Outra pessoa
Balanço a cabeça tentando afastar a irritação cega que cresce em meu peito por continuar sendo julgada por homens, quando a única serventia deles no mundo é nascer e crescer pelos cuidados das mulheres. Tenho a consciência de cada possível falha dentro desse plano mas no momento derrubar cada negócio feito é mais útil ao angariar recursos do que confrontar o Don.
—O Don não vai acreditar nisso Beatrice – Giacomo resolve se pronunciar depois dos seus longos minutos analisando meus passos — Podemos conseguir alguns meses, mas em algum momento Sartori vai somar dois mais dois principalmente quando só encontrar os ossos do Stefano.
É um ponto válido, sei disso mas não posso mover as peças sem o apoio deles e se é preciso apelar para um emocional que já não existe mais não vejo nenhum problema.
—Eu sei, só que não posso viver aqui, não posso continuar aqui. – Falo entoando a voz com desespero.
As melhores mentiras sempre se baseiam na verdade, não nego por um único momento o medo de perder a oportunidade de vingança e medo por correr o risco de perder eles, minha família. Minhas pernas tremem apenas por cogitar essa possibilidade.
– Giácomo vai fazer com que nossa vingança prospere, o nome dos Sartori será apagado – Observei a confiança de Jack em querer vingar nossa família.
Seu apoio sendo um ponto crucial para mover um pouco mais Giácomo na direção do tabuleiro ao invés de alimentar seu desejo pela carnificina.
—Darei minha vida para que eles paguem irmã. – Giácomo respondeu batendo o martelo em nossos destinos ele é o único que pode agir secretamente nos dois lados, senti confiança com a afirmação na sua voz.
A máfia italiana não aceitaria uma mulher no comando, mesmo que os bastardos mereçam ser acorrentados aos troncos de madeira e açoitados em suas bundas brancas por mulheres para notar o quanto são apenas homens, mas no momento tudo o que quero é ser livre pela primeira vez na vida.
Poder respirar o ar contaminado pelo sangue deles derramado e não pelas minhas dores reverberando nas paredes dessa casa.
–Se você não fizer a segurança delas dar certo, eu mesmo vou garantir que seu corpo vire comida para os peixes – Hunter rosnou para o soldado, suas mãos indo para dentro dos bolsos e puxando um pequeno vidro. — Jack vá pegar outra seringa no carro.
Jack saiu obedecendo a ordem,enquanto Hunter meu irmão pegou uma seringa da calça social e encheu com metade do líquido do frasco. Analisei cada pedaço do local vendo a disposição da comida que mal toquei ainda em cima do balcão.
— Giacomo, derrube essa comida pela sala, faça parecer como se tivesse tentado me defender – Ele acenou se levantando e dando a volta no balcão.
Dessa forma o cenário fica perfeito, a comida sendo jogada e o prato sendo quebrado dando a aparência de ter sido arrastada pelo espaço pequeno entre a cozinha e o corredor para os quartos.
Caminhei ficando no ponto exato em que a maior parte do sangue tinha se acumulado no tapete quando os chutes foram intensos demais para o corpo aguentar, naquele exato instante em que Stefano matou a última fagulha existente de esperança, Frank continua parado no meio da sala, organizei os pensamentos puxando o ar com força pronta para fazer o pedido solto o ar falo.
— Frank, preciso que me dê um soco – O olhar do homem se arregala ao mesmo tempo em que meus irmãos endureceram no lugar, Jack fechando a porta da frente com um olhar furioso.
Resolvo apressar a explicação para apaziguar a testosterona irradiando o lugar, não é como se um dos três fosse capaz de levantar a mão contra a irmã caçula então o dever cabe ao novato da equipe.
— Preciso que meu rosto fique marcado para parecer verdadeiro já que estou toda suja de sangue e você precisa ter alguma marca que mostra uma tentativa de proteção.
Hunter arqueou a sobrancelha, Giacomo riu e Jack continuou olhando como se visse uma desconhecida.
— Apresento a vocês o monstro forjado e criado pelo próprio Diabo – Abri um sorriso de canto.
Eles pareciam finalmente entender que não havia sido algo tão banal o que Stefano fez comigo nos últimos anos, a esposa dedicada, feliz e obediente nas festas da família era apenas uma fachada.
A casca vazia moldada, o troféu de suas conquistas para ser exibida em público, as marcas pelo meu corpo não eram visíveis para que ninguém suspeitasse de que uma das princesas da máfia era tratada como as pobres coitadas traficadas para os clubes da família.
E pela primeira vez na vida as cicatrizes ajudariam em algo, com o corpo sujo de sangue os hematomas ainda evidentes pela minha pele branca fariam o trabalho de aparentar um ataque, a linda esposa de Stefano cruelmente machucada a ponto de não resistir.
— Beatrice, preciso que preste atenção! – Hunter se aproximou com a seringa — Esse veneno vai fazer com que passe por morta nas próximas 24 horas, Bianca já está assim, a umas 5 horas. Precisamos acelerar isso, vamos trocar os corpos por qualquer indigente e vamos exigir o caixão fechado, você vai acordar no local de segurança.
— Vamos ver algumas coisas que ajudem vocês a se disfarçarem, Nova York só vai voltar a ser segura quando tomarmos o poder, ainda sim, ninguém pode desconfiar disso. Ninguém pode desconfiar que você e Bianca são o cérebro da nossa família. – Giacomo arrancou um sorriso com sua declaração.
Jack é bom nas ruas, Hunter é bom em fechar negócios lícitos ou ilícitos e Giacomo sempre foi a força bruta.
Frank saiu do seu estado inerte.
— Desculpe – O homem parecia triste em ter que atender a ordem.
O soco veio pesado e forte, meu rosto virou para a direita com o impacto e senti a visão embaçando. Mãos me seguraram e a picada veio logo em seguida, sendo deitada com a cabeça virada para o lado no chão, fui perdendo os sentidos escutando Jack reclamar do soco e talvez ele tenha se aproveitado para descontar a adrenalina no pobre soldado.
Despida com todas as marcas expostas pelo corpo, as cicatrizes recentes abertas e apenas uma toalha cobrindo a nudez.
A escuridão beijou meus sentidos como uma velha amiga, não era assustador.
Meu único medo era que tudo desse errado e meus irmãos morrerem porque fui egoísta demais para continuar esperando que Stefano me matasse.