros nesta casa. Então porque agora? O que estava acontecendo e quem era aquela garota que eu nunca tinha visto na vida? Eu precisava descobrir todas essas informações e imediatamente.

-O que está aprontando, Theo? -questiono fazendo questão de me sentar com a postura correta e um olhar penetrante do tipo vou roubar sua alma durante a noite, quando o vejo com a mão nas costas da desconhecida, empurrando-a em direção às escadas que levam ao segundo andar.

-Não é da tua conta, peste. -Theodoro rebate rispidamente rolando os olhos e a menina de longos cabelos castanhos me olha alarmada

Bom, isso é o que nós vamos ver, irmãozinho. Eu irei descobrir a merda em que está metido ou não me chamo Stella Coben.

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