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capítulo 6

Emma

Sabe quando você entende o quanto é errado fazer algo e, mesmo assim, faz?Estou passando por essa situação. Duas semanas de intensas conversas com meu chefe, Ian Novack, mostraram para mim o quanto sou idiota e boba.

Primeiro: claramente, eu estava me apegando a ele e,arrisco-me a dizer, gostando dele. Ian é um babaca egocêntrico e, quando se estressa, é arrogante com todos que estão em sua frente.Desde que começamos asconversas, isso veio diminuindo um pouco, assim como o desejo dele de me encontrar.

Gosto de ver que o chefe que todos odeiam, no fundo, não é tão odiável.Sempre que ele está entediado ou tem novidades, manda-me mensagens de textos ou me liga quando chegamos em casa. Falamos sobre muitos assuntos, como, por exemplo,dos pais dele ou da vida boemia que ele tinha antes de tudo acontecer.

É estranho falarmosde coisas que nunca falei abertamente com ninguém, nem mesmo com Bia, que ainda está chateada comigo.Também estou com ela.

O pior de tudo é notar como estou ansiosa para ouvir sua voz, receber uma mensagem sua ou vê-lo no trabalho, mesmo que ele não saiba quem sou.

Estou completamente ferrada.

Meu dia foi cheio hoje e a única mensagem que recebi foi um “Bom dia, passarinho! ”

Não posso reclamar, pois também não consegui um tempo para o responder ou pensar no que acontecerá no fim do dia.

Agora, entrando em casa, coloco as chaves em cima do móvel, jogominha bolsa sobre o sofá como se ela fosse uma almofada,vou direto ao quarto escolher um pijama fofo e entro no banheiro.Meus pés doem, mesmo que eu trabalhe 100% do tempo sentada, em uma cadeira.

Como minhas lentes de contato estão me incomodando, tiro-as e resolvo ficar com meus óculos de reserva. No ensino médio, eu tirava tal acessório, o qual se unia ao aparelho dentário, tornando-me motivo de piada. Por isso me isolei e me coloquei na pior situação em que já estive.

Não que eu fosse rebelde ou cometesse loucuras.Mas, fazer amizade com pessoas de caráter duvidoso não pareciam uma má ideia quando eles se assemelhavam, aparentemente, comigo.

Por essa razão, hoje me reservo, tanto em relacionamentos— o que nunca tive— quanto em amizades, não me entregando totalmente.Bia é a únicaque já chegou perto o bastante de mim. Ela é minha vizinha, e foi assim que nos conhecemos.

Assim que cheguei para morar neste apartamento, o qual aluguei após brigar com minha mãe pela milésima vez,Bia estava enlouquecendo com o aparelho de som que havia comprado, principalmente por não saber como configurá-lo, e os vizinhos estavam reclamando do alto barulho que ele fazia.Então, pela minha paz, resolvi deixar as caixas da mudança de lado e bati em sua porta para tentar acabar com o ruído.Era algo simples para mim, porém difícil para a garota que só tinha um ano amais que eu de idade. Depois disso, ela me ajudou a colocar tudo no lugar em meu apartamento novo e comemos uma pizza no fim da noite.

Não nos tornamos amigas logo de cara, porque, como eu disse, não confio facilmente nas pessoas.Mas ela foi tão insistente em ficar do meu lado, jantar no chão, dizendo que era mais confortável, e me irritar com suas dicas de moda, que acabei me apegando a essa nova amizade.

A verdade é que Emma Stone não é a pessoa mais interessante do mundo e confiante.E, por ser assim, afasto as pessoas, deixando-me no escuro, sozinha e solitária.Claro... essaé uma opção. Em Los Angeles, por exemplo, um dos meus antigos colegas gostava de mim, sóque nunca quis nada com ele.Já aqui, Victor e Beatriz são meus amigos, porém, confesso que sempre boicoto as nossas relações.

Ian Novack é algo novo e divertido que me anima e me empolga, fazendo-me desejar nunca mais parar de conversar com ele.Devo confessar que se fosse qualquer outro, eu não hesitaria em conhecê-lo de perto.Mas, infelizmente, é meu chefe, muito rico, poderoso e sai em capas de revistas com as mais lindas modelos. Ele é tão lindo que me sufoca e só quer ser meu amigo. É lógico que o mistério sobre mim atiça os seus pensamentos;só que nada além disso. Ademais, assim que me visse, iria descobrir quão sem graça sou e, com certeza, não teria mais interesse de conversar comigo.

Enquanto a água aquecida tenta relaxar meu corpo, minha mente imbecil se lembra da imagem sexy do meu chefe saindo do prédio mais cedo.Estava sorridente e conversava com o motorista. Eu não sei o porquê de ele não usar a garagem do edifício onde trabalhamos, já queseria mais prático e reservado.O homem é um mistério para mim.

O barulho em meu celular me desperta dos pensamentos absurdos. Ainda estou com espuma pelo corpo e fico chateada por ter que sair do meu momento. Se for Ian, com certeza reclamarei sobre isso.

Impressionantemente, consigo ser respondona, irônica e provocar pelo telefone.Coisas que seriam difíceis de fazer pessoalmente.

Enrolada na toalha, abro a bolsa de forma desajeitada e pego o aparelho. Não é ele, e sim meu superior, o senhor Milton.

Respiro fundo e reviro os olhos.Acabei de chegar do trabalho e estou cansada.O que esse homem quer comigo a esta hora?

— Senhor Milton, a que devo a honra? —Fui sintática, mas irônica.

— Preciso de você urgentemente, Emma.Estamos sendo invadidos. —Falou apressadamente, ofegando. —É a melhor que temos,e o chefe está uma pilha de nervos com essa questão. Derrubaram o sistema e, a cada minuto que se passa, podemos perder tudo que lutamos para guardar.

Só pode ser uma piada.Como derrubaram as nossas defesas?

— Ok.Estou voltando para a empresa.Só preciso colocar uma roupa.

Amaldiçoo seja quem for que tenhafeito tal coisa.

— Não, Emma!Não foi em Nova York, e sim em Los Angeles.Estamos indo te buscar.Chegaremos aí em quinze minutos.

— O quê?!— Olho para o celular, ainda assustada.Do que ele está falando?— Senhor, eu...—A ligação cai.

Dá tempo de espernear e amaldiçoar mais uma vez o causador dessa invasão. Não tenho um minuto de folga.

Corro para o quarto e tento escolher para vestir algo que não seja péssimo. São nesses momentos que me julgo por não escutar Bia, que tem razão sobre minhas roupas.Porém, por sorte, ela me fez comprar algumas peças que considerou “melhorzinhas”.

A calça jeans escura e a blusa com poucos detalhes me ajudam a ficar... menos “Emma desajustada”. Pego meu casaco, pois está fazendo frio lá fora e não sei como estará em Los Angeles, apesar do clima de lá ser mais quente do que é aqui.

Prendoo cabelo em um rabo de cavalo e pegoos óculos, não querendo ter o trabalho de colocar as lentes. O par de botas de curto cano, com um leve salto, é minha marca registrada e completa o meu arranjo. Só tenho tempo de pegar o celular e fechar as portas, pois a mensagem de Milton, bastante apressado, logo chega para mim.Tenho medo de irritá-lo ainda mais.

Assim que saio para a rua, vejo o carro escuro que ele usa, estacionado do outro lado. Corro para entrar nele e seguirmos o nosso caminho.

Dentro do veículo, meu superior me explica mais sobre o ocorrido. Eu sei o estrago que um dano do tipo pode fazer em todo o sistema. E se forem hackers, os problemas se multiplicam, pois qualquer dado roubado poderá nos dar um prejuízo de milhões de dólares.

Com tudo que está acontecendo, minha cabecinha fora da terra não pensou muito bem em como chegaremos em Los Angeles rápido o suficiente para ajudar nessa falha. É claro que existem engenheiros lá que podem corrigi-la com facilidade, no entanto o que Milton me explicou é que o chefe deseja alguém de Nova York para dar um suporte extra.

Quando passamos pela entrada do aeroporto, entramos na pista de lançamento e eu noto uma coisa fora do comum:a grande e luxuosa aeronave da família Novack. É o transporte mais rápido para nós, só que algo me diz que nada acabará bem.E, unindo essa ideia ao pensamento de que o chefe precisa de alguém para o auxiliar, chegoà conclusão óbvia: Ian está nos esperando lá dentro e vou ficar cara a cara com ele.

Meu coração está praticamente saindo pela boca, minhas mãos suam e minha respiração acelerada me agonia.

— Tem medo de avião, Emma? —Perguntou Milton, vendo o meu estado.

—Não.Eu só estou ansiosa e...Com um pouco de medo sim; devo confessar.—Mas não é pelo motivo que ele acredita.

O homem com quem conversei por semanas está dentro do transporte e, provavelmente, sob estresse.Explodirá de raiva o caminho todo. Algo que estragaria tudo que construímos, porque nem o fato deconhecê-lo melhor agora, diminuiria a minha raiva se ele me tratasse como sempre tratou os que trabalham na empresa.

Saio do carro sentindocomo se o chão fosse feito de lava. O frio na minha barriga está quase me paralisando.

O meu superior é o primeiro a subir na aeronave, e só isso é suficientepara ouvirmos a arrogância do homem. Tenho que respirar fundo antes de colocar os pés dentro do pequeno avião.

Arrumo os óculos e me viro em direção à poltrona de couro macio onde me sentarei.

Ian me encara. Está, claramente, sob pressão, mas apenas me observa.

Pisco algumas vezes, saindo do transe, e me sentoem meu lugar. Eu estou perto da janela enquanto ele está a duas cadeiras de mim, podendome ver com muita facilidade. Ser encarada tão de perto e com tanta raiva é difícil. Meu coração parará a qualquer minuto.

— Por que demoraram tanto? —Perguntou para Milton, que está sentado de frente para ele. — Como uma coisa dessa pôde acontecer conosco, Milton?Logo conosco?

— A... Eu não sei... Senhor, ainda temos que saber onde foi a falha ou se...

— Pare de gaguejar, homem!—Pediuirritado.

Consigo observá-lo à distância, e ele sabe.Por isso me encara, fazendo-me desviar os olhos dele.

Passo o caminho todo ouvindo o quanto foi errado o que aconteceu, que não devia ter ocorrido tal coisa com uma empresa de proteção de dados e o quanto todos são incompetentes.

Não posso desejar que ele me reconheça,apenas que pare de falar tantas besteiras. Ian chateado não é o homem que conheci, e eu já devia saber o que aconteceria.Confesso que estar em sua presença e ouvir tudo isso é difícil.

Resolvo respirar fundo e não ligar para o que ele diz.

Dou graças a Deus por pousarmos,mas sabendo que o pior ainda está por vir.

O carro que nos levará, já estáà nossa espera. E se já estava difícil ficar na aeronave com ele, em um carro, onde o espaço é reduzido, é duas vezes mais.

Entro no automóvel e me encolho no banco. Não falei uma palavra desde que nos encontramos e, se Deus permitir, não falarei nada.

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