Capítulo 3
FILHO? Você vai ter um filho? – grita Beatriz, atônita com a notícia. Ela o empurra, enraivecida — Como você se atreve a fazer isso comigo?
— Fale baixo, Bibi, por favor. Nós ainda não fizemos o teste, mas é praticamente certo que sim. – responde Hugo, segurando ela pelos ombros —Você precisa me dar o divórcio. Eu quero fazer isso de forma amigável para que as pessoas não fiquem falando coisas… Mas se você continuar se recusando…
— É obvio que eu vou continuar me recusando! – grita tirando as mãos dele de seu ombro — Ou você acha que essa história de filho vai me comover? Agora mais do que nunca, EU NÃO DOU O DIVÓRCIO!
— Quer parar de gritar, Beatriz! A gente não tem mais nada há um ano. Não estamos mais juntos, deu para entender? Acabou o que tínhamos. O nosso casamento não existe mais! Agora, por favor, seja racional e madura, assine os papéis.
— EU NÃO VOU ASSINAR HUGO! NÃO VOU ASSINAR! – berra, enquanto pula como se fosse uma criança birrenta – EU NÃO VIVO SEM VOCÊ, ENTENDEU?!
Depois dessas palavras Beatriz vai para cima do Hugo e tenta beijá-lo, na esperança que ele cedesse como das outras vezes. Hugo empurra sua esposa, a derrubando no chão. Ela agarra as pernas de Hugo e implora:
— Eu amo você, Hugo! A gente se ama, meu amor! Pelo amor de Deus, volta para mim! Fique comigo, fique comigo, meu amor! – aos prantos. Ainda agarrada às pernas dele, implora — Vamos fazer terapia de casal, novamente. A gente queria ter uma família juntos, lembra?
— Lembro, assim como lembro que você não queria filhos enquanto não estivéssemos prontos. Mas eu estou pronto desde o dia em que te conheci, e você? – questiona se ajoelhando na frente de sua esposa desconsolada — Você sempre adiou. Sempre cheia de outras prioridades. Eu venho esperando por você há anos. Agora eu encontrei alguém que se arrisca e que está pronta para ter uma família. Por todo sentimento que tive por você, Beatriz – acaricia seu rosto — Eu te dou um mês para assinar o divórcio de forma amigável, um mês. Caso contrário, entrarei com o litigioso. Entenda de uma vez por todas que acabou.
Após dizer isso, ele se levanta e vira as costas. Beatriz deseja se erguer e abraçá-lo. Fazer com que através de seus beijos ele se lembre de que a ama. Quer que ele a toque. Deseja que tudo aquilo fosse um sonho, mas em sua mente permanece a palavra “Acabou”. Ela se levanta e sai sem dizer mais nada.
Assim que Beatriz sai do lobby, nota que alguns convidados a estão encarando. Eles escutaram tudo. Parece sem sentido explicar o que houve, aliás, nada mais faz sentido para ela. Está decidida a ir embora da festa quando uma luz acende ao lado da mesa dos noivos. O mestre de cerimônia liga o microfone e diz:
— Boa noite a todos os convidados. Bem vindos ao jantar de ensaio de Sônia Figueiredo Peixoto e Jorge MacPherson Andrade. E para iniciar os brindes, gostaríamos de chamar a Senhora Beatriz Gouvêa Abraão, madrinha e amiga da noiva. Uma salva de Palmas à Senhora Gouvêa Abraão.
Uma luz se acende em cima de Beatriz e o garçom lhe entrega uma taça de champanhe. Ela vai em direção ao mestre de cerimônias, suas emoções ainda estão à flor da pele, não se recorda direito do discurso que escreveu para esse momento. Na verdade, ele nem serve para a ocasião era apenas algo escrito para um jantar de despedida de solteira. Quando ela percebe, já está à frente do mestre de cerimônias que agora lhe entrega o microfone. Ela o segura e vira para os convidados com um sorriso, enquanto procura por Hugo. Acaba encontrando Flávio sentado na mesa dos solteiros com um olhar estranho, preocupado. Ele está certo em ficar preocupado, Beatriz está disposta a tudo para voltar com Hugo, ainda mais naquele momento.
****
— Boa noite a todos os presentes – começa Beatriz segurando o microfone com uma das mãos e com a outra a taça de champanhe. — É uma honra estar presente nessa noite tão especial para Sônia e Jorge – apontando a taça em direção aos noivos que sorriem para ela — Sabe, vai parecer um tanto clichê, mas Sônia é muito mais que uma amiga para mim, é a irmã que eu nunca tive. A minha irmã que meus pais não puderam me dar, mas a vida encarregou de providenciar. Você, minha irmã, que esteve em todos os meus momentos e que hoje me deixa participar do seu melhor momento. Você sempre cuidou de mim e eu sempre rezei para que entrasse alguém na sua vida que te amasse, cuidasse de você e que estivesse disposto a aceitá-la do jeito que é com todas as suas imperfeições. Demorou um pouco… Confesso… Demorou muito.
Todos os convidados e os noivos riem. Beatriz volta encarar os convidados a procura de Hugo, sem sucesso. Sua mente diz para continuar o discurso, mas seu coração grita para ela desabafar tudo o que sente.
— Desculpe-me revelar seu segredo, Sônia. Demorou muito, mas eis que surgiu o Jorge. Ele não era bem um príncipe em um cavalo branco, mas a amava e veio cuidando da minha querida irmã desde então. – Beatriz para, essa era a parte em que ela diria sobre Hugo que foi o cupido da relação de sua amiga. Olha para Sônia que recebe um beijo na bochecha de Jorge. Olha para Flávio que a encara, impassível. Tenta encontrar Hugo, em vão. — Claro que não podemos nos esquecer da pessoa que fez isso acontecer – bebe em um gole o champanhe, esquecera que era para o brinde — Desculpe - me, pode me trazer outro? Onde eu estava? – Ela começa a sentir calor e se abanar. Não consegue terminar o discurso. Respira fundo, enquanto olha para o belo lustre no centro do salão. Respira mais uma vez. As palavras estão entaladas em sua garganta.
O mestre de cerimônia se posiciona ao lado dela, enquanto Flávio já se levanta, indo em direção a Beatriz. Então ela sorri para o mestre de cerimônia mostrando que está tudo sob controle. Coloca o microfone próximo à boca novamente e prossegue, dizendo:
— Desculpem-me mais uma vez, acho que o champanhe subiu um pouco rápido – sorrindo — Continuando, claro que não podemos nos esquecer da pessoa que fez isso acontecer… Graças ao Hugo Gouvêa Abraão, meu marido… Meu marido… Onde quer que ele esteja… Com quem quer que esteja… – sua voz embarga. As luzes tentam localizar Hugo, sem sucesso — Eu sei que está por aí, querido… Talvez vocês não consigam localizá-lo… Ele deve estar tentando se esconder com a amante que trouxe para a festa… Sim… Ele trouxe uma amante para cá, sabendo que eu viria. – então Hugo surge iluminado na penúltima mesa segurando as mãos de sua acompanhante que agora coloca uma das mãos no rosto — Lá estão eles! Uma salva de palmas aos amantes! Vamos lá! Batam palmas para eles! Aliás, palmas para eles e o bebê que estão esperando! O bebê fruto de um adultério!– grita Beatriz, eufórica, colocando o microfone embaixo do braço e batendo palmas, acompanhada de alguns convidados que não estão entendendo o que acontece — Sabe Sônia, eu acho que você… Acho que você não devia casar com o Jorge… Ele é amigo do Hugo, melhor amigo. E sabem o que dizem não é? Diga com quem andas e direi quem és, Jorge! Fará o mesmo que seu amigo está fazendo comigo! Traindo-me diante de todos sem nenhum pudor! Traidor! – grita Beatriz enquanto o mestre de cerimônia tenta tirar o microfone das mãos dela.
Beatriz olha de relance para sua amiga que agora chora nos braços de Jorge, depois tenta encontrar Flávio que desapareceu e por último Hugo que saía do salão com sua acompanhante.
— Hugo! –berra Beatriz fazendo com que Hugo olhasse para trás pela última vez. Aquele olhar significa apenas uma coisa: O fim.
Beatriz sente seu corpo amortecido, quando os seguranças a tocam para retirá-la do salão, a pedido de Margout. Ao sentir o toque, Bia tenta se virar para falar com sua amiga, mas não consegue, mesmo se debatendo com toda sua força. Todos olham, chocados, para Beatriz que se debate enquanto os seguranças a tiram do palco. Ela grita “traidor”, com todas as suas forças. Quando dá por si está do lado de fora do Copacabana Palace com flashes dos paparazzis em sua volta. Tenta afastá-los, em vão. Todos eles querem uma foto da herdeira dos Gouvêa que surtou no jantar de ensaio da amiga. Em um acesso de raiva, Beatriz empurra um paparazzi e corre para o meio da movimentada Avenida Atlântica.
****
As ondas batem impiedosas nas pernas de Beatriz, como pequenas lâminas atravessando sua carne. Mas naquele momento é a menor dor que sente. É a primeira vez que sente que acabou definitivamente o seu casamento. O que mais doía em seu peito é o fato de ter visto que Hugo não a ama mais.
Tudo em que ela pensa é em como viverá sem ele que é o seu mundo e lhe foi tomado. Ela continua entrando no mar, enquanto deseja voltar ao começo, quer poder encontrá-lo naquele réveillon e ter dito não. Ter a chance de viver sem ele e todo aquele amor que sente por Hugo. As ondas batem em seu abdômen, como se lhe dessem vários socos. Talvez ela mereça aquilo.
Como será viver sem o toque dele? Como eu era antes de conhecê-lo? O que eu fiz da minha vida, pensa Beatriz enquanto seu corpo é puxado pelas ondas. No início Beatriz pensa em desistir, tenta se lembrar como veio parar na praia, mas não importa mais, nada mais importa. Então uma enorme onda surge a levando para o fundo.
Beatriz afunda cada vez mais, se lembra das palavras duras de Hugo e da forma como ele a dispensou. Aos poucos o ar vai saindo de seus pulmões. Pode jurar que consegue ver Hugo vindo em sua direção, o sente segurando seu corpo e a levando para superfície. Então tudo se torna escuro.