Capítulo Um: Itália.
Depois de mais de quatro horas de voo eu chego a Roma com o olhar de quem via um mundo novo. Todos me acompanharam até o aeroporto no embarque, e no desembarque estou totalmente sozinha, esqueço-me que não sei falar quase nada em italiano, o pouco que aprendi foi com vovó, que é descendente de italiano e me ensinou algumas coisas desde que eu era criança. É estranho misturar meu alemão com italiano, espero que aos poucos eu aprenda. Sigo até o ponto de táxi e vejo um rapaz de jaqueta de couro e óculos escuros com um inglês arranhado cortejando as mulheres que passavam, e logo percebe a minha presença e dá uma risadinha sarcástica, acho que ele estava zombando da minha roupa ou do meu cabelo bagunçado. Desviei o olhar fazendo sinal para um táxi encostar com um sorriso amarelo, torcendo para ele prestar atenção em outra coisa que não fosse eu. Um táxi encosta e o motorista sorridente com um bigode e barba de lenhador me cumprimenta, primeiro em italiano, depois com um inglês básico. Entro no táxi e dou uma última olhada no rapaz de jaqueta preta atuando como Don Juan italiano na calçada, ele ainda estava me observando, eu dei de ombro e fechei a porta.
O motorista dá partida no motor e logo começar a tagarelar qualquer coisa ligando o rádio, preenchendo o silêncio que ás vezes pairava entre nós, ele mostra alguns lugares, nomes de monumentos, museus, praças conhecidas, e dizendo coisas que não consigo compreender. Percebo que preciso me adiantar com a língua se pretendo ficar na Itália.
Seis meses antes da viagem e dessa mudança toda, eu conversei muito com vovó, ela tentou me fazer mudar de ideia, mas eu sempre quis conhecer a Itália, mesmo sem saber por quê. Só sei que muitas vezes sonhei com alguns lugares, talvez por assistir tantos filmes italianos com vovó. Estudei um pouco sobre cada lugar, e claro, me organizei com tudo, moradia, contatos, e uma reserva em dinheiro para segurar as pontas até eu encontrar um emprego. E eu vou precisar— Vovó faz questão de me mandar mesadas até lá— Sonhei com tudo, eufórica, e já cheguei a acreditar que teria coragem de sair de Sylt, e eu tive.
O pequeno apartamento fica num vilarejo entre outras casas antigas, com algumas ruelas charmosas de chão de calcário dando um bordão na orla, com uma vista linda para o mar. O motorista me ajuda com as malas até a escada do pequeno prédio colorido de paredes desgastadas pelo tempo, com um largo sorriso ele se despede desejando sorte, em italiano, "In bocca al lupo".
A maneira como os italianos se comunicam é icônica, eles se expressam com tanta lealdade aos seus sentimentos que fica impossível não perceber os sentidos de cada gesto, ora com as mãos, ora com a boca, e até o olhar. Todos são significativos. E os italianos têm um jeito peculiar de receber os visitantes e estrangeiros, desconfiados em sua maneira expressiva de ser, me acolhem na escada e oferecem ajuda, gritando algo que reconheci apenas três palavras e consigo chegar finalmente no terceiro andar, á minha porta. Eles se despedem ainda de maneira hilária e divertida, percebendo que estou perdida com a língua deles e eles mais perdidos ainda com o meu alemão.
Apesar do cansaço, não consigo deixar coisas para depois, estou ansiosa demais para dormir ou deitar, sequer consigo sentar para me situar de tudo. Ajeitei o pequeno apartamento, que já estava mobiliado. Notei que precisaria fazer compras, porém resolvo deixar para depois e aprecio o pôr do sol que se abria na minha janela de encontro com o mar que banha todo o vilarejo, com toques alaranjados penetrando nas nuvens desnudando algumas estrelas no fim verão italiano. E ali, a minha vida começa, com passos pequenos e tão apressados. Sinto-me pequena nesse momento, com o olhar de quem estava se descobrindo, se descascando, imaginando o que a Itália iria me oferecer, e eu oferecer a ela.