5: Desabrigada
Josué
Nadja me chamou para conversarmos num parquinho e então vim saber o que a mulher precisa.
Observo ela sentada num banco, olhando para as crianças se divertindo no escorregador. Seus cabelos estão soltos e ela usa um vestido branco que a faz parecer um anjo. Quem poderia imaginar que tipo de trabalho essa mulher faz?
Ela sorri quando uma criança joga uma manga podre na outra e as mães começam a brigar.
— O que tá pegando? — Me aproximo dela e sento ao seu lado.
— Bom dia, Josué. — Ela suspira. — Receio não poder utilizar integralmente o meu tempo para me dedicar à sua missão.
— Por quê? — Cruzo os braços e estreito os olhos. — Tá querendo me enrolar?
— Por problemas pessoais, tive que sair da casa do meu padrasto e, como eu não sou independente financeiramente, não tenho local para onde ir.
— Você trabalha com ele. E seu salário?
— De graça. Trabalho de graça. — Ela coloca o cabelo atrás da orelha e vira o rosto. — Algo que não me orgulho. Todavia, eu não tenho dinheiro no momento para arrendar uma casa e não quero pedi-lo ajuda financeira.
— O que eu tenho a ver com isso?
— Tenho duas opções: pedir que me dê um adiantamento.
— De jeito nenhum! Não te dou um centavo até aquele desgraçado estiver a sete palmos do chão!
Ela cruza as pernas e me lança um sorriso seguido de um suspiro. Parece que quer falar algo, mas reluta. Só espero que não vá pular fora.
— Abre o bico, filha!
— O que pedirei é humilhante, mas a opção mais viável. Poderia me abrigar, por favor? De preferência com você, porque suas outras casas são menos seguras.
— Quer morar comigo? — Levanto as sobrancelhas e dou um riso curto.
— Querer é uma palavra forte. Eu necessito.
Uma patricinha na favela? Na minha casa? Isso não vai dar bom. Além de ter que dar metade dos meus bens para essa mulher, agora eu vou ter que sustentar? Que situação cheguei, em.
— Josué, eu não vou ser um encosto. Passo 85% do meu dia na igreja ou trabalhando. Nem me verá na sua casa.
— Vai acabar virando a minha esposa de verdade.
Ela dá um risinho e diz:
— Se eu fosse sua esposa, eu estaria implorando para Deus me levar. Não tenho QI negativo para ser mulher de bandido.
— Zombando de mim? Nadja, você não tá se ajudando.
O seu sorriso some e ela olha para o lado.
— Desconte o tempo que eu ficar na sua casa do valor que irá me dar.
— E se você não conseguir chegar ao Soares?
— Pode me matar. Tem gente que mata por dívida de 2 reais. Eu tenho consciência que não tenho condições de pagar. Além disso, percebeu que mesmo que eu não consiga completar a minha tarefa, poderei receber com o divórcio?
— Você não é louca.
— Realmente. Eu não faria isso. Seria burrice.
— Sobre me pagar, você pode rodar a bolsinha.
— Vai contra os meus valores cristãos.
— Não pode se prostituir, mas pode trabalhar para traficante?
Ela ia me responder, mas preferiu ficar calada e não olhar nos meus olhos. Não sei de onde ela tirou que é crente…
Abro a porta da minha casa, Nadja entra depois de mim e fecho a porta. Ela olha para todo o lado com a boca aberta.
— Por fora da casa você não passa nem um reboco, mas por dentro é esse luxo todo? Não é uma casa de rico, mas é uma casa bem jeitosa e bonita.
— É um conceito, sabe? — Sento no sofá.
— Sei. — Ela deixa a mala do lado do sofá e se senta. Olha para o meu PC Gamer ao lado da televisão e levanta as sobrancelhas. — Você gosta de jogar?
— Eu curto uns jogos. Principalmente de RPG.
— E esse trem é o quê?
— Você não sabe o que significa RPG? — Dou um riso vendo o olhar completamente perdido dela. Ela é estranha. Aposto que não teve uma infância saudável. — Vamos falar de como serão as coisas: eu não tenho empregada, então raramente faço comida. Quem faz é minha mãe quando ela vem aqui. Tem sempre gente aqui, então não estranha quando acordar, não me ver, mas ver um moleque qualquer.
— E quem limpa a casa?
— Fim de semana eu pago uma senhora para limpar, mas já que você tem mãos…
— Trabalho todos os dias da semana, não tenho tempo para limpar sua casa.
— Relaxa, eu só tava tirando com sua cara.
— Não está colocando, mas já está tirando?
Cruzo os braços e ela vira o rosto.
— Eu só estava tirando. — Ela me olha de lado e coloca o cabelo atrás da orelha.
Suspiro e me levanto. Levo Nadja para o segundo andar e abro a porta de um quartinho só com um guarda-roupa e uma cama de solteiro.
— Pode ficar aqui.
— Obrigada. — Sorri e entra no quarto. Ela junta as mãos atrás das costas e fica me olhando sem dizer nada.
— Uai?
— Uai!? Tô esperando você dizer “fique à vontade” e fechar a porta.
Abusada do caralho. Eu devia ter jogado ela no quartinho de ferramentas. Não sei quantos anos aquele lugar tá sem limpeza, dona Nalva tem medo dos ratos que tem lá e nem chega perto para limpar.
— Não abusa ou eu te jogo na rua, viu?
— Eu sei o meu lugar.
— Espero que saiba mesmo. — Fecho a porta e vou para o meu quarto que fica no fim do corredor. Encontro a Bru ainda deitada na minha cama, dormindo.
Bruna é uma mulher que eu curto ficar. Acho que faz uns 2 meses que fico com ela. Ela não é melosa, não quer ser fiel, nem mesmo tem ciúme das outras, por isso que tá sempre aqui.
Pego a toalha que deixei pendurada na porta, saio do quarto e vou para o banheiro. Coloco a toalha em cima da pia e tiro a minha roupa.
— Caralho! — Arregalo os olhos ao ver o cara mais gostoso da favela pelo espelho. — Cada dia mais lindo. — Ergo o braço esquerdo e contraio meus músculos.
Ouço a porta ser aberta e Nadja se espanta ao me ver sem roupa, mas me seca de cima a baixo.
— Perdão! — Ela se vira.
— Não sabe bater na porta, não?
— Infelizmente, não sei. Acredita?
Sorrio de lado. Essa tem coragem.
— Já pode se virar.
Ela se vira e se assusta ao me ver pelado.
— O senhor não possui modos? — Ela se vira de novo.
— Modos eu tenho. O que me falta é vergonha na cara.
— Quando sairá do banheiro?
— Vou tomar banho. Daqui a pouco saio. Quer usar?
— Também preciso me banhar. Então aguardarei.
— Vem tomar comigo.
— Já que é assim, perfeito. Economizamos tempo, energia e água. — Ela entra no banheiro.
— Como é que é?