Capítulo 3
Isla
Agora que a adrenalina baixou, não tenho coragem sequer de olhar para o lado. A pessoa que dirige como louca, acredito que um rapaz, também não diz nada por longos minutos. Deixamos a rua em que tudo aconteceu a pouco tempo e eu me pergunto aonde esse cara pretende me levar ou o que fará comigo. Será que ele é algum tupo de maluco ou pervertido como aqueles dois idiotas?
-Onde você mora? -a voz grave e profunda me faz saltar sobre o banco e só então percebo que nem o cinto de segurança eu tinha colocado.
-O-oi? -questiono nervosamente e finamente me viro em sua direção.
Essa não! Não pode ser. Isso não está acontecendo de verdade, é apenas mais um pesadelo, só pode! É o que penso quando me deparo com a realidade.
-Eu perguntei onde fica a sua casa. -Theodoro Coben, capitão do time de lacrosse do nosso colégio é quem está ao volante nesse momento, o semblante fechado demonstrando certa irritação por não ter tido uma resposta até agora.
É impossível evitar a sensação de insegurança diante da célebre presença da galinha dos ovos de ouro do Potossin Honório. Sério. Essa cara bonita que possui não se resume apenas a beleza, charme, fama, status, poder e dinheiro. Ela também carrega consigo muitos adjetivos nem tão lisonjeiros como por exemplo esnobe, cínico, intragável, irritantemente convencido, mimado, inconveniente e autoritário. Qualidades essas que me fazem questionar o porquê de sua atitude recente se nem ao menos trocamos meia dúzia de palavras na vida e uma vez que Theodoro Coben não se importa com ninguém no mundo além de si mesmo.
Então por que esse cara está me ajudando? Será que espera algo em troca? Porque pessoas como ele só fazem alguma coisa esperando por uma recompensa.
-Você tem algum problema? -ele diz e então eu deixo minhas divagações de lado voltando ao presente. -Será que pode responder alguma das minhas perguntas ou você é muda?
-Além de estar machucada, não tenho nenhum outro problema. -respondo mais ríspida do que pretendo e logo me arrependo.
Desviando o olhar para o lado de fora da janela, digo em um tom mais moderado o endereço de casa. O restante do trajeto é feito em silêncio. Nem um dos dois se importa em quebrar o clima tenso que paira no ar. Eu não ligo para isso, afinal de contas não somos nada além de meros desconhecidos e por mim está de bom tamanho. Desde que eu chegue em casa sã e salva no final dessa noite horrível, tudo bem.
-Pronto. -Theodoro avisa estacionando o veículo em frente minha casa. -É aqui que você mora? -uma careta se forma em seu rosto mal barbeado ao observar o local. -a casa até que é ajeitadinha, mas o bairro e a vizinhança... -ele faz um gesto de negação com a cabeça.
-Hum... Nem todo mundo possui o sobrenome ou a conta bancária de um Coben, Theodoro. Existem pessoas simples que precisam ralar todos os dias para sustentar um lugar como esse. -digo e ele arqueia uma sobrancelha em um misto de surpresa e desafio. -Bom, tenho que ir. Obrigada pela carona e... pela ajuda. -coloco a mão na maçaneta do carro na intenção de abri-lo.
-Ei, ei! Não tão rápido assim, mocinha. -ele trava as portas do veículo impedindo-me de sair.
E mais uma pessoa é adicionada a crescente lista desse apelido idiota. Mocinha... Que intimidade é essa? Quem ele pensa que é para falar comigo desse modo?
-Que foi? Esqueci de agradecer por mais alguma coisa? -questiono entre frustrada e irritada.
-Não quero seus agradecimentos. Palavras são de graça e todo mundo usa. -Theodoro rebate como se eu fosse algum tipo de idiota.
-Então o quer de mim? -perco o pouquinho de consideração que um dia poderia chegar a ter por esse ser.
-Uma troca de favores. Uma mão lava a outra, certo? -se ele acha que irei concordar com a frase estúpida está muito enganado.
-Olha aqui, seu... seu doido. Se está pensando em alguma coisa pervertida é melhor já ir tirando o cavalinho da chuva. -exclamo já sentindo os ânimos se exaltarem.
-O que? Mas é claro que não é nada disso que está pensando, sua maluca. A minha proposta para você é outra, bem diferente.
-Diz logo ou eu vou embora. -ameaço.
-As portas estão travadas, você não vai a lugar algum. -ele debocha. -Não até que eu queira. Mas voltando ao assunto em questão. Você não é tipo de pessoa que se encaixa para os meus planos e muito menos minha primeira opção, contudo, situações desesperadas exigem medidas desesperadas. Vai ter que servir de qualquer jeito.
Olho desconfiada para seu rosto que não transmite muita informação. Não sei de que plano se trata, entretanto coisa boa é que não deve ser. Vindo de quem vem... Não posso esperar que seja algo no mínimo decente.
-Quero que você se passe por minha namorada para todos no colégio e fora dele também. -Theodoro suspira aparentando cansaço e esfrega a testa com polegar e o indicador. -É só por um tempo, depois daí cada um segue seu rumo, sem complicações, sem cobranças. -ele dá de ombros enquanto me encara como se dizer aquelas baboseiras fosse coisa mais normal do mundo.
-Por que? -quando me vejo já estou fazendo a pergunta e não consigo refreá-la a tempo.
-Não importa e não é da sua conta. Tudo o que precisa saber eu mesmo direi a você.
-Não. -a resposta sai rápida e sucinta.
-Não? Não o que? Você sabe quantas garotas dariam um rim para ouvir coisa semelhante e estar em seu lugar? -ele indaga inconformado e incrédulo com minha recusa.
-Ainda bem que não sou nenhuma delas então. Mas como eu já disse, Coben, a resposta continua sendo não. Agora pode por favor abrir a porta e me deixar sair?
-Não. Acho que você não me entendeu direito, mocinha. Eu não te fiz uma pergunta de sim ou não. Eu só expliquei a situação. Goste você ou não.
-Ah, é? Por acaso acha que sou obrigada a fazer suas vontades, ceder aos seus caprichos só por causa de quem é e do sobrenome que carrega? Está muito iludido, meu querido. -digo indignada.
-Você vai aceitar, minha querida, não devido a esses fatos que também são de grande importância, apontados de modo tão displicente, mas por causa que você me deve! Eu acabei de salvar sua vida há poucos instantes se não se lembra.
-E vai jogar isso na minha cara agora como argumento?
-Vou. -ele responde com a maior cara de pau.
-Você é muito baixo. Como pode? Não se envergonha disso?
-Nenhum um pouco
-Você não foi obrigado a nada.
-Exatamente. Fiz por que quis. Mas agora você está em dívida comigo e chegou a hora de cobrar.