CAPÍTULO 3
MARIA LUÍZA
Batuco meus dedos na superfície dura da minha mala, já impaciente, esperando que Pâmela destrua mais um pobre coração iludido e possamos partir para Valência como me prometeu.
Arrisco uma olhada na direção dela, um moreno alto e escandalosamente atraente encara minha amiga com uma expressão de decepção, ela leva uma de suas mãos para o rosto dele, acariciando e balbuciando o que acredito ser palavras de consolo. Os olhos dele voltam a brilhar em encantamento, olhando-a com certa adoração.
Reviro os olhos quando ela lhe dá um de seus sorrisos sedutores, capazes de dobrar o mais vil dos homens e ele cai perfeitamente, correspondendo ao seu sorriso e a beijando na bochecha.
Sorrio, não acreditando na cena.
Pâmela Mourão é dez vezes pior que seu irmão mais velho, mas a sua carinha de Santa engana todo mundo.
— Feito. — Ela diz quando está próxima a mim novamente, dando de ombros como se tudo que acabei de presenciar não fosse nada de mais.
— Você é terrível. — Digo, não escondendo meu sorriso.
Ela sorrir de volta, me olhando em desafio.
— Como se você fosse pura e ingênua. — Diz, acusando-me com sarcástico.
— Nunca disse que era. — Respondo e nós rimos juntas, chamando a atenção de algumas pessoas no aeroporto.
E essa era uma grande verdade, eu não era nenhuma donzela pura e indefesa, mas já tinha passado dessa fase de farra que minha amiga tanto ama. Meu principal objetivo no momento era mostrar aos meus pais que meu sonho não era uma fantasia inacessível e infantil, que eu podia viver perfeitamente do que amava e estava pronta para vencer qualquer obstáculo. Não sou mais nenhuma menina, há muito tempo me enxergo como uma mulher capaz e independente, só preciso fazer com que eles enxerguem o mesmo. Tudo bem que eu estava largando pela segunda vez a faculdade, qualquer um que olhasse de fora me acharia uma mimada egoísta e ingrata, só que a única verdade é que eu estava correndo atrás dos meus sonhos e infelizmente isso não incluía mais um ano em um curso que eu não gostava.
Meu telefone não parou de tocar na última meia hora, mamãe deve estar entrando em desespero depois da mensagem que enviei. Era, para mim, ter entrado em um vôo que me levasse direto para o Brasil, primeiro São Paulo e depois Rio janeiro, onde ela e papai estariam me esperando para termos uma conversa série sobre o meu futuro.
— Vamos? Daqui a pouco o gostoso do amigo de meu irmão chega e voaremos rumo ao seu futuro. — Suas palavras me fazem sorrir esperançosa, suspiro cheia de expectativas e caminho ao seu lado com um frio na barriga.
Sinto que essa viajem vai mudar minha vida.
— Estou orgulhosa de você, Lú. — Diz, entrelaçando seu braço ao meu. — Queria ter sua coragem e encarar papai, dizer o quanto odeio a faculdade de medicina e sua nova mulher.
Paro minhas passadas, fazendo com que ela também pare as suas. Deixo minha mala de lado e agarro sua duas mãos, mantendo nossos olhares presos um no outro.
Sua expressão é de confusão.
— Você pode Pam, apenas vá e diga. Tenho certeza que Théo lhe apoiará. — Ela sorrir com a menção do irmão mais velho. Por favor, minha amiga, corra atrás do seu sonho. — Digo, cansada da tristeza frequentemente em seu olhar.
Conheci Pâmela há cinco anos, no Brasil, durante as suas férias e nos tornamos amigas inseparáveis deste então. Acho que sua personalidade irreverente se encaixou com a minha desbravadora. Fugimos do normal, não nos encaixamos fácil e isso nos ligou.
— Sim, Théo me apoiaria sem dúvidas. Prometo que quando chegar em casa falarei com ele e com papai. — Assinto, lhe dando um abraço encorajador.
Sei muito bem que a medicina nunca lhe agradou, sua paixão pela dança foi herdada da mãe e minha amiga tem um talento nato, embora ignorado.
— Vamos. — Digo, voltando a pegar nossas malas.
Passamos por um grande portão de vidro, avistando de longe seu Leopoldo conversando com um homem.
Vozes altas me chamam a atenção e encaro um jovem casal que discute de forma fervorosa em italiano, a mulher abraça a criança em seu colo com força e tenta a todo custo se afastar do toque do homem. Muitas pessoas estão prestando atenção na briga, mas eles parecem não se importarem. O homem está trajando um terno cinza-escuro, de aparência sofisticada e gravata vermelha. Fico estática observando toda a cena, ele passa as mãos pelos cabelos, depois as põe no bolso e balança a cabeça de um lado para outro, rindo alto. A mulher treme, deixando as lágrimas molharem seu rosto.
— Não encare. — Pâmela sussurra quando me pega olhando o casal, o homem também percebeu que estou encarando a tempo demais e me dá um olhar sombrio.
Minha amiga me puxa para longe e alguns passos já estamos distantes da confusão, encarando uma linda aeronave.
— Théo e papai adoram esbanjar. — Minha amiga explica e adentramos o jatinho, dou de cara com poltronas de couro, uma área separada com uma cama do mesmo material dos assentos.
UAU.
É tudo que consigo pensar.
— Bonito, não é? — Pergunta e eu aceno que sim.
— Perfeito. — Murmuro.
— Estamos sem aeromoça, não gostei como a última encarou meu irmão. — Diz, dando mais uma vez de ombros como se não fosse nada de mais.
Acontece que minha amiga pode ser muito possessiva quando quer.
Estamos sentadas quando seu celular apita, indicando uma nova mensagem.
Um sorriso malicioso brota em seus lábios e já sei que o conteúdo da mensagem deve ser erótico, ela volta sua atenção para mim.
— O quê?
— Você vai me odiar. — Murmura, fazendo meus olhos estreitarem em sua direção.
— Não.
— Sim, esse é apenas Giuseppe Fiorentino, um dos caras mais gatos e desejados de toda Itália.
— Também é o ex da sua prima.
Sua expressão é de incrédula quando escuta minhas palavras.
— Sim, não me lembrava disso. Agora tenho mais um motivo, hora da vingança. — Um sorrio maquiavélico estampa sua bela face agora, os olhos azuis-claros transparentes cintilam e sei que ela fará isso.
Merda!
— Quando? — Pergunto, me referindo ao possível encontro que ela já marcou com o ex de sua prima.
— Agora. — Diz, receosa.
— Não mesmo!
— Sim, por favor. — Pede com olhos de gato pidão e começamos uma breve discussão, onde seus poderes de persuasão sempre me vencem.
Estamos fora do jatinho agora, ela ainda tenta me convencer de que não pode perder essa oportunidade e quero apertar seu fino pescoço.
— Seu irmão e pai vão te matar.
— Só se eles descobrirem. — A sua expressão indica que está tramando algo e quando abro a boca para perguntar somos interrompidas.
— Pâmela? — Uma voz altiva chama, mas está se referindo a mim quando o olho.
Os olhos escuros avaliativos, parecem decorar todas as nuances do meu rosto e temo está babando agorinha mesmo. O cara é simplesmente gostoso demais, todo imponente no uniforme de piloto e Pâmela e eu suspiramos juntas, afetadas pela beleza devastadora do homem.
Puta merda.
Ela disse que o cara era bonito, mas isso aí já é ultrapassar os limites da perfeição.
Carambola, minha boceta está animada só de olhar para boca dele, imagine quando checar o resto.
Ele parece falar algo, mas estou tão fora de mim que não consigo juntar um raciocínio.
Minha amiga responde por mim e toma a iniciativa de dizer que eu sou ela, algum plano mirabolante está passando por aquela cabecinha para fazer tal afirmação. A encaro indignada, também confusa, mas ela me dá um olhar de" Não me desminta".
Ela vai embora alguns minutos depois, me pedindo para ir viajar sem ela e me passando mensagens indecifráveis com o olhar, estou tonta, ainda sem saber que atitude tomar. O homem passa a falar comigo, tentando de toda maneira estabelecer uma conversa e isso me deixa curiosa, Pâmela me falou que ela o tinha visto poucas vezes e foi um dos poucos amigos do seu irmão que não esteve rastejando em sua cama.
Então, que raios ele está fazendo?
Sinto o tom da sua voz mudar, quase como se estivesse com raiva e penso em checar sua expressão.
Só que a mulher que vi mais cedo aparece no meu campo de visão, desesperada e ofegante, ainda segurando a menininha em seu colo.
Ela começa a falar, parecendo transtornada. Não dizendo coisa com coisa e confundindo entre o seu idioma e o inglês, o piloto gato pede para falar apenas no inglês, sendo o que entendemos.
A mulher parece amedrontada e encolhe com o tom de voz usado por ele e quero xingar o babaca, não está vendo que ela já está nervosa o suficiente.
Observo de longe figuras masculinas se aproximarem de onde estamos, o mesmo homem de terno cinza aparece entre eles e não penso, simplesmente sigo meu instinto e pego a mulher com a criança e coloco dentro do jatinho. Ouço o piloto gato proferir algumas palavras, talvez alguns xingamentos, mas segue para a cabine mesmo assim.
Um longo tempo passa até que a aeronave deixe o chão, minha respiração voltando ao normal quando olho pela janela e vejo lá homens parecerem formigas.
Observo que a mulher faz o mesmo, chorando e sorrindo enquanto olha para baixo.