Caçadores
Aidéa/Amélia, voltou ao aquífero, mas foi pelo caminho seco, pois para fazer o caminho inverso, teria que pegar os dutos de águas sujas indo para a purificação e não estava a fim de se sujar com dejetos não identificados. Seguiu pelos corredores até chegar em uma estação de ligação, onde subiu num veículo individual, fechado com material resistente e transparente, ligado a trilhos lisos, inteiros e sem interferências. Esse veículo corria por toda lateral interior do Planetóide, conduzindo qualquer coisa ou pessoa em longas distâncias por curto espaço de tempo.
Em um piscar de olhos ela chegou no setor de purificação de ar. Uma imensa instalação, ocupando apenas uma das pontas do planeta, mas responsável pelo por todo o complexo. Entrou por uma porta que levou a um corredor e que levou-a à sala de manutenção. Entrou na sala de computadores e ocupou a frente de uma das telas, nenhum dos três funcionários que estava no local, deu atenção a sua entrada, pois estavam acostumados a troca de funções e funcionários, na verdade ninguém se conhecia.
Ela entrou no sistema e analisou todo o complexo, identificou quase imediatamente, todas as peças obsoletas e que precisavam ser trocadas. Fez o pedido ao setor de manutenção e continuou analisando a estrutura física, parte de engenharia mecânica e elétrica e foi aí que encontrou vários mecanismos invertidos, que caso não fosse corrigido imediatamente, não levariam dois ciclos de tempo (60 horas terráqueas), para envenenar o ar, causando mal estar, cansaço físico e mental, debilitado todos os habitantes do lugar.
Entrou em contato com os dois engenheiros de plantão, indicando o problema e pedindo urgência na correção. Levantou-se e foi ao local da inversão mais próxima para observar se seria obedecida em seu pedido de urgência. Parou próxima ao local, escondida por um imenso tubo vertical, fundindo-se ao lugar e esperou. Logo apareceram dois homens e dirigiram-se as válvulas de filtragem e depois de observarem todos os controladores de pressão e bombeamento, confirmaram a troca de parâmetros que invertia passagens importantes entre o ar puro e o tóxico.
— Como isso aconteceu? Não tem como acontecer sozinho. — Falou o engenheiro, identificado pela roupa amarela.
— Teremos que investigar qual foi o último técnico que veio aqui — respondeu o técnico de manutenção, de roupa cáqui.
— Para isso teremos que avisar a fiscalização de segurança, só eles podem verificar as fichas e vídeos dos funcionários que atuaram aqui. — devolveu o engenheiro.
— Eu não tenho coragem de relatar uma falha tão perigosa para todo o planeta. — Defendeu-se o técnico.
— O importante é que alguém identificou e estamos corrigindo, vamos verificar os outros conjuntos de válvulas e pressurizadores. — Chamou o engenheiro e após acertarem tudo, foram para o próximo local.
Aidéa estava cada vez mais cismada com esse caos nos sistemas primários do planetóide. Alguém parecia estar sabotando tudo, para matar as pessoas silenciosamente. Com certeza, não queriam destruir o planeta, só tirar todos os habitantes e depois poderiam povoá-lo novamente, consertando o que escangalharam. Uma jogada de estrategista, mas quem seria e para que povo estava liberando o lugar?
Ela verificou que eles realmente estavam acertando tudo e voltou ao veículo, indo direto ao aquífero. Aquele era o lugar mais importante de todo o complexo, pois era o único produto natural da terra, que fornecia não só a água, como o oxigênio e a energia para todo o planetóide. Só que as horas se passaram e o período de trabalho encerrou, ela queria aproveitar esse momento e observar se alguém diferia do comportamento habitual.
Escondida em uma das galerias, viu os funcionários passarem nas fileiras habituais, seguindo para o refeitório e depois iriam para seus quartos. Passou um bom tempo ali, camuflada de parede, até que no final da fila um dos funcionários se deslocou, furtivamente, para a área de entrada do aquário. Aidéa seguiu o indivíduo, que entrou em um vestiário e saiu com roupa de mergulho. Ela correu e se trocou também, voltando e seguindo para a mesma entrada do funcionário furtivo.
Viu ele pela vidraça na parede, nadando em uma direção que ela não fora. Entrou na água e foi atrás, conforme entrava pela caverna submarina, via-se num local cada vez mais rústico, até sair em uma imensa lagoa azul, com um teto de milhares de pedrinhas coloridas. Haviam luzes artificiais por toda volta, que faziam as pedras refletirem a luz como um caleidoscópio.
Lindo!
Uma caverna colorida. Aidéa estava tão envolvida pelo ambiente que não percebeu o homem vindo por baixo d'água e puxando ela pelos pés para o fundo. Ela se virou rapidamente, deparando-se com uma face sorridentes por trás da máscara respiratória. Ele apontou para cima e subiram, nadaram até uma das praias que se formavam na orla da lagoa. Tiraram as máscaras e se olharam.
— Quem é você? — ele perguntou.
— Meu nome é Amélia.
— Você me seguiu, porque?
— Achei estranho.
— É, tudo no planeta está estranho. Essa política controladora tirou nossa essência e o pior é que a maioria não percebe que isso não é vida. — Comentou o estranho.
— Entendo você, estou morrendo com esse sistema, por isso te segui, queria saber se você faria algo divertido. — Falou Amélia, sorrindo.
— Conheci esse lugar quando fui consertar uma saída de água do aquário e resolvi me aventurar.
— Aventura… essa não é uma palavra falada ou praticada por aqui.
— É verdade, não é. Eu não sou daqui, vim com um conhecido de trabalho. Ele descarregava a nave de entrega e eu carregava a mercadoria para os depósitos da estação cargueira. Ele me falou desse lugar e viemos nos aventurar. Conseguimos autorização de trabalho porque precisavam de quem fizesse o que ofereciam e assim ficamos.
— Interessante! E seu amigo trabalha em que setor? — Amélia perguntou, interessada.
— Embarque e desembarque de cargas. — Respondeu ele, fazendo ela lembrar de quando chegou, será que já estava lá?
— Ele ficou na mesma área em que eu trabalhava antes. — Informou ela.
— Sim? — Perguntou ele, franzindo a testa, desconfiado.
— Eu, agora, fiscalizo o funcionamento de máquinas de cada setor. — Informou ela, inocentemente.
— Que legal, então você anda bastante não? — Perguntou ele.
— Sim. Acaso você viu algo estranho acontecendo por aqui? — Perguntou ela ao que era justamente a coisa estranha por ali.
— Para ser sincero, você perguntando agora, achei estranho encontrar umas válvulas funcionando contrárias às especificações. Se eu não estivesse sempre observando, não notaria e a água já estaria mostrando sinais de despressurização. — Se ele estava sempre observando, como estavam ao contrário? Pensou ela.
— O que exatamente causaria isso? — Perguntou ela, como se não soubesse de nada.
— A água não chegaria aos setores mais longínquos e um deles é o agro. Iria a falência.
— Isso causaria um caos. — Comentou ela.
— Verdade. O pior é saber que foi alguém que fez de propósito. — Ele jogou a desconfiança no ar.
— Isso é sério?
— Mas não é problema meu, fiz o que pude, os administradores que cuidem disso. — Isso soou muito estranho aos ouvidos dela.
— Acho que você tem razão. — Aidéa fingiu concordar com ele para não criar discussão.
— Melhor irmos, a luz já vai se apagar. — Sugeriu ele.
— Sim, é melhor mesmo.
Mergulharam e seguiram para a caverna de ligação, Aidéa ainda desfrutava da delícia da água fresca e da fauna e flora existente em lugar tão inóspito. Logo chegaram ao vestiário, se despediram e foram cada um para seu alojamento.