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4

Não conseguia distinguir todos as dores que estava sentindo.

Acredito que o que estava mais doendo era a minha alma, mesmo sentindo diversas dores.

Usaram meu corpo do jeito que queriam, havia lutado no começo com unhas e dentes, lutei o máximo que meu corpo aguentaria mas, quando as agressões que continham chutes, socos e mordidas começaram,me senti declinada a aceitar o que estava acontecendo.

Em determinado momento, acredito que perdi a consciência em alguns momentos. Meu corpo era invadido em dupla, as dores eram intensas e horríveis e, já não lutava contra eles, pedia apenas mentalmente que a morte tivesse piedade de mim e que ceifasse minha vida. Mas me sentia viva cada vez mais.

Diante de tudo, me vi tentando me refugiar em minhas próprias lembranças. Lembranças que naquele momento pareciam ser mais um mero sonho, me acalentavam.

Com os olhos fechados, sentia as pontas de seus dedos percorrerem meu corpo. Meu corpo estava completamente aquecido e não era somente por estar em cima de uma laje, em baixo do sol. Ele provocava essa sensação em mim, uma sensação boa que irradiava por toda parte do meu corpo e que me fazia sentir como se estivesse nas nuvens.

Com ele, meu primeiro amor, me senti amada, como nos filmes que assistia. Naquele momento eu me sentia em um filme,mesmo não estando em um dos cenários famosos dos mesmos. Mas não importava, acreditava que só bastava estarmos juntos, como naquele momento, que tudo ficaria bem.

Eu estava convicta de que tudo acabaria bem, tínhamos todo um plano traçado, detalhadamente minuciosamente e tentávamos o seguir a risca, sabendo que no final, teríamos nosso feliz para sempre.

- Eu amo você - Ele sussurra, com os lábios encostados em minha bochecha e tive a mais pura certeza de que era verdade.

Pelo menos naquele sonho, naquela lembrança, acreditei.

A realidade me atingiu com força, como um soco no estômago. Eu os ouvia me penetrando de todas as formas, os sentia me bater e os ouvia me xingar, além de tudo isso, ainda sentia suas urinas em mim como se eu não tivesse valor algum.

Talvez não tivesse mesmo. Talvez aquele fosse meu castigo por tudo que aconteceu e não me referia apenas a morte do meu marido, que havia sido causada por mim. Estava mais além do que isso, lá no passado.

Não havia uma palavra para descrever como estava me sentindo. Usada? Suja? Violada? Poderia ser o conjunto de todas essas palavras e mais algumas. Já não conseguia chorar, não saía lágrimas, só conseguia gemer e soluçar, enquanto meus olhos estavam fixos num ponto invisível.

Deitada no chão de barriga para baixo, com meus braços e pernas de um jeito estranho ao meu redor, os noto andar de um lado para outro, rir e conversar entre eles, como se nada tivesse acontecido.

Eu sabia que precisava tentar fugir, era a opção mais racional que qualquer pessoa tentaria, na situação que eu estava. Só que sentia que não conseguiria, estava muito fraca, me sentia debilitada, fora as dores múltiplas, quádruplas... que estava sentindo e que tentava ignorar, mesmo sabendo que era inútil.

Quando o cômodo fica vazio novamente e percebo um silêncio se instalar, uso o resquício de força que ainda me sobrava, para começar a me arrastar, pouco a pouco. O cheiro de urina e de sexo era forte e, já começava a me causar náuseas, além de me fazer sentir nojo de mim mesma.

Não sabia se um simples banho, conseguiria fazer com que eu me sentisse limpa. Era como se a única coisa que pudesse realmente me limpar, fosse água sanitária ou algo mais forte que isso.

Continuo me arrastando e logo consigo chegar na área da frente, não havia ninguém ali, então a esperança de que poderia fugir, se ascendeu dentro de mim e vi ali uma perfeita oportunidade para sair dali.

Levanto com dificuldade, me apoiando em uma cadeira e fazendo uma esforça extrema para conseguir me por de pé. Respirava pela boca ao caminhar em direção do portão, mas bastou uma olhada por cima do ombro, para notar que não estava mais sozinha.

Matias não estava muito longe de mim, mas não parecia que iria me impedir de fugir.

Mesmo com o alto risco de ser pega, consigo chegar no portão e estranho o fato do mesmo estar aberto, e não trancado.

Meu queixo treme e um soluço escapa do minha boca, quando saio para rua e começo a andar pela calçada, notando alguns olhares em minha direção. Olhares abismados e chocados.

Todas as pessoas que me aproximava e pedia ajuda, simplesmente se afastavam rapidamente. Não me davam ouvidos, não queriam me ajudar. Demorei um pouco para perceber que era por causa de Matias, que me seguia como um cão pela rua e que por causa disso, impedia que alguém me ajudasse.

Me aproximo de uma senhora idosa com umas sacolas, abrindo minhas mãos diante do meu corpo nú.

- Me ajuda - Peço com a voz urgente, num sussurro - Me ajuda. Por favor - Praticamente súplico,mas prestes a dizer alguma coisa, ela arregala os olhos ao olhar para minhas costas, franze o cenho e com a expressão triste, balança a cabeça de um lado para o outro.

- Me perdoa, meu Deus - diz baixo, se afastando de cabeça baixa.

Continuo andando pela rua, pedindo ajuda para as pessoas que via. Quando tentava entrar em alguma daquelas vendinhas de bairro, as mesmas fechavam as portas, impedindo que eu pedisse ajuda.

Eu chorava alto, mas nenhuma lágrima molhava meu rosto, invés disso, continuei andando, esperando ver alguma viatura que pudesse me ajudar, mas não havia nenhuma por perto, se quer um policial. Estava pela minha conta e risco, correndo o risco de continuar sendo violentada ou até mesmo morta.

As pessoas ali continuavam me olhando, paralisadas, mas não tentavam me ajudar.

De repente, sinto um forte puxão em meu cabelo, que me faz perder o equilíbrio e cair para trás.

- Ninguém vai ajudar - Matias ri, dando um tapinha em meu rosto - Sabem muito bem o que acontece, quando se metem em assuntos que não é da conta deles. E você não é um assunto da conta deles.

- Deixa eu ir embora - digo num sussurro, sem forças, olhando fixamente dentro de seus olhos, ainda buscando piedade em seus olhos.

- Você pode ir - diz saindo da minha frente - Mas não vai muito longe - Ele volta a me olhar - Você não é daqui. Isto está estampado na sua cara, podem matar você, antes mesmo de conseguir sair daqui - Ele me lança um sorriso maldoso - Então vai, tenta a sorte.

O que ele estava dizendo, tinha algum fundamento. Poderia morrer se tentasse fugir, mas também poderia morrer se continuasse com eles.

- Eu só quero ir embora - digo baixo, puxando minhas pernas para junto do meu corpo, me abraçando. - Só isso.

- Só vai embora quando o Christian quiser, ele é tipo um deus aqui. Já deve ter percebido isso.

Balanço minha cabeça de um lado para o outro, sem querer aceitar. Matias não esperava que eu diga mais nada, segura meu braço novamente com força e me puxa para cima, para que ficasse de pé.

Minhas pernas fraquejam e não consigo ficar de pé, principalmente sabendo que voltaria literalmente para o inferno.

- Não me faça arrastar você - Eu queria despertar um pingo de piedade que fosse em Matias, só que sentia que isso não era possível nele, já que não consegui fazer isso no próprio Christian.

Não parecia haver um coração no peito deles, deveria ter uma pedra ou um cubo de gelo, menos um coração. Isto estava mais do que claro para mim naquela altura do campeonato, estavam condicionados a me torturar de todas as formas possíveis e impossíveis, me levar para o extremo.

Matias acaba por fazer o que disse, começa a me arrastar pela rua, não se importando nem um pouco se os paralelepípedo iriam me ferir. E me feriram. Podia sentir minha pele se rasgar e o sangue começar a brotar e, mesmo com meus gritos e os olhares em nossa direção, ele continua, assoviando baixo, distraído com seus próprios pensamentos.

Parecia que ele fazia isso sempre, arrastar mulheres pelas ruas, as torturar... Com certeza ele já deveria ter feito isso, dada a sua maestria com o que fizera comigo, junto com os demais, era de se concluir que não era a primeira vez que faziam algo do tipo e sem dúvida eu não seria a última.

Senti o gosto do meu próprio sangue em minha boca, além da fraqueza se tornar persistente e eu começar a ficar tonta, zonza. Já não me importava por estar sendo arrastada, muito menos com as novas dores, que agora faziam companhia para as que já estavam ali.

Estava fadada aquele destino e já não tinha como lutar contra.

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