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Arabella
Hoje é o dia em que começo a trabalhar com meu parceiro, que infelizmente é Miguel. Não sei o que esperar dessa história de trabalho em equipe, mas independente de qualquer obstáculo, irei me empenhar muito pois essa é uma oportunidade de ouro e eu não irei perde-la por nada.
Eu vou é bancar a esperta e aprender tudo o que puder observando Miguel de perto. O cara é um dos melhores na nossa área, não que eu vá assumir isso em voz alta, mas, reconheço seu talento.
Faço o ritual de todo dia, passo o cartão de identificação, atravesso a recepção e sigo para minha sala. Ao entrar levo um susto ao ver Miguel sentado no lugar que outrora era de Rafael, trabalhando em alguma coisa em seu computador. Eu sabia que ele estaria ali mas era tão estranho, parecia que alguma coisa estava fora do lugar. Assim que me viu, parou de digitar e cumprimentou-me com um bom dia educado e voltou ao que estava fazendo.
Me sentei e liguei o computador, abri minha caixa minha caixa de e-mail e achei aquilo que procurava. O e-mail que Anthoni havia enviado, explicava o que deveria ser feito. A campanha que criaríamos deveria ser basicamente como sempre fazemos as demais, exceto pela parte de que ESSA tem que ser excepcional, pois estaríamos sendo avaliados. Objetivos:
1: Que a mensagem promocional chegue ao seu público-alvo.
2: Que a mensagem seja entendida pelo público.
3: Que a mensagem estimule os receptores a fim de tomarem ação.
E como tudo na vida precisa de planejamento, precisaríamos nos ajuntar e estabelecer um plano de metas que envolvia: Avaliar as oportunidades de comunicação de marketing; Quais os canais de Comunicação que seriam usados, Determinar os nossos objetivos; Determinar o 'Promotion Mix'; Desenvolver a mensagem promocional; Desenvolver o orçamento de promoção; Determinar a eficácia da campanha.
Era muita coisa mas eu estava confiante. Assim que terminei de ler o e-mail girei a cadeira em direção a Miguel e vi que ele continuava digitar e teclar freneticamente em seu computador. Quando percebeu que eu o observava parou o que estava fazendo e olhou para mim.
-Estive olhando algumas ideias e gostaria de saber a sua opinião. Não é tudo, mas já é um bom esboço para começarmos. -disse ao se levantar e trazer seu notebook para a minha mesa.
Ele puxou sua cadeira sentando-se ao meu lado e começou a me mostrar algumas páginas de seu planejamento. Por um momento achei ele estivesse trabalhando sozinho, porque o cara já tinha adiantado muita coisa e estava muito bom, só que ele deve ter esquecido que deveríamos estar fazendo isso juntos.
Desse jeito iria parecer que não fiz quase nada, até por que realmente eu ainda não fiz. O projeto seria praticamente dele. Então eu faria algumas pequenas mudanças para que esse projeto também tivesse uma cara minha.
Quando terminou de apresentar o esboço, comecei a indicar as modificações que faríamos. Confesso que pensei que Miguel não iria gostar das minhas observações ou achar que eu estava insinuando que não tinha ficado bom, sei lá, esperei por alguma reação contrária, mas ele não o fez.
Começamos a modificar uma coisa e outra e assim fomos até o final do dia. Não havíamos terminado ainda contudo estávamos bem adiantados. O esboço estava remodelado e pronto, agora tínhamos a parte mais trabalhosa pela frente, a criação tinha que sair do esboço e criar vida.
***
Já estamos na quarta semana em que estamos trabalhando juntos. E por Deus, como Miguel é teimoso feito uma mula! Embora seja talentoso, ele consegue ser irritante ao extremo. As vezes tenho vontade de pular na garganta dele e arrancar cada fio dourado de sua barba com uma pinça para ver se ele deixava de ser insuportável.
O cara é persistente para caramba e tenta ser persuasivo para cima de mim. Discordamos de muita coisa o tempo todo e após tanto trabalho árduo, finalmente estamos na reta final para terminar o projeto.
Ah, mas se a vida fosse simples assim, não seria a vida. Algo tinha que acontecer, não era possível terminar assim tão fácil.
Mal chegamos pela manhã e já estávamos enterrados de trabalho só que mais uma vez, o que não é novidade, discordamos em mais uma coisa. Agora estamos em um impasse. Ninguém quer ceder ou concordar com o outro. Falta tão pouco para finalizarmos, mas essa criatura não entende.
Quero fazer do meu modo pois tenho certeza que vai ficar melhor, mais moderno e atrativo. Entretanto essa coisa não percebe. Miguel quer que seja a sua maneira, machista, só por que é homem acha que é melhor do eu. E sendo o queridinho do chefe pensa que tenho acatar o que ele quer. Só que ele está redondamente enganado se acha que irei ceder aos seus caprichos.
E estamos nós discutindo novamente só que dessa vez a discussão estava mais acalorada, pois ambos estão com os ânimos muito exaltados. Miguel estava recostado na parede entre sua mesa e a minha e constantemente passava a mão em seus cabelos em sinal de estresse.
Já eu, estava rodando a sala dando voltas e voltas, tentando pensar em uma maneira de me acalmar e civilizadamente resolvermos essa situação. Todavia nada vinha em minha mente e cada vez que ouvia a voz do senhor-eu-sou-dono-da-razão eu me irava mais.
Por que ele tinha que ser tão cabeça dura? Era só concordar e acabaríamos logo com isso. Mas não, ele tinha que dificultar tudo!
-Olha só, porque temos que ficar prolongando isso? Você sabe que dou meu jeito vai ficar melhor. Você praticamente fez todo o esboço, por que não pode concordar comigo agora? -eu disse.
Sei que mudamos muita coisa do esboço, mas tentei a sorte para ver se ele cooperava comigo.
-Nem vem com esse papo para cima de mim. Nós o refizemos de novo, então essa não cola. E não, eu não concordo com sua maneira, não vamos fazer assim. Você sabe que não é a melhor opção. -disse me encarando com o semblante sério.
-Ah, vai se ferrar! Você se acha o dono da verdade e que devo obedece-lo cegamente. Sou eu que não concordo com você e não o contrário, seu prepotente. -berrei irritada.
-Você está louca, só pode. Eu nunca afirmei ser o dono da verdade. E nunca, em momento algum eu me sobrepus a você. Não faço sei de onde tirou essas ideias. -ele elevou seu tom de voz.
-Você se sobrepôs sim. Em todo momento falava comigo como se eu não soubesse o que estava fazendo ou pior, como se eu fosse burra. -disse parando de vagar pela sala e olhando fixamente em seus olhos.
Ele olhou para mim com um semblante indignado. Suas sobrancelhas se arquearam tanto, que achei que encontrariam com seu coro cabeludo.
-Você é impossível! Não vou mais perder o meu tempo discutindo com você. Vou falar com Anthoni, é ele quem vai avaliar as duas opções e decidir. Porque com você não tem jeito. -disse.
Miguel não poderia contar para Anthoni, pois eu e esse idiota perderíamos pontos na avaliação de desempenho do trabalho em equipe, pois não chegamos a um acordo e ainda estamos brigando.
Seria péssimo. E eu não poderia deixar isso acontecer, não depois de ter aguentado esse mala por todo esse tempo. Ele não vai sair daqui, nem que eu tenha mesma tenha que impedi-lo.
Quando Miguel estava a caminho da porta eu o chamei, ele ainda segurava a maçaneta quando se virou para me olhar. Então eu corri e pulei nele. Travei minhas pernas em sua cintura e com o impacto do peso suas costas bateram contra a porta.
Ele me olhou como se eu fosse um bicho de sete cabeças, entretanto não dei importância. Agarrei seu pescoço com o máximo de força que tinha e não soltaria até que ele desistisse de ir falar com Anthoni. Não sei o que deu em mim naquela hora, só sei que quando eu percebi já tinha feito e agora não dava para voltar atrás.
-O que você está fazendo, perdeu o juízo? Que fazer o favor de me largar! -perguntou exasperado enquanto puxava-me pela cintura tentando me tirar de cima dele.
-Eu não vou te soltar, enquanto você não desistir de ir falar com Anthoni. -eu disse desesperada.
-É claro que vou falar com ele, não chegamos a lugar nenhum até agora e você não pode me impedir. -ele disse revoltado.
Dito isso, aumentei ainda mais o aperto ao redor de seu corpo. Já estando para lá de nervoso, ele puxou meus braços de seu pescoço e nos girou de maneira que eu ficasse de costas para a parede próxima a porta. Miguel segurou-os facilmente no alto contra a parede com uma mão e, com a outra tentava soltar uma de minhas pernas de seu tronco.
Foi quando tudo desandou. Aconteceu rápido de mais para que pudéssemos evitar. Na verdade, isso poderia ter sido evitado se eu não tivesse agido de maneira tão irracional.
Enquanto protagonizávamos nosso showzinho, a porta da sala foi aberta de súbito e, Anthoni com a presença de mais três pares de olhos nos pegaram no flagra.
Eram três mulheres, a mais velha aparentava ter uns quarenta e cinco anos, contudo possuía uma pele muito bem conservada de dar inveja. As outras duas mulheres aparentavam estar na casa dos trinta e poucos anos.
Eu observava tudo congelada na mesma posição, todavia tinha me esquecido de que ainda estava grudada em certa pessoa. Como entramos em estado de choque por termos sido surpreendidos, literalmente, não nos movemos, parecíamos estar petrificados.
Então retornando a consciência desprendi minhas pernas que estavam ao redor dele, e Miguel também pareceu voltar a si soltou meus braços e nos afastamos ao máximo um do outro.
Eu não sabia o que fazer, estava sem palavras e ao que parece o babacão também. Miguel nada disse para consertar o estrago. Anthoni que parecia extremamente chocado com nosso comportamento, interrompeu o silêncio constrangedor dizendo que teria uma conversa conosco em outro momento.
Gelei na hora pois sabia o que ele estava pensando. Mesmo que nada realmente tenha acontecido, não foi que pareceu. Anthoni sempre prezou pela disciplina e decência no ambiente de trabalho, ou seja, ambos estávamos muito ferrados.
Entretanto antes que qualquer outra coisa fosse dita, uma das mulheres, a mais velha do grupo, questionou nosso chefe.
-Ora, o que é isso Anthoni? Não me diga que irá repreender os pombinhos só por que estavam dando uns amassos? Na época da faculdade você nunca achou ruim quando fazíamos o mesmo entre as prateleiras da biblioteca. E olha que lá era um lugar sagrado para os amantes da literatura assim como você. -ela disse sem nem se importar por estar expondo suas vidas pessoais.
-Este não é o ambiente para essas coisas. Por Deus, isso é uma empresa séria! -Anthony respondeu-a ao mesmo tempo em que falava para nós.
-Ah, me poupe do sermão querido. Eles são jovens, bonitos e tem toda essa tensão sexual pairando no ar. Além de tudo eles estão em horário de almoço, não é? Então eles podem fazer o que quiserem nesse tempo. -ela retrucou sem se abalar.
Anthoni franziu o cenho, desgostoso com o rumo da conversa.
-Agora ande, já sei como vamos fazer para entrar em acordo e fechar negócio. Tive uma excelente ideia e aposto que você vai adorar. -ela disse e o puxou pelo braço em direção a porta.
Depois que todos se foram restando apenas eu e Miguel, nos encaramos de maneira estranha e embaraçosa e, como nada podia ser desfeito sentamos em nossos respectivos lugares e esperamos até que Anthoni nos chamasse para resolver essa situação.
Não continuamos o projeto, acho que nós dois estávamos cansados e apreensivos demais para fazer qualquer coisa. As horas se passaram e ainda não tínhamos sido chamados. Eu estava morrendo medo com que aconteceria e toda essa espera não estava ajudando em nada.