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Ela disse que não dormiria comigo

POV PEDRO

Quem quereria fazer 18 anos para ir embora de casa? Típico de alguém como ela! Patricinha, mimada e que não tinha o que fazer.

Se ela queria que eu perguntasse, estava ferrada. Não éramos nem amigos para eu ouvir suas lamentações, sobre o pai ciumento, a mãe que fazia suas vontades... Eu sabia muito bem como era aquele tipo de garota. Ela não era muito diferente de Anastácia. E pelo visto não era só fisicamente. Também era vazia por dentro. E ficava achando problemas para preencher sua vida monótona e perfeita.

Se julguei ela em menos de duas horas? Sim! Clara era fácil de se ler.

- Eu... Vou dar uma volta por aí... Quem sabe beber uns drinques azuis – riu e piscou, provando novamente o merengue – E encontrar alguém legal para me dar uns amassos.

Nem deu tempo de dizer que ela estava suja de merengue no queixo. Toquei a cobertura superficialmente e pus um pouco na boca, mal sentindo o gosto adocicado. Eu não comentei com ela, mas minha avó também usava Q-suco para dar cor ao merengue nas tortas.

Quem diria! Sai para o Baccarath, num sábado à noite, com três amigos. Logo nos tornamos oito pessoas no camarote. E agora eu estava sozinho. E só conseguia lembrar da porra do merengue colorido com suco em pó, que a doida tinha falado.

Qual a probabilidade de encontrar alguém na noite, teoricamente local para beber e paquerar, que falasse de suco em pó para dar cor no merengue?

Abri meus braços, me escorando, ocupando quase todo o sofá daquele lado. E mesmo sentado eu conseguia vê-la dançando. Não sei se ela tinha encontrado outras pessoas que conhecia ou fez um grupo de amigos naquela hora mesmo. Mas seguia pulando e cantando do jeito mais tosco e errado que já vi na vida. E eu nem precisava estar lá para saber que ela dizia para todo mundo que “amava” aquela música. Porque pelo visto ela amava qualquer uma que tocasse.

Ela era comum. Já disse que era fácil de lê-la? Nada intrigante. Só uma garota de dezoito que falava demais. Tanto que falava por mim e por ela.

“Só uma garota comum!”, me ouvi falando para mim mesmo em pensamento, enquanto ainda a observava. Era magra demais. Os peitos pequenos demais. O salto alto demais. A estatura baixa demais. Falava... Demais. Era tudo “demais”. Ou seria “de menos”? Será que a loucura era viral? Se sim, peguei dela.

Ah, porra, lá estava Pablo indo na direção dela, como se estivesse completamente enfeitiçado. Ela nem tinha tantos atrativos assim!

Ele pegou-a por trás e agarrou-se nela, passando as mãos ao longo de seu corpo, parando na cintura. E ela pareceu gostar. Sim, a garota que não gostava de homens de barba e era “preconceituosa” quanto àquilo estava deixando “Pablito” encostar os pêlos crescidos do rosto no ombro dela e pescoço.

Espera aí... Eu disse “Pablito”?

“Ana Clara! Mas pode me chamar de “Clara”! Eu não iria chamá-la de jeito nenhum, já que não nos veríamos nunca mais depois daquela noite. Até porque, se ela fosse o tipo de mulher que me chamasse a atenção, eu já a teria notado ali no Baccarath anteriormente.

A menina que sempre sonhou fazer 18 anos levou “Pablito” em banho-maria por três música, recusando-o furtivamente. Cruzei as pernas e comecei a rir de mim mesmo, enquanto curtia as investidas do paraguaio.

Peguei a garrafa de Chandon e bebi no gargalo o que restava. Até que a vista não estava tão ruim. E me peguei pensando se o paraguaio aguentaria ficar tão junto dela sem endurecer o pau.

- Oi.

Voltei minha atenção para a garota que me chamou, subindo no camarote. Me entregou um guardanapo de papel:

- Minha amiga mandou o número dela para você. Mas se quiser, posso apresentá-los pessoalmente agora. – Ofereceu.

- Quem é a garota? – Perguntei, por curiosidade.

Ela apontou para a morena alta, de corpo bonito e vestido tomara que caia, bem parecido com o de Clara, também brilhando conforme se mexia nas luzes coloridas do Baccarath.

- Eu... Prefiro ligar depois. – Tentei ser gentil.

Ela deu um sorriso sem graça e saiu. Olhei o número e pus sobre a mesa. Por que eu ligaria para uma desconhecida? Se não quis que me apresentassem ela pessoalmente, falar por telefone só se eu fosse louco.

Sim, eu era o tipo que recusava mulheres. Se eu gostava delas? Claro que sim... Muito! Mas meus objetivos no momento não me permitiam focar num relacionamento. E se eu não queria me envolver seriamente com ninguém, ficar por ficar não tinha sentido. Pelo contrário, ainda corria risco de arrumar uma “sarna para me coçar”, uma louca que ficasse pegando no meu pé, como Anastácia fez um tempo, até eu decidir ficar com ela. E eis meu erro. Antes não tivesse me envolvido e ficasse forte até o fim. Só assim não estaria ali, sozinho, pensando nela e imaginando porque não veio, mesmo eu convidando.

Era quatro da manhã quando Marcos e Aníbal decidiram ir embora e levaram as duas garotas junto, garantindo deixá-las em casa.

Logo Pablo e Clara vieram e a amiga morena dela também, que estava acompanhada de um homem que frequentemente estava por ali, na noite do Baccarath.

- Clara, eu vou embora! Vamos? – A outra a chamou.

- Eu nem comi o meu bolo, Flora.

Ela continuava focada no bolo, desde que chegou. Esfomeada!

- Já pedi para o meu pai chamar um táxi. Estou com dor de cabeça e meus pés estão doendo.

- Mas é o meu aniversário! – Ela fez beicinho, tentando convencer a outra a ficar.

Mas era muito manipuladora e descarada!

- Já liguei a cobrar para o papai. Não vou ligar de novo! Ele já deve ter mandado o táxi.

- Tudo bem! – Ela revirou os olhos e fez cara de triste.

- Te llevo a casa. – Pablo ofereceu.

Como ele a levaria em casa? Pablo mal sabia em que cidade estava! Falava “portunhol”, estava hospedado num Hotel e “duro”, sem dinheiro para nada! Tanto que quem pagou para ele passar a noite conosco foi Marcos.

- Você tem carro? – Ela perguntou.

- Sí.

Sim? Eu deveria interferir e falar a verdade, que ele não tinha carro e estava mentindo?

- Veio de la Uruguai de carro, Pablito? – Ela perguntou, curiosa... Ou desconfiada.

- Sí.

Eu balancei a cabeça, rindo. Pablo era um cínico. E já nem se importava de ela dizer que ele vinha do Uruguai. Aliás, acho que ele nunca se importou. Quem se importou fui eu.

Elas se despediram e a outra se foi. Achei que Clara iria sair com Pablo logo em seguida, mas não. Sentou e pegou o bolo novamente.

- Quer um pedaço? – Me ofereceu.

Neguei com a cabeça.

- Un pedaço de bolo, Pablito? – Perguntou como se ele fosse surdo e não espanhol.

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