Capítulo 6
Lemi Murabak
Assim que o avião pousou em Kudsi, meu coração começou a bater mais rápido. A ansiedade, misturada com a expectativa, tomava conta de mim, pois sabia que iria me reencontrar com pessoas que amava profundamente. Empurrei a porta do avião e, com minha bengala apoiada em uma das mãos, comecei a descer as escadas.
Eu já estava acostumado com os olhares das pessoas, o fato de ser manco chamava a atenção de todos ao meu redor. Antes, eu me importava com os olhares curiosos e julgadores, mas agora, com o passar dos anos, eu tinha aprendido a não permitir que essas opiniões alheias me afetassem.
Contudo, quando avistei minha mãe e meu irmão esperando por mim, meu coração se encheu de emoção. Os olhos marejados de mamãe, que não conseguia conter as lágrimas que escorriam pelo seu rosto. O nó em minha garganta parecia maior do que nunca, e só consegui soltar uma única palavra: "Mãe".
Ela correu em minha direção e nos encontramos em um abraço apertado. O calor do seu corpo contra o meu me transmitia uma sensação de alívio e segurança. Os olhos vermelhos de minha mãe refletiam a saudade que ela sentira durante meu tempo distante, e agora todos os sentimentos acumulados eram liberados em lágrimas sinceras.
Logo, meu irmão, Aslan, também se uniu ao abraço coletivo. Aquela cena era comovente e me fez perceber o quão abençoado eu era por ter uma família que me amava incondicionalmente. Eu tinha me esquecido disso. Eu estava novamente envolvido no seio de minha família, e apesar de todas as dificuldades que eu enfrentava diariamente, aquele momento de reencontro era um lembrete de que eu não estava sozinho.
"Venha, meu filho, seu pai está esperando por você. É tão bom ter você aqui."
Seguimos em direção ao imponente palácio, os carros entravam pelos portões da grandiosa construção que trazia à tona lembranças dolorosas do dia do meu acidente. A presença ostensiva da segurança ao redor do palácio só aumentava a pressão que eu sentia dentro de mim. Afinal, eu não pertencia mais a esse mundo, a esse ambiente de poder e responsabilidades.
Assim que entrei na sala do palácio, pude ver a quantidade de sobrinhos que eu tinha agora. Como puderam se multiplicar dessa forma em tão pouco tempo? As crianças, inocentes e curiosas, observavam-me com olhares cheios de admiração. E como eram crianças lindas. Diana, a esposa de Aslan, me abraçou, disse que estava com saudades e não era para eu me afastar.
Finalmente, chegou o momento de encontrar meu pai. Ele estava deitado em seu grandioso quarto, com a expressão serena no rosto. Cada pedaço daquele lugar trazia à tona uma lembrança, um fragmento de uma infância que parecia distante. Meu pai sorriu ao me ver e eu me sentei ao seu lado, segurando sua mão com ternura.
"Fico feliz que você esteja aqui, meu filho", disse ele com voz fraca. Seus olhos refletiam a sabedoria acumulada ao longo dos anos, e eu sentia uma mistura de gratidão e medo ao encará-los. Conversamos por um tempo, mas então meu pai compartilhou algo que me deixou atordoado. "Tenho um pedido a lhe fazer, meu filho."
"O que é, meu pai?"
"Quero que me prometa que vai aceitar o que vou lhe propor, Lemi. Não deixe que seu pai parta dessa vida sem que você aceite meu pedido."
"Qual é o seu pedido, papai?"
"Karilink, meu filho. É um país que eu herdei e passará a ser seu. Aslan já governa Kudsi, agora preciso que você se torne o novo governante de Karilink", disse ele com determinação.
Eu nunca ambicionei o trono, as responsabilidades e as decisões que viriam com ele. Esse país foi devolvido ao meu pai, eu tinha lido algo sobre isso enquanto me recuperava. No entanto, meu pai estava prestes a partir deste mundo, e como poderia eu dizer não a um pedido de um homem moribundo?
"Pai, eu não posso aceitar esse pedido."
"Lemi, por Alá, me prometa que vai governar Karilink, me prometa, meu filho."
Com a voz embargada, tentei expressar minha resistência, meu desejo de seguir um caminho diferente. Mas meu pai me olhou com olhos suplicantes, implorando para que eu assumisse seu legado, para que eu me tornasse um homem poderoso como ele fora.
Quando olhei para minha mãe, lá estava ela implorando para que eu aceitasse, ela sabia que ele tinha pouco tempo e estava esperando somente isso para poder partir em paz.
"Eu aceito, papai. Vou governar Karilink, assim como o senhor deseja", a carga emocional era avassaladora.
"Que felicidade ouvir isso. Só tem uma condição, para assumir Karilink, você deve estar casado, ter uma esposa ao seu lado."
"Casado? Mas eu…"
"Lemi, acho que não é tão ruim um casamento? Deixe seu pai feliz, meu filho", mamãe se junta a mim e sussurra em meu ouvido. "Não sabemos quanto tempo ele tem, ele quer passar Karilink para você ainda em vida."
Essa condição adicionou ainda mais peso à minha decisão. Eu jamais imaginei que minha vida tomaria esse rumo, que eu seria colocado diante de uma encruzilhada tão difícil. A responsabilidade de escolher um caminho que determinaria o restante de minha trajetória era avassaladora.
Agora, diante dessa exigência de casamento, meu coração se enche de incertezas e angústias. O destino me coloca à prova mais uma vez, me obrigando a confrontar meus desejos e anseios mais profundos. Será que sou capaz de aceitar esse fardo e me tornar o governante que meu pai espera que eu seja? Ou devo abrir mão e
trazer a infelicidade de um homem doente que quer morrer em paz, sabendo que o povo está em boas mãos?
As lágrimas começam a rolar pelo meu rosto enquanto encaro as consequências dessa escolha iminente. Será que, algum dia, encontrarei um equilíbrio entre meu dever para com meu pai e a busca por minha própria realização? A resposta ainda permanece obscura, mas sei que, para decidir meu destino, preciso encarar de frente a realidade e dar espaço às minhas próprias paixões e desejos.
O futuro se desdobra diante de mim, repleto de desafios e escolhas difíceis. A resposta está prestes a se revelar, e somente eu posso encontrar a coragem para seguir em frente.
"Eu vou me casar, papai. Vou encontrar uma esposa e tomar conta do país, fazendo a sua vontade", ouço a voz de minha mãe agradecendo a Alá por minha decisão. "Agora eu preciso encontrar uma noiva que esteja disposta a se casar com um manco e ter sua vida presa à minha", desta vez, quem sussurrou as palavras fui eu.